PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

quinta-feira, 20 de agosto de 2020

TEATRO DOS VAMPIROS

Fantoff era um pesquisador de Paris, ele estudava lendas antigas, suas origens, e passou a atuar, posteriormente, como uma espécie de curador de artes, estamos em 1870, e Fantoff se dedica agora ao teatro, escreve umas peças de comédia, dentre elas, uma se destacara em 1869, a “A Dama Louca”, que ganhou um prêmio de melhor texto na última temporada parisiense de inverno, concorrendo com um grande amigo seu, este que também era diretor, Lancaster, que havia ganho em 1887 e 1888 dois prêmios, o primeiro de direção e o segundo por melhor texto.

Fantoff se dirigia para a encenação de Fedra de Racine no Teatro Paris, em Montmartre, e se dizia um admirador das remontagens da tragédia neoclássica, que era um desafio que ele não enfrentaria escrever naquela métrica raciniana em que a história se decorre num único dia, e que pensava mesmo era em fazer uma montagem adaptada de O Doente Imaginário de Moliére, com a direção deste seu amigo Lancaster, que era um pesquisador do comediógrafo, este já tendo dirigido O Avarento e As Preciosas Ridículas, e que já planejava a montagem de Tartufo, numa versão que ele queria que fosse a sua melhor versão de Moliére, e já adaptava um texto para isto.

Fantoff havia se destacado num trabalho de produção e figurino, além de ter trabalhado com cenografia por cinco anos, junto com um outro amigo seu, Joseph, no Teatro Pascal, também em Montmartre, e que resultou na cenografia de As Nuvens de Aristófanes, com um Sócrates fazendo um Deus Ex Machina que era pura fanfarronice, e também fez a cenografia da tragédia Electra de Eurípides, e uma versão simpática de Thomas Kid, que era uma miscelânea de sua obra teatral em forma de pequenos fragmentos, tentando imitar algo do período elisabetano, só que lhe dando um ar parisiense meio forçado adrede, e com um cenário acidentado e pobre, meio que subvertendo a enormidade do teatro elisabetano.

Havia ainda, mas no Quartier Latin, um teatro meio sinistro, de verve gótica, aonde estavam sendo montados pequenos textos de terror e horror gótico, que Fantoff foi visitar, e era o chamado Teatro dos Vampiros, ele acabou vendo uma montagem lá de uma peça escrita por um novo autor, Creonte, que escrevera sob efeito de ópio um texto em três atos de nome “O Enigma”, que era uma história gótica com surtos de consumo de sangue, voos e levitações inexplicáveis.

Fantoff fez contato com um dos contrarregras deste Teatro dos Vampiros, que tinha sido fundado há cinco anos, em 1865, por um empresário obscuro que agora investia em teatro e histórias de terror, de nome Leon Blanc, e que era um velho estrambótico de uns setenta anos, que vivia com uma moça de vinte anos que era intitulada “Mademoiselle Nuit”, uma moça bonita, mas sinistra em suas vestes geralmente pretas. Este contrarregra tinha o nome de Lemort, e se dizia sobrinho de criação deste empresário de origem desconhecida de nome Leon Blanc.

Creonte ainda não havia cruzado com Fantoff, quem o conhecia de dois encontros ao acaso era Lancaster, e relatou para Fantoff que foram impressões bem estranhas, ele disse que Creonte parecia uma espécie de alienígena de aparência cadavérica e bem magro, parecia estar sempre sob o domínio do ópio ou de outra substância qualquer de dons oníricos. Creonte, que montaria sua mais nova peça ainda nesta semana da visita de Fantoff, teria como seu astro principal em “O Enigma”, uma espécie de líder e guru do grupo de atores do chamado Teatro dos Vampiros, que era um inglês naturalizado francês e radicado em Paris, que tinha o nome artístico de “Blackstar”.

Esta figura era sinistra e bem alta e forte, pois tinha cerca de dois metros e dez centímetros, e tinha a força de um touro e era um dos melhores amigos deste empresário Leon Blanc, Blackstar era o melhor ator da companhia que se chamava “Seita Gótica”, e que reunia numa espécie de sindicato e companhia de atores, gerida também por Leon Blanc, todos os atores que eram contratados e que trabalhavam desde 1864 no Teatro dos Vampiros.

Depois do ator Blackstar, das mulheres, a atriz que mais se destacava, por sua vez, era uma moça de trinta anos de nome Heloísa, e que fazia papel de louca, de vampira, de freira e tudo o que se exigisse, com uma veia trágica, mas que tirava de letra um papel cômico se calhasse. Creonte até tinha feito uma peça em sua homenagem em 1869, de título “Heloísa no Inferno”, que foi uma peça gótica em quatro atos de enorme impacto e que rendera a Creonte o apelido de “o mestre do horror em Paris”.

O chamado Teatro dos Vampiros não concorria diretamente com o Teatro Pascal e nem com o Teatro de Paris, as peças montadas no Teatro dos Vampiros eram de autores novos e todas inéditas, e só eram montadas lá, isto é, a Seita Gótica se juntava a uma equipe de autores independentes, que eram seis autores, cinco homens e uma mulher, sendo o mais talentoso Creonte, seguido da Senhora das Trevas, que tinha o título também de Marianne Storm, e assinava suas peças alternando os dois pseudônimos.

Também tinha o jovem autor Pierre Jolie, que era casado com a jovem atriz, também da Seita Gótica, Juliette Blanchet, e que fazia papéis de coadjuvante, tendo já trabalhado bastante sob a tutela de Heloísa, que tinha uma expertise adquirida de um estudo independente de teatro elisabetano e técnicas de farsa e clown que utilizou maniacamente em seu sucesso “Heloísa no Inferno”.

Fantoff, em sua primeira visita ao Teatro dos Vampiros, conversou muito com Lemort, e ficou sabendo um pouco mais do funcionamento deste teatro na prática e um pouco da dinâmica dos atores, e viu que era tudo completamente diferente de seus trabalhos realizados no Teatro Paris e no Teatro Pascal, ele pensava em ter contato com Creonte depois de assistir a peça “O Enigma”, e conhecer alguns atores desta chamada “Seita Gótica”.

