PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

quinta-feira, 4 de junho de 2020

EVERALDO BLANK CONTRA O MUNDO

Everaldo nasceu em Campos dos Goytacazes em 1977, filho de mãe católica fervorosa e praticante, era um menino que, desde cedo, mostrou seu pendor por buscar conhecimento, e se acreditava ser realmente alguém especial, logo mostrou características messiânicas, liderava alguns meninos de sua turma com ideias sobre a constituição do universo, e sua mãe achava que ele era um gênio.
Aos sete anos, liderando cinco meninos, foram se embrenhar na floresta para buscar o Santo Graal, Everaldo Blank dizia que havia um lugar sagrado feito por velhos luminares de civilização atlante que haviam colocado um mapa do Santo Graal ali no mato, eles ficaram a tarde inteira passeando pelo mato, mas o céu fechou, começou a chover, e depois de uma trovoada, Blank e seus amigos desistiram da aventura e voltaram à cidade, Blank disse que o mistério seria desvendado, no entanto, com um livro que ele iria escrever, decifrando o mistério do Santo Graal, e que seria reconhecido por ser um grande filósofo, quando completasse ainda dezessete anos.
A mãe de Blank voltou na tarde do domingo seguinte de sua missa católica, depois de ter rezado muito, e encontrou Blank na sala, com livros de maçonaria, e perguntou para Blank a razão dele estar no meio da sala, com um manto azul, incensos e meditando em plena tarde de domingo, se ele não queria tomar um ar, mas Blank explicou para a mãe que ele estava se concentrando para a sua grande missão de se tornar um líder intelectual, uma espécie de novo iluminado, e sua mãe ficou fascinada e orgulhosa daquele seu filho genial.
Em seguida, Blank se embrenhou na metafísica aristotélica, em suas teorias do movimento, ficou fascinado com as relações entre potência e ato, foi direto para o Organon estudar silogismos, aprendeu a decorar as dez categorias do ser, e gostava de se exibir para seus amigos com seus novos conhecimentos filosóficos, mesmo tendo apenas sete anos e aprendido a ler há apenas um ano. Aos oito anos ele releu a metafísica aristotélica e resolveu ler a Bíblia Católica inteira, sua mãe lhe deu uma edição da Bíblia de presente e ele leu com afinco, aos nove anos sabia citar os Salmos mais importantes de memória e ficava cada vez mais convencido de sua genialidade e de como era de fato um ser especial.
Aos dez anos Everaldo Blank se pôs a começar a sua grande obra filosófica, ele queria criar um novo sistema de moral e uma teoria do conhecimento própria, e futuramente seria líder de um movimento, também de uma seita com o seu próprio nome, ele sabia que seria um pensador de vulto na Humanidade, reconhecido como filósofo original, criador de um novo sistema filosófico que revolucionaria a filosofia de seu tempo, ele só não sabia, como tinha certeza, que tinha uma missão na Terra, e a cumpriria com louvor.
Everaldo Blank começou a sua primeira obra filosófica, e sua mãe lhe ajudava nas suas tardes depois da escola com pães fresquinhos e leite quente com achocolatado, e ele se punha a escrever seu primeiro livro, que ele dizia ser o começo de uma trilogia filosófica, tudo com a sua inspiração bíblica e aristotélica, mas ele crendo piamente que criava algo novo e original.
Blank se dedicou com afinco à sua primeira obra filosófica, demorou um ano e meio, e aos doze anos, ele foi com seu manuscrito, Sistema de Moral Blankista – Tomo I, e levou para uma editora local em Campos, a editora recusou os manuscritos, e ele foi para uma gráfica, mas descobriu que não tinha dinheiro, ele pediu à mãe que lhe pagasse à gráfica uma impressão de cem exemplares, e foi quando ele teve seu primeiro livro filosófico publicado, ele achou que seria reconhecido pelo livro, mas este não teve repercussão, nem mesmo na cidade de Campos dos Goytacazes, mas ele não desistiu de seu projeto, e foi escrever o Tomo II de sua grande obra de pensador da Humanidade.
Blank, então, depois de seu Tomo I, em que falou da axiologia e de uma moral formal baseada em valores católicos, buscou aprofundar as suas noções de boa vontade agostiniana e de influências tomistas em seus escritos, saindo um pouco de seus cacoetes aristotélicos, como era uma obra de juventude, havia muitos sofismas, falácias, mas Blank pensava estar produzindo uma obra de vulto, e este seu segundo tomo, depois do primeiro volume de duzentas páginas de moral de inspiração católica, partiria para uma posição escolástica que, ao fim, resultaria na sua leitura de Maritain, uma leitura enviesada para que Blank reafirmasse sua fundamentação de moral cristã numa formalidade oca feita de lógica porosa, com máximas, axiomas e conclusões açodadas, meio que emulando o modelo spinoziano de corolários e todo aquele passo-a-passo maçante e enfadonho cheirando a mofo e anacronismo.
