PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

sábado, 6 de julho de 2013

O BERRO DA PALAVRA

Cultivo o nome das coisas
e me atenho ao material
que as corrompe.
O nexo do sinal
as ilumina,
toda matéria densa
se consuma em palavra,
o verso então
a recoloca,
na dimensão paralela
dos nomes,
com a palavra aberta
e novos nomes,
a palavra retumbando
em espasmo
de luta verbal,
e do ritmo a pena
se desanca
de tanto
montar
em cima
da palavra
como
se fosse
um cavalo
tonto
de tanto
berrar.

05/07/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)

CORES DA ALMA

As cores vistas pela retina.
Cada cor um drama diferente.
Cada drama uma dor de cor.
Se a alma em todas as cores
se compõe,
e dá paz à brancura
do céu,
e dá guerra ao vermelho
da morte.
O luto,
na noite
preta,
pranteia
com lágrimas
azuis.

05/07/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)

REGISTRO INDECISO

Paro em frente ao silêncio.
Penso em formas-poesia
que possam definir
o tom principal
deste silêncio.

Paro ou ando?
Pois se corro, grito.
Se ando, falo.
Se paro, silencio.

05/07/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)

VIDA DA RAIZ

Árvore da vida,
canta a nau
entorpecida.

Planalto dos faustos assassinos,
vinga-se a máquina de tudo
em todas as cores.

Vida! Plêiade da ametista,
flor vindoura
de sol intumescido,
vermelho e negro,
branco e azul!

Caule caudal na onda da luz.
Folhas voando
no tempo
da raiz.

05/07/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)

CORAÇÃO DE INCENSO

Do nardo acorda a tempestade.
Lento o poema se escurece.
Tece e tece,
urdidura mandala,
poliédrica
mutante
estátua,
passadas brutas
e verso de ferro,
aço de poesia
e ferida de grito.

Do almíscar planam os delírios.
Com a pura violência
da meditação,
êxtase violento
que é soco
dentro
do coração.

05/07/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)

ÂNSIA DE POESIA

Poema ânsia de vida.
Poema-filosofia.

Desde a água até o fogo,
bruma e fogueira.

Desde o tédio até a fantasia.
Fera dominada no sonho
vira pássaro
e fúria
na alma
decantada.

Poema-delírio.
Faz todo o riso
das lamentações
da tribulação.

Poema-sonho.
Acorda na noite
com sede
de poesia.

05/07/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)

FOME DA CAVEIRA

Vértebra na onda do sonho cáustico,
envenena o poema em poeta de cal.
Vértebra quebrada
no anzol,
peixe devorado
de fome.

Quando anda o crânio e o fêmur,
quando resta o esqueleto.

Corpo, carne.
Devora.
Fome.
Estômago.
Ossos.

Nódoa fria das ligaduras.
Cai a carne com dor nos músculos.

Vermes comem os olhos,
vermes comem as orelhas.

Sobra a caveira
sob a terra devoluta
da guerra.

05/07/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)

SENTIMENTO DE NAVIO

As roupas paramentadas caem nuas.
Desvela-se o tempo em toda a magnitude.
Certo o odor da fera nas águas do infinito.

Fera aturdida por caçadores
numa mata densa de segredos.
Os olhos cegos do morcego
rondam na noite da mata,
o sangue venoso
cai na singradura
dos navios vermelhos,
e os ossos dos corsários
descansam no fundo do mar.

05/07/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)

CÉU DA TERRA

Geme a flor porvindoura do holocausto,
freme o dia na onda matutina da semente.
Ópio convulsionado da pena,
cai límpido nas asas da urdidura.

Sem tempo ao caos das lembranças,
o vento castiga a nuvem
e o sol irrompe com seu soco.

Venta em todas as sebes mordidas.
A fé é pura no cais das labaredas.

Donde o rio corre manso,
o monge se destina ao espanto,
e a flor atávica sorri em êxtase.

