Jardim estro e folguedo
corte plano um:
o rapaz encontra uma maleta
de dólares,
corta, externa:
o câmera faz de conta
que ele não é poeta,
plano geral, panorama da mansarda.
altiplano: dores do mármore,
depois o período calcolítico,
a idade do bronze,
e o ferro que funda o metal.
Seca a seiva, a messe agoniza
depois da fenda na pedra.
corte final:
o rapaz diz que não sabe
que seu biógrafo
rasgou seus poemas
e os queimou
numa grande
pira olímpica.
11/03/2017 Gustavo Bastos
sábado, 11 de março de 2017
CODA
Balança o balangandã,
maraca e bruta massa,
furta-cor e maçãs do rosto,
caldo capital mentolado.
Balança as ancas os soníferos
e as receitas de poções.
Bruma e bomba no criador
das batalhas, um falso poeta
que não sabe seu sentido,
farto, enfadado, ele se aposenta
com seus metros de pedra
e coração humilhado.
Balança o palhaço o clown
o esteta mais afetado
com rebuscado abstruso
e cristalizado,
ferve teu poema como uma infusão,
cura as cicatrizes tuas
com versos salinos
de parnaso afrancesado,
ou ainda se mata
depois da coda.
11/03/2017 Gustavo Bastos
maraca e bruta massa,
furta-cor e maçãs do rosto,
caldo capital mentolado.
Balança as ancas os soníferos
e as receitas de poções.
Bruma e bomba no criador
das batalhas, um falso poeta
que não sabe seu sentido,
farto, enfadado, ele se aposenta
com seus metros de pedra
e coração humilhado.
Balança o palhaço o clown
o esteta mais afetado
com rebuscado abstruso
e cristalizado,
ferve teu poema como uma infusão,
cura as cicatrizes tuas
com versos salinos
de parnaso afrancesado,
ou ainda se mata
depois da coda.
11/03/2017 Gustavo Bastos
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A VERDADE BROCADA EM SUMA
Que a verdade meio que é soco
e meio que é grito.
O poema estreia na luta diária,
escreve o intento com
rugas de velhaco,
exuma teu broquel
com faróis.
Que a verdade é meia boca
como a boca do mundo
que vive,
que o poema, pobre coitado,
é um sumo sacerdote
da bacanal,
sortudo como um forasteiro
que ganha duelos
de fumo e carteado,
tal é o esteta e sua trupe maluca
que no pio da pajelança
cura até o poeta
mais exangue.
11/03/2017 Gustavo Bastos
e meio que é grito.
O poema estreia na luta diária,
escreve o intento com
rugas de velhaco,
exuma teu broquel
com faróis.
Que a verdade é meia boca
como a boca do mundo
que vive,
que o poema, pobre coitado,
é um sumo sacerdote
da bacanal,
sortudo como um forasteiro
que ganha duelos
de fumo e carteado,
tal é o esteta e sua trupe maluca
que no pio da pajelança
cura até o poeta
mais exangue.
11/03/2017 Gustavo Bastos
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BARRICADA
Me dá um ás na manga
e sucos e leiterias que
bebo sequioso.
Ruma ao farol, oh castelo,
e demite meu doce sabor
com rusgas entre público
e crítica.
Destarte as casas queimam,
sofre o parlapatão
que sumário corte
faz a súcia surtar.
Bola um plano, teu mistério
que diaboliza, faz um caso
estulto que pilha a patuleia,
Arrisca-se poeta no diário
em que notas suicidas
são somente bramidos
de alfanje,
rota terceirizada do poeta:
os editores moucos mudos
e que não têm paixão
na barricada em que caem,
delongas: este poema é de um
torto verso que enverga.
11/03/2017 Gustavo Bastos
e sucos e leiterias que
bebo sequioso.
Ruma ao farol, oh castelo,
e demite meu doce sabor
com rusgas entre público
e crítica.
Destarte as casas queimam,
sofre o parlapatão
que sumário corte
faz a súcia surtar.
Bola um plano, teu mistério
que diaboliza, faz um caso
estulto que pilha a patuleia,
Arrisca-se poeta no diário
em que notas suicidas
são somente bramidos
de alfanje,
rota terceirizada do poeta:
os editores moucos mudos
e que não têm paixão
na barricada em que caem,
delongas: este poema é de um
torto verso que enverga.
11/03/2017 Gustavo Bastos
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VERSO PERMANENTE
Que eu inverta a sina e persista
neste verso campônio,
ah que o poema é poesia
e monturo de cinzas.
Pois, dentre os meus atos proscritos,
ao léu que rima suma obra-prima,
refaz anjo e demônio
como eixos da existência.
A poesia, fundada com ópio,
elenca os silêncios que
fuligem voa pelo ar.
Que leio cantores, e canto escritores,
que revejo os planos geométricos
e a carne surrada do sonho,
e não me faz cócegas nem
a ideia principal de ser navio.
Pois rio, e neste caudaloso encômio,
retrato os sóis da cor de âmbar
que pintam o universo,
e que, recôndito dos autores,
tudo é festa quando
verso faço.
11/03/2017 Gustavo Bastos
neste verso campônio,
ah que o poema é poesia
e monturo de cinzas.
Pois, dentre os meus atos proscritos,
ao léu que rima suma obra-prima,
refaz anjo e demônio
como eixos da existência.
A poesia, fundada com ópio,
elenca os silêncios que
fuligem voa pelo ar.
Que leio cantores, e canto escritores,
que revejo os planos geométricos
e a carne surrada do sonho,
e não me faz cócegas nem
a ideia principal de ser navio.
Pois rio, e neste caudaloso encômio,
retrato os sóis da cor de âmbar
que pintam o universo,
e que, recôndito dos autores,
tudo é festa quando
verso faço.
11/03/2017 Gustavo Bastos
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sexta-feira, 10 de março de 2017
HOLLOW
I
Tantos casos estudados nesta cosmologia, e que são seres nus,
como poucos vermes que sobrevivem ao mundo, e que tentam abarcar os númenos com
galhardia de soberbos e alvissareiros, pois por pouca monta os severos e os
antoninos sucumbem ao senado pueril, eu de meu turno resvalo e reservo fortuna
para um cabedal brio de espuma no vento sacal dos hindus e seus vímanas, como
uma corrente literária manchada de lodo e vinho, este que é sabor estulto na
glória do sistema, este também estulto, capital armado e nauseabundo, contrito
o esquema de Aristóteles explode com o rigor de um kantiano crítico feroz do
sono metafísico, com um Hume sensitivo na campanha de um fundo vitral que arde
por entre os ventos mais modernos, um plano cartesiano que ribomba pétreo com
sarcasmo de poeta, e o riso enfermo que mora num castelo em Copacabana, na mais
miserável canção que está de frente à rua que grita somos os outsiders, os
mamulengos e vitrolinhas da paixão antiga, dos poemas rebuscados com notas de
absinto, das rimas ricas como idólatras que têm sede.
Dos poetas antiquados que não vivem no mundo, não neste
mundo, em mundo algum, moram em carne e osso como vapores de veneno na história
mundial, moram tal os animais ou bestas repletas de carbono em seus corpos e
polímeros cosmogônicos teodiceia da arte rupestre, um totem burilado com sílex
na caverna de Paris, setenta ladrões como gangue, viralizados costumes que são
a rixa e o riot das galeras fumegantes, dos estertores do fracasso, dos
lenhadores e tremores que sorriem para alguns capatazes com seus enfermos
vitoriosos, guerra e paz na aura de um anjo fetichizado com bombas de esterco
na fome do boi, estes senhores do mundo que vivem morrem como indigentes da fama,
como desejo ruminado nas estrelas mais abscônditas, remadores dos sonhos de
pano por entre frestas que olham ao nada, rasputins negros com faces de mago,
monitoram os passos a cada dia, e sentam na torre de lume viscoso, eles olham o
pote de ouro que revela poesia na esbórnia, são telemas e budismos ranqueados num
campeonato de astúcia, num grimório de fardos e buchas de canhão.