Seu Tomo II ficou pronto quando ele completou 14 anos, e desta vez ele conseguiu uma publicação em uma editora por indicação de um professor seu de música, até porque agora ele estudava piano e colocou na cabeça também que seria dramaturgo e matemático, estudando também os fenômenos sonoros e da luz. Seu Tomo I também entrou no contrato, e ele fechou com a editora que haveria o Tomo III para fechar a sua Trilogia de Moral Blankista. O Tomo II, sua segunda obra de juventude, saiu quando ele completou quinze anos, e novamente não teve repercussão, nem mesmo em Campos dos Goytacazes, mas Blank sabia que fechando a sua trilogia com o Tomo III, ele estaria apto para fazer voos maiores e mais ambiciosos, pois já planejava fazer uma fundação com seu nome, que seria o nome de seu movimento filosófico, o Blankismo.
Seu sistema de moral da trilogia era seu primeiro passo para a fundação do Blankismo, pois este seria complementado com seus volumes de teoria do conhecimento blankista e depois de uma lógica blankista e uma teoria da alma também de concepção blankista. Seus conhecimentos filosóficos se ampliavam, ele fazia exercícios diários de silogismos e paralogismos, seus estudos de matemática e de composição da luz avançavam, e seus estudos de piano progrediam, ele começou a compor, já com influência de Beethoven, queria fazer sinfonias, aprendeu a ler partituras e sonhava em ser também maestro. Sua composição ao piano, aos dezesseis anos, se chama Sonata Opus Gloriam Dei, e tinha um ar clássico que bebia diretamente de Ludwig. Ele também se dedicava a um sistema próprio de notação musical, mas a experiência não deu muito certo, pois o sistema ruiu com paradoxos.
Seu sistema de valores avançava, o Tomo III trataria de noções a priori de moral cristã, com ideias morais formais, com teses inspiradas num tomismo cada vez mais esquemático, os corolários viraram uma salada de teses católicas com ecos de maçonaria e vícios de espírito de sistema que seriam bem adequados para livros filosóficos publicados até o século XIX, e seus aforismos começavam a se multiplicar como um volume seu extra de moral blankista, e um sistema de retórica blankista, que era para seu futuro projeto de se tornar também político. O Tomo III fica pronto, e Everaldo Blank sabia que era hora de se tornar o grande pensador que sempre quis ser, pois sua profecia, pois também se considerava vidente, seria a de que aos dezessete anos seria reconhecido como filósofo e pensador, e seu Tomo III saiu aos dezessete anos, obra de juventude, ele já estudava Descartes agora tentando criar sua teoria do conhecimento blankista, e a trilogia de moral blankista se encerra com mais um fracasso de público e de crítica, ele decide que era hora de fazer a sua fundação, que seria um modo de fundar seu próprio movimento filosófico, o Blankismo.
Ele, então, aos dezessete anos, cria a Associação Iluminada do Blankismo, e funda seu próprio movimento filosófico, oficialmente, o Blankismo. Os princípios do Blankismo foram confeccionados num pequeno opúsculo por Everaldo Blank assim que a Associação foi fundada, e seus princípios para todo o povo eram ambiciosos, ele seria o arauto de uma nova filosofia, que Blank julgava revolucionária e que transformaria o conhecimento para sempre. E seu livro de aforismos, como um complemento de seu sistema de moral, foi publicado por Blank logo em seguida, todos estes livros circulavam em seu pequeno novo grupo de discípulos, tanto os três tomos de moral blankista, como seu opúsculo de princípios gerais para todo o povo e seu volume de aforismos que reuniam todas as máximas de Everaldo Blank que, agora, aos dezoito anos completos, juntava todas as suas frases, máximas e provérbios desde que teve a sua primeira iluminação espiritual ainda aos sete anos, quando foi buscar o Santo Graal no meio da floresta.
Seu primeiro livro de Teoria da Alma, que seria o Iluminações Espirituais, foi publicado quando ele completou dezenove anos, já estudando na universidade para se formar em Filosofia, e suas leituras de Descartes e Kant avançavam para que ele tivesse condições de montar a sua teoria do conhecimento blankista, sua leitura de Fenomenologia do Espírito de Hegel também se iniciara e ele estava empolgado com seu destino glorioso de arauto e pensador para todo o povo. Everaldo Blank era o gênio que criou o Blankismo, e como arauto e fundador desta nova filosofia, agora com a sua Associação Iluminada do Blankismo, seria reconhecido como o grande gênio que é, um filósofo original e uma espécie de visionário de novos fundamentos que ele queria divulgar para todo o povo, já que colocava em todos os seus livros, como subtítulo, um livro “para todo o povo”. Everaldo Blank era o arauto, e já contava com doze discípulos, que seriam seus “apóstolos do conhecimento”.
