PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

sábado, 27 de outubro de 2012

O CAMINHO MÁGICO

Encontro a mim mesmo
no caminho,
pergunto à fada da curva
qual é a mensagem.

Do outro lado,
um duende maldoso
com as suas astúcias,
dele faço que não me
importo,
o poema na curva
da fada eu traço.

Caminho de mim mesmo,
pergunto ao meu duplo
de um futuro distante
como ele está,
ele sorri radiante
e eu não entendo
o porquê,
eu me vejo no espelho
e procuro
na minha face
a essência
de uma alma
que mal conheço
ou explorei.

27/10/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)

A REFEIÇÃO DO MAR

O nardo reverbera no mar
com o descanso das ondas,
o lírio e o diamante
correm em silêncio sublime,
com os relógios que
se fundem às bússolas
eu sonho com o meu
porto seguro,

dama delicada
que surge
em seio farto
de seu mar e sal,
de seu coração
enlevado
de amor pelo meu
poema.

Diante do sol
que aterrisa
como um sonho,
eu vejo nenúfar
e pedra estrelada
de lápis-lazúli,
um caldo de berilo
e um jaspe
na flor do jasmim.

Nas ondas refulgentes
em temor de navios,
luta o peixe
com o arpão,
luta a miragem
com a ilusão,
e os pescadores
buscam
suas redes
como antevisão,

a mesa será farta
com a dor exaurida
do arpão,
um bom guisado
de indolor caça
para os que
comem,
e de dor devoradora
para os espinhos
que sobram
da vida do peixe,

outra noite estará
o pescador
nos dentes do tubarão,
a vingança do mar
em onda bruta
também faz a sua
refeição,

as carnes duras
na boca do tubarão,
o mar salgado
que silencia
no verão.

27/10/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)

VIDA

   Dei um murro no corpo das belezas interiores, como um chacal faminto que urra na montanha dos prados e confins de campos pela noite. O instante nobre do vinho nos dá o sentido da vaga em minhas entranhas, olhos de sal na dor dos antigos poetas.
   Como é a dor na vasta poesia do sol? Como andar certo pela via da morte? O que resta a dizer senão terrores fúnebres em cantos de salvação? Como estarei salvo? Onde há o altar em sacrifícios de sangue?
   Eu tenho o mapa da fuga para Meca. Eu vejo a planície se abrir no deserto do Saara, eu tenho em minha alma a miragem que sonhei em noites de acampamento pela selva dos meus amores. Eu tenho o meu amor, ela está salva, e ela me salvou! Tenho fé em todos os ritmos de minha pena, tenho ódio em todas as quedas que não julguei, tenho o silêncio nos meus oráculos de profetismos de Cassandra. Eu sou a nuvem que honra a tempestade em notas de profundo temor, eu tenho a chama violeta nas horas desejadas do cadafalso no qual não dormi, eu matei o selvagem que olhou meu coração, eu honrei todas as damas que amei.
   Não há irmão meu que não me tenha em bom apreço, os tenho em mim como medalhas no meu peito, vejo a inocência de seus sonhos como os teria tido, e os vi em sucesso por meu desejo febril, eu andei pela estrada com o vigor de um cavalo a galope, senti cada fogo de meu verso em tons de melancolia, tudo matei do que não me servia, visionários, eu estava na noite azul dos ataques inesperados, não voltei à cena do crime não consumado, pois Deus fez do crime a sua vingança, e eu me vinguei com as mãos divinas. Tudo de poetas e poesia eu tomei ao meu talante, depurei todos os odores das palavras, remontei todas as astúcias de acordo com o sentimento nobre da arte que moldei em trabalho duro e incessante, assinei com o meu sangue o dia e as horas em que fiz todas essas andanças, a minha pena não descansa, a tudo responde com morte e vida, esperança de eternidade e fundo riso de comédia.
   Lembrei das amadas flores que deitaram na praia vermelha, na hora do recreio das almas desamparadas, eu lutei pelo amor verdadeiro que eu creio, eu creio no amor libertador, como um anjo que desce ao meu peito e me alivia das caçadas em que me metia. Eu honro esta mulher como o firmamento em que descanso os meus olhos e minha alma, eu a tenho para o repleto sonho de verão, para a salvação que a alma adora e louva, para que nada tenha sido em vão! O Espírito está comigo, e eu a tenho em espírito, do corpo só o prazer, da alma a eternidade que sobe para o sol místico, o amor é uma dança de corações solitários que se apegam, o acordo de almas é a dança funda do coração, tudo está nas mãos divinas que me salvaram e me levam a este amor, eu creio, e muito tenho buscado, uma busca insana que se joga no mar revolto, e que retorna na praia calma da aurora, eu vejo a aurora, eu sinto a forma bela com que a canção será composta, o seio do mundo receberá o sonho infinito que derrama da pena, tudo por um amor que nos dá o sentido que tanto queremos, que tanto lutamos, que tanto fugiu numa noite ao luar, eu vejo claro a sanidade com uma festa nos olhos que se veem, que não se perderam de todo, que se encontram novamente neste todo que chamam vida.
   A luta que invade as trevas passadas são ódios ancestrais de palcos mortos com a chama que exauriu de padecimentos sem fim, a lágrima não valeu um níquel deste coração negro que me subjugou, não tenho nenhuma lição nobre em ficar na masmorra com os dentes em transe e a dor do mistério de se aproximar da morte, não olho o estrelato com paixão, a paixão horrenda com febre e desespero não me mataria, mas foi por pouco, o instante transfigurou-se em anjo na hora do fogo eterno, e o inferno recebeu a inveja rindo do fracasso de um verme cego e corroído, nunca se teve tanta inveja na poesia, a História definiu os poderes para quem tem e não para quem quer, e a pena ficou viva em pranto de dor subjugada pela mentira que a partiu ao meio em puro horror, a revolta cresceu em dores extasiantes, a lágrima correu como rio em todo o tempo de espera, as armas ricocheteavam no pensamento devorado pela dúvida, mas a justiça e o amor de verdade nos salva, eu salvo o meu amor e o meu amor me salva, não tenho medo dos derrotados, a nuvem passa e os versos ficam, toda honra do mistério é um fogo que nos dá a vida em toda a sua plenitude, não há juiz que faça da morte a justiça, pois a vida é que é justa para quem nela crê. O amor não é metafísico e nem corpóreo, é só uma conversa tranquila entre corações que se conhecem e que se entendem, não há mistério e tudo se explica com o próprio valor da vida, o fundamental está manifesto, os olhos vão ver, e os corações vão na valsa como se nada mais importasse. A poesia pode estar certa, a certeza é a alma que reconhece o que há de eterno em cada instante, muitos passam cegos, sorte dos que têm olhos para ver, destes são o mundo, e o mundo e a vida são fiéis par aqueles que creem. O sol está nascendo, e o caminho é de luz, luz que não se explica, o sol está nascendo, e a luz ilumina tudo, eu vejo, e agora tenho a razão como sustento de minha visão, eu vejo e nela creio. O amor é o instante que é eterno, a cura de todo deserto, quando a vida se torna música e o sol vem mais para perto. O coração se eleva e a poesia se revela. A flor está no jardim da esperança e a canção brota com verdade. Verdade que tudo muda, verdade que nos faz ver.