Fantoff já concebia uma peça inspirada em Thomas de Quincey, O Comedor de Ópio, pois queria um destes atores da Seita Gótica para fazer o papel do dependente de ópio da história contada por Thomas de Quincey, e queria montar a peça no Teatro dos Vampiros, mas para isto teria que convencer a companhia de atores da Seita Gótica, a equipe de autores e também Leon Blanc, pois o Teatro dos Vampiros, até então, tinha sido um grupo fechado e de versões inéditas, sem nada que se relacionasse a adaptações, releituras e remontagens.

E depois de sua noite vendo Fedra de Racine, Fantoff decidiu que sua visita ao Teatro dos Vampiros também serviria para ele buscar algo novo, nada de neoclássico, embora seu plano para O Doente Imaginário de Moliére fosse, para ele, na área da comédia, a sua última adaptação antes de ele fazer mais comédias próprias, que se juntaria ao que ele pensava de Thomas de Quincey como peça, e dali em diante priorizaria versões de textos seus inéditos, como fora a sua peça “A Dama Louca”, e que lhe rendera prêmio.

Fantoff, depois de uma longa conversa com Lemort e de ter visto um dos ensaios fragmentários de dois atores da companhia Seita Gótica, numa espécie de exercício muito estranho com barulhos, grunhidos e gestos estilizados que Fantoff desconhecia em teatro, ele se deu por satisfeito e iria retornar ao Teatro dos Vampiros na noite de sexta-feira para ver a montagem de Creonte da tal peça “O Enigma” e que seria a estreia da mesma.

Fantoff decidiu que falaria novamente com o contrarregra Lemort para ser apresentado ao autor Creonte. A peça “O Enigma”, por sua vez, teria como atores os grandes da companhia, Blackstar e Heloísa, e uma espécie de menino prodígio de nome artístico Flamboyant, que havia feito três peças no Teatro dos Vampiros, virou um tipo de coringa na companhia, pois se encaixava em qualquer buraco em que lhe metessem.

Fantoff entra em contato com Lancaster e o cenógrafo Joseph, os três combinam de ir juntos ver a tal peça gótica de Creonte e talvez buscarem novas ideias para as peças que aconteciam no Teatro Paris e no Teatro Pascal, longe da reverência a Racine e as maníacas remontagens das peças de Moliére, que dominavam, por sinal, os planos de Lancaster, um fanático pelo comediógrafo, e a ideia teatral de Fantoff para O Doente Imaginário, a última peça de Moliére.

O Teatro dos Vampiros tinha um desenho oval da plateia, com poltronas espaçosas, laterais para a área de luxo, na cena havia um estrado bem grande e retangular, e os chamados efeitos especiais eram um mistério, pois o público nunca descobriu por qual mecânica eram feitas as levitações e os brilhos sobrenaturais de algumas das montagens da companhia Seita Gótica.

Muitas vezes, a atriz Heloísa, por exemplo, parecia que entrava numa espécie de êxtase, levitava e ficava com a face iluminada num azul sobrenatural, o que testemunharam algumas pessoas que puderam assistir à montagem de “Heloísa no Inferno”, e ninguém nunca soube qual era o segredo que havia lá no Teatro dos Vampiros para aqueles efeitos especiais avançados.

Chega a noite de sexta, a estreia de “O Enigma”. Fantoff, Joseph e Lancaster chegam, e Fantoff conversa com Lemort, este diz que apresentaria Creonte ao término da estreia, pois Creonte estava confinado em seu camarim (na verdade, Lemort omitiu o fato de que Creonte estava fumando ópio e queria ver a estreia de sua peça sob o efeito da substância onírica, pois fazia tudo inspirado pelo ópio, além de outros fatos que serão em breve elencados aqui sobre a natureza particular desta companhia gótica).

Fantoff consegue os três lugares para a primeira fileira, é de lá que ele e seus dois amigos veriam a atuação de Blackstar e Heloísa, os dois principais atores da Seita Gótica, e o tão falado Flamboyant, que tinha uns treze anos e parecia que seria o novo astro da companhia. Logo Creonte sai de seu camarim num transe onírico que o fazia se sentir levitando, ele se dirige ao setor de luxo, nas laterais, e de lá veria a sua obra em ação, com a direção de Heloísa, que agora faria a estreia como diretora de teatro, ao mesmo tempo em que atuaria.

No Quartier Latin o chamado Teatro dos Vampiros estava ganhando uma aura mística em que se discutia sobre os tais efeitos especiais das peças, muitos que frequentavam o público do teatro tentavam depreender a mecânica de tais efeitos destas peças feitas pela Seita Gótica, mas ninguém havia chegado a uma conclusão. O trabalho dos contrarregras também não era decifrável, neste ponto, pois eles guardavam segredo com os atores do que era preparado na véspera destas sessões, que sempre eram um tipo de catarse trágica semelhante às descrições do fenômeno feita por Aristóteles em sua Arte Poética.

A impressão que a peça “Heloísa no Inferno” havia causado, por exemplo, talvez tenha sido maior do que as últimas montagens shakespearianas tanto no Teatro Paris como no Teatro Pascal. A concorrência entre estes dois teatros de Montmartre agora convivia com um universo paralelo e misterioso povoado pelas peças autorais do Teatro dos Vampiros.

A diferença de orientação artística entre os teatros Paris e Pascal e o que era feito no Teatro dos Vampiros, por sua vez, era um abismo, pois o que se fazia no teatro sinistro do Quartier Latin era sem precedentes na História do teatro francês e talvez na História mundial do teatro como um todo.

Não havia nada parecido a peças como “Heloísa no Inferno”, ou ainda as peças “Aranhas” e “Dante Vampiro”, estas duas da Senhora das Trevas, por exemplo, ou ainda, uma outra montagem de Creonte, umas das primeiras montadas no Teatro dos Vampiros, que foi a sua peça “Quartier Latin do Ópio”. Até então, contudo, o maior vulto tinha sido com “Heloísa no Inferno”, e que provavelmente seria superada agora pela montagem de “O Enigma”, que já era o resultado do auge criativo do tétrico autor Creonte.