O opúsculo de princípios gerais virou a Bíblia dos doze discípulos do Blankismo, o diretor-executivo da Associação Iluminada do Blankismo virou uma espécie de vice-líder do movimento, seu nome era João, e ganhou um pseudônimo, agora se chamaria Ficteto, todos os outros onze discípulos ganharam pseudônimos, Teeteto, Protágoras, Filolau, Górgias, Plínio, Isócrates, Adolfo, O Grande, Luís Cláudio, O Breve, Pangloss, Roberval, e o mais jovem, Abelardo, O Prodígio. Ficou decidido pela Associação que Everaldo Blank não teria pseudônimo, uma vez que o arauto do Blankismo tinha que divulgar seus escritos para todo o povo com seu nome verdadeiro. O Blankismo agora também ganhava um comentador da obra de Everaldo Blank, que era o discípulo Adolfo, O Grande, que ficou no encargo de fazer dois livros de comentários à grande obra moral blankista, a Trilogia de Sistema de Moral de Everaldo Blank, enquanto um outro discípulo faria a exegese filosófica do livro de Aforismos, o discípulo Roberval, e os outros discípulos ficariam com outras atribuições, desde obrigações burocráticas da Associação, como o trabalho na internet de divulgação das ideias blankistas e da figura de Everaldo Blank, o arauto do Blankismo.
Em meio à produção da teoria do conhecimento blankista, Everaldo Blank, depois de terminar seu livro de retórica blankista, começou a escrever seu tratado de política blankista, o Blankismo agora também viraria um movimento político, pois Everaldo Blank ambicionava entrar para a política, e logo começou a flertar com ideias e valores de extrema direita, contra a legalização da maconha, do aborto, e contra a união homoafetiva, Blank era de formação católica e tomista, evoluiu todo o seu sistema de moral blankista com um fundo aristotélico, tomista e fundamentalmente católico, e suas ideias políticas foram do liberalismo, caminharam para o conservadorismo, e enfim se situou no TFP do reacionarismo, Tradição, Família e Propriedade, inicialmente republicano, mas ao fim ele viraria monarquista, um defensor do retorno da família real ao poder no Brasil. Mas, neste estágio inicial de construção do pensamento político blankista, ainda vemos um reacionarismo dentro de uma ideia de República ditatorial e de valores cristãos contra a degeneração moral dos costumes.
Os estudos de moral e cívica também passam a fazer parte do programa pedagógico blankista e da Associação Iluminada Blankista, agora também com um projeto de livro pedagógico com princípios de educação blankista, um livro que foi produzido em um ano e publicado junto com o novo tratado político conservador do Blankismo, novamente sem grande repercussão, mas amplamente divulgado pelos apóstolos do conhecimento do movimento blankista, que agora ganhava uma edição comentada pelo discípulo Adolfo, O Grande, da obra moral de Everaldo Blank, livro este que ganha o título “Interpretação do Pensamento Moral do Arauto Everaldo Blank”, comentário filosófico sobre os três tomos de Sistema Moral Blankista, um panegírico dos valores da filosofia moral blankista e extensão dos estudos morais da Associação Iluminada Blankista.
Everaldo Blank, munido de seu dom visionário e de seu pendor missionário, junto com os doze apóstolos do conhecimento, criou uma bibliografia que seria o códice blankista, que reunia as obras de Everaldo Blank publicadas até então, e uma coletânea de artigos morais, políticos e de natureza ficcional, Blank publica aos vinte e um anos, também, sua incursão no mundo literário, um livro de contos e um romance sobre o Santo Graal, seus artigos começam a ser publicados em jornais e Everaldo Blank se torna jornalista, grava um disco ao piano com sonatas e pequenas peças de influência em Ludwig Van Beethoven, e trabalhava na composição de uma sinfonia na partitura, sua Sonata Opus Gloriam Dei vira sua composição inicial e mais emblemática na sua obra musical, e o Blankismo logo ganha um Tratado sobre Música Blankista, de cento e vinte páginas, que é um apanhado da concepção filosófica de Everaldo Blank sobre a música e o que seria a música clássica blankista, neste mesmo ano sai o livro de comentários aos aforismos de Everaldo Blank, feito pelo seu discípulo Roberval, cujo título era “Comentário Filosófico dos Aforismos do Arauto Everaldo Blank”.
