Fantoff era um pesquisador de Paris, ele estudava lendas antigas, suas origens, e passou a atuar, posteriormente, como uma espécie de curador de artes, estamos em 1870, e Fantoff se dedica agora ao teatro, escreve umas peças de comédia, dentre elas, uma se destacara em 1869, a “A Dama Louca”, que ganhou um prêmio de melhor texto na última temporada parisiense de inverno, concorrendo com um grande amigo seu, este que também era diretor, Lancaster, que havia ganho em 1887 e 1888 dois prêmios, o primeiro de direção e o segundo por melhor texto.
Fantoff se dirigia para a encenação de Fedra de Racine no Teatro
Paris, em Montmartre, e se dizia um admirador das remontagens da tragédia neoclássica,
que era um desafio que ele não enfrentaria escrever naquela métrica raciniana
em que a história se decorre num único dia, e que pensava mesmo era em fazer
uma montagem adaptada de O Doente Imaginário de Moliére, com a direção deste
seu amigo Lancaster, que era um pesquisador do comediógrafo, este já tendo
dirigido O Avarento e As Preciosas Ridículas, e que já planejava a montagem de
Tartufo, numa versão que ele queria que fosse a sua melhor versão de Moliére, e
já adaptava um texto para isto.
Fantoff havia se destacado num trabalho de produção e
figurino, além de ter trabalhado com cenografia por cinco anos, junto com um
outro amigo seu, Joseph, no Teatro Pascal, também em Montmartre, e que resultou
na cenografia de As Nuvens de Aristófanes, com um Sócrates fazendo um Deus Ex
Machina que era pura fanfarronice, e também fez a cenografia da tragédia
Electra de Eurípides, e uma versão simpática de Thomas Kid, que era uma
miscelânea de sua obra teatral em forma de pequenos fragmentos, tentando imitar
algo do período elisabetano, só que lhe dando um ar parisiense meio forçado
adrede, e com um cenário acidentado e pobre, meio que subvertendo a enormidade
do teatro elisabetano.
Havia ainda, mas no Quartier Latin, um teatro meio sinistro,
de verve gótica, aonde estavam sendo montados pequenos textos de terror e
horror gótico, que Fantoff foi visitar, e era o chamado Teatro dos Vampiros,
ele acabou vendo uma montagem lá de uma peça escrita por um novo autor,
Creonte, que escrevera sob efeito de ópio um texto em três atos de nome “O
Enigma”, que era uma história gótica com surtos de consumo de sangue, voos e
levitações inexplicáveis.
Fantoff fez contato com um dos contrarregras deste Teatro dos
Vampiros, que tinha sido fundado há cinco anos, em 1865, por um empresário
obscuro que agora investia em teatro e histórias de terror, de nome Leon Blanc,
e que era um velho estrambótico de uns setenta anos, que vivia com uma moça de
vinte anos que era intitulada “Mademoiselle Nuit”, uma moça bonita, mas
sinistra em suas vestes geralmente pretas. Este contrarregra tinha o nome de Lemort,
e se dizia sobrinho de criação deste empresário de origem desconhecida de nome
Leon Blanc.
Creonte ainda não havia cruzado com Fantoff, quem o conhecia
de dois encontros ao acaso era Lancaster, e relatou para Fantoff que foram
impressões bem estranhas, ele disse que Creonte parecia uma espécie de
alienígena de aparência cadavérica e bem magro, parecia estar sempre sob o
domínio do ópio ou de outra substância qualquer de dons oníricos. Creonte, que
montaria sua mais nova peça ainda nesta semana da visita de Fantoff, teria como
seu astro principal em “O Enigma”, uma espécie de líder e guru do grupo de
atores do chamado Teatro dos Vampiros, que era um inglês naturalizado francês e
radicado em Paris, que tinha o nome artístico de “Blackstar”.
Esta figura era sinistra e bem alta e forte, pois tinha cerca
de dois metros e dez centímetros, e tinha a força de um touro e era um dos
melhores amigos deste empresário Leon Blanc, Blackstar era o melhor ator da
companhia que se chamava “Seita Gótica”, e que reunia numa espécie de sindicato
e companhia de atores, gerida também por Leon Blanc, todos os atores que eram
contratados e que trabalhavam desde 1864 no Teatro dos Vampiros.
Depois do ator Blackstar, das mulheres, a atriz que mais se
destacava, por sua vez, era uma moça de trinta anos de nome Heloísa, e que
fazia papel de louca, de vampira, de freira e tudo o que se exigisse, com uma
veia trágica, mas que tirava de letra um papel cômico se calhasse. Creonte até
tinha feito uma peça em sua homenagem em 1869, de título “Heloísa no Inferno”,
que foi uma peça gótica em quatro atos de enorme impacto e que rendera a
Creonte o apelido de “o mestre do horror em Paris”.
O chamado Teatro dos Vampiros não concorria diretamente com o
Teatro Pascal e nem com o Teatro de Paris, as peças montadas no Teatro dos
Vampiros eram de autores novos e todas inéditas, e só eram montadas lá, isto é,
a Seita Gótica se juntava a uma equipe de autores independentes, que eram seis
autores, cinco homens e uma mulher, sendo o mais talentoso Creonte, seguido da
Senhora das Trevas, que tinha o título também de Marianne Storm, e assinava
suas peças alternando os dois pseudônimos.
Também tinha o jovem autor Pierre Jolie, que era casado com a
jovem atriz, também da Seita Gótica, Juliette Blanchet, e que fazia papéis de
coadjuvante, tendo já trabalhado bastante sob a tutela de Heloísa, que tinha
uma expertise adquirida de um estudo independente de teatro elisabetano e
técnicas de farsa e clown que utilizou maniacamente em seu sucesso “Heloísa no
Inferno”.