Sete pantokrators que vivem giro de escopeta, de fumo
revirado com espoleta, belicosos que querem a paz mundial, fervores de antros
pacificadores, de não-violência, dos hippies de ocasião, dos fashionistas que
definem o mundo de segunda mão, da realidade aumentada como manto e segredo
penhorados depois do escaldo e martírio. Venha, os ogros imantam servos com náiades
esbeltas como anacoretas, e bebem uísque com tambores na cabeça e flautas nos
braços, senhoras músicas que de guitarra e trompete repete o fusion
indefinidamente, pois cada retrato destes ossos têm a espessura de uma
densidade de átomo, indivisível como uma bola de gude, temerários como templos
e pagodes na sarça briosa que elenca vates e vedetas. Canção esmerada que
tilinta tal o metal de rigor que funda filosofia de poetastro depois da bebedice,
que define saudade como uma rima fugitiva.
II
Aéreo o plano aedo cintila, rumoreja ferve e briga, e ferve
tal o campo mestre que cintila, como cobra serpentina, e um estrelado
estribilho que cintila, bruma rebuscada que mesmeriza tal o sino que dobra, e o
banho em festonado vinho, odre pecaminoso que bebe e ventila, evento e
evidência de poema, a prova científica do terror, vertido como água benta na
pacífica amurada, um grafite terroso no sonho de poeira, levedura que nos dá a
boca de saída, pentecostes nos ombros de atlas com o mapa ao pé do geógrafo,
bolhas de mundo estouradas por revoluções, penedos que caem como mísseis no
apocalipse, espíritos imundos que brigam com pastores, brechas do sistema que
assomam no estudo corrupto dos punguistas, leves sintomas de hematomas que roem
a corda do enforcado, sete flechas de indigenistas que buscam o eldorado,
tânatos dorido que fervilha necromancia depois do ritual poético.
Linho que costura cada gesto artaudiano com gags
beckettianas. Olhos mesmerizados que ensinam a palavra morte aos neófitos que
ainda sonham acordados, pleito burlado por campanhas sujas de pós-verdade,
brotos de floresta que povoam um mundo perdido, paraíso silvestre que nos dá
selvagens novos de literatura da mata, poetas novos que caem como cometas no
frio do sistema falido das artes comerciais que deliram anátemas proscritos.
Banho de lua nas noites que eu servia ao mártir, estes barcos que navegam mar
azul de diamante, frio de mar turquesa caribenho, milhares de remadores que vão
à galáxia dos aviadores, reis setentrionais contra centuriões que formam o
exército brancaleone dos românticos suicidados.
Eis que vive um novo brio bíblico que sonhava holocaustos na
hégira e no êxodo, benta a água de poder de tais sacerdotes em seus levitas pasmados
com o Deus-homem. Eis que venho de sonhos tempestuosos e kafkianos e pesadelos
de Godot depois do milagre indômito que delirava o paraíso de permuta entre
cantores de fancaria. Ai! Ai de mim! Tenho cada visão que caio em
deslumbramento como um ósculo olvidado depois do porre. Mas, no meio da canção,
com dotes de artista, reverbero samples e synths mais que anacrônicos, são vinhas
de monastério com ritmo de jazz na fusão dos elétrons que batem entre neutrinos
invisíveis da bala perdida, eis que numa viagem astral venho contar-lhes a dor
profunda da miséria dos poetas, mas ainda tenho fogo que queimar na sarça mais
potente do sol.
III
O fog londrino me apetece, o beberrão morde os tímpanos com
rock de estrada, fervilha um berro kerouakiano, um velho mestre que se chamava
Ferlinghetti, Neal Cassady que morria na linha do trem, os Estados Unidos e
toda a gama de capitalistas de Wall Street e seu touro valente que faz
tentações de estelionato, os espiões da Big Apple que reviram seus bens com
fome ventral de cartas na manga, pois que eu tenho por mim que prefiro Louvre e
seus melismas potentes como mantras sinfônicos, já que vejo as litanias
repetirem Fausto e Mefistófeles depois do urro brutal que Goethe não evitara nem
na sua invenção de Werther epistolar, ah que nem mesmo a lenda medieval nos
salva do capital, mas é seu cristal mais atraente, e o dinheiro gasto em tais deambulações
serve ao historiador para contar uma biografia acidentada como pinguelas de rua
de terra, de rios de cobre depois do caos mimético dos plantonistas que
encontram a morte com dentes de fogo na noite violenta, pois que sumido está o
zen na hora enferma, e nem tenho mais tibetanos que lembrem de maoístas sem lhes
ferver as pestanas, e o desastre sonha em se proteger da mediocridade, pois ela
mata e delira cabeças ocas como hollow men que não servem para nada.
Ah! Ai de mim! Estou no inferno de Caronte, nas uvas de
Dioniso, na febre inaugural de Téspis, nos trágicos que de Ésquilo e seu
Prometeu Acorrentado apenas faz loas ao abutre, e leis cósmicas são fado nestas
peças antigas, o que hoje temos como puro acaso, e que nos idos putrefatos de
Março estavam como novos ventos de um novo mundo cristão, que tem o reverso da
moeda como Inquisição, o que também hoje tem o nome de manicômio, e que custa a
verba pública para os bolsos de seus torturadores, nova platitude medieva, oh
como cada burgo sonhava revolução, e como cada soviete sonhava revolução, e
como cada hollow man sonhava status quo.
IV
A caça às bruxas está aberta:
Grimório do capa preta,
Eis que rumina maçons
Na sete emblema de arquiteto
Que campeia marmóreo
Como capiteis em Parthenon
Oh Crowley e seus cantos heroicos
Oh bruxos como celtas em Stonehenge
Ah fada musicada que burila soma
Na mente mística do Absoluto
Ah como cada magia tem altas paragens
O paraíso perdido e seus sapientes embriagados
O êxtase de Santa Teresa D`Ávila
No fim da aurora que rutilava salvação.
11/03/2017 Poema em prosa
Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
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Poesia
quarta-feira, 8 de março de 2017
OS PEIXES
Pescadores são augúrios da sorte
que finca a carne na coragem.
Eis que fartura quando cristos
caminham na aura do mar,
como anjos pescam
as formas deste oceano,
e sim um mar que abre vivo
e a face divina ilumina,
que os peixes, em seu tráfego
interminável de cardumes,
faz o mar povoar
os mistérios
do ser,
pois o mar, os peixes e os pescadores,
são como a trindade
que do sal todo o universo
ressoa, e vejo este dom visionário
que alimenta as lendas
do prazer,
tais os delírios
que o desconhecido
eclode
como enigma,
o mar e seus peixes,
de súbito,
na rede que puxa
a esperança.
08/03/2017 Gustavo Bastos
que finca a carne na coragem.
Eis que fartura quando cristos
caminham na aura do mar,
como anjos pescam
as formas deste oceano,
e sim um mar que abre vivo
e a face divina ilumina,
que os peixes, em seu tráfego
interminável de cardumes,
faz o mar povoar
os mistérios
do ser,
pois o mar, os peixes e os pescadores,
são como a trindade
que do sal todo o universo
ressoa, e vejo este dom visionário
que alimenta as lendas
do prazer,
tais os delírios
que o desconhecido
eclode
como enigma,
o mar e seus peixes,
de súbito,
na rede que puxa
a esperança.
08/03/2017 Gustavo Bastos
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ESTUDOS DA NUDEZ SIMPLES
O corpo é o centro da experiência
com o mundo, se está preso ou
solto, liberdade de estar em qualquer
lugar é que o corpo é,
pois do vício que lhe toma
e da virtude de sua força,
está na nudez desta experiência.
O corpo convida ao estalo de
si mesmo. Cair em seu flerte
requer um olho sonhador,
sem desvios de seu forno quente
que explode hormônios,
sem se fechar ao desejo
que lhe culmina
a face.
Experiência limite e anti-linear:
o corpo dá volta nas interações mundanas
e no fim do dia volta a si mesmo
como borboleta e casulo,
alternando seu estar no mundo
com o estar em si.
08/03/2017 Gustavo Bastos
com o mundo, se está preso ou
solto, liberdade de estar em qualquer
lugar é que o corpo é,
pois do vício que lhe toma
e da virtude de sua força,
está na nudez desta experiência.
O corpo convida ao estalo de
si mesmo. Cair em seu flerte
requer um olho sonhador,
sem desvios de seu forno quente
que explode hormônios,
sem se fechar ao desejo
que lhe culmina
a face.
Experiência limite e anti-linear:
o corpo dá volta nas interações mundanas
e no fim do dia volta a si mesmo
como borboleta e casulo,
alternando seu estar no mundo
com o estar em si.