O Blankismo ganhava todo um corpus philosophorum, tanto da obra de Everaldo Blank, como também de seus dois comentadores, Adolfo, O Grande, e Roberval, este último que agora se dedicaria a comentar a obra musical e o trabalho político-filosófico do grande arauto do movimento filosófico Blankista, Adolfo, O Grande, produziria um novo comentário sobre a obra de filosofia moral blankista, e Luís Cláudio, O Breve, seria uma espécie de guardião dos princípios gerais do Blankismo, encarregado de memorizar todo o pequeno opúsculo no qual tais princípios estavam codificados. O Blankismo tinha um objetivo de propagar a filosofia blankista para todo o povo, e Everaldo Blank gostava de reforçar esta missão de sua Associação Iluminada Blankista.
Aos vinte e dois anos Everaldo Blank conclui seus dois volumes de teoria do conhecimento blankista, cujos títulos são Da Sensação, e Empirismo Material, aonde ele sai de sua influência cartesiana inicial e flerta com um empirismo inglês requentado, com tiques lockianos e ecos de Berkeley e Hume em muitos de seus trechos escritos, sua teoria da sensação e de conhecimento empírico também eram influenciados pelo seu estudo de composição da luz e dos buracos negros e da gravitação universal, e seus estudos matemáticos também ganham uma versão em livro, Análise Matemática Blankista, em que se viam equações e alguns exercícios de geometria analítica, e seus estudos de física são lançados quando ele completa vinte e três anos, ano em que ele ganha o diploma de bacharel e licenciado em Filosofia, seu livro Física Blankista da Matéria é lançado, e a Associação Iluminada Blankista amplia o corpus philosophorum, além destas novas obras, com um trabalho de monografia de Everaldo Blank sobre a Fenomenologia do Espírito de Hegel.
Seu pensamento político ganha um novo lançamento, Tratado do Conservadorismo Cristão, e sua militância política o faz se filiar ao PTB, Everaldo Blank começa a contestar várias causas com as quais ele discordava, e vê na estrutura jurídica brasileira uma oportunidade para peticionar por suas causas e combater o que ele reprovava. Seu primeiro embate é com a Teologia da Libertação, ele entra com um processo judicial contra um Frei por blasfêmia e proselitismo anticristão, perde o processo, que é arquivado. Everaldo Blank logo entra em choque com movimentos civis de afirmação de minorias perseguidas, como o movimento LGBT e políticas antirracistas, também entra em conflito com o movimento feminista a favor do aborto e contra a marcha da maconha.
Everaldo Blank logo vira uma espécie de contestador sistemático que se imiscui dentro do universo processual e recursal da Justiça brasileira, e passa a usar todos os recursos processuais da esfera civil do Direito Brasileiro, sempre em relação a causas que lhe afetavam politicamente, ideologicamente e moralmente. Seu primeiro grande processo é impetrar uma ação indenizatória contra o movimento de legalização do aborto, ele processa um movimento feminista e perde a causa por insuficiência de provas contra a líder feminista Mônica, que tinha sido acusada por Everaldo Blank de ter feito dois abortos ilegais e incentivado mais três mulheres do movimento feminista a abortarem, por falta de provas, o processo foi arquivado, e Mônica desistiu de pedir reparos por danos morais, pois percebeu que Everaldo Blank queria lucrar em cima da Associação Feminista para ganhar recursos para a sua Associação Iluminada Blankista. Plínio, um de seus discípulos, tinha se infiltrado no movimento feminista para gravar áudios e tirar fotos, tanto na Associação Feminista como nos movimentos de protesto pró-legalização do aborto, mas não conseguiu evidências que pudessem incriminar Mônica e algumas de outras líderes do movimento.
Everaldo Blank, depois destes processos contra defensores da Teologia da Libertação e contra feministas pró-aborto, vira um ativista judicial, acionando a Justiça nos mais diversos casos, numa atitude, em geral, reacionária e de ultradireita, com ações impetradas para gerar polêmica, ele se torna relativamente conhecido nos meios jurídicos, pois sua carga peticional ganhava uma proporção cada vez maior, com ajuda de seus doze apóstolos do conhecimento, e sua Associação Iluminada Blankista vira uma espécie de bunker de conspiração contra movimentos de esquerda e de afirmação de direitos, as causas judiciais de Everaldo Blank vão se tornando cada vez mais bizarras e sensacionalistas, feitas para chamar a atenção, e seu intuito com isto era tanto ganhar recursos para a sua Associação como ter repercussão e passar a vender as suas obras, que até então só eram conhecidas pelo seu pequeno círculo de discípulos e alguns poucos leitores, de pouco reconhecimento acadêmico e de uma ambição muitas vezes sem fundamento ou tempo suficiente de maturação filosófica.