Fantoff, em sua primeira visita ao Teatro dos Vampiros,
conversou muito com Lemort, e ficou sabendo um pouco mais do funcionamento
deste teatro na prática e um pouco da dinâmica dos atores, e viu que era tudo
completamente diferente de seus trabalhos realizados no Teatro Paris e no
Teatro Pascal, ele pensava em ter contato com Creonte depois de assistir a peça
“O Enigma”, e conhecer alguns atores desta chamada “Seita Gótica”.
Fantoff já concebia uma peça inspirada em Thomas de Quincey,
O Comedor de Ópio, pois queria um destes atores da Seita Gótica para fazer o
papel do dependente de ópio da história contada por Thomas de Quincey, e queria
montar a peça no Teatro dos Vampiros, mas para isto teria que convencer a
companhia de atores da Seita Gótica, a equipe de autores e também Leon Blanc,
pois o Teatro dos Vampiros, até então, tinha sido um grupo fechado e de versões
inéditas, sem nada que se relacionasse a adaptações, releituras e remontagens.
E depois de sua noite vendo Fedra de Racine, Fantoff decidiu
que sua visita ao Teatro dos Vampiros também serviria para ele buscar algo
novo, nada de neoclássico, embora seu plano para O Doente Imaginário de Moliére
fosse, para ele, na área da comédia, a sua última adaptação antes de ele fazer mais
comédias próprias, que se juntaria ao que ele pensava de Thomas de Quincey como
peça, e dali em diante priorizaria versões de textos seus inéditos, como fora a
sua peça “A Dama Louca”, e que lhe rendera prêmio.
Fantoff, depois de uma longa conversa com Lemort e de ter
visto um dos ensaios fragmentários de dois atores da companhia Seita Gótica,
numa espécie de exercício muito estranho com barulhos, grunhidos e gestos
estilizados que Fantoff desconhecia em teatro, ele se deu por satisfeito e iria
retornar ao Teatro dos Vampiros na noite de sexta-feira para ver a montagem de
Creonte da tal peça “O Enigma” e que seria a estreia da mesma.
Fantoff decidiu que falaria novamente com o contrarregra
Lemort para ser apresentado ao autor Creonte. A peça “O Enigma”, por sua vez,
teria como atores os grandes da companhia, Blackstar e Heloísa, e uma espécie
de menino prodígio de nome artístico Flamboyant, que havia feito três peças no
Teatro dos Vampiros, virou um tipo de coringa na companhia, pois se encaixava
em qualquer buraco em que lhe metessem.
Fantoff entra em contato com Lancaster e o cenógrafo Joseph,
os três combinam de ir juntos ver a tal peça gótica de Creonte e talvez
buscarem novas ideias para as peças que aconteciam no Teatro Paris e no Teatro
Pascal, longe da reverência a Racine e as maníacas remontagens das peças de
Moliére, que dominavam, por sinal, os planos de Lancaster, um fanático pelo
comediógrafo, e a ideia teatral de Fantoff para O Doente Imaginário, a última
peça de Moliére.
O Teatro dos Vampiros tinha um desenho oval da plateia, com
poltronas espaçosas, laterais para a área de luxo, na cena havia um estrado bem
grande e retangular, e os chamados efeitos especiais eram um mistério, pois o
público nunca descobriu por qual mecânica eram feitas as levitações e os
brilhos sobrenaturais de algumas das montagens da companhia Seita Gótica.
Muitas vezes, a atriz Heloísa, por exemplo, parecia que
entrava numa espécie de êxtase, levitava e ficava com a face iluminada num azul
sobrenatural, o que testemunharam algumas pessoas que puderam assistir à
montagem de “Heloísa no Inferno”, e ninguém nunca soube qual era o segredo que
havia lá no Teatro dos Vampiros para aqueles efeitos especiais avançados.
Chega a noite de sexta, a estreia de “O Enigma”. Fantoff,
Joseph e Lancaster chegam, e Fantoff conversa com Lemort, este diz que
apresentaria Creonte ao término da estreia, pois Creonte estava confinado em
seu camarim (na verdade, Lemort omitiu o fato de que Creonte estava fumando
ópio e queria ver a estreia de sua peça sob o efeito da substância onírica,
pois fazia tudo inspirado pelo ópio, além de outros fatos que serão em breve
elencados aqui sobre a natureza particular desta companhia gótica).
Fantoff consegue os três lugares para a primeira fileira, é de
lá que ele e seus dois amigos veriam a atuação de Blackstar e Heloísa, os dois
principais atores da Seita Gótica, e o tão falado Flamboyant, que tinha uns
treze anos e parecia que seria o novo astro da companhia. Logo Creonte sai de
seu camarim num transe onírico que o fazia se sentir levitando, ele se dirige
ao setor de luxo, nas laterais, e de lá veria a sua obra em ação, com a direção
de Heloísa, que agora faria a estreia como diretora de teatro, ao mesmo tempo
em que atuaria.
No Quartier Latin o chamado Teatro dos Vampiros estava
ganhando uma aura mística em que se discutia sobre os tais efeitos especiais
das peças, muitos que frequentavam o público do teatro tentavam depreender a mecânica
de tais efeitos destas peças feitas pela Seita Gótica, mas ninguém havia
chegado a uma conclusão. O trabalho dos contrarregras também não era
decifrável, neste ponto, pois eles guardavam segredo com os atores do que era
preparado na véspera destas sessões, que sempre eram um tipo de catarse trágica
semelhante às descrições do fenômeno feita por Aristóteles em sua Arte Poética.
