PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

sexta-feira, 6 de agosto de 2021

LORDS OF CHAOS – A SANGRENTA HISTÓRIA DO METAL SATÂNICO UNDERGROUND – PARTE XI

“o equívoco fundamental de uma ideologia nacionalista que tenta salvar a própria cultura através da aniquilação”

Na visão de Varg Vikernes, o músico atribui os incêndios de igrejas na Noruega devido ao Cristianismo ter destruído tradições originais do folclore norueguês e mitologia nórdica, que vinha do paganismo. Os incêndios seriam uma espécie de levante contra esta invasão da igreja cristã no território norueguês. O Burzum, one man band de Varg, por sua vez, seria uma arma de encorajamento para estes eventos, segundo o músico : “sonho sem base na realidade. É feito para estimular as fantasias de mortais – para fazê-los sonhar”.

Em Lords of Chaos, podemos ler : “Ainda que Vikernes e os outros detidos por queimar igrejas tenham dado motivações para seus atos que vão além da crueldade, nenhum deles expressou nenhum grau de remorso pelo sofrimento que causaram nas vidas de sacerdotes e fiéis, ou pelo doloroso impacto nas comunidades vizinhas. Na época de sua primeira prisão relacionada aos incêndios, Vikernes fez uma série de comentários extremamente sádicos aos jornais e revistas, que refletiam as preocupações iniciais do black metal norueguês com espalhar o “mal” e a dor.”

Contudo, a carga simbólica dos incêndios de igrejas cristãs vai para além da mera crueldade, há um fator ideológico relacionado a uma preservação cultural, um tipo de vingança. Por sua vez, os dois casos que ganharam mais repercussão foram os incêndios das igrejas de Fantoft e Holmenkollen, que eram mais peças de museus do que verdadeiras congregações, e segue Lords of Chaos : “Por outro lado, a igreja Hauketo, nos arredores de Oslo, tinha uma congregação ativa. Na madrugada do dia 3 de outubro de 1992, a igreja da paróquia queimou até não restar nada.”

Vikernes foi condenado pelo tribunal de Oslo a indenizar os prejuízos causados pelos incêndios, contudo, seu advogado alegou inocência de todas  as acusações, e Varg ostentava uma expressão de desdém durante o julgamento, uma vez que já se negara a pagar as indenizações, ficando ao fim com uma dívida de juros que somavam quase um milhão de coroas. A igreja de Fantoft, por sua vez, se tornou o maior símbolo deste período conturbado que envolveu a cena black metal norueguesa.

Varg Vikernes, numa entrevista, diz o seguinte : “Eu não fui julgado culpado pela queima da igreja de Fantoft em Bergen, mas, de qualquer forma, foi isso que engatilhou a coisa toda. Foi no dia 6 de junho, e aí todo mundo ligou com o satanismo, por causa do 06/06, e foi no 6º dia da semana.

O que todo mundo ignorou foi que no dia 6 de junho de 793, em Lindisfarne na Grã-Bretanha, o primeiro saqueio viking conhecido na história aconteceu, com vikings de Hordaland, que era o meu condado. Ninguém fez essa ligação – ninguém. Aquela igreja é construída em solo sagrado, um círculo natural e um horg de pedra (um altar pagão). Eles enfiaram uma grande cruz no topo do horg e construíram a igreja no meio do lugar sagrado.”

O ingresso da cena black metal norueguesa se deu, por sua vez, na conhecida e polêmica entrevista de Varg ao Bergens Tidende, em 20 de janeiro de 1993. E Lords of Chaos segue : “No bojo do interrogatório de Varg pela polícia de Bergen, uma série de outros membros da cena black metal também foram detidos por diferentes departamentos policiais, e interrogados a respeito de incêndios em igrejas e do assassinato do homossexual em Lillehammer, incluindo Samoth e Bard Eithun, do Emperor – o último, inclusive, que seria considerado culpado pelo homicídio. Ainda assim, não havia evidências o bastante e todos foram soltos após serem interrogados.”

Em Lords of Chaos, a expansão da repercussão da cena black metal fica estampada no seguinte fato : “Quando a onda de crimes anticristãos passou a ser vista como algo que emanava, de alguma forma, do movimento black metal, a atenção da mídia começou a crescer em escala exponencial, para a alegria dos principais mobilizadores da cena, Vikernes e Aarseth. O artigo mais infame da época foi uma matéria de capa na edição 436 da importante revista britânica de metal Kerrang!, que chegou às bancas em 27 de março de 1993.

Quanto à estética da publicação, se dava da seguinte forma : “Dominada por uma foto marcante de Vikernes olhando por sob longas mechas do seu cabelo tingido de preto, com duas gigantescas facas cruzadas nas mãos, a capa também apresentava uma igreja em chamas e uma inserção menor de uma foto da banda Emperor, trajando corpse paint, mantos com capuz e armas medievais. A manchete estilo tabloide promete : “INCÊNDIO ... MORTE ... RITUAL SATÂNICO ... A Verdade Feia do Black Metal”. Do lado de dentro, a matéria de cinco páginas apresenta ao resto do mundo, com muito sensacionalismo, a versão norueguesa do black metal.”