Everaldo Blank, com uma posição de extrema direita, continua então seu ativismo judicial, e entrou em polêmica política ao peticionar um Habeas Corpus contra uma caça da Polícia Federal de dois ex-dirigentes nazistas, tal ação estapafúrdia foi arquivada por ter bases insuficientes, e Everaldo Blank logo voltou à carga com um Habeas Corpus para garantir a publicação no Brasil do livro Os Protocolos dos Sábios de Sião, publicação considerada antissemita, mais uma ação estapafúrdia que não deu em nada, mas ganhou repercussão relativa no meio jornalístico, para além de sua fama no meio judiciário, que já sabia de seu ativismo processual, e um jornalista de O Dia, jornal do Rio de Janeiro, publicou um artigo sobre o ativismo judicial de Everaldo Blank, intitulado, “Everaldo Blank é um impostor da Justiça”, era o jornalista Paulo Fontes, que, depois de publicado o artigo, foi processado por Everaldo Blank, para apagar a publicação, mas Paulo recorreu e conseguiu manter os direitos sobre a matéria publicada.
Paulo Fontes seguiu seu trabalho, enquanto Everaldo Blank agora queria encampar uma candidatura à vereador pelo PTB para a sua cidade de Campos dos Goytacazes, em 2000, aos vinte e três anos, Everaldo Blank sai candidato a vereador pelo PTB, consegue 190 votos, não se elege, e se volta com todas as suas energias para seu trabalho na Associação Iluminada Blankista, na qual agora ele queria fazer um trabalho melhor de divulgação de sua obra filosófica, ele tenta contatos dentro do próprio PTB para ter uma melhor visibilidade no partido, mas suas propostas eram consideradas exóticas por parte do partido, sendo Everaldo no máximo tolerado dentro da direção, mais um candidato comum a vereador que não teria muito futuro. Everaldo Blank, no entanto, tinha outros planos e ambições, queria construir uma carreira política de vulto, assim como ainda lutava para ser reconhecido como pensador e filósofo, tanto entre seus pares do meio acadêmico, como pela massa crítica do pensamento público, e seu ativismo judicial era um dos meios que ele utilizava para divulgar as suas ideias e causas.
Paulo Fontes recebe outro processo de Everaldo Blank, desta vez por uma reportagem sobre a Associação Iluminada Blankista que Blank acusou como difamatória, Paulo recorre e o processo é arquivado, as menções à seita de Blank na reportagem são consideradas meramente de caráter descritivo. Blank processa novamente as feministas, desta vez outra organização pró-aborto, esta de São Paulo, acusada por Blank de incentivar o aborto ilegal, o processo é arquivado, pois o juiz considera que a organização apenas se posicionava politicamente, sem, no entanto, induzir mulheres a fazer aborto ilegal, uma vez que o estatuto da organização não mencionava tal prática como recomendável, apenas como fonte de ilustração para traçar suas estratégias e políticas.
Em 2001, Everaldo Blank começa um périplo para virar palestrante de sua obra filosófica, consegue um convite para fazer um curso de Blankismo em Campos dos Goytacazes, chega ao auditório, e lá estava o operador de som, sua mãe e os doze apóstolos do conhecimento, seus discípulos, membros da Associação Iluminada Blankista, e sua primeira palestra é um fracasso, Abelardo, O Prodígio, se põe a declamar poesia, no final, e depois lê o opúsculo dos princípios gerais do Blankismo para uma plateia vazia. Everaldo Blank volta então suas forças para seu ativismo judicial e suas ambições políticas, entra em contato com a direção do PTB em Campos dos Goytacazes para se lançar candidato a deputado federal, cria um estatuto próprio para sua plataforma política, mas não convence a direção, que pretendia lançá-lo novamente para candidato a vereador, e lhe oferece uma suplência de um futuro candidato a deputado estadual, o qual ele declina e prefere sair candidato a vereador em 2004, agora com um prometido apoio maior da direção local de Campos dos Goytacazes e do tesoureiro do PTB estadual do Rio de Janeiro.
Everaldo Blank encampa mais um processo contra a feminista e abortista Mônica que, desta vez, se vê em meio a provas forjadas de aborto ilegal feitas sorrateiramente pelo discípulo de Blank, Plínio, e Mônica consegue uma absolvição, mas é obrigada a fazer trabalho voluntário para a Associação Iluminada Blankista, que pede uma ação indenizatória em seguida, forjando um roubo ao tesouro da Associação, acusando Mônica de furto, ela se revolta, consegue obter provas de que se tratava de uma farsa feita por Everaldo Blank, e ganha uma pequena indenização por danos morais, Everaldo Blank, que não tinha salário fixo, acaba se endividando no banco para pagar Mônica, que volta à sua fundação que ela tinha organizado recentemente, e tinha um sorriso no rosto ao ter conseguido provar que Everaldo Blank tinha interesses escusos e que era um ativista judicial profissional, suas causas eram pretextos para extorquir as pessoas.