A impressão que a peça “Heloísa no Inferno” havia causado,
por exemplo, talvez tenha sido maior do que as últimas montagens
shakespearianas tanto no Teatro Paris como no Teatro Pascal. A concorrência
entre estes dois teatros de Montmartre agora convivia com um universo paralelo
e misterioso povoado pelas peças autorais do Teatro dos Vampiros.
A diferença de orientação artística entre os teatros Paris e
Pascal e o que era feito no Teatro dos Vampiros, por sua vez, era um abismo,
pois o que se fazia no teatro sinistro do Quartier Latin era sem precedentes na
História do teatro francês e talvez na História mundial do teatro como um todo.
Não havia nada parecido a peças como “Heloísa no Inferno”, ou
ainda as peças “Aranhas” e “Dante Vampiro”, estas duas da Senhora das Trevas,
por exemplo, ou ainda, uma outra montagem de Creonte, umas das primeiras
montadas no Teatro dos Vampiros, que foi a sua peça “Quartier Latin do Ópio”.
Até então, contudo, o maior vulto tinha sido com “Heloísa no Inferno”, e que
provavelmente seria superada agora pela montagem de “O Enigma”, que já era o
resultado do auge criativo do tétrico autor Creonte.
Blackstar havia sido o personagem principal do primeiro
sucesso verdadeiro do Teatro dos Vampiros, que foi a peça de Creonte, “Quartier
Latin do Ópio”, e que rendeu um prêmio de melhor ator do Júri Parisiense para
Blackstar, o mesmo que premiou Creonte um ano depois pela direção de “Sarça
Bíblica”, e que premiou a atuação lendária, anos depois, de Heloísa em sua peça
mor “Heloísa no Inferno”.
“Quartier Latin do Ópio” foi uma peça escrita e dirigida por
Creonte em três atos que se encerrava com Blackstar, encarnado no personagem
usuário de ópio e poeta, Jean-Pierre Perrault, que bebe uma taça de sangue de
uma jovem loira sacrificada e fuma um narguilé de ópio como ato final, no que o
público nunca soube se o sangue e o ópio eram verdadeiros, mais um mistério de
Creonte que ficara no ar para o público pensar depois da catarse.
Começa a peça “O Enigma”, primeiro ato, entra Blackstar, que
fazia o personagem Claude Gerome, entra Heloísa, que fazia Abigail, Jean
Torreau, que fazia Menard, entraria no terceiro ato. Neste primeiro ato, entra
Flamboyant, que fazia o menino Clemente, começa a fala de Claude Gerome, ele
faz uma declamação poética inspirada nos poemas de William Blake.
Blackstar declama então estes versos com visões escatológicas
e cosmogônicas alternando com versos feitos sobre sangue e morte, todos os
versos de inspiração em William Blake, e muitas vezes fazendo recapitulações
livres de Dante Alighieri e de O Paraíso Perdido de Milton, tudo escrito pelo
texto febril sob efeito de ópio de Creonte, que na ala lateral de luxo do
teatro, estava num transe onírico contemplando a sua própria criação.
Abigail era uma espécie de bruxa, de mística, e fazia
feitiços contra inimigos de Claude Gerome, e era uma das amantes de Claude
Gerome, que era casado com Claire, personagem feito pela atriz Susanne Flammarion,
que entraria somente no segundo ato, num tipo de conflito kármico com a
personagem Abigail, e a transformação em vampiro do menino Clemente, também no
segundo ato.
A transformação em vampiro de Clemente no segundo ato vem de
uma mordida do personagem Claude Gerome, que tinha sido o vampiro antigo das torres
de William Blake, e que usava os poderes mediúnicos de Abigail para fazer novas
vítimas, estas que eram hipnotizadas e mordidas por Claude Gerome, sendo que no
primeiro ato de “O Enigma”, ele morde cinco mulheres jovens, e se junta a um
grupo de vampiros decadentes da Champs-Élysées, que ajudavam Claude Gerome a
tomar estas jovens para si, um grupo de dez vampiros que eram atores
coadjuvantes da peça e atuavam também como coro nas declamações de Claude
Gerome.
Claude Gerome encerra o primeiro ato, depois de morder a
quinta jovem (ninguém sabia de onde eram pinçadas estas figuras, pois não
pertenciam à Seita Gótica), começa a entrar em transe mediúnico e levita cinco
metros acima do estrado em que era apresentada a peça, sua face ganha uma
iluminação roxa, meio sinistra, seus olhos brilham, ele entoa um canto
gregoriano que tinha uma amplitude desconhecida.
Não havia acústica natural para aquele som que Blackstar
emitia, parecia um fenômeno mediúnico e sobrenatural, ele fica trinta segundos
suspenso no ar, desce novamente ao estrado do teatro, lentamente, pega a jovem
novamente, ele entrega esta jovem ao seu coro de vampiros, que devora a jovem
impiedosamente, a cortina se fecha e se encerra o primeiro ato de “O Enigma”.
O segundo ato começa com a mordida de Claude Gerome sobre o
menino Clemente, que aparece no primeiro ato furtivamente como um tipo de santo
mirim, que acaba sendo convertido ao satanismo por Abigail, toma uma poção
mágica que lhe coloca numa espécie de transe que o faz levitar por alguns segundos
ainda no primeiro ato.
Neste segundo ato, o menino Clemente, que já havia matado e
comido dois morcegos depois do feitiço de Abigail, acaba sendo transformado em
vampiro por Claude Gerome e vira seu pupilo contra um hino de anjos em que se
só ouvia o som, logo após o começo deste segundo ato. Abigail reaparece e diz a
Claude Gerome que tal hino era uma alucinação produzida pela mediunidade do
menino Clemente, que até há pouco tempo era considerado um tipo de santo pelo
vilarejo de que veio.
