PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

quarta-feira, 7 de junho de 2023

PAU DE ARARA

Fiquem com o gosto amargo e azedo

da tortura à luz do dia, depois dos

porões da ditadura, depois da escravidão.


A Lei Afonso Arinos, diante das noites loucas,

nada pôde fazer, prendia-se para averiguação,

assim como se já prendeu por vadiagem.

Antigamente, malandro dançava capoeira 

para enganar o meganha, 

pois tinha luta no meio.

Samba era coisa de vadio, 

tinha cerveja e pango.

Hoje a lei contra o racismo,

que é crime, também enfrenta

o absurdo do racismo estrutural.


Negro sempre teve que ouvir racismo

fingindo que era injúria racial.

Negro favelado, negra que tinha 

uma alegoria sobre saúde mental etc.


Tudo insuportável, chato de doer,

doloroso para o coração.

Contudo, eu não sei o que é racismo!

Eu sou branco, minha empatia

é só imaginação, mas meu pai

foi no pau-de-arara sim,

na ditadura militar,

e apanhou como 

um negro apanha

hoje na rua se é 

confundido com 

ladrão, ou se é 

ladrão, podendo ser

torturado.


Um ladrão

de chocolate, aquele 

que eu, menino branco,

menor de idade,

já roubei e comi,

sem estar com fome.


O pau-de-arara

é da fome do negro

que roubou chocolate.

O pau-de-arara

atávico da tortura

nunca mais!

O pau-de-arara

que é um soco

no estômago,

e nos pinta

a white face

da morte

da polícia parda

que ainda mata.


07/06/2023 Gustavo Bastos 


ARTE DA FLORAÇÃO

Rosa dos ventos, a hora está aí, voilá!

Que nem sempre alegria o mote trará,

mas com a noite sonora e a manhã d`aurora, ah!


Vendo toda rosa rosa neste vento, 

minha astúcia tem ideias,

e o verão, deste solstício iluminado,

vê toda uma floração na senda que

se revirava na alegria do lótus.


A rosa dos ventos mira todo farol,

como a arte sonda sua estética,

um estilo de denodo e o metro

da crítica que se faz arguta,

nas águas revoltas do mar,

nas correntezas traiçoeiras

do rio castanho e caudaloso.


Sim, o poeta abre o peito e nada desvairado,

até chegar ao seu porto, ofegante,

com uma estrela na mão

e sua dádiva brilhando no sol,

a musa e os risos dos deuses

no grande campo verde 

que sonha.


07/06/2023 Gustavo Bastos 


EPPUR SI MUOVE

Avança a trama, desenha um arco a trajetória,

em que se abriu a ciranda das escolhas,

os gritos das paixões e as razões meditadas.


O poeta escreveu códigos de sua insciência,

criatura que nem tateia o mistério e ainda

se vê às turras com a vã filosofia.


Bem, o coração desvela outras razões,

e a descoberta de um novo continente

é a abertura do horizonte ou do abismo.


Àquele que se distraiu mais do que planejou,

o abismo poderá se lhe abrir qual garganta,

um vale do olvido em que a desídia não descansará.


Por seu turno, os que foram à lida, com plano certo

e o preparo devido aos imprevistos, colhem de 

farta messe a consequência de atos meditados

com razão e coração, com paixão e astúcia,

e contemplam as conquistas como reis e rainhas.


Se move a grande máquina, anima mundi,

axis mundi, chama eterna, fogo fátuo,

jogo entre duplos de destino e acaso,

espelhos e prismas, forças e métricas,

o breve e o longevo, ogiva e cornucopia,

paralaxes do aleph borgiano,

o átimo e a sempiternidade.


Já está vasto o horizonte, de todo este sol

e de todo este mar, como quem bebe

seu início e seu fim, em circunvoluções

de vinho e vivendo a festa da vida.


07/06/2023 Gustavo Bastos