“E a preocupação social é a nota dominante da poesia de
Cesário Verde.”
CESÁRIO VERDE – O HOMEM
E A OBRA
A OBRA DE CESÁRIO VERDE
– CONTINUAÇÃO
A poesia do real de Cesário Verde tem também aspectos de
preocupações sociais, e neste ponto há um parentesco com a exaltação dos poetas
revolucionários, mas há uma diferença entre Cesário e estes poetas que é o fato
de os revolucionários terem um compromisso social em base livresca, colhida da
cultura geral de que se nutriam, enquanto a fonte de Cesário Verde era a
realidade vivida em seu cotidiano, com imagens reais das quais ele dá o seu
testemunho em seus poemas, frutos de uma observação direta. E a preocupação
social é a nota dominante da poesia de Cesário Verde.
A poesia de Cesário se configurava como algo inteiramente
novo no cenário da literatura portuguesa de sua época, e que tinha na mestria
do uso dos adjetivos uma de suas marcas, e isto no sentido de suas variadas
combinações, e nisto ele também não era superado por nenhum de seus
contemporâneos, com a nobre exceção de Eça de Queirós, mas este na prosa. O
caráter dos adjetivos na poesia de Cesário Verde é que os poemas ganhavam em
corpo e exuberância, na descrição exaustiva que o poeta fazia das situações que
tentava esboçar em seus poemas, estas que tinham, por sua vez, uma rara
qualidade estética, numa nova poesia do real, com acentos inéditos na
apresentação das características de tal real, resultando numa expressão
renovada para a poesia até então praticada, com uma novidade de imagens que
também eram de notável beleza, e outro trunfo, que era a sua exatidão e a
sobriedade de seus versos. No dizer de Antonio José Saraiva, Cesário Verde era
“tão exato como Gomes Leal era difuso, tão conciso quanto aquele era caudaloso”,
que segue dizendo: “de todos os poetas da chamada escola nova, Cesário foi o
único que conseguiu cortar com a retórica romântica, criando uma expressão
inteiramente nova, ajustada à expressão direta de um novo conteúdo”.
Na tentativa de entender a indiferença e a hostilidade com
que esbarrou a obra de Cesário em vida, podemos elencar fatores decisivos, como
o fato de o poeta não ter publicado nada em livro quando ainda vivo, e que veio
ainda com o fato de que sua carreira literária foi breve, pois a morte lhe
colheu quando o poeta contava apenas 31 anos. Outro fato é que o poeta esteve à
margem dos grupos literários então em voga, e que era fator decisivo para obter
menção e ser visto. Folheiem-se as obras de história da literatura, e podemos
constatar, e isso em todas as épocas, que os nomes que elencam como dignos de
menção, mesmo tendo atenção ao que se vai produzindo, sempre guarda lacunas,
muitas vezes fundamentais, podendo ocorrer que sejam ignorados e postergados
nomes de mérito e valor muito maiores do que muitos dos que ali figuram, seja
por falta de obras publicadas, como também pela ausência de filiação literária.
E Cesário é um destes casos, sem a proteção de nenhuma tertúlia, de nenhum
círculo, e que teve como resultado este ter vivido e morrido ignorado, se
tratando de um dos grandes poetas de toda a literatura. No que a posteridade,
nos versos ilustres de um Fernando Pessoa, na pele de Álvaro de Campos,
invoca-o como mestre: “Ó Cesário Verde, ó Mestre, / Ó do “Sentimento de um
ocidental”, sendo unânime hoje o reconhecimento amplo do talento de Cesário
Verde. No que não podemos dizer, contudo, que tal poesia não tenha defeitos,
aliás, como tudo na vida, e que nos coloca não numa posição de poeta imaculado,
mas como uma poesia que não teve seu desenvolvimento pleno, marcado pela
imaturidade de um poeta que morreu ainda jovem, repleta do excesso de
prosaísmo, qualidade e defeito ao mesmo tempo, com toda a ambivalência de tais
valorações. Mas seu valor hoje na História da poesia é inegável.