Agora, no movimentado Quartier Latin, Clemente era um
satanista que virou imortal pelas mãos de Claude Gerome, o chefe do coro de
vampiros decadentes que lhe acompanhava e obedecia a suas ordens cegamente.
Clemente emite uma luz vermelha inexplicável, logo em seguida, e o hino de
anjos silencia, dando lugar a sons que pareciam de demônios angustiados.
Claude Gerome dá uma ordem a Clemente para que pegasse mais
uma jovem que adentra o estrado, parecia que o desespero da jovem era real, o
coro captura a jovem e a oferece em holocausto para saciar a sede de sangue de
Clemente, agora um vampiro.
Em seguida ao sacrifício desta jovem, que sai aparentemente
morta do estrado (muitos com a certeza de ser mais um efeito especial do Teatro
dos Vampiros), começa um diálogo sobre bruxaria e ocultismo entre Abigail e
Claude Gerome, eles se medem entre si com seus conhecimentos ocultos e
apresentam um manual de satanismo para o menino Clemente depois deste longo
diálogo.
Aparece enfim Claire, que corre em direção a Claude Gerome,
perdidamente apaixonada, e com ciúmes terríveis de Abigail, uma intelectual do
porte de Claude Gerome, e Claire sabia que os dois eram amantes e parceiros de
magia, mas Claire queria mesmo eliminar ou até matar Abigail se pudesse, mas
morria de medo dos feitiços e poderes mediúnicos de Abigail, e tentava apenas
seduzir Claude Gerome o tempo inteiro para que ele esquecesse aquelas conversas
infinitas e noites de amor que ele fazia com Abigail sempre regado a taças de
sangue de jovens indefesas e ópio de qualidade.
Claude Gerome, depois de levar Claire a um aposento, com
taças de sangue da tal jovem que fora morta em cena (o público ainda se
questionava se a jovem fora morta ou era um efeito especial), voltam em transe,
Claude Gerome levita depois de ter bebido muito sangue, umas dez taças ao todo,
e fica a três metros do chão, seu rosto volta a brilhar, desta vez num azul
cobalto.
Claude Gerome declama poemas feitos por Creonte, versos em
homenagem às pinturas de William Blake e com um trecho final que Claude Gerome
dizia ter sido retirado de um grimório desconhecido, de autor anônimo, que na
verdade era uma invenção do texto de Creonte para impressionar o público.
Claude Gerome, depois de declamar o poema em levitação,
retorna à superfície do estrado, aonde reencontra Abigail, agora com uma veste
negra e ervas alucinógenas para produzir uma poção do amor que ela queria que
Claude Gerome bebesse.
Abigail faz um suco de uvas para Claude Gerome, ele bebe, e
lá estava misturada a tal poção do amor, que faz com que Claude Gerome tivesse
um desejo súbito e incontrolável de beijar Abigail na frente de Claire, que
entra em pânico e tenta demover em vão seu amado.
Claire se retira para seus aposentos, e Abigail leva Claude
Gerome para um passeio surreal em que, num momento de êxtase, os dois, depois
de beberem uma taça de sangue da tal jovem morta, levitam por trinta segundos e
brilham em suas faces uma luz vermelha cor de sangue.
Em seguida à levitação de Abigail e Claude Gerome, se ouve um
hino satânico, Clemente reaparece em vestes azuis escuras, toca um sino, chama
o coro de vampiros decadentes de Claude Gerome, eles começam a simular cantos
de uma missa negra, Claude Gerome e Abigail voltam do transe extático,
despertam para um banquete junto com os tais vampiros decadentes.
Aparece mais uma jovem desconhecida para mais um sacrifício,
ela é oferecida em holocausto para que Claude Gerome lhe mordesse e bebesse o
seu sangue. Depois de colocarem um grande lençol preto sobre o corpo da jovem,
mais uma vez parece que sai mais uma jovem morta do estrado, o público se
assusta, mas acha que aquilo era parte do espetáculo e mais um efeito especial
do Teatro dos Vampiros. E assim se encerra o segundo ato da peça de Creonte, “O
Enigma”.
Começa o terceiro ato, aparece um caçador de vampiros,
Menard, um tipo social estrambótico, com fama de mulherengo, e que fica vidrado
em Abigail, esta decide seduzir Menard para planejar o seu envenenamento, e diz
em segredo seu plano para Claude Gerome.
Claire volta de seu sono profundo em seus aposentos, tenta
chamar a atenção de Claude Gerome, em vão, ele está imerso em seus planos, e
pensa no ardil de Abigail para matar Menard envenenado. Claude Gerome simula
uma amizade com Menard, e sabia que o caçador de vampiros tramava contra ele,
mas o ataque de Abigail tentava se antecipar aos planos de Menard, que
provavelmente seria mais uma vítima naquela trama assassina de toda a peça “O
Enigma”.
É feito um jantar em que está Abigail, Claire, Menard,
Clemente, Claude Gerome e o grupo de dez vampiros decadentes, Menard conversa,
come e bebe muito, Claude Gerome percebe os trejeitos suspeitos do tal caçador
de vampiros, também observa a linguagem corporal de Abigail, que fazia a sua
estratégia para levar Menard para a sua arapuca.
Claude Gerome encerra o jantar com um discurso, logo em
seguida ele deixa o jantar e vai embora com Claire. Abigail, já tendo o jogo
ganho com o priápico Menard, o leva a seu aposento, logo após todos os convivas
já terem deixado o jantar, lá ela consegue seduzir Menard sem precisar fazer
sexo com ele.