Everaldo Blank então entra, desta vez, com um processo contra uma jornalista de Campos dos Goytacazes, Vera Sampaio, por danos morais por uma matéria dela sobre mistificação na Associação Iluminada Blankista, que ela cita no texto como “um arremedo de escola filosófica que é um mistifório de mistificações, falácias e que vivia da renda de processos judiciais estrambóticos”. Everaldo Blank não consegue vencer, Vera consegue manter a matéria ativa e a poderia usar e divulgar quando quisesse ou bem entendesse. Vera então produz mais uma matéria, desta vez sobre o ativismo judicial de Everaldo Blank, intitulado “Como jantei Everaldo Blank”, ela é processada novamente, por calúnia e difamação, o juiz não considera a matéria ofensiva e diz que a liberdade de expressão era um valor a ser defendido pela justiça, o processo é indeferido.
Everaldo Blank se revolta e manda Plínio investigar a vida de Vera Sampaio, Plínio descobre sua ligação com o movimento da marcha da maconha, Plínio então decide armar um flagrante em Vera por porte de drogas, vai ao jornal de Vera, entra sorrateiramente, e coloca duas trouxinhas de maconha e um pino de cocaína em sua bolsa, uma vez que Plínio disse que estava ali para ir aos arquivos do jornal para fazer uma pesquisa, conversa pessoalmente com Vera, sem ela saber do que se tratava, distrai Vera enquanto planta o flagrante em sua bolsa, uma hora depois, por denúncia anônima feita por Plínio, Vera Sampaio é presa em flagrante por porte de substância entorpecente, o movimento da marcha da maconha reage e decide fazer um levantamento do fato, já desconfiando de que o problema tinha sido causado por Everaldo Blank e sua famigerada Associação Iluminada Blankista. Vera paga uma fiança e é solta e orienta o grupo da marcha da maconha a investigar os passos de Everaldo Blank, a marcha da maconha então contrata um detetive para se infiltrar na Associação de Everaldo Blank, mas o detetive, depois de um mês, não encontra provas contra Everaldo, e Vera e seu grupo desistem da investigação.
Everaldo Blank, agora já em 2002, sem a sua candidatura para deputado federal e sem ter aceito a suplência em uma candidatura para deputado estadual pelo PTB, decide radicalizar as suas causas e seu ativismo judicial e se volta contra a marcha da maconha, volta à carga contra o movimento a favor da legalização do aborto e mira também no movimento LGBT e se posiciona contra a união homoafetiva, decide criar sua plataforma política neste sentido, se autointitula católico fervoroso e praticante e leva a sua obra filosófica para fora do circuito de sua Associação e a divulga dentro do PTB e se junta ao tesoureiro estadual do partido para conseguir uma boa divulgação de seus livros, pois ainda não tinha conseguido grande repercussão, pois acabou sendo mais conhecido pelo seu ativismo judicial do que como pensador, uma vez que as menções sobre este seu lado na imprensa era pequena, comparada à sua fama relativa de processar Deus e o mundo.
A divulgação é feita pelo tesoureiro por uma editora que tinha relações com o PTB e toda a obra de Everaldo Blank acaba sendo republicada em novas edições em 2003. Desta vez, seus escritos têm uma repercussão relativa, tanto em Campos dos Goytacazes como no próprio Rio de Janeiro, mas na parte de crítica acadêmica, acaba sendo uma obra que foi recebida como piada filosófica e mistificação conceitual saturada de ideias falaciosas e sem fundamento verdadeiro, em geral, um fundo afetado de aristotelismo requentado por retórica redundante, na verdade, no jargão filosófico, Everaldo Blank sofria de síndrome do grande gênio e era, por fim, uma espécie de pseudo-sábio metido a guru.
Everaldo Blank passa a divulgar em dez palestras seguidas em Campos dos Goytacazes seus escritos que foram reeditados e republicados, se concentra em seus volumes morais e políticos, Everaldo demonstra afetação nestas palestras e acaba sendo arguido por um grupo de acadêmicos que foram a estas palestras com intenções de ridicularizá-lo, e em meio de aporias inúmeras, Everaldo tartamudeia e o resultado das palestras é uma catástrofe, Vera Sampaio volta à carga e escreve um artigo fazendo troça de Everaldo Blank, e logo em seguida Vera e seu jornal, junto com a marcha da maconha, entra com um processo por forja de provas na Associação iluminada Blankista que foi para incriminar Vera injustamente. Blank recorre e, desta vez, vence o processo contra Vera, que nunca conseguiu provar a armação que ele tinha feito para ela no porte de drogas, enquanto Vera vence mais uma em relação ao artigo que ela havia publicado, com liberdade de escrever o que bem entendesse sobre a Associação de Blank e seu fiasco nas palestras, e sua fama no meio acadêmico como um palhaço verboso, falso profeta, e líder de um movimento filosófico imaginário.