Numa entrevista dada por Bard Eithun, segue o relato sobre o assassinato cometido por ele : “Eu estava na rua, eu tinha saído pra beber mas eu não quis porque tinha muita gente, então eu estava voltando para casa. Esse homem se aproximou de mim – ele estava obviamente bêbado e era obviamente um veado. Ele queria falar comigo. (...) Aí ele me perguntou se a gente podia sair dali e ir até o bosque. Aí eu aceitei, porque ali eu já tinha decidido que eu queria matar ele. (...) Então a gente foi pra dentro do bosque, em um parque grande onde aconteceu a abertura das Olímpiadas de Inverno. Eu costumava sempre ter uma faca no meu bolso de trás. Era uma faca preta com uma empunhadura, do tipo dobrável que trava.

Aí eu não lembro bem o que eu estava pensando, mas eu ao menos sabia que se eu não fizesse agora, eu não teria outra oportunidade. Aí eu saquei a faca, virei e esfaqueei ele. Ele estava andando atrás de mim, eu me virei e enfiei a faca na barriga dele. Depois disso eu não lembro de muita coisa, só que era como se eu estivesse olhando para todo o incidente por olhos que estavam fora do meu corpo. Era como se eu estivesse olhando duas pessoas brigando – e uma delas tinha uma faca, então era fácil matar a outra.

Eu estava furando a barriga dele e ele caiu de joelhos. Eu comecei a enfiar a faca no pescoço e no rosto. Aí ele deitou e eu estava em cima dele, dando facadas. Minha intenção era tirar toda a vida dele. Eu não queria que ele conseguisse sobreviver e ir pro hospital e me denunciar. Era mais fácil matar ele e ir embora e esperar que tudo desse certo.

Ele tentou me derrubar, mas não é fácil quando a outra pessoa tem uma faca. Ele estava deitado e eu queria matar ele. Eu dei uma facada com muita força nas costas, e atravessou a escápula. Eu tive que pisar nele pra conseguir tirar, porque a faca estava presa entre os ossos. Foi provavelmente aí que ele morreu. Depois disso eu quis caminhar, e eu caminhei um pouco, mas aí ele fez uns barulhos. Eu pensei, “ele não está morto”, e voltei pra lá e chutei a cabeça dele com meu coturno, várias vezes. Eu queria ter certeza que ele estava morto. Depois disso eu fui embora.”

Aqui temos descritas mais algumas polêmicas sobre a cena black metal norueguês, seu ingresso no mainstream devido sobretudo à entrevista na Kerrang, e todo o contexto de demência ideológica que tentava justificar ideias de vingança cultural, com o enfrentamento pseudo-político de ações terroristas perpetradas por jovens que cultuavam um tipo de crueldade e ostentavam o mal com uma mistura anódina de culto pagão para negar que estavam cometendo crimes.

A cena teve muita repercussão pelo sensacionalismo da imprensa, que logo colocou manchetes chamativas e fotos impactantes para produzir o efeito desejado de polêmica e choque, o terror como um dos motores mórbidos de parte de uma mídia que precisa estar fazendo o seu barulho usual para poder ter sucesso, o que coloca a cena black metal norueguesa, tanto no contexto da Bergens Tidende como da Kerrang, como um prato cheio para uma boa vendagem e garantias de ibope. As revistas de rock, nestes casos, pareciam mais ou tabloides ou páginas criminais compradas em bancas de quinta.

Toda a ostentação de Varg, que beirava a demência, tinha toda uma vestimenta intelectualizada, com conhecimento histórico e mitológico, um tipo de vestimenta que nunca oculta todo o equívoco fundamental de uma ideologia nacionalista que tenta salvar a própria cultura através da aniquilação, da vingança e do crime, o terrorismo como luta cultural semelhante ao extremismo hediondo de jihads deformadas e anódinas, feitas para produzir somente o caos e a morte.

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.

Link da Século Diário :  https://www.seculodiario.com.br/cultura/a-sangrenta-historia-do-metal-satanico-underground-parte-xi 

 

 

 

quarta-feira, 4 de agosto de 2021

METAVERSO

“o fim da fronteira entre virtual e real”

Mesmo com uma expansão ainda incipiente da nova tecnologia 5G, que vem para instalar a internet das coisas em muitos lugares do mundo, já existe uma pesquisa que avança na direção do 6G, que deve ser ativada em torno de 2030.

Temos iniciativas como a da Apple, que já faz estudos com engenheiros contratados, nas áreas de sistemas sem fio, rumo a uma independência tecnológica da empresa, que hoje possui modens 5G projetados pela Qualcomm.

A Samsung, uma das concorrentes da Apple, divulgou em julho de 2020 um documento detalhando estratégias para o 6G, uma rede que poderia atingir velocidades bem maiores que a do 5G, pois a empresa sul-coreana espera ter uma rede cuja latência seja de 100 microssegundos.