Abigail, em seguida, coloca uma bebida vermelha para ele
beber, lá ela inocula uma poção com uma mistura inusitada de veneno de Naja e
uma dose de láudano que mataria um elefante em questão de minutos. Menard, que
já não se controlava de desejo por Abigail, decide beber logo a tal bebida para
ir à cama com Abigail, ele bebe, fica um minuto inteiro perseguindo Abigail
pelo aposento, ela foge, logo em seguida ele começa a ficar zonzo e babar pela
boca, seu coração logo para, ele começa a ter convulsões sinistras e cai duro
no chão já morto.
Abigail dá a notícia a Claude Gerome, que comemora com ela
bebendo mais um estoque de sangue das duas jovens que haviam saído mortas do
estrado, eles levitam por um minuto e dançam entre si numa coreografia tétrica,
enquanto Clemente entra e toca um tema fúnebre ao piano.
Claire vê a cena e tem mais uma crise de ciúmes e pânico. Os
dez vampiros levam o corpo de Menard, já morto, desta vez a cena era puro
teatro, o ator sai do estrado e vai fumar um charuto, mas os vampiros
decadentes voltam da coxia e afirmam a Claude Gerome que o corpo havia sido
queimado numa pira num ritual satânico, Clemente então toca mais um tema
fúnebre, a dança de Claude Gerome e Abigail agora estava no chão do estrado,
dominando a cena com desenvoltura.
A peça “O Enigma” então se encerra com um canto de Clemente,
que bebe sangue e levita tocando uma flauta, os dez vampiros decadentes deixam
o estrado numa espécie de êxtase diabólico. Claire sai de cena atordoada, pois
Abigail leva Claude Gerome a seus aposentos, a música ganha tom de hino, vozes
estranhas soam de cima da cena, Clemente desce ao chão, faz um monólogo de dez
minutos sobre heroísmo e transcendência.
Claude Gerome retorna à cena, bebe uma taça de sangue, e
declama um poema do autor Creonte, mais um sobre William Blake com o leitmotiv
do misticismo, ao encerrar o poema, ele lê um último trecho de um grimório
inventado por Creonte e as cortinas se fecham, a peça “O Enigma” termina. Os
atores retornam novamente somente para fazer o usual agradecimento, com dois
discursos, um de Blackstar e um final de Heloísa.
Creonte desce de sua lateral de luxo para encontrar com os
atores e fazer os seus costumeiros elogios, como sempre fazia ao final de suas
estreias, e sobretudo pela sua devoção à Heloísa, sua atriz preferida e que
fazia seu debut como diretora de teatro justamente com a melhor peça escrita
até então por Creonte, “O Enigma”.
Enquanto Creonte descia em direção à coxia, o público saía do
Teatro dos Vampiros, e este se dividia entre pessoas que estavam fascinadas e
extasiadas, e um outro grupo que estava horrorizado com as cenas de corpos
saindo do estrado, era um misto de sucesso, de um lado, e a impressão de que
tudo era muito chocante e gratuito, de outro, e Creonte agora esperaria os
textos da crítica teatral parisiense para ter certeza de que havia feito um
trabalho impactante, e que nesta estreia teve uma recepção ambígua do público.
Fantoff, Lancaster e Joseph saem das poltronas depois que
quase todo o público já deixara o Teatro dos Vampiros, e Fantoff se dirige até
Lemort, o contrarregra, que fazia o trabalho de recolhimento do cenário junto
com alguns outros funcionários do teatro. Lemort diz que Creonte já havia sido
avisado por ele de que Fantoff queria falar com o autor, Lemort diz que haveria
um grande banquete naquela noite e Creonte, sempre muito gentil, convidara
Fantoff e seus dois amigos para o tal banquete para eles conversarem sobre
teatro.
Lemort conduziria os três cavalheiros para o endereço, que
ficava a uma quadra do Teatro dos Vampiros, no restaurante Le Chat D`Enfer, que
era um estabelecimento em que Creonte era dono em sociedade com Blackstar, o
ator-fetiche do Teatro dos Vampiros, com sua altura e porte de gladiador.
Fantoff chega, junto com Lancaster e Joseph, ao Le Chat
D`Enfer, Lemort apresenta os três a Creonte que, bem prestimoso, coloca os três
cavalheiros num lugar privilegiado da grande mesa retangular que se estendia
para o tal banquete, que seria um evento fechado apenas para convidados neste
restaurante imenso que era o Le Chat D`Enfer, que era um mundaréu de mesas,
cadeiras, e um palco com piano, no qual o ator Flamboyant tocaria naquela noite
após a estreia de “O Enigma” e que seria uma comemoração de mais um feito de
Creonte e seus atores.
Antes de começar a ser servido o jantar, teria uma
apresentação de um ator português com fluência em francês, este que fazia um
esquete temático que poderia mudar com o tempo, e que era sempre escrito por
Creonte, o ator era Quincas Barreto e seu personagem fixo era Phantôme, era o
papel fixo de um fantasma que costumava falar barbaridades, um pequeno número
de comédia, e o texto mudava e poderia voltar, havia um rodízio que dependia da
inspiração de Creonte, Quincas Barreto era ator contratado e exclusivo do Le
Chat D`Enfer, portanto, não pertencia à Seita Gótica e nunca havia trabalhado
nas peças que eram montadas no Teatro dos Vampiros.
Depois da apresentação de esquetes de meia hora do ator que
fazia Phantôme, começa a sessão de piano de Flamboyant e começa a ser servida a
entrada antes do prato principal, e Fantoff começa a conversar longamente com
Creonte sobre teatro e a fixação de Creonte na poesia de William Blake, que
ficara claro em toda a peça “O Enigma” que muito bem impressionara Fantoff.