POEMAS:
O SENTIMENTO DUM
OCIDENTAL
AVE-MARIAS: O poema clássico de Cesário Verde se
divide magistralmente em quatro partes, e esta primeira tem o clima da rua e da
maresia, no que vem: “Nas nossas ruas, ao anoitecer,/Há tal soturnidade, há tal
melancolia,/Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia/Despertam-me um desejo
absurdo de sofrer.”. O poeta em meio ao clima soturno, em que a noite cai,
sente dor, ou pior, o sofrimento, e a descrição urbana, dá os sinais de que o
poema se alimenta: “E os edifícios, com as chaminés e a turba,/Toldam-se duma
cor monótona e londrina./Batem os carros de aluguer, ao fundo,/Levando à via
férrea os que se vão. Felizes!/Ocorrem-me em revista exposições, países:/Madrid,
Paris, Berlim, Sampetersburgo, o mundo!”. O poeta tenta viajar pelo mundo num
esgar que é o poema, com o fog londrino, e mais os outros, que passam felizes,
enquanto o poeta agoniza com suas imagens, que vêm aos borbotões: “Embrenho-me,
a cismar, por boqueirões, por becos,/Ou erro pelos cais a que se atracam botes./E
evoco, então, as crônicas navais:/Mouros, baixéis, heróis, tudo ressuscitado!/Luta
Camões no Sul, salvando um livro a nado!/Singram soberbas naus que eu não verei
jamais!”. O poema tem a luta de Camões, nas crônicas navais em que ele evoca os
heróis ao paroxismo de ressuscitá-los, eis a primeira parte em que se tenta
salvar um livro náufrago.
NOITE FECHADA: O poema então segue, nesta segunda
parte, e o som ecoa com febre de loucuras mansas: “Toca-se as grades, nas
cadeias. Som/Que mortifica e deixa umas loucuras mansas!/O aljube, em que hoje
estão velhinhas e crianças,/Bem raramente encerra uma mulher de “dom”!”. O
coração do poeta então aparece como um grande abismo: “À vista das prisões, da
velha Sé, das cruzes,/Chora-me o coração que se enche e que se abisma.”. E o
poeta então vê a História, com as igrejas e o clero, e com a imagem de um
inquisidor: “Duas igrejas, num saudoso largo,/Lançam a nódoa negra e fúnebre do
clero:/Nelas esfumo um ermo inquisidor severo,/Assim que pela História eu me
aventuro e alargo.”. O épico toma a frente, com descrição vulgar de um poeta
que está inspirado: “Mas, num recinto público e vulgar,/Com bancos de namoro e
exíguas pimenteiras,/Brônzeo, monumental, de proporções guerreiras,/Um épico
doutrora ascende, num pilar!”. E a partida é dada, o poema continua seu trajeto
histórico, desta vez acordando a Idade Média: “Partem patrulhas de cavalaria/Dos
arcos dos quartéis que foram já conventos;/Idade Média! A pé, outras, a passos
lentos,/Derramam-se por toda a capital, que esfria./Triste cidade! Eu temo que
me avives/Uma paixão defunta!”. E a cidade lhe dá a ameaça da eclosão de uma
paixão defunta, e a poesia se esfacela em revolta: “E eu, de luneta de uma
lente só,/Eu acho sempre assunto a quadros revoltados;”.