Tal velocidade de conexão causará uma transformação completa em tecnologias de realidade estendida, como as de realidade virtual, aumentada ou mista, inteligência artificial, hologramas, também com avanços na medicina, na educação, na indústria cultural e na indústria produtiva. A Samsung espera concluir este projeto até 2028, quando se tornará comercial.

Pesquisas também são feitas pela Huawei e Xiaomi, e na China os resultados dos estudos apontam para uma rede 6G que poderá atingir uma velocidade 8 mil vezes mais rápida que a do 5G. O Japão também entrou nesta corrida, anunciando um investimento de U$2 bilhões, numa parceria com a Toshiba e a operadora NTT Docomo.

Um dos objetivos dos japoneses é o registro de patentes quando as empresas começarem a desenvolver softwares e hardwares conectadas ao 6G. A LG também já iniciou as pesquisas em 6G, enquanto a FCC, equivalente norte-americana da Anatel, abriu as frequências entre 95 GHz e 3 THz para fins experimentais.

Na Europa, por sua vez, temos um projeto comandado pela finlandesa Nokia, o programa Hexa-X, iniciado em janeiro deste ano, com o objetivo de realizar pesquisas para viabilizar as bases de criação desta tecnologia e os fundamentos para a implementação do 6G. O plano de velocidade da Nokia, contudo, é menos ambicioso, em comparação à meta chinesa de atingir uma tecnologia 6G de 1TB (terabyte) por segundo.

Em virtude desta previsão de uma velocidade de conexão sem precedentes, tal instalação do 6G terá um desafio de lidar com uma estrutura física com a expansão de uma rede com frequência altíssima na faixa dos terahertz (THz), um grande desafio para os engenheiros, pois implicaria em instalações mais numerosas de antenas com alta frequência e menor capacidade de cobertura, pois um sinal na casa dos terahertz cobrirá apenas um raio de 10 metros.

Será necessária a criação de uma nova tecnologia de amplificação de sinal, então, para evitar esta grande concentração de antenas. O consumo de energia também terá que ser solucionado, relacionado a novas tecnologias de materiais e de chips para viabilizar comercialmente e ambientalmente o 6G, pois as empresas terão que pesquisar muito para poder produzir novas tecnologias de processadores, componentes, fornecedores de energia, antenas e retransmissores, criando esta infraestrutura para o 6G.

Ainda não há uma previsibilidade exata das aplicações e consequências do 6G, dando azo à imaginação digna de ficções científicas, as comparações possíveis no momento são com as perspectivas já apresentadas e palpáveis do que se espera da internet das coisas com o 5G.

No caso do 5G sua instalação generalizada irá produzir dispositivos instalados em carros, drones, eletrodomésticos, equipamentos urbanos, projetando cidades inteligentes, com auxílio da inteligência artificial em sua aliança à rede sem fio, servidores remotos, edifícios, relógios, sensores nas roupas, casas inteligentes, trânsito e segurança. Toda uma gama de aplicações que já são visualizadas pela internet das coisas do 5G.

O 6G, se é possível fazer uma boa previsão, seria a radicalização do que seria uma cidade inteligente, ficando ainda no campo da fabulação as implicações que virão sobre a realidade estendida. Tudo o que ainda podemos tentar imaginar sobre um 6G em ação, vem das perspectivas que começarão a acontecer com a instalação generalizada do 5G.

Uma das implicações possíveis do 6G, ainda sem uma previsão factível, seria a da produção do que chamam de metaverso, que é um universo digital imersivo, interativo, com alto grau de realidade, com aplicações de realidade aumentada, virtual e da inteligência artificial.

O metaverso, então, seria a produção de um universo digital imersivo que implicaria em um espaço compartilhado coletivamente na web, com experiências físicas recriadas no ambiente digital, com relações offline e online ao mesmo tempo, provocando, enfim, o fim da fronteira entre virtual e real, eis o metaverso.

Portanto, podemos imaginar, guardadas as proporções, o metaverso como um tipo de “matrix”, um ambiente em que distâncias geográficas desapareceriam, criando novas relações de trabalho e de vida social, rompendo com a lógica binária das atuais videoconferências, que se intensificaram com a pandemia, pois nestas há dois momentos, primeiro, a duração da transmissão, segundo, a vida fora dela, offline.

No caso do metaverso esta interação entre virtual e real seria permanente, um mundo em que tudo estaria tomado por realidade aumentada, virtual e inteligência artificial, em meio ao mundo físico e natural. As interações romperiam com a lógica binária ainda vigente entre online e offline.

O metaverso é uma manifestação em crescimento da internet 3.0, esta que sucederá a atual internet, e a definição deste metaverso dependerá desta nova tecnologia web e seu desenvolvimento concomitante com a expansão e aplicações do 5G e da nova tecnologia do blockchain.

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.

Link da Século Diário : https://www.seculodiario.com.br/colunas/metaverso