PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

sábado, 28 de outubro de 2017

POETAS EM FUGA

Meus elmos que digladiam
nos contrafortes,
os cantos velozes
do ataque,

a catapulta que lança o dardo
contra os flancos da morte,
dardos de fogo
que rompem
no vento
da sarça,

eu, o poeta mais astuto,
corrompo a aurora
com a lira venturosa
que faz litanias
contra a guerra,

os cantos velozes
entram na fúria
dos centuriões,

dardos de fogo
contra os sonhos,

poetas em fuga,

a morte e a vida
sopram como
poemas.

28/10/2017 Gustavo Bastos

CANTO NA NEVE

A neve que gela nos polos
sonda os poemas
com um frio que
intumesce o peito
na flor do corpo,

a neve vetusta que
prorrompe
os cantos
lunares,

suas ranhuras no sol branco
são os gelos que cantam
no inverno,

polos de sopros e ventos
na silente meditação,

o frio com seus afagos
de mármore nos cantos
dos poetas lívidos,

neve que encanta
o estro
com o frio
e o delírio.

28/10/2017 Gustavo Bastos

O TIGRE

O tigre roçava a relva,
no espanto da floresta
que rumorejava zonza
a sede,

o tigre, de garras e olhos rentes,
passava com elegância
entre as moitas,

seu estro encantado
de tigre,
seu abismo de grito
de tigre,

o tigre e seus dentes
famélicos,

o tigre que governava
aquela geografia
com suas patas
de fogo,

amarelo e preto,
listrado como um ator
das guerras animais,

o tigre e seu mistério.

28/10/2017 Gustavo Bastos



NOITE ESPECIAL

A dança das borboletas incendeia
a noite, com lumes entram
também os vaga-lumes,
doces canções são entoadas
do violão que chora,

fico pleno, com os sons que
a noite flutua em seu sopro,

fico pleno, com os olhos que
a noite sussurra em seu vento,

a dança das borboletas
e os lumes que brotam
dos vaga-lumes,

a dança que soa mais encantada
com o violão que chora,

eu me sinto pleno.

28/10/2017 Gustavo Bastos

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

O TRABALHO DAS HORAS

Fogo que sulca a terra
com fuligem e ferro,
terreno do pântano,
fluidos mecânicos
da guerra,

vai, poeta bruto,
te virar na máquina
astuta, te virar
no chão
que não dorme,

não cessa o trabalho,
não cessa o progresso,

vai, poeta zonzo
e bêbado,
correr feito louco
nas horas redondas
que giram,

fogo que move todos os sonhos,
vai, poeta,
dar um salto mortal
como um acrobata
diante
do martírio,

vai, poeta, ter tua vida
vibrante no caos.

26/10/2017 Gustavo Bastos

OBRA DOS TEARES

O poeta do submundo tece
seu fio com esmero,
plano bem urdido,
contido.

Deste tear temos um poema,
cada verso burilado,
os mares e rios
sulcados
com força
e paciência,

levamos os anos de esforço,
palmo a palmo, passo a passo,
com gritos e silêncios
e os intervalos
da máquina,

o poeta se tece no mundo vasto
dos sonhos bem medidos,

correm os anos e o plano vira projeto,
o projeto vira labor,
o labor vira obra,
a obra no fim
engrandece
a vida.

26/10/2017 Gustavo Bastos

O PLANO DO MUNDO

Nos continentes se fazem estradas
para os cantos geográficos,
os palmos medidos e os projetos
balizam as ambições industriais
e urbanas,

erguem-se monumentos aos montes,
castelos modernos com veios futuristas,
uma ordem uniforme
que organiza as distâncias,

como um grande arquiteto das ruas,
as linhas férreas e as avenidas
fazem as veias do mundo fluido,

os homens trabalham duro
erguendo-se nas vigas
nas alturas dos edifícios,

muitos imigrantes, a diáspora
dos tempos que lhes intumescem
os músculos,

e o mundo talhado
no fogo
avança
como
uma febre
embrutecida.

26/10/2017 Gustavo Bastos

UM PÁSSARO NO CÉU

De uma parábola, o anjo nu desceu
ao barro dos precipícios :
"Tu, poeta, desce neste passeio íngreme,
amarra uma barricada nos flancos,
teus poemas lhe darão
fortes tumultos."