08/03/2017 Gustavo Bastos
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ESPÍRITOS DA FLORESTA
Tal que uma cabana na chuva
me acampa em água total,
severo o corpo emula
o desastre.
Me and my sickness,
olhos perpétuos de dor,
oh sad sad world!
Tal que o poeta não está
em si mesmo sem estar
no poema,
tal o enfeite em sua verdade,
o prumo sólido e conquistado
em seu verso,
oh que mosquitinho chato
a berrar na madrugada
e me tirar do sono,
que tambor mais aviltante
no redemoinho da viagem astral!
oh espíritos da floresta,
me levem ao disco voador
dos sirianos pelados
na luz do outro mundo.
08/03/2017 Gustavo Bastos
me acampa em água total,
severo o corpo emula
o desastre.
Me and my sickness,
olhos perpétuos de dor,
oh sad sad world!
Tal que o poeta não está
em si mesmo sem estar
no poema,
tal o enfeite em sua verdade,
o prumo sólido e conquistado
em seu verso,
oh que mosquitinho chato
a berrar na madrugada
e me tirar do sono,
que tambor mais aviltante
no redemoinho da viagem astral!
oh espíritos da floresta,
me levem ao disco voador
dos sirianos pelados
na luz do outro mundo.
08/03/2017 Gustavo Bastos
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DESVIO DE ROTA NA MANHÃ
Como se faz coaxar sapo cururu
e gritar curumim no rio de sucuri,
e vitalizar carmim e pescador-martim.
Como se cobra d`água fosse,
e linha mestra por entre
as iaras amazônicas,
e segredo de bruxo
no mar tormentoso.
De muro grafitado e folclore
os coloridos da vida perpassam
a sua face cinza,
dois extremos e a poesia
que figura não mais
como acessória,
mas fundamental.
E o sapo alucinógeno, que coaxa
sonho estrelado, faz poesia
e bandeira de mastro sério
como o poeta que pula e muda
o disco com o rigor
de um funcionário antigo.
08/03/2017 Gustavo Bastos
e gritar curumim no rio de sucuri,
e vitalizar carmim e pescador-martim.
Como se cobra d`água fosse,
e linha mestra por entre
as iaras amazônicas,
e segredo de bruxo
no mar tormentoso.
De muro grafitado e folclore
os coloridos da vida perpassam
a sua face cinza,
dois extremos e a poesia
que figura não mais
como acessória,
mas fundamental.
E o sapo alucinógeno, que coaxa
sonho estrelado, faz poesia
e bandeira de mastro sério
como o poeta que pula e muda
o disco com o rigor
de um funcionário antigo.
08/03/2017 Gustavo Bastos
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O MUNDO ALUCINADO DAS LETRAS
Eu enlouqueço nos desenhos,
se o prumo tento recobrar,
é pelos signos da cor
que o pulso retoma
a história toda.
Prático está o fim do dia,
relaciono os sonhos e o descalabro
das cinzas que sobram
da aventura.
Pois na casa e no meu pátio
está sorvido o líquido precioso
que vive a remontar os corpos
do baile noturno.
Envio uma nova mensagem com
vinhos levitados e coca-cola,
redemoinho de serpentinas
invadem a bacanal.
Retrô este visual de velho loucão,
e que aos oitenta e nove anos
poemas faz como um doutor de tudo,
revira seus metros com sílabas
e toma a pinga na água da boca,
eu enlouqueço mais ainda com poesia
do que o mundo que se alucina.
08/03/2017 Gustavo Bastos
se o prumo tento recobrar,
é pelos signos da cor
que o pulso retoma
a história toda.
Prático está o fim do dia,
relaciono os sonhos e o descalabro
das cinzas que sobram
da aventura.
Pois na casa e no meu pátio
está sorvido o líquido precioso
que vive a remontar os corpos
do baile noturno.
Envio uma nova mensagem com
vinhos levitados e coca-cola,
redemoinho de serpentinas
invadem a bacanal.
Retrô este visual de velho loucão,
e que aos oitenta e nove anos
poemas faz como um doutor de tudo,
revira seus metros com sílabas
e toma a pinga na água da boca,
eu enlouqueço mais ainda com poesia
do que o mundo que se alucina.
08/03/2017 Gustavo Bastos
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terça-feira, 7 de março de 2017
SPIRITUALS
I – O FUNDO MITOLÓGICO
Os passarinhos do céu são longânimos:
Atitude ventral: o caboclo sete flechas retira-se da batalha
campal, a tosse espirra com bruma valente, o exú sete trevas rebomba a nau
mestra com galhardia. Veio meu sumário neste dia frouxo de meu poema: a lida é
seca e pura, eu via igrejas pasmadas como delírios na rota de saberes moucos,
surdos aviltados por barulhos, mudos gritando com as mãos, a saber navega em si
o poeta que não sabe de si, louco como um assunto estorvo, mutante que revigora
as pestes de que a antiguidade é farta, pois Seth revirava Bek, Osíris e a fada
Ísis, pelo canto sumério um deserto se abria em Tigre e no Eufrates, pois Baal,
como se via na gira, borbulha tal o elmo, pois Tamuz, Enlil, o grande Marduk
face a face com Tiamat, todo este séquito sabia todas as notas do sistema
sexagesimal, um outro castelo feito na rua astronômica em que dormia tal
estrela, vestes de vestais com Deméter, riso e troça com miasma de tal
defumação do rigor da luta, pastores e ribeirinhos falando tupi no meio do
defumador, eu que lia as cartas e Pai Antônio das Almas apenas fazia fumaça.
II – O FUNDO MUSICAL
As avezinhas do céu são libertárias:
Quando se ouvia Robert Johnson se tinha em seus dedos e
palheta ou sabe-se lá o que foi teu pacto, a ver nas fazendas de algodão um martírio
se ouvia os lamentos virarem arte, pois de outro modo seria apenas sofrimento e
não ladainha, e não saída voilá da parte d`alma que canta, ou se tudo fosse de
fato só duramente forjado, não haveria poesia, só roncos e patifes, não haveria
poesia, só murros em cada passo, não haveria música, só um estrondo que rimaria
desesperado. Pois, com as notas musicais se edifica o espírito da verdade, e
não se rima em demasia a produção dorida, mas se faz templo de ritual com sete
cortes na jugular, como um cancioneiro que ritualiza não teu dorido lamento
apenas, mas teu apaziguado sonho que floreia mais a utopia geral do que o
flagelo do mundo, pois, com todo o concerto, não temos apenas a dor do coração,
mas a felicidade que ruma ao paraíso depois de morta, uma visão ou antevisão,
um dom se assim se quer chamar, ou a violência pacífica que tem norte e sul em
cantorias vertidas do sangue ruim da vida, do líquido sonhado e azul que não
sangra mais, da nobreza escrava que dedilhava as mãos de blueseiros depois de
um drama nas unhas fincadas em algodão.
III – O FUNDO POÉTICO
Os cucos do céu são pontuais:
A poesia métrica ou espatifada são sonoras e musicais, são
discursivas e modais, são poemas com cavaletes, com vinhos, com romanceiros,
vertem fúrias, sobra o espírito vulcânico, corrompe o demônio interno, fulgura
como montanha e galardão. Nota a poesia com vinha retinta, bruma de banho e
sol, como fia sem porfia, como tanto se faz com doses de lida, e nem se faz
idiota, ou pouco inteligente, mas sim como um coro trágico desperta, e longa ou
curta se esmera. Vai-te poesia de sim e de tudo! Mas quanto melisma simbólico,
e frutos metafóricos! A vida se frutifica como mel e maná, otimiza sem lugar,
viraliza sem notar, sem cerimônia o poema eterniza, e rima qual longo sonho ou
delírio, mas, cônscia e reta, a poesia fulmina e gira, tal a sua geologia, tal
a arte geodésica, a rima gravita, o verso em crosta se firma, e à atmosfera
voa. A poesia é esta nau dos insensatos que nada mais faz além de cantar, pois
dádiva tu és, poesia como empresa, vinho como glória, alma como mérito, corpo
como guerra, vícios e virtudes como o que se é. Poesia, tua morada é de mitos,
sua tez é democrática, teu legado é todo o universo, pois uma vez lida, poesia,
tua fuga se encontra, e pasma o mundo sem ter te visto ou mirado quando tudo se
sucedia a olhos vistos, poesia, poesia. Ah, mas que rima pouco dada, que
vagabundo sem sorte! Mas não, poesia tem tudo em uma linha, tudo em dez linhas,
como o fio que não faz porfia, como Ariadne que mata o cão, linha de linha e
costura de armadura, poesia é linda como o verão, respeitável como o inverno,
faz verso na primavera, e depois se despede no outono, com folha seca da relva
vermelha, rubra seca folhagem do sangue, via de fogo fátuo que a natureza
assimila sem enfado, poesia é um grau de mestria por espada e flor, por guerra
e paz, poesia é contradição absolutizante, paradoxo que borbulha champanhe,
vinho tinto seco que lambe a garganta dos sonhos que não são vãos, poesia farta
o homem como um banquete, e quem não a entende passa fome, e o faminto morre
por nada mais, sem poesia. Farta a tua seiva, a tua sebe, a tua colheita, farta
do mundo cão teu verso potente como som, farta do mundo vão dos que passam fome
sem saber. Poesia é comida, é refeição
sagrada da alma, poesia é esta alma canora que dá de comer ao mundo, mesmo que
o mundo prefira a fome.