AO GÁS: Na terceira parte, o poeta permanece
em seu périplo: “E saio. A noite pesa, esmaga.”. Mais uma vez a imagem da
noite, que aqui pesa sobre o poema, mas que lhe inspira, no entanto. E o poema
segue, agora descritivo, mais uma vez: “As burguesinhas do catolicismo/Resvalam
pelo chão minado pelos canos;/E lembram-me, ao chorar doente dos pianos,/As
freiras que os jejuns matavam de histerismo.”. Uma imagem nada amistosa da vida
monástica, a histeria como efeito do jejum, na visão do poeta, que segue: “E eu
que medito um livro que exacerbe,/Quisera que o real e a análise mo dessem;/
Casas de confecções e modas
resplandecem;/Pelas vitrines olha um ratoneiro imberbe./Longas descidas! Não
poder pintar/Com versos magistrais, salubres e sinceros,/A esguia difusão dos
vossos revérberos/E a vossa palidez romântica e lunar!”. O poeta bem queria
pintar todas as imagens, e o livro que exacerba, na sua biografia, que em vida
nunca veio a lume, mas o poeta insiste: “Mas tudo cansa! Apagam-se nas frentes/Os
candelabros, como estrelas, pouco a pouco;”. Mas a sua vontade férrea vai se
minando, a exaustão dá as caras, e o poeta entra em autocomiseração: ““Dó da
miséria! ... Compaixão de mim! ...”/E, nas esquinas, calvo, eterno, sem
repouso,/Pede-me sempre esmola um homenzinho idoso,/Meu velho professor nas
aulas de Latim!”.
HORAS MORTAS: O poema, nesta parte derradeira, tem
o poeta enlevado por uma quimera: “O teto fundo de oxigênio, de ar,/Estende-se
ao comprido, ao meio das trapeiras;/Vêm lágrimas de luz dos astros com
olheiras,/Enleva-me a quimera azul de transmigrar.”. O poeta prossegue com
visões de angústia: “Colocam-se taipais, rangem as fechaduras,/E os olhos dum
caleche espantam-me, sangrentos.”. E o poema segue com uma esperança vã, com a
luta poética entre a morte e a eternidade: “Se eu não morresse, nunca! E
eternamente/Buscasse e conseguisse a perfeição das cousas!”. A busca da
perfeição, típica de quem não entendeu o fato fissurado e estilhaçado da vida,
tem nesta rachadura o tormento que vem a seguir: “Mas se vivemos, os
emparedados,/Sem árvores, no vale escuro das muralhas! .../Julgo avistar, na
treva, as folhas das navalhas/E os gritos de socorro ouvir estrangulados.”. A
imagem do estrangulamento é a falta de ar, e o poema ainda se fia em uma triste
canção alcoólica, que segue: “Na volta, com saudade, e aos bordos sobre as
pernas,/Cantam, de braço dado, uns tristes bebedores.”. E o fel e a dor, o
imoral, a tosse e o fumo, em conjunto formando a massa irregular do poema, em
que a dor humana luta contra uma barreira sinistra nesta busca de libertação,
que é a imagem do horizonte que tenta o amplo a todo tempo: “Por cima, os
imorais, nos seus roupões ligeiros,/Tossem, fumando, sobre a pedra das sacadas./E,
enorme, nesta massa irregular/De prédios sepulcrais, com dimensões de montes,/A
Dor humana busca os amplos horizontes,/E tem marés de fel como um sinistro mar!”.
POEMAS:
O SENTIMENTO DUM
OCIDENTAL
A Guerra Junqueiro
I
AVE-MARIAS
Nas nossas ruas, ao anoitecer,
Há tal soturnidade, há tal melancolia,
Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia
Despertam-me um desejo absurdo de sofrer.
O céu parece baixo e de neblina,
O gás extravasado enjoa-me, perturba:
E os edifícios, com as chaminés e a turba,
Toldam-se duma cor monótona e londrina.
Batem os carros de aluguer, ao fundo,
Levando à via férrea os que se vão. Felizes!
Ocorrem-me em revista exposições, países:
Madrid, Paris, Berlim, Sampetersburgo, o mundo!
Semelham-se a gaiolas, com viveiros,
As edificações somente emadeiradas:
Como morcegos, ao cair das badaladas,
Saltam de viga em viga os mestres carpinteiros.
Voltam os calafates, aos magotes,
De jaquetão ao ombro, enfarruscados, secos;
Embrenho-me, a cismar, por boqueirões, por becos,
Ou erro pelos cais a que se atracam botes.
E evoco, então, as crônicas navais:
Mouros, baixéis, heróis, tudo ressuscitado!