Blackstar havia sido o personagem principal do primeiro sucesso verdadeiro do Teatro dos Vampiros, que foi a peça de Creonte, “Quartier Latin do Ópio”, e que rendeu um prêmio de melhor ator do Júri Parisiense para Blackstar, o mesmo que premiou Creonte um ano depois pela direção de “Sarça Bíblica”, e que premiou a atuação lendária, anos depois, de Heloísa em sua peça mor “Heloísa no Inferno”.

“Quartier Latin do Ópio” foi uma peça escrita e dirigida por Creonte em três atos que se encerrava com Blackstar, encarnado no personagem usuário de ópio e poeta, Jean-Pierre Perrault, que bebe uma taça de sangue de uma jovem loira sacrificada e fuma um narguilé de ópio como ato final, no que o público nunca soube se o sangue e o ópio eram verdadeiros, mais um mistério de Creonte que ficara no ar para o público pensar depois da catarse.

Começa a peça “O Enigma”, primeiro ato, entra Blackstar, que fazia o personagem Claude Gerome, entra Heloísa, que fazia Abigail, Jean Torreau, que fazia Menard, entraria no terceiro ato. Neste primeiro ato, entra Flamboyant, que fazia o menino Clemente, começa a fala de Claude Gerome, ele faz uma declamação poética inspirada nos poemas de William Blake.

Blackstar declama então estes versos com visões escatológicas e cosmogônicas alternando com versos feitos sobre sangue e morte, todos os versos de inspiração em William Blake, e muitas vezes fazendo recapitulações livres de Dante Alighieri e de O Paraíso Perdido de Milton, tudo escrito pelo texto febril sob efeito de ópio de Creonte, que na ala lateral de luxo do teatro, estava num transe onírico contemplando a sua própria criação.

Abigail era uma espécie de bruxa, de mística, e fazia feitiços contra inimigos de Claude Gerome, e era uma das amantes de Claude Gerome, que era casado com Claire, personagem feito pela atriz Susanne Flammarion, que entraria somente no segundo ato, num tipo de conflito kármico com a personagem Abigail, e a transformação em vampiro do menino Clemente, também no segundo ato.

A transformação em vampiro de Clemente no segundo ato vem de uma mordida do personagem Claude Gerome, que tinha sido o vampiro antigo das torres de William Blake, e que usava os poderes mediúnicos de Abigail para fazer novas vítimas, estas que eram hipnotizadas e mordidas por Claude Gerome, sendo que no primeiro ato de “O Enigma”, ele morde cinco mulheres jovens, e se junta a um grupo de vampiros decadentes da Champs-Élysées, que ajudavam Claude Gerome a tomar estas jovens para si, um grupo de dez vampiros que eram atores coadjuvantes da peça e atuavam também como coro nas declamações de Claude Gerome.

Claude Gerome encerra o primeiro ato, depois de morder a quinta jovem (ninguém sabia de onde eram pinçadas estas figuras, pois não pertenciam à Seita Gótica), começa a entrar em transe mediúnico e levita cinco metros acima do estrado em que era apresentada a peça, sua face ganha uma iluminação roxa, meio sinistra, seus olhos brilham, ele entoa um canto gregoriano que tinha uma amplitude desconhecida.

Não havia acústica natural para aquele som que Blackstar emitia, parecia um fenômeno mediúnico e sobrenatural, ele fica trinta segundos suspenso no ar, desce novamente ao estrado do teatro, lentamente, pega a jovem novamente, ele entrega esta jovem ao seu coro de vampiros, que devora a jovem impiedosamente, a cortina se fecha e se encerra o primeiro ato de “O Enigma”.

O segundo ato começa com a mordida de Claude Gerome sobre o menino Clemente, que aparece no primeiro ato furtivamente como um tipo de santo mirim, que acaba sendo convertido ao satanismo por Abigail, toma uma poção mágica que lhe coloca numa espécie de transe que o faz levitar por alguns segundos ainda no primeiro ato.

Neste segundo ato, o menino Clemente, que já havia matado e comido dois morcegos depois do feitiço de Abigail, acaba sendo transformado em vampiro por Claude Gerome e vira seu pupilo contra um hino de anjos em que se só ouvia o som, logo após o começo deste segundo ato. Abigail reaparece e diz a Claude Gerome que tal hino era uma alucinação produzida pela mediunidade do menino Clemente, que até há pouco tempo era considerado um tipo de santo pelo vilarejo de que veio.

Agora, no movimentado Quartier Latin, Clemente era um satanista que virou imortal pelas mãos de Claude Gerome, o chefe do coro de vampiros decadentes que lhe acompanhava e obedecia a suas ordens cegamente. Clemente emite uma luz vermelha inexplicável, logo em seguida, e o hino de anjos silencia, dando lugar a sons que pareciam de demônios angustiados.

Claude Gerome dá uma ordem a Clemente para que pegasse mais uma jovem que adentra o estrado, parecia que o desespero da jovem era real, o coro captura a jovem e a oferece em holocausto para saciar a sede de sangue de Clemente, agora um vampiro.

Em seguida ao sacrifício desta jovem, que sai aparentemente morta do estrado (muitos com a certeza de ser mais um efeito especial do Teatro dos Vampiros), começa um diálogo sobre bruxaria e ocultismo entre Abigail e Claude Gerome, eles se medem entre si com seus conhecimentos ocultos e apresentam um manual de satanismo para o menino Clemente depois deste longo diálogo.

Aparece enfim Claire, que corre em direção a Claude Gerome, perdidamente apaixonada, e com ciúmes terríveis de Abigail, uma intelectual do porte de Claude Gerome, e Claire sabia que os dois eram amantes e parceiros de magia, mas Claire queria mesmo eliminar ou até matar Abigail se pudesse, mas morria de medo dos feitiços e poderes mediúnicos de Abigail, e tentava apenas seduzir Claude Gerome o tempo inteiro para que ele esquecesse aquelas conversas infinitas e noites de amor que ele fazia com Abigail sempre regado a taças de sangue de jovens indefesas e ópio de qualidade.