IV – O FUNDO LITERÁRIO
As andorinhas do céu são veraneios:
A Literatura espiritual que conquista o coração das coisas, o
literário que emana tua estrela pátria, e se expande tal o cosmos que brilha, tem
no livro um maná inesgotável da aventura, pois a escrita se faz em ode e elegia,
alegria e mutação, dor parida e fonte de feliz canção, o poema astúcia deste
concerto é a coroa da vida, a literatura se serve de tudo o que existe na
imaginação, e o mundo real é um espelho que joga com este delírio. Vamos! Toda
a sorte do mundo e todo o amor do mundo neste universo literato, que nos leva
além, que nos dá a luz que vem de um estalo de sol, que nos dá a noite profunda
da reflexão, que nos traz estórias loucas que o mundo surpreende, tais são as
aventuras letradas que sorriem para o dia auroral que nos dá tudo, e que nos
livra de todo o mal. Literatura é um pássaro que vai e voa para mais longe do
que o olhar ao horizonte, que nos vinga de frios eternos da morte, que nos leva
ao cerne de todo o existir, pois que da sombra faz treva espiritual se demudar
em luz própria, e nos dá salvamento para o Orfeu que toca o coração da música,
a literatura vem de poesia e aedos rapsodos e começa a se inserir em ficção,
duas frentes libertárias que é poesia e estória, música e imaginação. Vem me
dar o dia à tarde a carta escrita no outono da vida, no mar que bem se quer com
a flor benquista que bebe vinho, com a dor vertida que nos leva à filosofia
mais bruta do mundo, para mais que tudo o sonho reverter-se do pó e virar céu
azul ao infindo voo, e eis que o torpor não é mais o desejo da pena, mas a
lucidez extrema que povoa o mundo real, a vida mais autêntica que conquista
todo o universo com loas de suprema letícia. As minhas canções saem na rua que
grita estamos aqui, rua da cidade que pula e ri, o circo que passa no vento da
careta que faz a criança, o lúdico que se embrenha em meio ao caos, a cidade
mais alta torre se despe pelo calor e se cobre no frio, todas as canções
atingem o coração das coisas, e a literatura, deste modo, canta de si mesma o
seu terreno imaginoso, de que a terra é
repleta, a plenitude é o clímax que o poema, enfim, ventila, por saber-se tão
preso ao chão, mas com o espírito livre que bebe e come cheio de esperança! Sim!
A terra é da literatura e de seu espírito livre, uns dizem alma de poeta,
outros dizem inspiração de artista, e os que fazem dizem esperança. Literatura
é vida reafirmada em sol e gerações delirantes.
V – O FUNDO FILOSÓFICO
Os anjos do céu são eternos:
A filosofia espiritual emana como a esfinge fundamental que
do karma mais bruto nutre os passos de paquiderme à leveza da angelitude,
passos firmes que sonham alto, passos delicados que trabalham com cuidado,
esmero na arte e força no coração, leão de todas as horas é filosofia e seu
corte na coisa toda, espírito aqui é analítico e sintético, espiritual é o
idealismo totalizante de uma figura final, mas não tem fim, e o estro do espírito
tenta ser sistema, depois tenta ser crítica, antes ainda essência, depois ainda
nada disso, uma das perspectivas, a liberdade, e se está sempre diante da
esfinge que é o universo, o pensamento tem força, mas a existência tem uma
força descomunal diante do pobre pensador que tenta se organizar, toda a poesia
que bebe em filosofia, certa se embriaga, mas continua só cantando, pois do
total que se dá a todo o tempo, os pré-socráticos diziam ser algo, os
contemporâneos ainda o sentem em certas cosmologias, mas tudo que brilha no
olhar destes todos que vivem é a encarnação da dúvida e da origem do mal,
sonhamos muito na paz, e somos sempre bélicos na estrada, se tudo fosse
perfeito ruiria, pois nem poeta e nem filósofo, na sua melhor hora, será pleno
ou perfeito, ondas de humor povoam a terra e seus dramas, o mal do mal gerado
inverte e bem vem como utopia, o canto espiritual ainda ecoa como um pequeno
oásis, já se perdeu, toda esta estória de plenitude já se perdeu, em algo ainda
moramos na esperança, como uma entidade benfazeja nos dizendo que há luz no
mundo, e que nem tudo é grave ou pecado, e que nem tudo a filosofia dá conta, e
que nem tudo a poesia e a literatura resolvem, e que nem no mundo mais brando
do coração não há conflito, a batalha espiritual busca a sabedoria, esta sim
entidade dificílima, repleta das nossas contradições e repetições, a plenitude
dos erros que nos dá tudo que temos, a poesia e toda a literatura, juntando-se
à filosofia e ao mito, como forma de esperanças que tentam dar conta do mundo e
melhorá-lo, e que do erro tenha vez este todo acerto da imperfeição total, spirituals
vem de canto dorido para cantar a esperança que já está em todo coração que sonha
e faz, libertação é o nome de spirituals, este é o poema.
07/03/2017 Gustavo Bastos
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domingo, 5 de março de 2017
VERTENTES DA IDEOLOGIA
Bela nau de piratas:
espadas e alfanjes,
cimitarras de guerreiros.
Bela escola de anarquistas:
panfleto de cantores roucos
com a fuligem da tarde.
Bel-canto canoro de andorinha,
funesto o abutre,
bruta a pedra que
nada pensa.
Oh corte dos badulaques
e premonições de ardil,
corte de faca profundo
no peito do sol inquieto,
que soma alucinógeno
nos dá cântaros
de paraíso?
e onde estará utopia
e eldorado?
05/03/2017 Gustavo Bastos
espadas e alfanjes,
cimitarras de guerreiros.
Bela escola de anarquistas:
panfleto de cantores roucos
com a fuligem da tarde.
Bel-canto canoro de andorinha,
funesto o abutre,
bruta a pedra que
nada pensa.
Oh corte dos badulaques
e premonições de ardil,
corte de faca profundo
no peito do sol inquieto,
que soma alucinógeno
nos dá cântaros
de paraíso?
e onde estará utopia
e eldorado?
05/03/2017 Gustavo Bastos
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COMETA E ARCO-ÍRIS
Cometa fujão que bem disse
no entorno desta esfera seca,
que rima sua base com lilases
e morde nuvem com rabo de rato.
Cometa condão que milagre
às favas compete com a poesia,
e retira meu pranto de mentira,
meu lodo carnal de filosofia,
que sibila cantante tal a onda
que deixa,
e me dá história contada
com metro invertido,
terrível sonho aqui em terra brasa,
seca e brava,
como um cometa o sonho evanesce,
vira fumaça e se esquece,
este vil vinho na esfera fogo,
seca e terrível, mortiça
com vitrais através da luz solar,
e o prisma multicor
que do arco-íris
é só a miragem.
05/03/2017 Gustavo Bastos
no entorno desta esfera seca,
que rima sua base com lilases
e morde nuvem com rabo de rato.
Cometa condão que milagre
às favas compete com a poesia,
e retira meu pranto de mentira,
meu lodo carnal de filosofia,
que sibila cantante tal a onda
que deixa,
e me dá história contada
com metro invertido,
terrível sonho aqui em terra brasa,
seca e brava,
como um cometa o sonho evanesce,
vira fumaça e se esquece,
este vil vinho na esfera fogo,
seca e terrível, mortiça
com vitrais através da luz solar,
e o prisma multicor
que do arco-íris
é só a miragem.