Luta Camões no Sul, salvando um livro a nado!
Singram soberbas naus que eu não verei jamais!
E o fim da tarde inspira-me; e incomoda!
De um couraçado inglês vogam os escaleres;
E em terra num tinir de louças e talheres
Flamejam, ao jantar, alguns hotéis da moda.
Num trem de praça arengam dois dentistas;
Um trôpego arlequim braceja numas andas;
Os querubins do lar flutuam nas varandas;
Às portas, em cabelo, enfadam-se os lojistas!
Vazam-se os arsenais e as oficinas;
Reluz, viscoso, o rio; apressam-se as obreiras;
E num cardume negro, hercúleas, galhofeiras,
Correndo com firmeza, assomam as varinas.
Vêm sacudindo as ancas opulentas!
Seus troncos varonis recordam-me pilastras;
E algumas, à cabeça, embalam nas canastras
Os filhos que depois naufragam nas tormentas.
Descalças! Nas descargas de carvão,
Desde manhã à noite, a bordo das fragatas;
E apinham-se num bairro aonde miam gatas,
E o peixe podre gera os focos de infecção!
II
NOITE FECHADA
Toca-se as grades, nas cadeias. Som
Que mortifica e deixa umas loucuras mansas!
O aljube, em que hoje estão velhinhas e crianças,
Bem raramente encerra uma mulher de “dom”!
E eu desconfio, até, de um aneurisma
Tão mórbido me sinto, ao acender das luzes;
À vista das prisões, da velha Sé, das cruzes,
Chora-me o coração que se enche e que se abisma.
A espaços, iluminam-se os andares,
E as tascas, os cafés, as tendas, os estancos;
Alastram em lençol os seus reflexos brancos;
E a Lua lembra o circo e os jogos malabares.
Duas igrejas, num saudoso largo,
Lançam a nódoa negra e fúnebre do clero:
Nelas esfumo um ermo inquisidor severo,
Assim que pela História eu me aventuro e alargo.
Na parte que abateu no terremoto,
Muram-me as construções retas, iguais, crescidas;
Afrontam-me, no resto, as íngremes subidas,
E os sinos dum tanger monástico e devoto.
Mas, num recinto público e vulgar,
Com bancos de namoro e exíguas pimenteiras,
Brônzeo, monumental, de proporções guerreiras,
Um épico doutrora ascende, num pilar!
E eu sonho o Cólera, imagino a Febre,
Nesta acumulação de corpos enfezados;
Sombrios e espectrais recolhem os soldados;
Inflama-se um palácio em face de um casebre.
Partem patrulhas de cavalaria
Dos arcos dos quartéis que foram já conventos;
Idade Média! A pé, outras, a passos lentos,
Derramam-se por toda a capital, que esfria.
Triste cidade! Eu temo que me avives
Uma paixão defunta! Aos lampiões distantes,
Enlutam-me, alvejando, as tuas elegantes,
Curvadas a sorrir às montras dos ourives.
E mais: as costureiras, as floristas,
Descem dos magasins, causam-me sobressaltos;
Custa-lhes a elevar os seus pescoços altos
E muitas delas são comparsas ou coristas.
E eu, de luneta de uma lente só,
Eu acho sempre assunto a quadros revoltados;
Entro na brasserie; às mesas de emigrados,
Ao riso e à crua luz joga-se o dominó.
III
AO GÁS
E saio. A noite pesa, esmaga. Nos
Passeios de lajedo arrastam-se as impuras.
Ó moles hospitais! Sai das embocaduras
Um sopro que arrepia os ombros quase nus.
Cercam-me as lojas, tépidas. Eu penso
Ver círios laterais, ver filas de capelas,
Com santos e fiéis, andores, ramos, velas,
Em uma catedral de um comprimento imenso.
As burguesinhas do catolicismo
Resvalam pelo chão minado pelos canos;
E lembram-me, ao chorar doente dos pianos,
As freiras que os jejuns matavam de histerismo.