Claude Gerome, depois de levar Claire a um aposento, com taças de sangue da tal jovem que fora morta em cena (o público ainda se questionava se a jovem fora morta ou era um efeito especial), voltam em transe, Claude Gerome levita depois de ter bebido muito sangue, umas dez taças ao todo, e fica a três metros do chão, seu rosto volta a brilhar, desta vez num azul cobalto.

Claude Gerome declama poemas feitos por Creonte, versos em homenagem às pinturas de William Blake e com um trecho final que Claude Gerome dizia ter sido retirado de um grimório desconhecido, de autor anônimo, que na verdade era uma invenção do texto de Creonte para impressionar o público.

Claude Gerome, depois de declamar o poema em levitação, retorna à superfície do estrado, aonde reencontra Abigail, agora com uma veste negra e ervas alucinógenas para produzir uma poção do amor que ela queria que Claude Gerome bebesse.

Abigail faz um suco de uvas para Claude Gerome, ele bebe, e lá estava misturada a tal poção do amor, que faz com que Claude Gerome tivesse um desejo súbito e incontrolável de beijar Abigail na frente de Claire, que entra em pânico e tenta demover em vão seu amado.

Claire se retira para seus aposentos, e Abigail leva Claude Gerome para um passeio surreal em que, num momento de êxtase, os dois, depois de beberem uma taça de sangue da tal jovem morta, levitam por trinta segundos e brilham em suas faces uma luz vermelha cor de sangue.

Em seguida à levitação de Abigail e Claude Gerome, se ouve um hino satânico, Clemente reaparece em vestes azuis escuras, toca um sino, chama o coro de vampiros decadentes de Claude Gerome, eles começam a simular cantos de uma missa negra, Claude Gerome e Abigail voltam do transe extático, despertam para um banquete junto com os tais vampiros decadentes.

Aparece mais uma jovem desconhecida para mais um sacrifício, ela é oferecida em holocausto para que Claude Gerome lhe mordesse e bebesse o seu sangue. Depois de colocarem um grande lençol preto sobre o corpo da jovem, mais uma vez parece que sai mais uma jovem morta do estrado, o público se assusta, mas acha que aquilo era parte do espetáculo e mais um efeito especial do Teatro dos Vampiros. E assim se encerra o segundo ato da peça de Creonte, “O Enigma”.

Começa o terceiro ato, aparece um caçador de vampiros, Menard, um tipo social estrambótico, com fama de mulherengo, e que fica vidrado em Abigail, esta decide seduzir Menard para planejar o seu envenenamento, e diz em segredo seu plano para Claude Gerome.

Claire volta de seu sono profundo em seus aposentos, tenta chamar a atenção de Claude Gerome, em vão, ele está imerso em seus planos, e pensa no ardil de Abigail para matar Menard envenenado. Claude Gerome simula uma amizade com Menard, e sabia que o caçador de vampiros tramava contra ele, mas o ataque de Abigail tentava se antecipar aos planos de Menard, que provavelmente seria mais uma vítima naquela trama assassina de toda a peça “O Enigma”.

É feito um jantar em que está Abigail, Claire, Menard, Clemente, Claude Gerome e o grupo de dez vampiros decadentes, Menard conversa, come e bebe muito, Claude Gerome percebe os trejeitos suspeitos do tal caçador de vampiros, também observa a linguagem corporal de Abigail, que fazia a sua estratégia para levar Menard para a sua arapuca.

Claude Gerome encerra o jantar com um discurso, logo em seguida ele deixa o jantar e vai embora com Claire. Abigail, já tendo o jogo ganho com o priápico Menard, o leva a seu aposento, logo após todos os convivas já terem deixado o jantar, lá ela consegue seduzir Menard sem precisar fazer sexo com ele.

Abigail, em seguida, coloca uma bebida vermelha para ele beber, lá ela inocula uma poção com uma mistura inusitada de veneno de Naja e uma dose de láudano que mataria um elefante em questão de minutos. Menard, que já não se controlava de desejo por Abigail, decide beber logo a tal bebida para ir à cama com Abigail, ele bebe, fica um minuto inteiro perseguindo Abigail pelo aposento, ela foge, logo em seguida ele começa a ficar zonzo e babar pela boca, seu coração logo para, ele começa a ter convulsões sinistras e cai duro no chão já morto.

Abigail dá a notícia a Claude Gerome, que comemora com ela bebendo mais um estoque de sangue das duas jovens que haviam saído mortas do estrado, eles levitam por um minuto e dançam entre si numa coreografia tétrica, enquanto Clemente entra e toca um tema fúnebre ao piano.

Claire vê a cena e tem mais uma crise de ciúmes e pânico. Os dez vampiros levam o corpo de Menard, já morto, desta vez a cena era puro teatro, o ator sai do estrado e vai fumar um charuto, mas os vampiros decadentes voltam da coxia e afirmam a Claude Gerome que o corpo havia sido queimado numa pira num ritual satânico, Clemente então toca mais um tema fúnebre, a dança de Claude Gerome e Abigail agora estava no chão do estrado, dominando a cena com desenvoltura.

A peça “O Enigma” então se encerra com um canto de Clemente, que bebe sangue e levita tocando uma flauta, os dez vampiros decadentes deixam o estrado numa espécie de êxtase diabólico. Claire sai de cena atordoada, pois Abigail leva Claude Gerome a seus aposentos, a música ganha tom de hino, vozes estranhas soam de cima da cena, Clemente desce ao chão, faz um monólogo de dez minutos sobre heroísmo e transcendência.

Claude Gerome retorna à cena, bebe uma taça de sangue, e declama um poema do autor Creonte, mais um sobre William Blake com o leitmotiv do misticismo, ao encerrar o poema, ele lê um último trecho de um grimório inventado por Creonte e as cortinas se fecham, a peça “O Enigma” termina. Os atores retornam novamente somente para fazer o usual agradecimento, com dois discursos, um de Blackstar e um final de Heloísa.