05/03/2017 Gustavo Bastos
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SÓIS SIMBOLISTAS
na barbearia uma face estulta
corrói a si mesma,
pega de faca na luta vã
de sorrir,
tomo o café na tabacaria,
tomo formol de luta suicida,
como um ócio valente
que dorme,
uma onça que pula com garras,
um fantoche que faz teatro,
ou ainda este bruxo que ri
com sol em tal face de mundo,
oh, que nada mais importa
neste conto furibundo
de metal, que nada,
na barba cortada
e meu sorriso,
que nada mais no dia infinito
me delicia mais que o sol
na cara, e o livro que faz
melisma com som
de simbolistas velhos.
05/03/2017 Gustavo Bastos
corrói a si mesma,
pega de faca na luta vã
de sorrir,
tomo o café na tabacaria,
tomo formol de luta suicida,
como um ócio valente
que dorme,
uma onça que pula com garras,
um fantoche que faz teatro,
ou ainda este bruxo que ri
com sol em tal face de mundo,
oh, que nada mais importa
neste conto furibundo
de metal, que nada,
na barba cortada
e meu sorriso,
que nada mais no dia infinito
me delicia mais que o sol
na cara, e o livro que faz
melisma com som
de simbolistas velhos.
05/03/2017 Gustavo Bastos
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BATIDAS DE VENTO NA TESTA
Que o vidro quebrado das garrafas
me deem à bebedice destas danças,
qual rato fumando cachimbo,
gato de botas no verão escaldante
de um sol de flechas,
broto de bambu de cabanas verdes,
risos de mel no fim do dia.
Qual nada! Ó história de carroças
corridas na via de naus totêmicas!
Que danço por entre espartilho e taras,
risos de céu no quadro de pollock,
brumas de sal na vinha e sarça
que dá pau em doido,
oh riso estrelado que risonho
campeia o campo,
e dá de ombros com asas rosa shocking
no pássaro de prata
das odes de mormaço,
rei de tudo, tolo tonto
de saltar, que à miragem
dá aurora como fome de cão
nas estátuas de mármore
que a capela guarda
como tesouros de pirata,
e meu calhamaço cartapácio
que flutua risonho de feliz.
05/03/2017 Gustavo Bastos
me deem à bebedice destas danças,
qual rato fumando cachimbo,
gato de botas no verão escaldante
de um sol de flechas,
broto de bambu de cabanas verdes,
risos de mel no fim do dia.
Qual nada! Ó história de carroças
corridas na via de naus totêmicas!
Que danço por entre espartilho e taras,
risos de céu no quadro de pollock,
brumas de sal na vinha e sarça
que dá pau em doido,
oh riso estrelado que risonho
campeia o campo,
e dá de ombros com asas rosa shocking
no pássaro de prata
das odes de mormaço,
rei de tudo, tolo tonto
de saltar, que à miragem
dá aurora como fome de cão
nas estátuas de mármore
que a capela guarda
como tesouros de pirata,
e meu calhamaço cartapácio
que flutua risonho de feliz.
05/03/2017 Gustavo Bastos
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PSICONAUTAS
Meu solo de herói funciona
como uma engrenagem
de som:
duas pausas entre gritos,
dois socos e um sopapo.
Ventila meu vento forma de vida,
seres encastelados em estrelas,
espelhos d`água
e bruma.
Com as vedetas e brios fumaçados,
côrte de toda a patuleia,
vermes redondos e latinhas
cor de festa,
ventre explodido de arte:
meu rito de mecânica
que emite o som alienígena,
rotas de fuga na carta náutica
dos mapas geológicos
da primeira era,
eu, que sou um rebelde tosco,
tenho senhas em poemas
como uma poeira cósmica
na boca da supernova,
no quasar espatifado
dos psiconautas.
05/03/2017 Gustavo Bastos
como uma engrenagem
de som:
duas pausas entre gritos,
dois socos e um sopapo.
Ventila meu vento forma de vida,
seres encastelados em estrelas,
espelhos d`água
e bruma.
Com as vedetas e brios fumaçados,
côrte de toda a patuleia,
vermes redondos e latinhas
cor de festa,
ventre explodido de arte:
meu rito de mecânica
que emite o som alienígena,
rotas de fuga na carta náutica
dos mapas geológicos
da primeira era,
eu, que sou um rebelde tosco,
tenho senhas em poemas
como uma poeira cósmica
na boca da supernova,
no quasar espatifado
dos psiconautas.
05/03/2017 Gustavo Bastos
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FUNDO DE TUDO
Como se nota o carnaval,
tal o encanto da manobra
dos corpos de bronze,
eu tinha a fada com onda vermelha,
retinia o metal, eu endurecia os
ossos na bacanal.
Passavam os líderes de torcida,
os risos no chão do afã
do campeonato,
pelotão e fuzil,
anzol e anca.
Como se faz tríduo momesco
com as dores de parto
dionisíacas,
e se lambe o ácido na tez da folia.
05/03/2017 Gustavo Bastos
tal o encanto da manobra
dos corpos de bronze,
eu tinha a fada com onda vermelha,
retinia o metal, eu endurecia os
ossos na bacanal.
Passavam os líderes de torcida,
os risos no chão do afã
do campeonato,
pelotão e fuzil,
anzol e anca.
Como se faz tríduo momesco
com as dores de parto
dionisíacas,
e se lambe o ácido na tez da folia.
05/03/2017 Gustavo Bastos
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ANDY WARHOL E A POP ART – PARTE III
“Warhol tem um de seus momentos chave quando se volta para a
fotografia como matéria de seu trabalho”
A SERIGRAFIA COMO MEIO
ARTÍSTICO
Uma pintura que tem o tema da morte inaugura uma notável
produção de quadros que marca um novo momento na História da Arte, tal trabalho
que é inspirado numa catástrofe aérea em Nova Iorque, que era até então a mais
grave na história da aviação. Contudo, para Andy Warhol o evento da queda do
avião pura e simplesmente não foi o motivo do trabalho artístico, e sim o modo
que tal evento apareceu na imprensa, mais exatamente a fotografia da carcaça,
publicada, no dia 4 de Junho de 1962, no jornal de grande tiragem “New York
Mirror”.
Warhol então projeta na tela a fotografia do jornal, onde,
dominando todo o cenário, se ergue a empenagem do avião a jato que está caído, e
a copia através de pintura. Neste trabalho Warhol retoma não somente a
fotografia como também a manchete do jornal popular que, de forma
sensacionalista, começa em maiúsculas com as palavras “129 DIE” e continua, por
baixo da fotografia, com “IN JET!”, e o nome do jornal, “New York Mirror”, que aparece
no bordo superior do quadro, juntamente com a data de publicação e com o número
da edição.
Warhol tem um de seus momentos chave quando se volta para a
fotografia como matéria de seu trabalho, quando se fala de sua evolução
artística, tal que é um meio de expressão que, mais do que o trabalho com as
bandas desenhadas, as marcas dos artigos de consumo ou ainda as pinturas da
arte “superior”, determina com muito mais precisão a realidade da percepção. A
fotografia reproduz o que os olhos veem com mais veracidade do que todas as
pinturas antes dela, e eterniza, em certa medida, a realidade visível. E o bom
observador distante que era Warhol, deve ter notado logo muito cedo, por sua
vez, a influência que tomava no mundo tanto a fotografia como também o cinema.
Warhol teve esta percepção pela fotografia, embora nos meios
artísticos dos anos 50, a fotografia era ainda vista como algo menor e com mais
desdém até mesmo em relação à linguagem em imagens da banda desenhada e da
publicidade. A fotografia, portanto, tinha uma importância muito reduzida no
mundo da Arte, mas, por isso mesmo, era o meio ideal para servir aos objetivos
de Warhol. No quadro “129 DIE”, Andy Warhol não reproduz a realidade de forma
direta, mas se utiliza de uma fotografia de jornal de um desastre, que de fato
tinha acontecido, como um tipo de veículo de expressão que ligava a realidade
ao espectador.
Então, na análise sobre a intenção de Warhol com este
trabalho, temos que não é a realidade por si mesma o sentido de sua expressão,
mas sim tal realidade no seu contexto de reprodução, representando, por fim, um
fragmento desta realidade. Por fim, temos também que esta nova onda de
reprodução gerava um tipo de realidade em segunda mão, tal que era a realidade
na sua versão dos “mass media”, das revistas ilustradas e dos painéis
publicitários, como também do cinema e da televisão, que, ao fim, triunfa sobre
a realidade empírica.
