PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

sábado, 1 de outubro de 2011

OS BOÊMIOS (PARTE II)


   No teu ser o brasão impele,
   Corrente jaz de velhas eras.
   Que derrama sol e ferve esferas,
   Que da noite em degredo fere.

   É o campanário, veia lúcida.
   Há de ter tempestade na alma,
   Que vem da luz e da calma,
   Aportar no sonho da vida fúlgida,
   Oásis e morte que traz e me ama.

   Vinho do mar, violeta que dança aqui e acolá.
   Todo suntuoso mar, que do vinho é festa!
   Tudo que há para amar, perdido lá.

   Hoje é sabor doce, ou amarga vinha,
   Ainda que estrada vá.

   Lancinar, rosto que não mede as garrafas.
   Tenho certeza de hoje beber prantos,
   Colher depois risos sem amarras.
   Que eu só neste campo vejo malandros.

 

OS BOÊMIOS (PARTE I)


   Que hei de ver agora em constelação?
   Os bêbados que caíram sóbrios,
   Os vãos desvarios dos ópios.
   Querem dar olhos às mortes de verão?
   Pois eu dou veneno e sinto então.

   Do ar que bafejava noutra cascata,
   De bares corre vento e alegria.
   Não vejo minha flor, tudo resvala.

   Para o bar! Vos digo onde passar ...
   Pois há rua no meu caminhar.

   E a mesa me afoga, tempo cru da crueldade.
   Amamos a esbórnia,
   Tuas vidas, ó mocidade!
   Que vai e possui a cidade!

   Tudo que há de se beber ali,
   Bar que a madrugada toma,
   Sempre mistério que ouvi,
   Por nada que me é doma.

 

INTERROGATÓRIO


   Quem és tu, ó infame?
   Mestre de ambivalências, um paradoxo contínuo.
   Não tem nome o seu cadafalso?
   Ópios instrutivos de leituras, biografias queimadas.
   Avisa quando vem?
   Somente por botes em ninhos inférteis e escuros.
   Não tem uma faca amolada?
   As garras de unhas afiadas.
   Semeia?
   Versos de cadeiras de rodas, rosas chorosas.

   Deve algo ao povo envolto em chamas?
   Meu perdão e todos os perdões.
   Um Cristo de insanidade santa!
   Foste algum soldado autoritário?
   Nas guerras entrincheiradas voei eternamente.

   Por que não está se ocupando?
   Não adquiri habilidades práticas.
   Então, ouve seu coração?
   Às vezes tenho que escutar outros, desesperados.
   Trouxeste um presente?
   Não tenho dinheiro em meu motor de parlatórios.
   O que tu queres? Afinal de contas?
   Om mani peme hung, ó alegria do lótus!
     

ROSA MORTA (PERFEITA ILUSÃO)


    Se não existem flores,
                   sempre semeio torpores,
                                              de falsas flores.

   Encontro, qual rosa perfeita, sua maledicência.
   Ressoando a alma decantada no ar rarefeito,
   esgarçando a moral, voz hipócrita definhando.

   Estarei, depois, na praça cantante, deitado e mendicante.
   Vagarei no verso vulgar e amador.

   Meu verso, que é natimorto e feto noturno,
   olha de soslaio a derrota íntima.
   No sabor degradante de volúpias e febres,
   delírios acordam os sonos cadavéricos
   do ópio que me enleva.

           As flores são rosas mortas!

   Vejo entre mil essências o perfume de maravilhamento.
   Me tem a mortalha que mortifica, de olhos ardentes como fogo.
   Qual edificação multiforme, o pensamento se transforma.
   Delícias inumeráveis? Serei finalmente feliz?
   Agora vejo somente torpores, nada de flores.