E o poeta, meio tonto, bebeu os licores
que o anjo nu trazia em suas asas,
e disse ao anjo nu :
"Bebes como no céu tuas ambrosias,
um cálice diamantado e um duelo
nas estrelas com tuas abóbadas,
serve aos deuses, esses imortais
que vivem do ócio."

O Paraíso, uma entidade benfazeja,
tecia em silêncio seus jardins suspensos,
eram oito dimensões de gozo,
o cume era feito de nimbos brilhosos,
cada alma que ali chegava
virava luz e éter,
e vem então tal ente a dizer :
"Sou o éden que lhe apetece,
o gozo do mistério
está como um banquete
nos olhos da verdade,
um sabor sem igual
dos mundos felizes,
teu destino, poeta."

E o poeta, com os bolsos rotos,
a cara amassada de sono,
com um revés em seus sonhos,
brilhou os olhos como
um afortunado
no mundo de dor,
em seu deserto
berrou :
"O céu está mais perto
dos corações limpos,
semeio os versos
como um plenilúnio
de fábulas."

O Paraíso então chamou o anjo nu,
e este qual um hermes mensageiro
deixou um livro com efígie de águia
nas mãos do poeta exangue,
que balbuciou :
"A esperança tem uma dança estranha
de anjos e jardins de plenitude
e eu tenho o dever e o direito
de sonhar alto
como um pássaro
no céu."

26/10/2017 Gustavo Bastos

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

CRISTAL DO POEMA

Gerânios no jardim das delícias,
rosas melosas como
sóis ridentes,

lá ou aqui, no mundo aéreo
ou na terra bruta,
me vou como um pássaro,
me vou como um anjo,
venho como o diabo,
faço verso como um vampiro,
teço sonhos em campos férteis
de feno, sou como o sol
que vira o tempo
de luz,
e no meio do caos
sou harmonia,

festas nos jardins platinados,
campos de éden como
cantos de nereidas,
cantos do éden
como campos de naiades,

sonha, poeta, sonha!
que teu palácio
é todo transparente
como um cristal
que resiste ao fogo.

25/10/2017 Gustavo Bastos

CANÇÃO PURA DO VINHO

A taça, com o puro vinho,
adormece os sentidos
como um oceano de ócio,

no silente delírio
que mora no fundo
da alma,
um rio caudaloso
irrompe,

eu, filho do espanto e da glória,
me tenho todo como
um mártir de mármore,
um monge ou mago,
um bruxo ou santo,
um poeta gerado.

A taça mormente insaciável,
de seu ventre indômito
que respira álcool
e letargia,
me dá a sensação pura
do licor,
me lança ao infinito
do torpor.

25/10/2017 Gustavo Bastos

DELÍRIOS DO TEATRO

Destas ruas no outono guardo
o frio dos bares, nas andanças
pelo palácio estelar um deus moribundo
dançava a sua última valsa,

eu via com os seus olhos
as flores enxutas que ele
deixava para trás,

meu vinho fortificado
já vestia os sabores
que o canto úmido
poderia entoar,

nas rosas das saudades melífluas
um certo sorriso botânico
pintava os cacos
de que o coração sucumbia,

leve, o frêmito mais denso
rompia na galáxia
das supernovas,
como um vento mercurial
de potência e sonho,

ais, os fundos vítreos
de que o teatro cobria
o proscênio,
com gárgulas
no terror noturno,

eis, o coro das oito feras
como pântanos febris,
oito feras vulcânicas
como terremotos,
oito feras de chumbo
como petardos sonoros,

no teatro, com alvor das chagas
de uma guerra santa,
as damas vermelhas
cantavam como
borboletas alucinadas,
vestais pagãs
nos delírios
de barregãs,

lupanares derramados
nos hinos dos salmos
e dos trovadores
que faziam da epopeia
um cancioneiro
de ventanias,

poemas como licores
fremiam tais espantos
de madraços quando
o sol se calava
na noite,
e a estrela brilhava
no farol.