Creonte desce de sua lateral de luxo para encontrar com os atores e fazer os seus costumeiros elogios, como sempre fazia ao final de suas estreias, e sobretudo pela sua devoção à Heloísa, sua atriz preferida e que fazia seu debut como diretora de teatro justamente com a melhor peça escrita até então por Creonte, “O Enigma”.

Enquanto Creonte descia em direção à coxia, o público saía do Teatro dos Vampiros, e este se dividia entre pessoas que estavam fascinadas e extasiadas, e um outro grupo que estava horrorizado com as cenas de corpos saindo do estrado, era um misto de sucesso, de um lado, e a impressão de que tudo era muito chocante e gratuito, de outro, e Creonte agora esperaria os textos da crítica teatral parisiense para ter certeza de que havia feito um trabalho impactante, e que nesta estreia teve uma recepção ambígua do público.

Fantoff, Lancaster e Joseph saem das poltronas depois que quase todo o público já deixara o Teatro dos Vampiros, e Fantoff se dirige até Lemort, o contrarregra, que fazia o trabalho de recolhimento do cenário junto com alguns outros funcionários do teatro. Lemort diz que Creonte já havia sido avisado por ele de que Fantoff queria falar com o autor, Lemort diz que haveria um grande banquete naquela noite e Creonte, sempre muito gentil, convidara Fantoff e seus dois amigos para o tal banquete para eles conversarem sobre teatro.

Lemort conduziria os três cavalheiros para o endereço, que ficava a uma quadra do Teatro dos Vampiros, no restaurante Le Chat D`Enfer, que era um estabelecimento em que Creonte era dono em sociedade com Blackstar, o ator-fetiche do Teatro dos Vampiros, com sua altura e porte de gladiador.

Fantoff chega, junto com Lancaster e Joseph, ao Le Chat D`Enfer, Lemort apresenta os três a Creonte que, bem prestimoso, coloca os três cavalheiros num lugar privilegiado da grande mesa retangular que se estendia para o tal banquete, que seria um evento fechado apenas para convidados neste restaurante imenso que era o Le Chat D`Enfer, que era um mundaréu de mesas, cadeiras, e um palco com piano, no qual o ator Flamboyant tocaria naquela noite após a estreia de “O Enigma” e que seria uma comemoração de mais um feito de Creonte e seus atores.

Antes de começar a ser servido o jantar, teria uma apresentação de um ator português com fluência em francês, este que fazia um esquete temático que poderia mudar com o tempo, e que era sempre escrito por Creonte, o ator era Quincas Barreto e seu personagem fixo era Phantôme, era o papel fixo de um fantasma que costumava falar barbaridades, um pequeno número de comédia, e o texto mudava e poderia voltar, havia um rodízio que dependia da inspiração de Creonte, Quincas Barreto era ator contratado e exclusivo do Le Chat D`Enfer, portanto, não pertencia à Seita Gótica e nunca havia trabalhado nas peças que eram montadas no Teatro dos Vampiros.

Depois da apresentação de esquetes de meia hora do ator que fazia Phantôme, começa a sessão de piano de Flamboyant e começa a ser servida a entrada antes do prato principal, e Fantoff começa a conversar longamente com Creonte sobre teatro e a fixação de Creonte na poesia de William Blake, que ficara claro em toda a peça “O Enigma” que muito bem impressionara Fantoff.

Quando Fantoff perguntou a Creonte sobre as levitações e luzes, que Fantoff queria descobrir como se faziam aqueles efeitos especiais, Creonte disse que explicaria tudo isto após o jantar, e Creonte então pediu a Fantoff que fosse com ele, após o jantar no Le Chat D`Enfer, para ir junto com ele e Heloísa de volta ao Teatro dos Vampiros, pois lá Creonte revelaria o segredo de tais efeitos teatrais que aconteciam no Teatro dos Vampiros.

Todos comem a entrada e é servido o prato principal, a Senhora das Trevas, que tinha o nome verdadeiro de Marie Truffaut, que já havia bebido vinho além da conta, começa a contar piadas infames, e Creonte logo avisou a Fantoff e seu dois amigos que isto sempre acontecia nestes jantares, era um hábito da Senhora das Trevas beber e depois contar as suas piadas de gosto bruto e farsesco.

A Senhora das Trevas, depois de finalizar seu número de piadas infames, grita para o garçom trazer a sobremesa, e Flamboyant retoma a música do piano, logo após a Senhora das Trevas sossegar em sua cadeira e saborear a sua sobremesa.

Ao fim da sobremesa, são servidas taças com líquido vermelho para os dez vampiros decadentes, Heloísa, Blackstar, a Senhora das Trevas, e Creonte, eles bebem e Fantoff pergunta, já assustado, o que era aquilo para Creonte, que repete que todos os segredos do Teatro dos Vampiros seriam revelados por ele e Heloísa na coxia do teatro, e que seus amigos não poderiam ver, somente Fantoff, pois Creonte, depois da longa conversa com Fantoff, percebeu que este curioso dramaturgo lhe poderia ser útil em seu Teatro dos Vampiros.

Terminado o jantar, Creonte, Heloísa e Fantoff seguem, somente os três, para o Teatro dos Vampiros, que se encontrava fechado, o último a sair depois de feito todo o alvoroço da estreia de “O Enigma” tinha sido o contrarregra Lemort.

Creonte era um dos que tinham as chaves do teatro, que pertencia ao empresário Leon Blanc, que não havia ido à estreia, pois estava em Toulouse, numa temporada de descanso com sua mulher, Mademoiselle Nuit, e que retornariam na sexta seguinte para assistir à segunda apresentação da nova peça do gênio da Seita Gótica, o autor Creonte.

Os três chegam ao Teatro dos Vampiros. Creonte abre o teatro, eles entram pela plateia, seguem em direção ao estrado e entram na coxia, lá haviam garrafas com líquido vermelho, e Fantoff toma um susto, pois havia os dois corpos das jovens sacrificadas no estrado na coxia, com lençóis pretos cobrindo as partes destes dois corpos, eram então exatamente as jovens que haviam sido devoradas durante a apresentação da peça.