O fato de Warhol explorar uma gama variada de temas, e isto
antes de realizar as suas pinturas, era fruto de um artista extremamente
atento, que tanto juntava sugestões de terceiros, assim como também colecionava
revistas e jornais, para, no momento certo, os utilizar como modelos para seus
trabalhos artísticos. Quando chegava esse momento, Warhol achava que uma imagem
reproduzida em massa ou um artigo de uso cotidiano possuía traços pertinentes e
que poderia servir como uma espécie de representação eficiente do que se chama
de consciência coletiva, como modelos de relações, no qual se fundiam numerosas
convicções comuns, reunindo isto numa imagem de fácil assimilação e de efeito
duradouro.
Tal trabalho de Warhol com esta consciência coletiva pode ser
verificada, por exemplo, nas marcas e embalagens da indústria alimentar, que
eram as sopas e os legumes em latas, os molhos e bebidas em garrafas, que eram
então a narrativa cotidiana dos nossos hábitos, muito mais presentes que
quaisquer outros elementos em nossa civilização. E tal relação que Warhol
estabelecia com tais produtos também era potencializada pelo fato deles estarem
associados a determinados nomes de firmas e marcas, tais como as sopas
Campbell, a limonada Pepsi, a Coca-Cola, os detergentes Brillo e o ketchup da
Heinz, que representavam a tradução perfeita de um modo de vida cotidiano e
comum. Por sua vez, quando Warhol escolhe para motivos de arte as latas de
sopas Campbell, as garrafas de Coca-Cola e de ketchup Heinz e os pacotes de Brillo,
Warhol os coloca num patamar novo como ícones da civilização contemporânea.
Foi então, com este ato estético de Warhol, que era a decisão
de elevar tais produtos à categoria de obras de arte, que transformou, por sua
vez, estes rótulos e marcas rigorosamente idênticos em ícones secularizados. Tal
ato estético que era quando Warhol transferia tais produtos para uma tela, os
elevando artisticamente, representava concretamente o transporte de tais entes dos
supermercados para as galerias de arte. E, ao contrário de Marcel Duchamp, que
transplantou os objetos do mundo cotidiano, onde desempenhavam uma função bem
concreta, para um espaço estético, para que, desprovidos de toda a
funcionalidade se tornassem perceptíveis em si mesmos, Warhol submeteu os “ready
mades” da produção industrial em massa a um processo de transformação estética
e artística.
Como um ilusionista hábil da Arte Contemporânea, Warhol era
objeto de uma certa confusão no que se relaciona a sua técnica, pois ele operou
uma substituição da técnica artística tradicional, da qual se utilizara até
então, por uma técnica que correspondia mais aos seus novos motivos, tal que
era também mais familiar com o designer publicitário de sucesso que Warhol
também era. Tal mudança fez com que Warhol tivesse agora as fotografias de
imprensa e os rótulos e marcas como seus motivos artísticos preferidos. Warhol,
então, neste processo criativo renovado, logo se volta para a impressão
serigráfica de fotografias, passando a aproveitar as possibilidades desta para
as suas “pinturas”.
A serigrafia, por sua vez, era a técnica fundamental de
Warhol que o permitiu apagar dos quadros as características de cunho pessoal, eliminando
definitivamente todos os momentos subjetivos e, assim, deixando Warhol
completamente livre dos cânones dominantes do Expressionismo Abstrato. Esta
técnica de produzir anonimamente uma imagem, isenta de subjetividade, que era o
extremo oposto do Expressionismo Abstrato, e com a precisão de uma máquina,
desde que alguém tivesse determinado a composição e as cores, estava em
conformidade com o temperamento frio e observador de Andy Warhol. E nesta sua
escolha, Warhol deve ter sido igualmente estimulado pelo fato da impressão
serigráfica permitir a ele a criação de uma imagem estereotipada e propagar,
assim, um reflexo da consciência coletiva.
Esta técnica inédita na esfera da Arte tornou supérfluos os
complicados e dispendiosos desenhos de preparação das pinturas. Além disso, com
a transferência fotoquímica imediata de um modelo fotográfico para um peneiro,
Warhol conseguia quadros que interpelavam diretamente o espectador, como
acontece com as imagens dos mass media, sem, todavia, expor os seus quadros ao
esquecimento imediato, tal como ocorre com as imagens da imprensa de massas. Portanto,
para evitar o aspecto efêmero de tais imagens, Warhol fez uma aplicação
especial da técnica da serigrafia.
Modelo para Pintores Amadores (Flores), por exemplo, que é o
título de um quadro que simboliza justamente a mudança de técnica na carreira
do artista, representa os contornos de um desenho em formato mural,
incompletamente colorido, que o artista amador pode pintar segundo indicações
precisas, transformando-o numa verdadeira composição a cores. Por sua vez, o
desenho preparatório do quadro floral é esquemático e as cores preconizadas
correspondem às cores estandardizadas da civilização industrial. No entanto, o
modelo, que dá a impressão de um trabalho que requer uma grande capacidade
manual, não passa de um exemplar entre milhares de exemplares idênticos, em que
era necessário somente seguir as instruções do modelo.
Recorrendo às técnicas da fabricação em massa, Warhol aplica a
seu modo uma técnica que cria séries de quadros que se distinguem uns dos
outros, mesmo que apenas através de pequenas nuances, não deixando dúvidas
quanto a um certo fenômeno de depreciação do conceito de original, atributo
muito caro à Arte Contemporânea, sobretudo na sua faceta do Expressionismo
Abstrato, mas que, contudo, não representa a negação do conceito. A estratégia
de Warhol, no entanto, tem aspectos de subversão, pois destrói a ideia de prestígio
do original. Sob tal perspectiva nova, a ideia de arte em Warhol tinha o
caráter de simples produtos industriais, como artigos fabricados em série.
Warhol também travou conhecimento com Gerard Malanga, um
jovem poeta que depois foi seu assistente. Malanga descreve o início do seu
trabalho prático nas artes plásticas com estas palavras: “Começamos logo a
fazer a serigrafia de um retrato de Liz Taylor sobre uma tela, que tínhamos
preparado, pulverizando um fundo com tinta prateada. Este trabalho não era
muito difícil, mas acabou por se tornar muito sujo, quando tínhamos que limpar
o peneiro.” O que em Elizabeth Taylor e Marilyn Monroe, em Elvis Presley e
Marlon Brando pode ter encantado Warhol foi o fato de eles simbolizarem
determinadas correntes que percorriam a consciência coletiva americana, pois personificavam
concepções de beleza e de êxito.
Tal como anteriormente os retratos de Marilyn Monroe, os
retratos dos homens com mandado de captura ligam a série sobre a morte à série
imponente dos seus outros retratos. Mais do que qualquer outro gênero, Warhol
cultivou o do retrato. Inúmeros retratos são devidos a encomendas particulares
que o artista não se deu ao luxo de recusar. A maior parte dos retratos, que
“pintou” sem serem encomendados, foram inspirados em acontecimentos
particulares ou conjunturas específicas do momento. No entanto, é comum a todos
eles o fato de representarem personalidades importantes: artistas,
colecionadores, vedetas de cinema, políticos e criminosos. Numa sociedade
mediatizada, a celebridade é quase um barômetro “natural” do êxito social.
(Baseado no livro Andy Warhol de Klaus Honnef, editora
Taschen)
Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
Link da Século Diário: http://seculodiario.com.br/33055/17/andy-warhol-e-pop-art-parte-3
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Coluna da Século Diário,
Resenha Século Diário
O LIVRO DE CESÁRIO VERDE – PARTE I
“no momento histórico em que vivia ele não podia alcançar o
reconhecimento que merecia”
CESÁRIO VERDE – O HOMEM
E A OBRA
BIOGRAFIA
Numa praça em Lisboa temos um busto de bronze que tem no
pedestal a inscrição: “Cesário Verde – Poeta.” É o reconhecimento ao poeta que
teve a sua qualidade de poeta recusada pelos seus contemporâneos, tal que é a
compensação pela posteridade que desmentia sua queixa em carta a um amigo: “Literariamente
parece que Cesário Verde não existe.”
