“A convergência buscada pela Cúpula da Amazônia é a da construção de posições coordenadas"
O Dia do Meio Ambiente, em 5 de junho último, serviu para que Lula e a ministra Marina Silva se juntassem para anunciar medidas que visam reverter o processo de desmonte do setor feito pelo governo de Jair Bolsonaro. Lula assinou uma série de decretos para a proteção ambiental, no esforço pelo desenvolvimento sustentável. Um dos destaques entre os decretos foi a suspensão da medida provisória (MP) que deixava vulnerável a proteção da Mata Atlântica, o restabelecimento do Comitê Interministerial sobre Mudanças do Clima, a criação do Conselho Nacional para a COP 30 das Nações Unidas, dentre outras medidas importantes.
Um anúncio mais importante ainda, contudo, foi o do lançamento do Plano Amazônia : Segurança e Soberania, com Lula destacando que governadores, prefeitos e a sociedade civil serão ouvidos durante o processo. Este plano visa a proteção aos povos indígenas, demarcação do maior número de territórios possível, incentivo às atividades econômicas sustentáveis, para que se estabeleça um novo ciclo de desenvolvimento e combate à desigualdade.
O Brasil tem destaque na luta pela defesa do meio ambiente e contra as mudanças climáticas, e isto apesar do hiato que foi o período bolsonarista no Executivo. Nosso país tem papel preponderante no cuidado dos biomas, pois temos a maior floresta do mundo, a biodiversidade mais rica, uma matriz elétrica predominantemente limpa e renovável, com a ampliação de investimentos em energia solar e eólica.
O Brasil retoma este protagonismo mundial no meio ambiente já com uma agenda pronta que envolve a COP 30, cuja sede será em Belém do Pará, que foi precedida pela Cúpula da Amazônia, realizada em agosto deste ano, também em Belém, no Pará.
A Cúpula da Amazônia, por sua vez, teve a participação de oito países signatários do instrumento, que são, além do Brasil, os países da Bolívia, Colômbia, Guiana, Equador, Peru, Venezuela e Suriname, além de representantes de países convidados e de organismos internacionais, incluindo a OTCA (Organização do Tratado de Cooperação Amazônica). A Cúpula foi precedida pelos Diálogos Amazônicos, que incluiu mais de 300 eventos da sociedade civil.
O objetivo da Cúpula da Amazônia foi a adoção da Declaração de Belém, que visa estabelecer uma nova agenda comum de cooperação regional para o desenvolvimento sustentável da Amazônia, conciliando a proteção do bioma e de sua bacia hidrográfica, inclusão social, estímulos à economia local, valorização dos povos indígenas e das comunidades locais.
Além disso, ainda se faz necessário o fomento de ciência, tecnologia e inovação, e também o fortalecimento da OTCA (Organização do Tratado de Cooperação Amazônica), organização internacional com sede em Brasília. A convergência buscada pela Cúpula da Amazônia é a da construção de posições coordenadas nas negociações multilaterais em temas ambientais, começando pela COP-28 do Clima e pela COP-16 de Biodiversidade.
O texto final da Cúpula, contudo, ficou devendo em pontos fundamentais do tema ambiental, uma vez que não se alcançou nada em termos de metas claras, ou seja, que tenham prazos estipulados para a sua efetivação, o que foi coberto por algo vago e evasivo como “consensos progressivos”, confiando muito na sensação geral de ameaça ambiental, como se esta fosse o suficiente para apostar em compromissos firmados para consensos futuros para “não impor a vontade de ninguém”, o que é uma visão um tanto frouxa sobre metas e clareza quanto aos objetivos reais de uma conferência como esta.
Por exemplo, não existem metas comuns de desmatamento, medidas concretas para evitar o ponto de não retorno da Amazônia, e não teve veto da exploração de petróleo na região. Um dos pontos em que se pode ter um norte mínimo é no compromisso de criação de diversas instâncias de fiscalização comum para fortalecer a OTCA (Organização do Tratado de Cooperação Amazônica).
Em relação a falta de metas comuns de desmatamento, a Declaração de Belém deixou como perspectiva factível, no entanto, uma iniciativa inédita de compromissos de linhas de financiamento para substituição de atividades nocivas pelas sustentáveis na região. Tal medida seria efetivada, por exemplo, em fomentos como o estipulado em US$ 25 bilhões pela articulação de 19 bancos, com a liderança do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), com a ideia não somente de disponibilizar crédito como de estimular o crescimento do setor privado.
A importância da união dos países amazônicos, entretanto, é o que move a Cúpula da Amazônia, pois se estes países entrarem em consenso antes da COP-30, em 2025, zerando emissões de gases, desmatamento e degradação florestal, serão os primeiros países do mundo a atingirem as metas estimadas no acordo de Paris.
Por sua vez, para se ter uma ideia do problema, da solução e de seus impactos, devemos saber que a Amazônia não somente é responsável pela regulação e estabilização climática da região, como do mundo, e a conservação de seu bioma e de sua bacia é vital para a sobrevivência de 10% das espécies conhecidas na superfície terrestre.
Contudo, o chamado ponto de não retorno tem que ser cada vez mais combatido, uma vez que as taxas de desmatamento alarmantes, a degradação do solo e as mudanças climáticas dificultam cada vez mais a capacidade de recuperação deste bioma, o que pode levar ao estágio de não retorno ecológico, que seria a desertificação da Amazônia.
Medidas possíveis para combater os problemas ambientais da região, por fim, passam pela cooperação regional em matéria de dados, e a efetivação do desenvolvimento sustentável em toda a região. Outras medidas importantes são o desenvolvimento da bioeconomia, o combate de ilegalidades e de crimes ambientais, além de acordos entre o poder público, o setor privado e as comunidades locais, que devem cooperar e convergir para o bem comum da Amazônia.
Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
Link da Século Diário : https://www.seculodiario.com.br/colunas/meio-ambiente-parte-iii