Fantoff fica em pânico, achava que as mortes tinham sido cenográficas, tenta fugir, mas Creonte tinha trancado a coxia, Heloísa pede para Fantoff se acalmar se ele quisesse descobrir o segredo do Teatro dos Vampiros. Heloísa começa a acariciar Fantoff, lhe aperta as partes, Fantoff se excita. Creonte acende seu narguilé de ópio e começa a fumar, Heloísa pede para Fantoff se aclamar novamente, ele começa a relaxar, Heloísa começa a fazer sexo oral em Fantoff, ele tem um orgasmo, então Heloísa se levanta, pede para Fantoff se sentar numa poltrona confortável que havia na coxia e morde seu pescoço, bebendo parte de seu sangue que circulava na veia aorta.

Fantoff, depois da mordida de Heloísa, entra numa espécie de transe onírico que o leva a ter delírios e alucinações durante uma hora, ele não entendia o que estava acontecendo, Heloísa fala para Fantoff permanecer sentado na poltrona e disse novamente para ele se acalmar que Creonte explicaria tudo após passar o efeito entorpecente da mordida que Heloísa lhe havia dado.

Fantoff, durante seus delírios e alucinações, olha para Creonte, olha para Heloísa, depois olha para os dois corpos das jovens mortas na coxia, pensa em suicídio, pensa em matar Creonte, pensa em esquartejar Heloísa, mas ele não controlava a sua própria mente e só rezava para aqueles efeitos entorpecentes passarem logo e que Creonte lhe explicasse logo o que diabos era tudo aquilo.

Termina o efeito da mordida de Heloísa depois de passada uma hora em que Fantoff delirava e tinha alucinações, em meio a ideações suicidas e de assassinato. Creonte vai em direção à poltrona em que estava sentado Fantoff e diz que Fantoff agora pertencia ao Teatro dos Vampiros.

Fantoff ainda hesitava em entender, e Creonte disse, enfim, para que Fantoff não tivesse dúvidas, que Fantoff virara um vampiro, é quando Fantoff quase desmaia de choque, e diz que aquilo não existia, que ele deveria estar sonhando, e Creonte lhe dá um beliscão na cara e diz que a mordida de Heloísa tinha sido a mordida de uma vampira, era tudo verdade, Fantoff agora teria que beber sangue. Fantoff fica indignado, pensa em sair dali imediatamente, mas Creonte disse que já era tarde, que os dois escreveriam uma nova peça em conjunto, e que Heloísa seria a estrela deles.

Fantoff, depois de mais uma hora, e de ouvir as revelações de Creonte, tudo sobre levitações e luzes, por exemplo, não eram efeitos especiais de teatro, mas fenômenos mediúnicos adquiridos por todos que eram vampiros, e que o primeiro vampiro deles era Leon Blanc, o dono do Teatro dos Vampiros, que mordeu Creonte, este mordeu a Senhora das Trevas, que mordeu Blackstar e este mordeu Heloísa, que se tornou a principal mordedora do grupo, e que foi uma das fundadoras da Seita Gótica, junto com Blackstar.

Blackstar, por sua vez, criara o grupo dos dez vampiros decadentes que, ao conhecerem Blackstar e saberem que ele era um vampiro, pediram para serem mordidos, pois antes de conseguirem trabalho no Teatro dos Vampiros, estas figuras eram seres da rua, não tinham paradeiro ou aonde cair morto, e virar uma equipe de vampiros subalternos de Blackstar no Teatro dos Vampiros, seria tanto um lar, já que havia uma casa de dois andares anexa ao teatro aonde eles forma alojados, como uma oportunidade de trabalho.

Fantoff ouve toda a história de como surgiu o Teatro dos Vampiros e fica chocado ao descobrir que as duas jovens tinham sido assassinadas em cena, e que aquilo já se repetira em todas as apresentações do Teatro dos Vampiros.

Fantoff logo percebe que acabara de entrar num seita de assassinos, mas sente sede, muita sede, ele pensa querer água, mas Heloísa esclarece para Fantoff que a sua sede incontrolável e súbita era por sangue e que ele teria que beber o sangue de um dos corpos que ainda estavam lá na coxia.

Fantoff pula em cima de uma das jovens mortas e morde o pescoço, o sangue já frio de um cadáver de cinco horas atrás, que lhe sacia momentaneamente, ele precisaria beber o sangue que estava no estoque, conservado, e Heloísa traz uma garrafa, enche uma taça com sangue conservado, e finalmente Fantoff aplaca a sua sede.

Leon Blanc e Mademoiselle Nuit voltam na segunda-feira, Creonte apresenta Fantoff ao empresário do Teatro dos Vampiros e logo diz a Leon que este agora era um deles, mais um vampiro, e o melhor, era autor teatral, e que Creonte já maquinava criar uma nova peça com a colaboração de Fantoff.

Leon Blanc ri docemente, bebe uma taça cheia de sangue e oferece uma taça também para Fantoff, que já se acostumando a sua nova condição vampiresca, bebe a sua taça, enquanto isto, Mademoiselle Nuit, num lugar recôndito do Teatro dos Vampiros, faz seus estudos de ópera, soltando trinados e melismas ainda com traços toscos de quem estava aprendendo os rudimentos da voz operística.

Leon Blanc então encontra Blackstar, que chega à tarde no Le Chat D´Enfer, para resolver algumas coisas práticas, pois era ele que fazia a administração do restaurante, deixando Creonte cuidar da parte artística, com o palco com piano, detalhes visuais do restaurante e as montagens de esquetes com o tal ator português que se apresentava lá toda sexta de noite.

O jovem ator Flamboyant, que também era músico, ia eventualmente tocar piano lá, mas havia muitos pianistas que eram contratados temporariamente e se revezavam durante semanas ou meses, com Flamboyant sendo uma espécie de convidado especial, geralmente quando se faziam os encontros fechados da Seita Gótica.

