PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

A CONTRAOFENSIVA DOS EUA CONTRA GRUPOS DE RANSOMWARE

“A formação deste Cyber Command se trata de uma contraofensiva do governo dos Estados Unidos contra grupos de ransomware”


Recentemente tivemos o uso de um programa desenvolvido pelo NSO Group, sediado em Israel, por um hacker desconhecido que invadiu iPhones de pelo menos nove funcionários do Departamento de Estado dos Estados Unidos.

Os alvos eram autoridades norte-americanas radicadas em Uganda ou focando em questões relativas a este país localizado na África Ocidental. Este foi o uso mais amplo da tecnologia NSO feita por um hacker até então. 

Antes tivemos uma divulgação de informações sobre autoridades norte-americanas em reportagens divulgadas sobre a NSO, mas ainda não se tinha clareza se as invasões foram somente tentativas ou se obtiveram êxito. 

O NSO Group, contudo, afirmou que não identificou indícios de uso de suas ferramentas nestes ataques, mas decidiu cancelar contas relevantes e fará uma investigação sobre o caso baseado nas revelações das reportagens da Reuters.

O NSO Group alega, também, vender seus produtos somente para clientes ligados à área de inteligência e agências governamentais que aplicam a lei, e estes produtos servem de auxílio para trabalhos de monitoramento contra ameaças à segurança. O NSO Group, entretanto, não se envolve diretamente em operações de vigilância. 

Nos Estados Unidos, por sua vez, com esta onda de ataques de ransomware que, recentemente, têm se aprofundado, o país formou uma unidade de “cibercomando” ou “Cyber Command” que é um contra-ataque voltado para rastrear criminosos hackers e interromper seus ataques.

O “Cyber ​​Command” (Comando Cibernético, em português) é uma unidade de hackers das Forças Armadas dos Estados Unidos que tomou medidas de coibir as ações de hackers que atacaram empresas do país, mas o porta-voz da unidade de comando não especificou as medidas executadas.

O que está claro é que desde o ataque de ransomware ao oleoduto da Colonial Pipeline os militares norte-americanos estão engajados no combate a estas quadrilhas de ransomware, pois há uma disposição de hackear estes criminosos.

As agências de segurança do governo norte-americano aceleraram este rastreamento de grupos hackers, seja no corte de fontes de financiamento destas atividades ilegais como na vigilância destas redes criminosas. Aqui, dentre as medidas, o governo dos Estados Unidos conduziu uma grande onda contra estes operadores de ransomware.

A formação deste Cyber Command se trata de uma contraofensiva do governo dos Estados Unidos contra grupos de ransomware que muitos dizem ter sede na Rússia e no Leste da Europa, o que também inclui fontes que envolvem lavagem de dinheiro com criptomoedas. 

E a discussão diplomática agora sobre a segurança cibernética coloca frente a frente Joe Biden, presidente dos Estados Unidos, e Vladimir Putin, presidente da Rússia. 

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.

Link da Século Diário : https://www.seculodiario.com.br/colunas/a-contraofensiva-dos-eua-aos-grupos-de-ransomware



terça-feira, 7 de dezembro de 2021

A PRESENÇA DA MORTE NOS CONTOS DE EDGAR ALLAN POE

"O enigma final, por conseguinte, se dá nas circunstâncias da morte do próprio autor.”

Edgar Allan Poe foi um contista norte-americano do início do século XIX, e sua criação literária tanto inaugurou caminhos para o filão do gênero policial como do horror que poderemos ver em H.P. Lovecraft. A presença da morte, junto com a figura da mulher, e uma trama que flerta com o fantástico, antecipa tendências literárias, como disse, e coloca também Poe como um contista de grande envergadura e originalidade.

Poe é o poeta de O Corvo e o contista de O gato preto. A obra de Poe foi escrita numa espiral autodestrutiva de alcoolismo e também com a sua morte misteriosa, e aqui, vendo alguns de seus contos, vamos tematizar o modo como a morte aparece neles, sobretudo em seu efeito temático e de estilo, com este ar gótico que trabalha com cadáveres putrefatos e quetais, como o eixo em que se desenvolve a imaginação deste contista.

Em A queda da casa de Usher, primeiro conto da edição de Histórias Extraordinárias, a trama se desenvolve em torno da narração do visitante a esta casa e a descrição triste e gélida de seu morador Roderick Usher, e que teria perdido a sua jovialidade e se enfurnado neste lugar sombrio e sem vida.  Logo vemos os sentimentos de terror do narrador e a sua imaginação ardendo neste cenário em que a sua especulação busca entender algo de um cenário desolador e nada estimulante. 

Esta figura de Roderick lhe causava angústia. No conto ele descreve : “Vi que era escravo forçado de uma espécie anômala de terror. - Morrerei - disse-me -, devo morrer desta deplorável loucura.” Poe aqui já coloca a morte como eixo temático que incrementa o clima de mistério e terror, o personagem acometido deste mal estava em um embate com o seu horrendo fantasma, o medo.

A condição mental aqui se dá na tonalidade da loucura e da morte, podemos ver neste conto a fronteira que leva da loucura à morte, um sentimento de decadência e decrepitude, a tristeza, o vazio. Um sofrimento físico e espiritual domina toda a ambiência deste conto, e Lady Madeline, a irmã deste último representante dos Usher, aqui também aparece de forma diáfana e quase moribunda. O narrador logo é tomado por um estupor. Lady Madeline sofria de uma enfermidade desconhecida. E Roderick Usher, por sua vez, era a imagem da melancolia. 

Contudo, o fato principal do conto se dá quando o narrador nos diz : “uma noite, tendo sido informado, abruptamente, de que Lady Madeline já não existia, ele me manifestou a intenção de conservar o corpo, durante quinze dias (antes de seu sepultamento final), numa das numerosas criptas situadas no interior das paredes principais do edifício.” 

Aqui não darei o spoiler do conto, mas temos aqui a presença pálida e diáfana de uma mulher moribunda e logo a sua associação fatalista com a morte, colocando este eixo temático de Poe sobre a morte também como a sua relação com uma mulher à beira do falecimento e a culminância neste fetiche de Poe sobre enterros e emparedamentos bizarros. 

E temos o terceiro conto de Histórias Extraordinárias, que é o conto O gato preto, o conto que se tornou clássico quando se fala do autor Edgar Allan Poe. Aqui temos, mais uma vez, as obsessões do autor, e o conto tem o narrador que vai do alcoolismo, a uma divagação sobre a perversidade, que não seria exatamente um conceito filosófico, a sua relação com a esposa e seu gato preto Pluto.

Aqui temos a sua narração de agressões a seus bichos, e que culmina no enforcamento de seu gato por ele mesmo e o evento simultâneo de um incêndio que coloca a sua casa abaixo. O narrador do conto então vai para um antro infame, e acaba por ver um gato preto com mancha branca no alto de um barril de genebra ou de rum, o dono da espelunca não sabia que bicho era aquele, o gato segue o narrador, que o leva para a sua então casa. 

A narração do conto se estende rapidamente até uma culminância em que temos, mais uma vez, a morte de uma mulher, que é a esposa do narrador, isto sob a influência de uma peripécia com este gato, e todo o desastre de suas ações impensadas que vão dar, outra vez, no fetiche de Poe entre morte e emparedamento, tal qual “faziam os monges da Idade Média com as suas vítimas”. O desfecho do conto é bem conhecido, e não cabe aqui dar spoiler a quem ainda não tiver lido, muito recomendado para quem gosta de leitura policial e de terror.

No conto Berenice temos o narrador falando da personagem do título que é sua prima, ela é acometida de uma doença rara que a leva à convulsões epilépticas e a cair num estado de catalepsia. O estado cataléptico se assemelha à morte e pode ser confundido com o óbito, mais uma vez, a figura de uma mulher é associada a ideia de morte. 

Poe sempre tem esta abordagem de mulheres pálidas e diáfanas, acometidas de um mal de morte. A catalepsia é mais um fetiche, junto com a fatalidade de emparedamentos. Poe situa a morte em um transe estilístico que se junta ao terror e a tramas fantásticas, a morte tem todo um estilo estrambótico, excessivo, o contista Poe é exaltado em sua ligação de autor com a morte. A monomania do narrador, por sua vez, culmina com um desfecho de morte e catalepsia anunciado no início do conto. 

No conto Os crimes da rua Morgue temos em seu começo a descrição do que se trata uma inteligência analítica, a sua associação tanto com o jogo como com a vida prática no sentido de resoluções e antecipações, o conto que será sobre um crime, terá nesta introdução mais técnica o escopo necessário para o seu desenrolar, que é quando o narrador nos apresenta o personagem Dupin, do qual ele é interlocutor.

Dupin exemplifica este homem analítico. Logo nos deparamos com a notícia do crime de Madame e Mademoiselle L`Espanaye no jornal, e todas as diligências e investigações em torno do caso que tomou Paris, Morgue que era uma das vielas pobres entre a Rua Richelieu e a Rua Saint Roche.

Toda a trama se envolve, primeiro, na investigação oficial, e depois na intromissão de Dupin e a resolução do crime de forma surpreendente e insólita, em que os detalhes se concatenam e de uma aparente ilogicidade de todo o acontecimento intrincado, o conto tem um desenlace que flerta com o fantástico, mas sem apelar para o sobrenatural, mais uma vez, a morte se liga a cadáveres femininos, repetindo o ciclo de Edgar Allan Poe em torno de seu fetiche de cadáveres femininos como a presença principal da morte em seus contos. 

Edgar Allan Poe coloca em Dupin, desta vez, o exemplo de uma inteligência analítica que deslinda o conto sob a forma de um conto policial propriamente dito, ao passo que os outros contos que citei anteriormente são mais de um terror e ligado ao mistério da morte e suas imagens gélidas e perturbadoras. Aqui em Os crimes da rua Morgue, a morte é violenta, também perturbadora, mas ligada à ideia de um crime urbano, isto é, um caso policial, e não mais o objeto de um conto de terror ou de ambiência gótica e sombria. 

O enigma final, por conseguinte, se dá nas circunstâncias da morte do próprio autor. Edgar Allan Poe foi visto delirando na rua, em 3 de outubro de 1849, quando estava numa esquina de Baltimore, usando roupas bem estranhas e amarrotadas. Poe acabou por agonizar durante quatro dias no hospital chamando por um certo Reynolds, e repetindo a frase “Deus, ajude a minha pobre alma”, vindo a falecer.


Gustavo Bastos, filósofo e escritor.


Link da Século Diário : https://www.seculodiario.com.br/cultura/a-presenca-da-morte-nos-contos-de-edgar-allan-poe