27/10/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)

  

terça-feira, 23 de outubro de 2012

EUDAIMONIA (PARTE III)

[soneto alexandrino]

Canta o rouxinol na beleza das mortalhas,
com os concertos tão maviosos nas folhagens,
que crescem poetas sãos nas flores tão violáceas,
e sinto espanto no amor lívido em miragens.

Encanta o frio lento em canção de mãos pesadas,
em leves pés no chão que encontram luz de poeta,
e o farol sonha no estro virgem das lufadas
onde se diz voltar o tempo da voz quieta.

Vinha dormente em paz com o dia, dor sofrida
nas ribanceiras dos rios negros como espadas,
cortando a raiz pobre e florida que vem hirta,

E que nos dá bruma em desejos de sedentos,
quais desesperos vis na queda em plagas largas,
pois se viveu morte em viventes loas de ventos.

22/10/2012 Sonetos da Eternidade
(Gustavo Bastos)

O DIAMANTE DO CORPO

[soneto decassílabo sáfico]

Pensar é lúdico ritual do tempo
que se faz no caminho livre e torto,
como dançar a valsa viva regendo
uma ode alegre com o vinho absorto.

Penso o dia mais duro de viço intenso,
e crio temor ao vale fundo e frio,
com ares de montanha bruta em vento,
qual liga forte e dita pedra e vidro.

Quebro-te toda, diamantada estrada!
Que não levou meu corpo e mente morta,
mas deixou leve o poema que chorava.

O tempo vira na canção de brio,
com sol e céu total que nos revolta,
enfim ficando na dor o vazio.

22/10/2012 Sonetos da Eternidade
(Gustavo Bastos)

GALOPE EM BRIO

[soneto decassílabo heroico]

Ouço gritar o rito das valquírias
num mar de sal ao vício dos cavalos,
e olho lânguido brilho nos meus passos
como morte e terror nas vãs desídias.

Eu canto o estro vil com as perfídias,
ventanias e mortais dias de vassalos,
com correria e pujança em tons devassos
na carne da égua livre em flores pífias.

Vai o cedro do portento viril trote,
como forte em veloz tiro e galope,
honrar as nossas luzes por labor.

Vejo o céu da cor negra do corcel
em tropas de guerreiros de valor,
que morrem de vigor com brio e troféu.

22/10/2012 Sonetos da Eternidade
(Gustavo Bastos)

POEMA DA CHUVA

gota  gota  gota
gota  gota  gota
gota  gota  gota

cai a chuva

água
água
água
         escorre no chão
                              desce
                 ao subsolo
cai a gota
        gota
        gota
               da chuva   chuva   chuva
                    chuva   chuva   chuva
                    chuva   chuva   chuva

cai um raio              trovão
             raio          trovão
               raio      trovão
                 raio  trovão
                  (luz-som)
                    chuva

a tempestade a tempestade a tempestade
                         chove
                         chove
                            a
                          gota
                        líquida

20/10/2012 O Horizonte Opaco
(Gustavo Bastos)

EU É UM OUTRO

Se penso não sou.

A coisa muda é mais
autêntica,
ela mesma,
um itself
primário
que resume
o em si
dela mesma.

Se penso não estou.

O tempo é este do quero,
a vontade é esta mecânica
que se frustra no tempo.
O tempo é o maior chiste
dos desejos.

Penso, logo existo?

Não sou neste que pensa,
sou neste que escreve,
se penso me esqueço,
 se sinto, padeço.

O mundo enlouqueço.

A coisa reivindica tudo,
e a escrita mostra
o dizer em sua indefinição.

20/10/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)

CORPO NO MAR

Singrar o mar como sangra o corpo,
singrar o corpo como sangra o mar.
O mar do corpo é um corpo no mar,
o mar é todo no teu corpo ao luar,
o corpo se afoga no mar,
o corpo mergulha no mar,
eu sangro o mar que singro,
eu sinto o mar que pressinto,
o corpo baila como canta,
o mar é a canção do bailado,
meu corpo é o mar do meu sangue,
meu mar é a singradura
do instante.

20/10/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)

HISTÓRIA DA ÁRVORE

Rés-do-chão me toma,
o caule sustenta
a copa de tal filosofia.

Consumo os livros que vieram
de meus amados caules,
saboreio a palavra
de minha amada copa.

A raiz é tão sábia,
ela está no âmago,
ela está onde o solo
a recebe,
e ela desce
atrás de seus
nutrientes,
não desce ao inferno,
ela vai na carne
da terra.

O enigma que a raiz
desvenda ela traz
ao caule
e dele sobe
o assombro
da copa
que se alimenta
de sol.

18/10/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)

FAMÉLICO

Te escolho com canto indolor.
O espanto nasce da dor?
Como será o amor?
Eu quero saber
da experiência mística
de dois se amarem.

Pois quem está são
está errado.
Quem diz "tenho razão"
só pode estar louco.
Quem fere o coração
é um bom poeta,
quem cede ao coração
também é um
bom poeta,
o ótimo poeta,
no entanto,
só tem o coração
para verso,
seu reverso
é a fome.

18/10/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)

GUERRA DA CONSTELAÇÃO

Quando cai do cais
a queda ao solo,
quando o mar afoga
meus olhos
de noites salgadas,
eu vejo o horizonte
na totalidade
de minha experiência.

Vinha de teu sepulcro
grita vida!
Partindo de manhã
para o desconhecido.

Sobrevida de arte
no átrio das vigas,
máquinas que pulsam
enigmas do sol
com febre de espírito
nas almas dilatadas
da alucinação.

Morta está a tua faca,
face a face com o ritmo,
coração na névoa
com canção de fogo,
lutando por toda a eternidade
para a alma exaurir-se
de tanto amor
pela vida!
De tanto êxtase
e tempestade!

Em algum lugar
estará a estrela
nau aberta
da obra
em progresso
de narrativa
solar,
tal o emblema
que segura
toda a constelação
em sua guerra
de mundos
e firmamento.

18/10/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)

O PULSO FINAL

Uma rosa de fogo urdida
na montanha de sol.
Eu espero o sinal da salvação
de minh`alma,
espero o céu vistoso
de todas as vidas,
de todos os solistas
em seus próprios
corações.

Divago no gelo com
o calor da flor,
deliro no frio
com o quente do amor.

Sou ar que inspiro
de minha pena,
vou ao diamante da existência
com silêncio de uma orquestra
na pausa do maestro,

Vou às estrelas, pois vou
sem voltar,
vou aos outros sóis
deste infinito vasto
chamado universo.

Eu passo a entender
o significado do azul,
o sentido de tudo
na paisagem,
e creio na sabedoria verde
da floresta.

Pois tudo que sou
devo ao vinho,
Baco é superior,
a vida transborda
na esfinge
do meu âmago,

Entro na inteligência
do cosmos
como um argonauta
do mar vasto
de eterno
em eterno
até o sentimento
mais profundo
da existência,

A compaixão pela
vida que pulsa
no ardor de um poeta
em luta com suas sombras
de inferno,

O poeta aniquilado
para sempre
que sucumbe
à pena
nos dias
do apocalipse.

18/10/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)