Leon Blanc conversa longamente com Blackstar, e depois se dirige novamente a Creonte, que chega ao restaurante, vindo do teatro, junto com Fantoff, e Leon Blanc chama Fantoff e diz que ficara muito contente em conhecer seu novo autor teatral e que aquilo tudo daria muitos frutos.

Leon Blanc percebera a inteligência ardente de Fantoff, com uma curiosidade mórbida que o levou à coxia para ser mordido por Heloísa somente para poder descobrir os segredos que habitavam o Teatro dos Vampiros e a sinistra companhia de atores, a Seita Gótica. Leon Blanc logo se afeiçoa a Fantoff e todos que estavam naquela tarde no Le Chat D`Enfer combinam que estariam na segunda apresentação de “O Enigma”, Blackstar, claro, representando Claude Gerome.

Fantoff, na noite anterior à segunda apresentação de “O Enigma”, na quinta, se encontra com Lancaster para discutir sobre teatro, e acaba o convidando para ir ao Le Chat D`Enfer, lá eles vão e acabam encontrando ao acaso Blackstar, que estava lá cuidando de gerenciar algumas entregas que haviam chegado ao restaurante, que eram o material de limpeza, material para obras, e muita comida e bebidas.

Blackstar decide, um pouco depois, já tendo resolvido a acomodação das mercadorias e dos materiais com os funcionários da cozinha e da limpeza, se sentar junto com Fantoff e Lancaster.

Os três bebem vinho durante umas três horas seguidas, chega tarde da noite, Fantoff e Lancaster se despedem de Blackstar e eles saem do restaurante para ir cada um para suas casas em Montmartre. No meio do caminho, Fantoff tem uma crise de sede, ele precisava de sangue, tenta morder o pescoço de Lancaster, que não entende nada, fica assustado, e pergunta se Fantoff estava ficando louco, Fantoff começa a emitir uma luz azul escura de sua face e Lancaster acha que estava tendo uma alucinação e acaba desferindo um soco na cara de Fantoff que cai desacordado no meio da rua.

Lancaster não quis saber, e saiu deixando ali no meio da rua, desmaiado, Fantoff, que acaba sendo socorrido somente na manhã seguinte, por um guarda, que o leva, junto com dois bombeiros, para um hospital em Montparnasse.

Fantoff é avaliado neste hospital, e um psiquiatra acaba afirmando que Fantoff precisaria descansar por duas semanas, os três primeiros dias em observação no hospital, e o resto destes dias de repouso em sua casa em Montmartre. Mas, Fantoff percebe que estava entrando numa cilada, e acaba dando um jeito de fugir do hospital na sexta de noite, para conseguir ver a segunda apresentação de “O Enigma” e arrumar algum sangue fresco no Teatro dos Vampiros.

Fantoff chega ao Teatro dos Vampiros, esbaforido, uma hora antes da segunda apresentação de “O Enigma”, lá está Creonte, já sob efeito profundo de seu narguilé de ópio, aparece Leon Blanc, Mademoiselle Nuit, a Senhora das Trevas, Blackstar e os dez vampiros decadentes, Flamboyant, Susanne Flammarion, Heloísa, Jean Torreau.

Também estavam no Teatro dos Vampiros duas jovens que possivelmente seriam sacrificadas naquela noite e estavam ali sem saber em que armadilha tinham entrado, seduzidas por Blackstar, que sempre fazia isto para conseguir material para os holocaustos de sangue praticados no Teatro dos Vampiros.

Também chegaram parte da companhia da Seita Gótica que não fazia parte da peça “O Enigma”, como o autor Pierre Jolie e sua esposa Juliette Blanchet, atriz da Seita Gótica, ambos que faziam a preparação para a peça que sucederia a temporada de “O Enigma”, que seria o monólogo sobrenatural para declamação de Juliette Blanchet de título “O Voo”, escrito por seu marido, Pierre Jolie.

Também estava no Teatro dos Vampiros, naquela noite, o contrarregra Lemort, que logo Fantoff descobre que também era um vampiro, assim como todos da Seita Gótica e todos que trabalhavam no Teatro dos Vampiros. Fantoff vai, por alguns instantes, para a coxia beber sangue junto com Leon Blanc, que oferece uma taça com o melhor líquido sanguíneo do estoque do teatro para Fantoff, pois Leon Blanc já sabia que Fantoff passara por apuros e precisava se refrescar um pouco para ver “O Enigma” já saciado.

Todos os principais convidados ficam nas laterais de luxo, os atores que iam se apresentar vão para seus camarins, depois se dirigem à coxia, lá Creonte, minutos antes de começar a peça, já acabara de sair de seu camarim individual, que servia somente para ele se empanzinar de ópio antes de ver suas criações teatrais em atividade.

Creonte era o autor mais criativo do Teatro dos Vampiros, mas também o mais junk de todos, vivia constantemente sob o domínio onírico de seu consumo industrial de ópio, mais do que seus surtos de sede, que era um sintoma que ocorria a todos os vampiros.

Os surtos de sede dos vampiros, por sua vez, ocorriam em lapsos de tempo variáveis para cada vampiro individualmente, estes surtos de sede de sangue tinham diferentes gradações de intensidade também, e entre os vampiros entre si, uns tinham mais surtos que outros, e as intensidades eram bem variáveis, a que mais surtava e que mais tinha mordido gente na Seita Gótica era, disparado, Heloísa, e era a atriz, por conseguinte, que dominava com mais intensidade os fenômenos mediúnicos de levitação, brilhos sobrenaturais e episódios de êxtase místico.

Começa o espetáculo de “O Enigma”, e no desenrolar do primeiro ato, na hora exata em que mais uma jovem seria sacrificada no estrado, de súbito, uma batida policial invade o teatro, eram cerca de cinquenta autoridades, que entram colocando o público para fora e interrompendo a peça.

Creonte, que estava na área lateral de luxo, desce correndo, mesmo num transe onírico de ópio. Blackstar desce do estrado para enfrentar os policiais e acaba sendo contido por cinco autoridades, e o chefe de polícia disse que tinha um mandado feito por uma denúncia anônima, ele afirma que ali no Teatro dos Vampiros eram realizados rituais satânicos, beberagem de sangue e assassinatos, que algumas das famílias das jovens que foram sacrificadas no teatro tinham sido informadas no dia anterior da batida policial que tais jovens possivelmente tinham sido sacrificadas durante as peças realizadas no Teatro dos Vampiros.