Em 2003 ele processa um movimento LGBT carioca por incentivo de união homoafetiva, processa a marcha da maconha por apologia de uso ilegal de drogas e incentivo da fornicação sem camisinha e processa mais uma vez a fundação feminista pró-aborto de Mônica, ele processa também Paulo Fontes por outro artigo dele, este intitulado “Everaldo Blank é um fiasco acadêmico”, Vera Sampaio se junta a Paulo Fontes e publica uma reportagem sobre a Associação Iluminada Blankista, nesta reportagem a vida dele e de seus discípulos é devassada, e Vera acusa Everaldo mais uma vez de ter plantado provas e de misoginia contra Mônica, que era perseguida por ele já há alguns anos. Everaldo processa novamente Vera Sampaio, perde, e um grupo de neointegralistas entra em contato com Everaldo Blank, propondo uma aliança.
A marcha da maconha vence o processo contra Everaldo Blank, a liberdade de expressão é uma garantia constitucional, a fundação de Mônica também derruba mais um processo de Everaldo Blank, o meio acadêmico também acaba sendo processado por Everaldo por conluio contra suas palestras, que ele acusa de ter sido divulgada num artigo acadêmico difamatório, artigo este que nunca existiu e o processo é indeferido. O movimento LGBT ganha o processo contra Everaldo Blank. Chega 2004, e sua aliança com os neointegralistas é firmada, o gabinete deles vira um novo bunker da plataforma política de Everaldo Blank e sua nova candidatura a vereador pelo PTB ganha o apoio de uma destas organizações, esta localizada na capital, Rio de Janeiro, a “Anauê Gloriosa”, e Everaldo, mesmo com um apoio maior, e um financiamento público robusto pelo apoio direto do tesoureiro estadual do PTB, consegue apenas 330 votos e não se elege mais uma vez. Ele começa a ler Richard Dawkins e tem uma metanoia, Everaldo Blank vira um ateu convicto.
Ele então se coloca a escrever uma obra de moral ateísta, também com fundo aristotélico, renega seus escritos católicos, e produz durante os próximos três anos um tratado moral ateísta em dois volumes, um manual prático de ateísmo militante, e um tratado político laico, consegue criar uma teoria do conhecimento materialista e escreve um novo livro de física da luz, do som e de fenômenos de gravitação e formação de buracos negros. A relação da Associação iluminada Blankista com a Anauê Gloriosa se aprofunda, o conluio agora se concentra contra jornalistas e a esquerda política, um deputado estadual petista é processado por tráfico de influência que não é provado e Everaldo tem que pagar uma indenização ao deputado, Everaldo decide entrar com um processo contra o jornalista Estevão Albuquerque que divulga a relação estrita entre os blankistas e os neointegralistas, no qual Estevão levanta suspeitas do ativismo judicial de Everaldo mais uma vez, Everaldo perde o processo e cria um processo estrambótico para indenização dos descendentes de proprietários de escravos que perderam suas posses na Lei Áurea, o processo é indeferido e vira piada. Um processo pela criminalização da prostituição também é derrubado, mais um processo contra feministas, desta vez o movimento Femen, por atentado público ao pudor, também é derrubado.
Um processo chega ao Supremo, de autoria também de Everaldo Blank, desta vez contra a autorização para biografias, Blank participa de uma audiência, e tinha a intenção de anular a ação de editores que havia conseguido a liberação de biografias não autorizadas, uma matéria em O Globo sobre a polêmica de Everaldo Blank sobre a Lei Áurea leva o mesmo a processar o jornal, a ordem é apagar o parágrafo da reportagem que relata que a Associação Iluminada Blankista propôs uma alteração da Lei Áurea, de 1888, para indenizar economicamente os afetados com a libertação dos escravos no Brasil, ele perde o processo. Blank também processou, logo em seguida, a revista eletrônica Justiça Brasil, e perdeu, Everaldo acusava a revista de mencioná-lo como ativista judicial de extrema-direita, contrário à legalização do aborto e à união homoafetiva, e favorável a causas nazistas e à criminalização da prostituição. A juíza Bianca Fontes Silva, de uma Comarca do Rio de Janeiro, capital, entendeu que notícias sobre a vida de quem participa ativamente na esfera pública são de interesse público, e em seu processo disse que o autor do processo “atua defendendo causas reacionárias e fazendo polêmicas, com posições discriminatórias e de extrema-direita”.