A biografia de Cesário Verde não possui uma vastidão de
informações, pois tanto envolve um breve tempo de vida de 31 anos, como o
prosaísmo de sua atividade profissional, uma vez que era um modesto caixeiro
que trabalhava na loja de ferragens de seu pai, na Rua dos Fanqueiros, aonde aviava
fregueses, e fazia a escrita ou se encarregava da correspondência comercial, numa
vida de um cotidiano comum, com a gente sem história que o poeta iria apresentar
em seus poemas. Também Fernando Pessoa exerceu uma atividade profissional
apagada, mas este, ao contrário de Cesário Verde, integrou-se e participou dos
círculos intelectuais do seu tempo, na história das lides culturais com as
ideias que comungou na geração de Orfeu de que fazia parte. O que não aconteceu
com Cesário, a quem os contemporâneos ignoraram.
O ambiente familiar de Cesário Verde era marcado por um
grande espírito positivo e prático, no que não se tinha espaço para expansões
idealistas que normalmente se ligam à poesia, pois Eduardo Coelho, por exemplo,
que foi o fundador do Diário de Notícias, fora, também ele, empregado de José
Anastácio Verde, o pai do poeta Cesário, nos tempos da sua adolescência. E Eduardo,
no contexto deste trabalho, vira-se obrigado a abandonar a loja de ferragens por
via da oposição que o patrão fazia à sua atividade literária, oposição que
tinha uma justificação muito simples: “Versos não dão dinheiro.”
Será também esse espírito positivo, pragmático e utilitarista,
que provocará na família de Cesário Verde a ausência de religiosidade, numa
atitude de hostilidade face ao fenômeno religioso dominante na sociedade, no
que teremos um poeta anticlerical e republicano, que nos deixa alguns
testemunhos dessa atitude ao longo dos versos que escreveu. À atividade de
produtor juntava-se também a de exportador das frutas da fazenda. E, se o poeta
não deixa de se entusiasmar pelo trabalho, revela também um tipo de consciência
muito esclarecida dos aspectos concretos dessa atividade, o que refletirá em
seus versos um estro com boa dose de prosaísmo.
Comerciante, Cesário Verde nunca conseguiu ser aceito como
poeta pela geração de intelectuais seus contemporâneos, estando então vedado o
seu acesso às capelas literárias onde se forjam os mitos. E como a sua poesia
apresentava traços de novidade, no momento histórico em que vivia ele não podia
alcançar o reconhecimento que merecia, no que a crítica foi impiedosa ao
apercebê-la impressa em folhas periódicas. A publicação em 1874 no Diário de
Notícias do poema “Esplêndida” é acolhida por Teófilo Braga e Ramalho Ortigão,
dois pontífices das letras daquele tempo, com ironia e sarcasmo. Ramalho
aconselha o jovem autor (ao tempo com 19 anos) a tornar-se “menos Verde e mais
Cesário” – uma boa maneira de indicar o abandono da atividade literária. Mais
tarde, Teófilo Braga ignorá-lo-á por completo na organização do Parnaso
Português Moderno, onde nenhum poema de Cesário Verde foi incluído.
Outro incidente desagradável deu-se com o Diário Ilustrado
que, ao transcrever do Diário de Notícias o poema “Em petiz”, não se conteve de
comentários ignóbeis, mais dignos do panfleto do que da crítica. Ali se dizia
que cada verso do poema era “simplesmente um vomitório”.
Todas estas contrariedades pesaram fundo na alma do poeta, e
o poema “Contrariedades” parece ditado justamente por estas desilusões. Ali se
tenta um diagnóstico das causas que poderiam estar na base da rejeição de que
era vítima. Donde se conclui que os obstáculos que encontrava para singrar nas
letras provinham da sua independência, da sua marginalização relativamente aos
círculos de literatos. De qualquer modo, não é de crer que a confiança do poeta
no seu próprio talento fosse tal que o isentasse de uma sombra de dúvida quanto
à qualidade da sua produção literária. E isso explicará por um lado a escassez
do que nos deixou e o fato de não ter em vida publicado qualquer livro, embora
já em 1874 essa publicação se anunciasse “para breve”.
POEMAS:
CRISE ROMANESCA
DESLUMBRAMENTOS: O poema, da crise romanesca, que
Cesário Verde impõe com estro apaixonado, dirige-se com deslumbramento, e a sua
milady é um perigo, que aparece no poema então como a clássica contemplação do
poeta; “Milady, é perigoso contemplá-la,” (...) “Quantas vezes, seguindo-lhe as
passadas,/Eu vejo-a, com real solenidade,/Ir impondo toilettes complicadas! .../Em
si tudo me atrai como um tesoiro:”. O poema tem seu tesouro, e o poeta está em
fascinação: “Ah! Como me estonteia e me fascina .../E é, na graça distinta do seu
porte,/Como a Moda supérflua e feminina,/E tão alta e serena como a Morte! ...”.
As rimas fluem, e o estro arde em êxtase: “O seu olhar possui, num jogo
ardente,/Um arcanjo e um demônio a iluminá-lo;”. Anjos e demônios surgem na
contemplação, que tem no olhar de sua milady a mira de Cesário Verde: “E enfim
prossiga altiva como a Fama,/Sem sorrisos, dramática, cortante;”. A fama
precípua é de cortante drama, e o luxo surge então nas estradas: “E um dia, ó
flor do Luxo, nas estradas,/Sob o cetim do Azul e as andorinhas,/Eu hei-de ver
errar, alucinadas,/E arrastando farrapos – as rainhas!”. E assim milady supera
as rainhas que se arrastam aos farrapos, glória suprema do poeta e seu
deslumbramento.
HUMILHAÇÕES: O poema tem da humilhação ao
ambiente do teatro o desdém e os salões que o ignoram, este poeta que em versos
sem reconhecimento, se perde com estro pela noite destes salões: “Esta aborrece
quem é pobre. Eu, quase Job,/Aceito os seus desdéns, seus ódios idolatro-os;/E
espero-a nos salões dos principais teatros,/Todas as noites, ignorado e só.”.
No poema o teatro tem a presença feminina como um salto: “Na representação dum
drama de Feuillet,/Eu aguardava, junto à porta, na penumbra,/Quando a mulher
nervosa e vã que me deslumbra/Saltou soberba o estribo do coupé.”. E sua
passada é firme, como uma marcha: “Como ela marcha! Lembra um magnetizador,/Roçavam
no veludo as guarnições das rendas;/E, muito embora tu, burguês, me não
entendas,/Fiquei batendo os dentes de terror./Sim! Porque não podia abandoná-la
em paz!”. O poeta tonteia de terror, embora com sua visão extática não pudesse
sair dali e ficar em paz: “Ao mesmo tempo, eu não deixava de a abranger;/Via-a
subir, direita, a larga escadaria./E entrar no camarote. Antes estimaria/Que o
chão se abrisse para a abater.” O poema então termina com um súbito drama
final, em que o sujo e infecto se dá como um pedido final, um cigarro: “De
súbito, fanhosa, infecta, rota, má,/Pôs-se na minha frente uma velhinha suja/E
disse-me, piscando os olhos de coruja:/_ Meu bom senhor! Dá-me um cigarro? Dá?
...”.
NATURAIS
CONTRARIEDADES: O poema se dá na contrariedade de
Cesário Verde com o seu tempo, ele está cruel, revoltado, incompreendido, o
poema tem este azedume típico de uma alma canora que tem seu canto cortado: “Eu
hoje estou cruel, frenético, exigente;/Nem posso tolerar os livros mais
bizarros./Incrível! Já fumei três maços de cigarros/Consecutivamente./Dói-me a
cabeça. Abafo uns desesperos mudos:/Tanta depravação nos usos, nos costumes!”.
O poeta aparece aqui em sua face decadente: “O obstáculo estimula, torna-nos
perversos;/Agora sinto-me eu cheio de raivas frias,/Por causa dum jornal me
rejeitar, há dias,/Um folhetim de versos./Que mau humor! Rasguei uma epopeia
morta/No fundo da gaveta. O que produz o estudo?/Mais duma redação, das que
elogiam tudo,/Me tem fechado a porta.”. O poeta vê todas as portas fechadas, e
tem a ideia sabotadora de queimar seus escritos, num rompante: “Juntei numa
fogueira imensa/Muitíssimos papéis inéditos. A imprensa/Vale um desdém solene.”.