Quando Fantoff perguntou a Creonte sobre as levitações e
luzes, que Fantoff queria descobrir como se faziam aqueles efeitos especiais,
Creonte disse que explicaria tudo isto após o jantar, e Creonte então pediu a
Fantoff que fosse com ele, após o jantar no Le Chat D`Enfer, para ir junto com
ele e Heloísa de volta ao Teatro dos Vampiros, pois lá Creonte revelaria o
segredo de tais efeitos teatrais que aconteciam no Teatro dos Vampiros.
Todos comem a entrada e é servido o prato principal, a
Senhora das Trevas, que tinha o nome verdadeiro de Marie Truffaut, que já havia
bebido vinho além da conta, começa a contar piadas infames, e Creonte logo
avisou a Fantoff e seu dois amigos que isto sempre acontecia nestes jantares,
era um hábito da Senhora das Trevas beber e depois contar as suas piadas de
gosto bruto e farsesco.
A Senhora das Trevas, depois de finalizar seu número de
piadas infames, grita para o garçom trazer a sobremesa, e Flamboyant retoma a
música do piano, logo após a Senhora das Trevas sossegar em sua cadeira e
saborear a sua sobremesa.
Ao fim da sobremesa, são servidas taças com líquido vermelho
para os dez vampiros decadentes, Heloísa, Blackstar, a Senhora das Trevas, e
Creonte, eles bebem e Fantoff pergunta, já assustado, o que era aquilo para
Creonte, que repete que todos os segredos do Teatro dos Vampiros seriam
revelados por ele e Heloísa na coxia do teatro, e que seus amigos não poderiam
ver, somente Fantoff, pois Creonte, depois da longa conversa com Fantoff,
percebeu que este curioso dramaturgo lhe poderia ser útil em seu Teatro dos
Vampiros.
Terminado o jantar, Creonte, Heloísa e Fantoff seguem,
somente os três, para o Teatro dos Vampiros, que se encontrava fechado, o
último a sair depois de feito todo o alvoroço da estreia de “O Enigma” tinha
sido o contrarregra Lemort.
Creonte era um dos que tinham as chaves do teatro, que
pertencia ao empresário Leon Blanc, que não havia ido à estreia, pois estava em
Toulouse, numa temporada de descanso com sua mulher, Mademoiselle Nuit, e que
retornariam na sexta seguinte para assistir à segunda apresentação da nova peça
do gênio da Seita Gótica, o autor Creonte.
Os três chegam ao Teatro dos Vampiros. Creonte abre o teatro,
eles entram pela plateia, seguem em direção ao estrado e entram na coxia, lá
haviam garrafas com líquido vermelho, e Fantoff toma um susto, pois havia os dois
corpos das jovens sacrificadas no estrado na coxia, com lençóis pretos cobrindo
as partes destes dois corpos, eram então exatamente as jovens que haviam sido
devoradas durante a apresentação da peça.
Fantoff fica em pânico, achava que as mortes tinham sido
cenográficas, tenta fugir, mas Creonte tinha trancado a coxia, Heloísa pede
para Fantoff se acalmar se ele quisesse descobrir o segredo do Teatro dos
Vampiros. Heloísa começa a acariciar Fantoff, lhe aperta as partes, Fantoff se
excita. Creonte acende seu narguilé de ópio e começa a fumar, Heloísa pede para
Fantoff se aclamar novamente, ele começa a relaxar, Heloísa começa a fazer sexo
oral em Fantoff, ele tem um orgasmo, então Heloísa se levanta, pede para Fantoff
se sentar numa poltrona confortável que havia na coxia e morde seu pescoço,
bebendo parte de seu sangue que circulava na veia aorta.
Fantoff, depois da mordida de Heloísa, entra numa espécie de
transe onírico que o leva a ter delírios e alucinações durante uma hora, ele
não entendia o que estava acontecendo, Heloísa fala para Fantoff permanecer
sentado na poltrona e disse novamente para ele se acalmar que Creonte
explicaria tudo após passar o efeito entorpecente da mordida que Heloísa lhe
havia dado.
Fantoff, durante seus delírios e alucinações, olha para
Creonte, olha para Heloísa, depois olha para os dois corpos das jovens mortas
na coxia, pensa em suicídio, pensa em matar Creonte, pensa em esquartejar
Heloísa, mas ele não controlava a sua própria mente e só rezava para aqueles
efeitos entorpecentes passarem logo e que Creonte lhe explicasse logo o que
diabos era tudo aquilo.
Termina o efeito da mordida de Heloísa depois de passada uma
hora em que Fantoff delirava e tinha alucinações, em meio a ideações suicidas e
de assassinato. Creonte vai em direção à poltrona em que estava sentado Fantoff
e diz que Fantoff agora pertencia ao Teatro dos Vampiros.
Fantoff ainda hesitava em entender, e Creonte disse, enfim,
para que Fantoff não tivesse dúvidas, que Fantoff virara um vampiro, é quando
Fantoff quase desmaia de choque, e diz que aquilo não existia, que ele deveria
estar sonhando, e Creonte lhe dá um beliscão na cara e diz que a mordida de
Heloísa tinha sido a mordida de uma vampira, era tudo verdade, Fantoff agora
teria que beber sangue. Fantoff fica indignado, pensa em sair dali
imediatamente, mas Creonte disse que já era tarde, que os dois escreveriam uma
nova peça em conjunto, e que Heloísa seria a estrela deles.
Fantoff, depois de mais uma hora, e de ouvir as revelações de
Creonte, tudo sobre levitações e luzes, por exemplo, não eram efeitos especiais
de teatro, mas fenômenos mediúnicos adquiridos por todos que eram vampiros, e
que o primeiro vampiro deles era Leon Blanc, o dono do Teatro dos Vampiros, que
mordeu Creonte, este mordeu a Senhora das Trevas, que mordeu Blackstar e este
mordeu Heloísa, que se tornou a principal mordedora do grupo, e que foi uma das
fundadoras da Seita Gótica, junto com Blackstar.