O Teatro dos Vampiros cremava os corpos após um dia dos sacrifícios. Contudo, nesta noite de sexta, os policiais entram na coxia e salvam as duas jovens que seriam sacrificadas. Uma das jovens é retirada do palco, e a outra, que estava amarrada dentro da coxia, é libertada, e todo o estoque de sangue é confiscado.

Toda a companhia de atores e autores, incluindo Leon Blanc e Mademoiselle Nuit, todos são algemados e presos. No dia de sábado, após a noite em que a polícia entrou no Teatro dos Vampiros, o estabelecimento é interditado para investigação, que dura um mês, e é concluído que se tratava de uma seita de vampiros, a notícia que sai no diário parisiense é “Noite dos Vampiros vira caso de polícia”, e outra manchete “Vampiros assassinos são presos”.

Neste um mês de investigações, com todos os vampiros presos, incluindo Fantoff, eles agonizam de sede, pois não havia sangue para consumo, tinha sido tudo confiscado. Heloísa, Blackstar, Fantoff, Flamboyant, Leon Blanc, e todo o resto dos vampiros começam, primeiro, a enlouquecer, e depois de um mês, começaram a sofrer de inanição, em questão de três meses, todos sem beber sangue desde a interdição do Teatro dos Vampiros, foram morrendo, e em questão de seis meses, todos estavam mortos por inanição, dominados pela loucura.

Conto pronto em 20/08/2020

Contos Psicodélicos – Volume II

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.

Blog : http://poesiaeconhecimento.blogspot.com

 

quarta-feira, 19 de agosto de 2020

AS DARK KITCHENS

“O movimento do delivery tende a se expandir com esta atuação das dark kitchens”

As dark kitchens se apresentaram como uma solução para aumentar a eficiência do delivery de restaurantes, com economia e uma maior agilidade de entrega. Tal modalidade se tornou uma extensão natural do mercado em relação ao avanço do delivery e para atender as demandas dos consumidores.

As dark kitchens são cozinhas profissionais de restaurantes que usam o espaço físico exclusivo para o delivery, ou seja, são diferentes das cozinhas tradicionais, pois não há espaço físico para atendimento dos clientes, podem ser cozinhas grandes, compartilhadas, ou “escondidas” em locais que não são acessíveis para o público. E as dark kitchens podem, ainda, atender a diversas marcas ao mesmo tempo, pois o foco é o delivery.

A opção pelas dark kitchens podem ser praticadas por restaurantes novos que só fazem o delivery ou, também, ser uma alternativa para empresas já consolidadas no mercado, mas precisam dar conta da demanda do delivery ou atender em locais mais remotos, como cidades menores.

As dark kitchens podem servir para ampliar o mercado de delivery, e para os restaurantes é uma alternativa mais barata de custo do que um espaço físico para clientes e mais eficiente para atender toda a demanda crescente de delivery. Este conceito de dark kitchens, por sua vez, surgiu com a popularização dos aplicativos de entrega de comida.

Muitas reportagens indicam que as dark kitchens surgiram em Londres, e sua existência no mercado está apenas nas redes sociais, pois não existe loja ou fachada para clientes. As dark kitchens são um empreendimento bem mais barato do que o restaurante tradicional, pois só precisa de uma cozinha, um cozinheiro, contrato com algum aplicativo e um produto para vender.

Com o tempo, as dark kitchens se popularizaram em países como Colômbia, México, Brasil, Argentina, Chile e Peru, e com o sucesso destas dark kitchens, algumas delas puderam expandir seus negócios para se tornarem uma franquia e até abrir os primeiros restaurantes físicos.

A Rappi, por sua vez, aplicativo de entrega de refeições, oferece à estes empreendedores de dark kitchens, por sua vez, espaços para alugar e trabalhar exclusivamente para eles. A Uber Eats, por sua vez, não investe em infraestrutura, mas promove as marcas diferentes de uma mesma cozinha, por exemplo. Os negócios de dark kitchens fazem a sua reputação, por sua vez, nas redes sociais e espaços online.

Hoje temos 12 % do negócio de refeições envolvendo delivery,  e neste ramo temos uma redução de custos de 30% a 40 % com as dark kitchens, pois o aluguel se torna mais barato, e não precisa contratar garçons ou outros funcionários. Os clientes e entregadores também se beneficiam deste modelo, pois há uma maior cobertura das áreas de entrega e uma redução do tempo de entrega.

O aplicativo Apptite, por sua vez, criou um modelo de cozinheiros independentes, pois opera um delivery de comidas feitas em casa, e está em operação desde 2016, aplicativo pelo qual o cliente pede um prato caseiro feito por chefs profissionais e amadores.

O aplicativo diz que todo o trabalho posterior à preparação da comida pelo chef independente é feito pelo aplicativo, os chefs pagam com isto uma comissão de 25% ao aplicativo, e este fornece para o chef independente sacolas, embalagens, lacres e etiquetas, itens de uso obrigatório, e também cobre a gerência de motoboys.

O movimento do delivery tende a se expandir com esta atuação das dark kitchens. Falando da logística, por exemplo, temos a Rappi que utiliza hubs de cozinhas para alocar restaurantes parceiros ou também em um espaço independente, e com o aumento da eficiência e flexibilidade realizada pelas dark kitchens, por exemplo, uma mesma cozinha pode trabalhar com diversos produtos ao mesmo tempo.

O parceiro da Rappi pode fazer uma dark kitchen com uma única especialidade, ou utilizar uma dark kitchen com uma capacidade maior de produção, podendo abrigar duas marcas diferentes, e a Rappi personaliza a infraestrutura e a estrutura para atender estas marcas que trabalham alojadas em dark kitchens.

Gustavo Bastos, filósofo escritor.

Link da Século Diário :  https://www.seculodiario.com.br/colunas/as-dark-kitchens