A imagem poética é destruidora, o poeta está em convulsão, seus poemas não
estão em evidência, resta aos amigos seu mundo particular de poeta histórico
póstumo: “Eu nunca dediquei poemas às fortunas./Mas sim, por deferência, a
amigos ou a artistas./Independente! Só por isso os jornalistas/Me negam as
colunas./Receiam que o assinante ingênuo os abandone,/Se forem publicar tais
coisas, tais autores./Arte? Não lhes convém, visto que os seus leitores/Deliram
por Zaccone.”. O poeta aqui aparece como o injustiçado, o ressentido, como se
ele próprio não tivesse que alçar sua poesia na evidência que ele deseja
ardentemente, o que nem sempre é possível, mas que não pode ser objeto de
lamento a quem se propõe tamanho empreendimento: “Perfeitamente. Vou findar sem
azedume./Quem sabe se depois, eu rico e noutros climas,/Conseguirei reler essas
antigas rimas,/Impressas em volume?/Nas letras eu conheço um campo de manobras;/Emprega-se
a reclame, a intriga, o anúncio, a blague,/E esta poesia pede um editor que
pague/Todas as minhas obras ...”. E o poeta está impotente, no aguardo de um
editor que lhe pague a fortuna crítica de seu trabalho imenso.
POEMAS:
CRISE ROMANESCA
DESLUMBRAMENTOS
Milady, é perigoso contemplá-la,
Quando passa aromática e anormal,
Com seu tipo tão nobre e tão de sala,
Com seus gestos de neve e de metal.
Sem que nisso a desgoste ou desenfade,
Quantas vezes, seguindo-lhe as passadas,
Eu vejo-a, com real solenidade,
Ir impondo toilettes complicadas! ...
Em si tudo me atrai como um tesoiro:
O seu ar pensativo e senhoril,
A sua voz que tem um timbre de oiro
E o seu nevado e lúcido perfil!
Ah! Como me estonteia e me fascina ...
E é, na graça distinta do seu porte,
Como a Moda supérflua e feminina,
E tão alta e serena como a Morte! ...
Eu ontem encontrei-a, quando vinha,
Britânica, e fazendo-me assombrar;
Grande dama fatal, sempre sozinha,
E com firmeza e música no andar!
O seu olhar possui, num jogo ardente,
Um arcanjo e um demônio a iluminá-lo;
Como um florete, fere agudamente,
E afaga como o pêlo dum regalo!
Pois bem. Conserve o gelo por esposo,
E mostre, se eu beijar-lhe as brancas mãos,
O modo diplomático e orgulhoso
Que Ana de Áustria mostrava aos cortesãos.
E enfim prossiga altiva como a Fama,
Sem sorrisos, dramática, cortante;
Que eu procuro fundir na minha chama
Seu ermo coração, como um brilhante.
Mas cuidado, milady, não se afoite,
Que hão-de acabar os bárbaros reais,
E os povos humilhados, pela noite,
Para a vingança aguçam os punhais.
E um dia, ó flor do Luxo, nas estradas,
Sob o cetim do Azul e as andorinhas,
Eu hei-de ver errar, alucinadas,
E arrastando farrapos – as rainhas!
HUMILHAÇÕES
De todo o coração – a Silva Pinto
Esta aborrece quem é pobre. Eu, quase Job,
Aceito os seus desdéns, seus ódios idolatro-os;
E espero-a nos salões dos principais teatros,
Todas as noites, ignorado e só.
Lá cansa-me o ranger da seda, a orquestra, o gás;
As damas, ao chegar, gemem nos espartilhos,
E enquanto vão passando as cortesãs e os brilhos,
Eu analiso as peças no cartaz.
Na representação dum drama de Feuillet,
Eu aguardava, junto à porta, na penumbra,
Quando a mulher nervosa e vã que me deslumbra
Saltou soberba o estribo do coupé.
Como ela marcha! Lembra um magnetizador,
Roçavam no veludo as guarnições das rendas;
E, muito embora tu, burguês, me não entendas,
Fiquei batendo os dentes de terror.
Sim! Porque não podia abandoná-la em paz!
Ó minha pobre bolsa, amortalhou-se a ideia
De vê-la aproximar, sentado na plateia,
De tê-la num binóculo mordaz!
Eu ocultava o fraque usado nos botões;
Cada contratador dizia em voz rouquenha:
_ Quem compra algum bilhete ou vende alguma senha?
E ouviam-se cá fora as ovações.
Que desvanecimento! A pérola do Tom!
As outras ao pé dela imitam de bonecas;
Têm menos melodia as harpas e as rabecas,
Nos grandes espetáculos do Som.
Ao mesmo tempo, eu não deixava de a abranger;
Via-a subir, direita, a larga escadaria.
E entrar no camarote. Antes estimaria
Que o chão se abrisse para a abater.
Sai; mas ao sair senti-me atropelar.
Era um municipal sobre um cavalo. A guarda
Espanca o povo, irei-me; e eu, que detesto a farda,
Cresci com raiva contra o militar.
De súbito, fanhosa, infecta, rota, má,
Pôs-se na minha frente uma velhinha suja
E disse-me, piscando os olhos de coruja:
_ Meu bom senhor! Dá-me um cigarro? Dá? ...
NATURAIS
CONTRARIEDADES
Eu hoje estou cruel, frenético, exigente;
Nem posso tolerar os livros mais bizarros.
Incrível! Já fumei três maços de cigarros
Consecutivamente.
Dói-me a cabeça. Abafo uns desesperos mudos:
Tanta depravação nos usos, nos costumes!
Amo, insensatamente, os ácidos, os gumes
E os ângulos agudos.
Sentei-me à secretária. Ali defronte mora
Uma infeliz, sem peito, os dois pulmões doentes;
Sofre de faltas de ar; morreram-lhe os parentes
E engoma para fora.
Pobre esqueleto branco entre as nevadas roupas!
Tão lívida! O doutor deixou-a. Mortifica.
Lidando sempre! E deve a conta na botica!
Mal ganha para sopas ...
O obstáculo estimula, torna-nos perversos;
Agora sinto-me eu cheio de raivas frias,
Por causa dum jornal me rejeitar, há dias,
Um folhetim de versos.
Que mau humor! Rasguei uma epopeia morta
No fundo da gaveta. O que produz o estudo?
Mais duma redação, das que elogiam tudo,
Me tem fechado a porta.
A crítica segundo o método de Taine
Ignoram-na. Juntei numa fogueira imensa
Muitíssimos papéis inéditos. A imprensa
Vale um desdém solene.
Com raras exceções, merece-me o epigrama.
Deu meia-noite; e em paz pela calçada abaixo,
Um sol-e-dó. Chovisca. O populacho
Diverte-se na lama.
Eu nunca dediquei poemas às fortunas.
Mas sim, por deferência, a amigos ou a artistas.
Independente! Só por isso os jornalistas
Me negam as colunas.
Receiam que o assinante ingênuo os abandone,
Se forem publicar tais coisas, tais autores.
Arte? Não lhes convém, visto que os seus leitores
Deliram por Zaccone.
Um prosador qualquer desfruta fama honrosa,
Obtém dinheiro, arranja a sua coterie;
E a mim, não há questão que mais me contrarie
Do que escrever em prosa.
A adulação repugna aos sentimentos finos;
Eu raramente falo aos nossos literatos,
E apuro-me em lançar originais e exatos
Os meus alexandrinos ...
E a tísica? Fechada, e com o ferro aceso!
Ignora que a asfixia a combustão das brasas,
Não foge do estendal que lhe humedece as casas,
E fina-se ao desprezo!
Mantém-se a chá e pão! Antes entrar na cova,
Esvai-se; e todavia, à tarde, fracamente,
Oiço-a cantarolar uma canção plangente
Duma opereta nova!
Perfeitamente. Vou findar sem azedume.
Quem sabe se depois, eu rico e noutros climas,
Conseguirei reler essas antigas rimas,
Impressas em volume?
Nas letras eu conheço um campo de manobras;
Emprega-se a reclame, a intriga, o anúncio, a blague,
E esta poesia pede um editor que pague
Todas as minhas obras ...
E estou melhor; passou-me a cólera. E a vizinha?
A pobre engomadeira ir-se-á deitar sem ceia?
Vejo-lhe luz no quarto. Inda trabalha. É feia ...
Que mundo! Coitadinha!
Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
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