Blackstar, por sua vez, criara o grupo dos dez vampiros
decadentes que, ao conhecerem Blackstar e saberem que ele era um vampiro,
pediram para serem mordidos, pois antes de conseguirem trabalho no Teatro dos
Vampiros, estas figuras eram seres da rua, não tinham paradeiro ou aonde cair
morto, e virar uma equipe de vampiros subalternos de Blackstar no Teatro dos
Vampiros, seria tanto um lar, já que havia uma casa de dois andares anexa ao
teatro aonde eles forma alojados, como uma oportunidade de trabalho.
Fantoff ouve toda a história de como surgiu o Teatro dos
Vampiros e fica chocado ao descobrir que as duas jovens tinham sido
assassinadas em cena, e que aquilo já se repetira em todas as apresentações do
Teatro dos Vampiros.
Fantoff logo percebe que acabara de entrar num seita de
assassinos, mas sente sede, muita sede, ele pensa querer água, mas Heloísa
esclarece para Fantoff que a sua sede incontrolável e súbita era por sangue e
que ele teria que beber o sangue de um dos corpos que ainda estavam lá na coxia.
Fantoff pula em cima de uma das jovens mortas e morde o
pescoço, o sangue já frio de um cadáver de cinco horas atrás, que lhe sacia
momentaneamente, ele precisaria beber o sangue que estava no estoque,
conservado, e Heloísa traz uma garrafa, enche uma taça com sangue conservado, e
finalmente Fantoff aplaca a sua sede.
Leon Blanc e Mademoiselle Nuit voltam na segunda-feira,
Creonte apresenta Fantoff ao empresário do Teatro dos Vampiros e logo diz a
Leon que este agora era um deles, mais um vampiro, e o melhor, era autor
teatral, e que Creonte já maquinava criar uma nova peça com a colaboração de
Fantoff.
Leon Blanc ri docemente, bebe uma taça cheia de sangue e
oferece uma taça também para Fantoff, que já se acostumando a sua nova condição
vampiresca, bebe a sua taça, enquanto isto, Mademoiselle Nuit, num lugar
recôndito do Teatro dos Vampiros, faz seus estudos de ópera, soltando trinados
e melismas ainda com traços toscos de quem estava aprendendo os rudimentos da
voz operística.
Leon Blanc então encontra Blackstar, que chega à tarde no Le
Chat D´Enfer, para resolver algumas coisas práticas, pois era ele que fazia a
administração do restaurante, deixando Creonte cuidar da parte artística, com o
palco com piano, detalhes visuais do restaurante e as montagens de esquetes com
o tal ator português que se apresentava lá toda sexta de noite.
O jovem ator Flamboyant, que também era músico, ia
eventualmente tocar piano lá, mas havia muitos pianistas que eram contratados
temporariamente e se revezavam durante semanas ou meses, com Flamboyant sendo
uma espécie de convidado especial, geralmente quando se faziam os encontros
fechados da Seita Gótica.
Leon Blanc conversa longamente com Blackstar, e depois se
dirige novamente a Creonte, que chega ao restaurante, vindo do teatro, junto
com Fantoff, e Leon Blanc chama Fantoff e diz que ficara muito contente em
conhecer seu novo autor teatral e que aquilo tudo daria muitos frutos.
Leon Blanc percebera a inteligência ardente de Fantoff, com
uma curiosidade mórbida que o levou à coxia para ser mordido por Heloísa
somente para poder descobrir os segredos que habitavam o Teatro dos Vampiros e
a sinistra companhia de atores, a Seita Gótica. Leon Blanc logo se afeiçoa a
Fantoff e todos que estavam naquela tarde no Le Chat D`Enfer combinam que
estariam na segunda apresentação de “O Enigma”, Blackstar, claro, representando
Claude Gerome.
Fantoff, na noite anterior à segunda apresentação de “O
Enigma”, na quinta, se encontra com Lancaster para discutir sobre teatro, e
acaba o convidando para ir ao Le Chat D`Enfer, lá eles vão e acabam encontrando
ao acaso Blackstar, que estava lá cuidando de gerenciar algumas entregas que
haviam chegado ao restaurante, que eram o material de limpeza, material para
obras, e muita comida e bebidas.
Blackstar decide, um pouco depois, já tendo resolvido a
acomodação das mercadorias e dos materiais com os funcionários da cozinha e da
limpeza, se sentar junto com Fantoff e Lancaster.
Os três bebem vinho durante umas três horas seguidas, chega
tarde da noite, Fantoff e Lancaster se despedem de Blackstar e eles saem do
restaurante para ir cada um para suas casas em Montmartre. No meio do caminho,
Fantoff tem uma crise de sede, ele precisava de sangue, tenta morder o pescoço
de Lancaster, que não entende nada, fica assustado, e pergunta se Fantoff
estava ficando louco, Fantoff começa a emitir uma luz azul escura de sua face e
Lancaster acha que estava tendo uma alucinação e acaba desferindo um soco na
cara de Fantoff que cai desacordado no meio da rua.
Lancaster não quis saber, e saiu deixando ali no meio da rua,
desmaiado, Fantoff, que acaba sendo socorrido somente na manhã seguinte, por um
guarda, que o leva, junto com dois bombeiros, para um hospital em Montparnasse.