Note-se a turba desvairada,
sem saber onde dar
e do quê se espantar.

Leva o corpo a febre do horizonte,
queima a vista na paz da paisagem,
e o céu imita a terra
no vento suicida
dos mistérios.

05/07/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)

FAUNA ESPANTADA

Vinhateiro na luta em sevícia,
rotina do espasmo com o leme louco.
Vozes multiformes na carne e na víscera.
Pranteia o ardil suas lamúrias.

Os rios vencem a corrida até o mar.
Os lírios silenciam na voz modular.
Carne e osso fulguram
no quadro abortado
dos poetas mortos.

Desbunde no vitral do delírio.
Ponte ao mistério na dança,
horizonte levitado de esperança.

Os dias tão azuis lembram
a cor do corte
na mão do lenhador.

Os faunos se escondem
durante a viagem de ácido
pelos riachos.
Pã nos dá vinho e canção
com a névoa dionisíaca,
o corpo vira musgo,
e a visão se espanta.

05/07/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)

SEMENTE DO DENODO

Agonia sempiterna na asa que volteia,
sua branca nuvem névoa fulgura.

O limo da pedra penteia a paisagem
com as luzes da retina, morde o sopro
com o véu negro da noite beligerante.

As armas sonham mortes aniquiladas,
os poetas sonham armas aniquiladas.

Pelo vício das horas incertas,
cai o cadáver na ronda dos desatinos.

Freme o tempo vil do covil da bruma.
Decai o anjo frio da luz possuída.

Agonia burlesca em Sodoma,
reta curva do verso,
corpo e nódoa no vinho.

As quiromancias exultam
na arte do poema
em fundo sulcado,
o verso é sulcado
na carne da goiva,
em seu ritmo
reina o denodo.

05/07/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)

FERMENTO TEMPORAL

As dálias se formam no odor do sol,
pelas águas brutas do cabedal da voz,
umedece o ritmo em torpor febril.

As frias notas do trompete
concentram o sono do feto
em partitura e improviso.

Sente o corpo a nudez esférica do cú,
leve o braço modula o tilintar das pernas.

Para o silêncio resta o poema
em grau verídico de sangue,
portas sedentas de janelas,
varandas explodidas no quintal,
ruas de farândolas na peste do fogo.

Os sombrios lírios espoucam na espuma
de uma baba de raiva que grita no mar.
Versos transcendem na dor dos vinhos
em seus sudários de pratas e rouxinóis.

As litanias sofrem o mau humor
das leveduras de uma canção seca,
ouve-se do universo a letra única
e o tom escuro dos buracos negros,
oxida uma galáxia na supernova,
o tambor vem do céu com os anjos
na beberagem dos poetas anarquistas,
cauda de cometa é o sol na fauna temporal.

A veloz e dura canção
é tormenta e tempestade
de visões,
os cavalos no pé da montanha
lutam com a morte
de uma pedra rolada,
morrem oito homens
e o sangue desce
da montanha
e inunda o corpo
seviciado
das flores roxas
que corroem
o nervo puro
das dores vertidas
do tempo de sol
que iluminou
toda a chuva
no vento
da aurora.

05/07/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)




terça-feira, 2 de julho de 2013

PENSAMENTO DO SAL

O sal, que pende da boca da terra,
prorrompe no sono do guarda,
sua luz salina desemboca na urdidura.

Alimenta, com o frio do branco,
feridas e equimoses do plano reto.

Mede o instante na liga da carne.
Com o sal, a visão lacrimal,
de onde o mar se abre.

Pela onda que gera,
em topázio gelado,
qual luta das bocas
na sede que provoca,
salga os dias e o horizonte.

Pelo canto da hora do mar,
salga todas as máquinas
no tear trabalhado
das mãos ordeiras
da paz e do silêncio.

O verso em mar de sal.
O tempo e o sal na terra.
O vento que espalha
nas salinas
os prazeres
da refeição.

15/06/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)