Num cuteleiro, de avental, ao torno,
Um forjador maneja um malho, rubramente;
E de uma padaria exala-se, inda quente,
Um cheiro salutar e honesto a pão no forno.
E eu que medito um livro que exacerbe,
Quisera que o real e a análise mo dessem;
Casas de confecções e modas resplandecem;
Pelas vitrines olha um ratoneiro imberbe.
Longas descidas! Não poder pintar
Com versos magistrais, salubres e sinceros,
A esguia difusão dos vossos revérberos
E a vossa palidez romântica e lunar!
Que grande cobra, a lúbrica pessoa
Que espartilhada escolhe uns xales com debuxo!
Sua excelência atrai, magnética, entre luxo
Que ao longo dos balcões de mogno se amontoa.
E aquela velha de bandós! Por vezes,
A sua traine imita um leque antigo, aberto,
Nas barras verticais, a duas tintas. Perto,
Escarvam, à vitória, os seus meclemburgueses.
Desdobram-se tecidos estrangeiros;
Plantas ornamentais secam nos mostradores;
Flocos de pós de arroz pairam sufocadores,
E em nuvens de cetins requebram-se os caixeiros.
Mas tudo cansa! Apagam-se nas frentes
Os candelabros, como estrelas, pouco a pouco;
Da solidão regouga um cauteleiro rouco;
Tornam-se mausoléus as armações fulgentes.
“Dó da miséria! ... Compaixão de mim! ...”
E, nas esquinas, calvo, eterno, sem repouso,
Pede-me sempre esmola um homenzinho idoso,
Meu velho professor nas aulas de Latim!
IV
HORAS MORTAS
O teto fundo de oxigênio, de ar,
Estende-se ao comprido, ao meio das trapeiras;
Vêm lágrimas de luz dos astros com olheiras,
Enleva-me a quimera azul de transmigrar.
Por baixo, que portões! Que arruamentos!
Um parafuso cai nas lajes, às escuras:
Colocam-se taipais, rangem as fechaduras,
E os olhos dum caleche espantam-me, sangrentos.
E eu sigo, como as linhas de uma pauta
A dupla correnteza augusta das fachadas;
Pois sobem, no silêncio, infaustas e trinadas,
As notas pastoris de uma longínqua flauta.
Se eu não morresse, nunca! E eternamente
Buscasse e conseguisse a perfeição das cousas!
Esqueço-me a prever castíssimas esposas,
Que aninhem em mansões de vidro transparente!
Ó nossos filhos! Que de sonhos ágeis,
Pousando, vos trarão a nitidez às vidas!
Eu quero as vossas mães e irmãs estremecidas,
Numas habitações translúcidas e frágeis.
Ah! Como a raça ruiva do porvir,
E as frotas dos avós, e os nómadas ardentes,
Nós vamos explorar todos os continentes
E pelas vastidões aquáticas seguir!
Mas se vivemos, os emparedados,
Sem árvores, no vale escuro das muralhas! ...
Julgo avistar, na treva, as folhas das navalhas
E os gritos de socorro ouvir estrangulados.
E nestes nebulosos corredores
Nauseiam-me, surgindo, os ventres das tabernas;
Na volta, com saudade, e aos bordos sobre as pernas,
Cantam, de braço dado, uns tristes bebedores.
Eu não receio, todavia, os roubos;
Afastam-se, a distância, os dúbios caminhantes;
E sujos, sem ladrar, ósseos, febris, errantes,
Amareladamente, os cães parecem lobos.
E os guardas, que revistam as escadas,
Caminham de lanterna e servem de chaveiros;
Por cima, os imorais, nos seus roupões ligeiros,
Tossem, fumando, sobre a pedra das sacadas.
E, enorme, nesta massa irregular
De prédios sepulcrais, com dimensões de montes,
A Dor humana busca os amplos horizontes,
E tem marés de fel como um sinistro mar!
Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
Link da Século Diário: http://seculodiario.com.br/33248/17/o-livro-de-cesario-verde-parte-3