Fantoff é avaliado neste hospital, e um psiquiatra acaba
afirmando que Fantoff precisaria descansar por duas semanas, os três primeiros
dias em observação no hospital, e o resto destes dias de repouso em sua casa em
Montmartre. Mas, Fantoff percebe que estava entrando numa cilada, e acaba dando
um jeito de fugir do hospital na sexta de noite, para conseguir ver a segunda
apresentação de “O Enigma” e arrumar algum sangue fresco no Teatro dos
Vampiros.
Fantoff chega ao Teatro dos Vampiros, esbaforido, uma hora
antes da segunda apresentação de “O Enigma”, lá está Creonte, já sob efeito
profundo de seu narguilé de ópio, aparece Leon Blanc, Mademoiselle Nuit, a
Senhora das Trevas, Blackstar e os dez vampiros decadentes, Flamboyant, Susanne
Flammarion, Heloísa, Jean Torreau.
Também estavam no Teatro dos Vampiros duas jovens que
possivelmente seriam sacrificadas naquela noite e estavam ali sem saber em que
armadilha tinham entrado, seduzidas por Blackstar, que sempre fazia isto para
conseguir material para os holocaustos de sangue praticados no Teatro dos
Vampiros.
Também chegaram parte da companhia da Seita Gótica que não
fazia parte da peça “O Enigma”, como o autor Pierre Jolie e sua esposa Juliette
Blanchet, atriz da Seita Gótica, ambos que faziam a preparação para a peça que
sucederia a temporada de “O Enigma”, que seria o monólogo sobrenatural para
declamação de Juliette Blanchet de título “O Voo”, escrito por seu marido,
Pierre Jolie.
Também estava no Teatro dos Vampiros, naquela noite, o contrarregra
Lemort, que logo Fantoff descobre que também era um vampiro, assim como todos
da Seita Gótica e todos que trabalhavam no Teatro dos Vampiros. Fantoff vai,
por alguns instantes, para a coxia beber sangue junto com Leon Blanc, que
oferece uma taça com o melhor líquido sanguíneo do estoque do teatro para
Fantoff, pois Leon Blanc já sabia que Fantoff passara por apuros e precisava se
refrescar um pouco para ver “O Enigma” já saciado.
Todos os principais convidados ficam nas laterais de luxo, os
atores que iam se apresentar vão para seus camarins, depois se dirigem à coxia,
lá Creonte, minutos antes de começar a peça, já acabara de sair de seu camarim
individual, que servia somente para ele se empanzinar de ópio antes de ver suas
criações teatrais em atividade.
Creonte era o autor mais criativo do Teatro dos Vampiros, mas
também o mais junk de todos, vivia constantemente sob o domínio onírico de seu
consumo industrial de ópio, mais do que seus surtos de sede, que era um sintoma
que ocorria a todos os vampiros.
Os surtos de sede dos vampiros, por sua vez, ocorriam em
lapsos de tempo variáveis para cada vampiro individualmente, estes surtos de
sede de sangue tinham diferentes gradações de intensidade também, e entre os
vampiros entre si, uns tinham mais surtos que outros, e as intensidades eram
bem variáveis, a que mais surtava e que mais tinha mordido gente na Seita
Gótica era, disparado, Heloísa, e era a atriz, por conseguinte, que dominava
com mais intensidade os fenômenos mediúnicos de levitação, brilhos
sobrenaturais e episódios de êxtase místico.
Começa o espetáculo de “O Enigma”, e no desenrolar do
primeiro ato, na hora exata em que mais uma jovem seria sacrificada no estrado,
de súbito, uma batida policial invade o teatro, eram cerca de cinquenta
autoridades, que entram colocando o público para fora e interrompendo a peça.
Creonte, que estava na área lateral de luxo, desce correndo,
mesmo num transe onírico de ópio. Blackstar desce do estrado para enfrentar os
policiais e acaba sendo contido por cinco autoridades, e o chefe de polícia
disse que tinha um mandado feito por uma denúncia anônima, ele afirma que ali
no Teatro dos Vampiros eram realizados rituais satânicos, beberagem de sangue e
assassinatos, que algumas das famílias das jovens que foram sacrificadas no
teatro tinham sido informadas no dia anterior da batida policial que tais
jovens possivelmente tinham sido sacrificadas durante as peças realizadas no
Teatro dos Vampiros.
O Teatro dos Vampiros cremava os corpos após um dia dos
sacrifícios. Contudo, nesta noite de sexta, os policiais entram na coxia e
salvam as duas jovens que seriam sacrificadas. Uma das jovens é retirada do
palco, e a outra, que estava amarrada dentro da coxia, é libertada, e todo o
estoque de sangue é confiscado.
Toda a companhia de atores e autores, incluindo Leon Blanc e
Mademoiselle Nuit, todos são algemados e presos. No dia de sábado, após a noite
em que a polícia entrou no Teatro dos Vampiros, o estabelecimento é interditado
para investigação, que dura um mês, e é concluído que se tratava de uma seita de
vampiros, a notícia que sai no diário parisiense é “Noite dos Vampiros vira
caso de polícia”, e outra manchete “Vampiros assassinos são presos”.
Neste um mês de investigações, com todos os vampiros presos,
incluindo Fantoff, eles agonizam de sede, pois não havia sangue para consumo,
tinha sido tudo confiscado. Heloísa, Blackstar, Fantoff, Flamboyant, Leon
Blanc, e todo o resto dos vampiros começam, primeiro, a enlouquecer, e depois
de um mês, começaram a sofrer de inanição, em questão de três meses, todos sem
beber sangue desde a interdição do Teatro dos Vampiros, foram morrendo, e em
questão de seis meses, todos estavam mortos por inanição, dominados pela
loucura.
Conto pronto em 20/08/2020
Contos Psicodélicos – Volume II
Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
Blog : http://poesiaeconhecimento.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário