Passo os olhos sobre a mesa,
documentos de uma vida perdida
passam pelos meus olhos
sobre a mesa,
vi o indecente sinal
das torturas
na minha xícara de café,
sentei e pensei em como julgar
as tarefas ínfimas
a um compasso universal,
dormitando as minhas feras
no azul de minha camisa,
olhos fixos na caneta preta
da qual saem poemas pretensiosos,
e uma voz oca em meu coração
com sede de sal,
ouvindo o livro cair em meu peito
como o drama longo da estante,
como o lamento dolorido
de uma biblioteca.
Me vingo com a substância escarlate
de minha túnica de sensaboria.
Com o gládio talvez eu possa
me defender da máquina
de fazer monstros,
o hospício e seus algozes
com réus de cérebros devorados,
o céu habita a loucura,
mas a regra da loucura
é um grito no inferno.
Passo os olhos sobre a mesa.
Papéis há muito esquecidos
saem de suas profundezas abissais
e eclodem na superfície,
palavras infindáveis
saem como de um poço
sem fundo,
o mundo inteiro contido
em versos excluídos,
o cadáver e o imortal
numa flecha envenenada,
como as rimas que se perderam
no fundo do oceano,
e as várias canções derramadas
nas ilusões da noite.
Eis o notívago, boêmio cancioneiro.
Manda em teu trôpego soluço
os gritos de liberdade,
faz o eterno em microcosmo
num átimo do átomo fundamental.
27/04/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)
Adélia Prado Lá em Casa: Gísila Couto
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