Everaldo Blank segue seu périplo em 2006, desta vez consegue descolar uma candidatura a deputado federal organiza um gabinete de campanha com a sua Associação Iluminada Blankista e a Anauê Gloriosa, sua campanha naufraga em irrelevância, e mais uma vez ele não se elege, a direção do partido, já em 2007, descobre esta ligação umbilical de Everaldo Blank com o neointegralismo e a direção nacional do PTB decide por sua expulsão sumária, pouco depois, no fim de 2007, Everaldo Blank, ex-católico e agora ateu convicto, deixa de ser um republicano reacionário a favor da ditadura militar e tem uma nova metanoia, desta vez se torna monarquista, sonhando com o retorno dos Orleans e Bragança ao trono do reino, em uma monarquia renovada, com o fim da democracia liberal e da Nova República. Blank, já em 2008, ajuizou no Supremo Tribunal Federal um Habeas Corpus contra decisão da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça que negou-lhe o direito de usar o escritório modelo da Universidade Federal do Rio de Janeiro para mover uma Ação Popular proibindo a aplicação de verbas públicas na organização da Parada de Orgulho Gay no Rio. Em seguida, Everaldo Blank foi proibido pela direção da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro de se apresentar dentro da instituição como advogado patrocinador de uma Ação Popular contra a utilização de verbas públicas na Parada do Orgulho Gay, Everaldo Blank atuava no Escritório Modelo da Faculdade, destinado a pessoas de baixa renda.
Até 2010, o Jusbrasil encontrou 255 processos de Everaldo Blank nos Diários Oficiais. Dentre os inúmeros processos, uma grande concentração deles contra movimentos feministas que eram a favor da legalização do aborto e movimentos feministas em geral como o Femen, contra a marcha da maconha, contra o movimento LGBT, contra jornalistas, contra universidades, contra o movimento negro, contra os defensores da liberdade de imprensa, contra os ambientalistas, contra o movimento de liberação das biografias, contra pessoas da esquerda política, contra o movimento indígena, contra os movimentos socialistas, contra a proibição de divulgação de material a favor da intervenção militar, contra a proibição de apologia ao nazismo, contra a Lei Áurea, contra documentos que liberem o sigilo militar nos tempos da ditadura, contra o movimento quilombola, contra o satanismo em bandas de rock brasileiras, contra práticas espirituais de cunho africano, contra advogados, contra repórteres, contra a Teologia da Libertação, contra a CNBB, contra o sindicato dos jornalistas, e contra os defensores do livre acesso ao arquivo nacional, alegando que havia documentos sigilosos que não poderiam ser divulgados. Vendo este ativismo judicial, o jornalista Andrew Barros não se conteve e escreveu um artigo que publicou em seu blog, o Tribuna Viva, intitulado “Everaldo Blank Contra O Mundo”, no qual descreve, com humor, o ativismo judicial incontinente de Everaldo Blank, que é descrito no artigo como um oportunista e arrivista jurídico, hipossuficiente e ávido por viver de renda do erário e de extorsão através de processos estrambóticos ricos de invencionice.
Em 2012, o processo contra o jornalista Andrew Barros chega a julgamento, Andrew contrata o advogado Pierre de Bourbon Orleans, que era descendente direto da família real brasileira, a família Orleans e Bragança, os dois vão à audiência, Pierre de Bourbon prepara a defesa de Andrew, Everaldo Blank impetrava a retirada do artigo do blog Tribuna Viva, e pedia uma indenização por danos morais, o processo se estende por algumas semanas, Pierre de Bourbon apresenta a defesa de Andrew ao juiz, o texto de Pierre é certeiro e suas falas são calmas, enquanto Everaldo Blank, na presença de Andrew Barros, e em frente ao juiz, ele que era agora um monarquista convicto, descobre, durante a audiência, que Pierre de Bourbon era da família Orleans e Bragança, e começa a atuar como um sabujo de Pierre, perguntando sobre a família real e sua ascendência.
Fascinado por estar travando uma conversa com um Orleans e Bragança, os gestos de Everaldo Blank logo se tornam patéticos, e Pierre aproveita a deixa para discorrer a defesa de Andrew Barros sem muita interferência da impetração de Everaldo Blank. Pierre de Bourbon convence o juiz de que não havia dano moral ao impetrante, mas que afiançou, no entanto, a retirada do artigo “Everaldo Blank Contra O Mundo” do blog Tribuna Viva, enquanto Everaldo Blank se dirigia a Pierre de Bourbon como “Sua Alteza” de um modo caricato e qual um lacaio que tinha descoberto seu ídolo. O processo é arquivado, o artigo acaba sendo retirado do blog Tribuna Viva, Andrew Barros se dá por satisfeito, pois já tinha provocado Everaldo Blank o suficiente, e este termina a audiência se dirigindo a Pierre de Bourbon como “Sua Alteza” até ao fim da audiência. Pierre de Bourbon cumpre a sua missão, e Everaldo Blank continua a sua vida de ativista judicial na sua luta reacionária contra o mundo.

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.


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