PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

SESMARIA

Logo a noite fugirá em meu espectro de morte,
tez de alabastro, como o mago
inquieto que dorme na passagem
de Caronte.

Eis, que o novilúnio, contemplando daqui,
requer o espírito clarividente,
em todo o seu esplendor.

E o sol fervente,
dentro do coração amassado,
ressurge como a glória faustosa,
retoma os direitos
ao corpo inerme,
soterra a paixão de caldo viril,
solfeja uma atração gravitacional
entre os sexos astutos
de filosofia,

delimitei este campo fértil:
quinze mil côvados,
tenho talentos e dobrões
aos montes,
do templo à arca,
tudo medido em ponta de cimitarra,
das terras que conquistei,
guarnecidas de maná
e bebida forte.

09/10/2014 Êxtase
(Gustavo Bastos)


FATOS COTIDIANOS

Eu andava pelos jornais, na feira o bruto gritava,
como é o mistério da fruta teu doce e sombra,
e levo umas maçãs, com poções de laranja,
retiro uma nota amassada,
não tive o despeito de me armar
de moedas,
o pastel estava no grau de queijo e carne,
perfeito como um chinês.

Eu li, recentemente, que do sal à pressão alta,
com todos os doces e salgados,
um urro nasce no sangue
que entope as veias
e dá um susto no coração ...
(papo de colesterol)

ah, meu coração é herói,
desses que tem o pão na manteiga
como uma glória na aurora,

e toda a estapafúrdia mania
do café pós-bêbado
de que tanta taça derramada
me deixa ao isqueiro, à mão,

e o fogo ascende,
transcende,
no bafo filosofal
dos cigarros
de meu peito roto
de minha voz trêmula
de gozo.

09/10/2014 Êxtase
(Gustavo Bastos)

MANSARDA-INSTALAÇÃO

Quero é estar no brando fundo olor,
de terra abismo concentrado,
cheio da areia
das infindas
brumas espumas
à boca, sedenta
e pacífica,
como um grande anelo,
que da sede devora
o mundo,
e da fome
bebe
a ilusão,
quero ser o pendor imaginário
de minha razão,
estalando de frio
no frontispício
de um lar de girândolas
com amurada
grafitada
de dentes,
corpos,
fogo,
letras estilizadas,
com estêncil, spray,
tinta bruta,
e metal em pó.

08/10/2014 Êxtase
(Gustavo Bastos)

VOLTEIO DE GIRO

Lembra-te de teu karma,
feito brasa
o corpo
é úmido,
quente,
feito água,
de tez mórbida luminescente,
creia em ti
como uma abóbada,
reta circular
de redundâncias,
eterno retorno,
volteio
de estrelas,
cosmos ignoto
de cores plúmbeas
como é o ardil
que desanca
a poemar.

08/10/2014 Êxtase
(Gustavo Bastos)

FRAGMENTO RADIOFÔNICO

Trecho 1:
corrói de cima para baixo
o meu peito
o senhor dos poemas
e suas astúcias.

Trecho 2:
a inteligência conceitual
não se comunica
à massificação ignara
dos exemplos fúteis,
falar da realidade
requer ideias,
e a cabeça só sai de si
com o verbo já
tendo enlouquecido.

Trecho 3:
o rádio emite o som
intermitente
comprimento de onda
lâmbida frequência
de amor
como um sussurro.

Final:
o ato poético
é o olho nu.

08/10/2014 Êxtase
(Gustavo Bastos)

AZUL COBALTO

Como se era eterno jovem,
já velho, no entanto ...

quanto revés de si ao mundo
e a sorte estampada
no oco da figura,
bem vestida,
bem apessoada,
sim, fundamental.

Quem, da penumbra,
sabe dos meus olhos?
Se ali há fogo e encanto,
e o fundo de lágrima
e ódio?

Ah, como era o amor náutico?
Ah, como foi teu pudor e obscenidades?
Se é químico, líquido, aquático?

Ai, que de fundo psicótico
cai meu indolor azul cobalto,
febre amarelo pastel
de âmbar
e fuligens
de escapamento.

Dói ver o semblante triste
do poema,
é de terra e areia
a praia mais dormente,
de beira relaxada
com a onda lambendo
meu corpo
de sal.

08/10/2014 Êxtase
(Gustavo Bastos)