25/10/2017 Gustavo Bastos

UNIVERSO DE PAZ

Com o frio da rocha as fúrias
correm ao bravio campo que brilha,
o mais audaz guerreiro
ousa a morte,

pelas ancas e flancos
dos insanos,
pelos cantos
dos santos,

tu, nervo caótico das armas,
luto furibundo com amor
exangue,

tu, flecha desalmada,
coturno duro de ponta,
faca indômita,

nas odes mais vibrantes,
nos hinos que exaltam
os poemas,
eu brincava de rei,

nos campos áuricos de trigo,
nos pomos ácidos do turbilhão,
nas águas revoltas da paixão,

eu brincava de rei nos horizontes
insondáveis do verso,

lá, no alto da torre,
nas estrelas polares,
nos salões de morfina,
eu lutava como gigante,
lutava como semideus,
lutava como um mago,

tu, incandescência dos lumes azuis,
das abóbadas cintilantes,
do fervor da fé quebrantada,

passa ao mar e ao sono lunar,
dorme na praia como um pássaro,
mergulha fundo como um peixe,

e que todo o mundo saiba
dos faróis que deliram
na noite,

e que a lua permeie esta noite
áurea como um grande grito,

e que todo o espanto
semeie terra e
vultos visionários,

e que a paixão forte clareie
todo o universo de paz.

25/10/2017 Gustavo Bastos

ALGUMAS PÉROLAS DE 1967

“entre 1966 e 1967, vemos surgir um guitarrista norte-americano de nome Jimi Hendrix”

ESTADOS UNIDOS

A banda em que despontou a estrela de Janis Joplin foi o Big Brother and Holding Co., esta que era uma das grandes bandas que surgiam naquele cenário de São Francisco de 1967, com novas bandas psicodélicas representantes de uma juventude que emergia com liberdade num cenário de protestos contra a guerra e o status de vida capitalista mediano.
E junto com isso, de todo o movimento hippie que carregava esta juventude dos anos 1960, sobretudo 1967, temos também bandas como o Grateful Dead, liderado pelo genial Jerry Garcia, num estilo que juntava folk, country e experimentalismo (com altas doses de LSD nas jam sessions), e a banda que representava bem o cenário californiano, hoje sendo até um som datado, dependendo do ponto de vista, que era a banda Jefferson Airplane. Com a Grateful Dead lançando seu debut em 1967, e a Jefferson Airplane lançando Surrealistic Pillow, e depois, ainda em 1967, After Bathing At Baxter´s. Temos também bandas de menor vulto como eram a Quicksilver Messenger Service, Moby Grape e a Love.
E uma banda de Los Angeles, The Doors, também despontava, em paralelo ao burburinho do Festival Pop de Monterey (a banda não tocou no festival), mas com a mesma intensidade das bandas de São Francisco, e que teve o ano de 1967 como um momento especial de afirmação na música e no rock, lançando seus dois primeiros álbuns, que foram o “The Doors” e o “Strange Days”, se colocando não como uma banda hippie como eram as de São Francisco, mas com a mesma verve experimentalista e psicodélica. 
A banda The Velvet Underground, por sua vez, também norte-americana, mas com origem em Nova Iorque, lançava naquele ano de 1967 o seu debut, o The Velvet Underground & Nico, guiada por músicos como Lou Reed e John Cale, que é o hoje famoso álbum com o desenho da banana de Andy Warhol, mas que na época foi um fiasco de crítica e de público.
Isto é, um álbum e banda subaproveitados na época em que surgiram, mas que, posteriormente, viriam a ser influência para inúmeras bandas bem-sucedidas que viriam nos anos à frente. Isto pode se dever ao som que a banda praticava, que não coadunava com nada, era um tipo de música de vanguarda, e que não se encaixava nem mesmo no experimentalismo ou psicodelia próprias de 1967 e do movimento que vivia o rock em geral, com músicas que não seguiam nenhum padrão existente, como I'm Waiting For The Man, Heroin e Venus In Furs.

REINO UNIDO

No Reino Unido, por sua vez, também temos um ano de 1967 brilhante, com bandas poderosíssimas, seguindo também, neste ano, a rota experimental e psicodélica, bandas como The Who, The Rolling Stones e The Beatles. Com os Beatles alcançando o topo criativo, junto com o produtor George Martin, voando alto com o emblemático álbum Sgt. Pepper’s Lonely Heart Club Band, marco de 1967 e de toda a História do rock, consolidando a guinada experimental da banda que havia começado com Rubber Soul e Revolver. 
Os Rolling Stones, por sua vez, navegaram na seara psicodélica sem terem o mesmo sucesso dos Beatles e de outras bandas, pois meses após o marco histórico dos Beatles, eles botam na praça o Their Satanic Majesties Request, um disco bom, agradável, mas que não foi bem recebido ou bem compreendido, uma vez que os músicos dos Stones surgiram bebendo na fonte do blues, e a versão psicodélica deles soou meio deslocada pelo que eles eram como banda desde então e que seriam também depois de 1967.
O The Who, por sua vez, em 1967, ainda antes dos saltos com as óperas-rock do Tommy ou do Quadrophenia, teve seu primeiro álbum conceitual, que foi o The Who Sell Out, apontando um caminho que estendia muito o escopo até então de canções curtas do estilo de vida mod de seus primeiros álbuns. Nada muito lisérgico, no entanto, mas com o conceito avançado pelo que eles tinham feito até então como compositores.
Ainda no cenário britânico, temos o excelente power trio do Cream, formado por Eric Clapton, Ginger Baker e Jack Bruce, com 1967 sendo o ano em que saiu o incrível e experimental Disraeli Gears, numa mistura que conseguiu reunir com perfeição tanto a fonte blues-rock como o experimentalismo psicodélico em voga naquela época, com hinos definitivos como era a faixa Sunshine of Your Love.
E no cenário britânico, entre 1966 e 1967, vemos surgir um guitarrista norte-americano de nome Jimi Hendrix, este que iria mudar tudo do que se conhecia com guitarra até então, e que despontou no mundo da música de fato com a sua primeira banda The Jimi Hendrix Experience, pois antes foi colaborador e músico de apoio de figuras como Little Richards.
Jimi, como músico, explodiu sobretudo depois de sua apresentação no Festival Pop de Monterey, com o The Who tocando antes dele, pois os caras já sabiam que Jimi chegaria para ficar no mundo do rock, no que Jimi Hendrix desbancou o até então chamado Deus da guitarra, Eric Clapton. A sua banda The Jimi Hendrix Experience que também contava com Noel Redding no baixo e Mitch Mitchell na bateria, sendo 1967 também o ano de lançamento do debut da banda, o Are You Experienced?, ano em que a banda também daria luz ao segundo álbum, Axis : Bold as Love.
E neste ano de 1967 também vemos se consolidar e se formar o que viria a compor o cenário do rock progressivo, com 1967 sendo palco para álbuns que abririam este caminho do rock como o debut do Procol Harum, com o nome da banda, já com o uso do órgão Hammond, e com o grande sucesso daquele ano que foi a faixa A Whiter Shade of Pale.
E num estilo que muitos ligam mais ao que seria um gênero à parte de uma única banda, podendo ser bem chamado de space rock, mas que forçosamente alguns botam na pasta rock progressivo, temos o debut do Pink Floyd, que foi o álbum The Piper at the Gates of Dawn, indo ao extremo da experimentação e da psicodelia praticada até então, com a maioria das composições feitas pelo então vocalista e guitarrista Syd Barrett, que logo em seguida teria a sua mente derretida pelo LSD, tendo que sair da banda. Este álbum pode ser bem considerado como o que consolidou o campo do experimentalismo no rock.

CONCLUSÃO

1967, portanto, tem importantes contribuições musicais, sobretudo no rock, com fenômenos simultâneos surgindo, e que tinha um cenário ideológico de liberdade, ímpeto que se refletia no rock e no estilo de bandas que mergulhavam de cabeça na psicodelia e no experimentalismo, cenário que tinha bases em São Francisco, mas que também contava com um forte fluxo criativo das emblemáticas bandas britânicas que também participaram deste processo de renovação e expansão do rock até então conhecido e praticado.

Link recomendado : https://www.youtube.com/watch?v=Mb3iPP-tHdA

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.

Link da Século Diário :  http://seculodiario.com.br/36287/14/algumas-perolas-de-1967