O parque foi montado por um grupo de artistas que usavam estêncil, pixo e grafite. Alguns artistas plásticos e de circo se misturaram ao grupo original e veio a ideia de fundação deste parque alternativo de nome “Dismaland”. Dois amigos, Fred e Royce, por sua vez, decidiram ir até lá, pois tinham ido ao famigerado Tívoli, que era meio esquisito, mas o Dismaland parecia o produto de horror cósmico lovecraftiano mais doido do que qualquer trem fantasma fuleiro do terceiro mundo ou montanha-russa com looping em que alguém chame o raul sem avisar.
O grupo que desenvolvia o tal conceito-Dismaland não tinha muito juízo, ao passo que a dupla de amigos era de dois idiotas que falariam merda, provavelmente, durante o tour inteiro pelo tal novo parque de atrações. Fred, um zé buceta de marca maior, e Royce, um pau no cu que não entendia nada de porra nenhuma, sabia alguma coisa de rock, e de resto, sua cabeça era totalmente vazia.
O líder do grupo de artistas que criou o Dismaland tinha o nome artístico de MX-G, que sabia das mecânicas cósmicas, muita bala de menta, gengibre, e roldanas, ritos pneumáticos, gasolina, zigue-zague, noções sobre hidráulica, pichar, pintar, fazer bonecos de vodu, esculturas, envenenar políticos com estêncil etc. Outro dos artistas era uma mulher jovem, de nome artístico La Vendetta, e que fazia serigrafia com roupas, xerox, tatuagens, pintava, fazia esculturas, matava suas namoradas lésbicas em rituais de sexo, ou seja, trocava de parceira, deixando um estrago para trás, não lamentava, fazia música eletrônica, tomava MDMA, e atacava de DJ em festa rave. O terceiro principal do grupo Dismaland, por sua vez, tinha o nome artístico de Chalk Boom, e fazia muito estêncil e era muralista usando spray, além de queimar seus desafetos com gasolina, pois era um racer de primeira.
Sobre o conceito-Dismaland, depois de MX-G se destacar como artista de estêncil na cidade de Mega, sendo herdeiro do movimento de grafiteiros que tinham gerado artistas de galerias como Noam e Phil MC, que também era DJ de hip hop, MX-G era agora considerado um dos maiores da História do movimento que vinha deste primeiro, isto é, o que um dia fora o The Urban Crew, agora tinha um grupo de vanguarda de rua de nome Falcons.
MX-G já estava milionário só com suas intervenções de estêncil e ainda tocava numa banda de Trip Hop de nome Radicals, que tinha ao menos três álbuns clássicos, dois do fim dos anos 1990 e um já em 2005. Agora tinha um projeto paralelo que misturava rap e jazz, num clima psicodélico, de nome Voodoo Lounge, e que tinha lançado um álbum cultuado tanto por hipsters como pelo pessoal ligado ao hip hop, de nome Freedom`s Station, só com músicas instrumentais.
Por sua vez, La Vendetta era empresária de uma rede de lojas de roupas, logomarca que surgiu da evolução de seu trabalho original de serigrafista de estampas, a famosa peita, em que fazia desenhos originais, e também estilizava com nomes de bandas e figuras de personalidades de domínio público. Se destacava também como DJ de circuitos de festas rave, tanto em Mega como nos arrabaldes, como na pequena cidade de Stone, que tinha meio que virado uma Meca tanto para o grime, o UK, mas sobretudo o techno e o trance de eventos de festas rave, uma cidadezinha de sítios simpáticos e que agora vivia alugada para festas gigantes de malucos que vinham tanto de Mega como de fora.
Numa dessas festas, uma das maiores, a Fusion, que tinha edições semestrais num grande sítio de Stone, foi que se projetou o trabalho de La Vendetta como DJ e que retardados chapados de LSD como Fred e Royce iam sem entender o conceito musical, artístico, etc, só para fritar e derreter no meio do gramado. Fred falava sem parar sobre o que ia fazer, e era muita coisa, mas nunca fazia nada, passava a tarde em casa vendo TV, agravando o caso depois que sua faculdade, onde cursava História, ficou 6 meses em greve. Royce era mais playba e ainda não fazia faculdade e tinha reprovado duas vezes no ensino médio, tinha entrado numas de malhar e tomar bomba e parecia um toco de amarrar jegue, com uma cara de psicopata cheirando lança-perfume na última edição da Fusion.
Chalk Boom, por sua vez, se destacava como muralista nos paredões de prédios, sobretudo no subúrbio de Mega e com algumas intervenções conhecidas no centro de Mega. Como racer, tinha ganhado um título de campeão de 500 cilindradas de motociclismo, e depois foi vice-campeão, ficando em quinto na última temporada. Tinha começado nas 200 cilindradas, ficando com uma terceira colocação e um vice-campeonato, isso entre motociclistas de Mega e de fora, e pretendia correr mais dois anos e se aposentar, passando a virar um consultor na equipe Paragon, na qual corria já há sete temporadas nas 500 cilindradas. No seu trabalho de estêncil, só ficava atrás, em influência, sucesso e valor de mercado, de MX-G.
A junção agora de MX-G, La Vendetta e Chalk Boom para o projeto de Dismaland era já uma evolução dos chamados sítios de intervenção que eles já faziam nas edições da Fusion, e que agora vinha como um parque alternativo. Os Falcons, que tinha nascido da costela do The Urban Crew, era um conceito atualizado e contemporâneo do que vinha da vintage coletivista da The Urban Crew, e era um diálogo entre artes visuais e música eletrônica, trip hop de down beats e a cultura geral do hip hop.
A Fusion, organizada por um empresário workaholic do centro de Mega, John Dayton, era a festa mais concorrida e visada das temporadas que ocorriam, sem parar, lá pelas bandas de Stone. John Dayton, inclusive, já tinha namorado La Vendetta, que tinha o nome civil de Mônica Messina, e que depois priorizou seus relacionamentos lésbicos e efêmeros. Dayton vivia à mil, muitos falavam que ele tomava MD, mas era café, guaraná e um complexo vitamínico de neurótico, dormindo três horas por dia, sem ter o costume de tirar folga ou férias.
No grupo do Falcons, por sua vez, que era um coletivo bem numeroso, com uma administração descentralizada, como uma marca, um símbolo comum, que diferentes vertentes compartilhavam em Mega, esse vasto coletivo, consequentemente, se subdividia, tendo então, por exemplo, os chamados núcleos, e MX-G, La Vendetta e Chalk Boom faziam parte do The Movement, um dos grupos principais ligado aos Falcons, assim como o Klaxon, que atuava mais como revista e entretenimento, com uma publicação de música alternativa e eletrônica que vendia bem em Mega e outras cidades.
A revista Frame, a principal publicação do grupo Klaxon, dialogava muito com as práticas do The Movement, e a novidade do Dismaland, em Mega, não passara batido, e era um esforço vindo do The Movement, mas que repercutia por todo o espectro dos Falcons e no cenário cultural da cidade como um todo, chegando também aos ouvidos de Dayton, idealizador e organizador da Fusion, e que agora negociava diretamente com La Vendetta, a secretária executiva de Dismaland, uma primeira edição da festa Fusion no tal parque, e que seria também a primeira edição em Mega.
MX-G, por sua vez, deu uma longa entrevista na Frame, falando sobre as suas duas bandas, as coisas no The Movement, e sobre o Dismaland. “Sei que o Radicals deu uma parada agora, desde o ano passado, e estamos, nós, o Dude, e o Phil L, cada um tocando seus projetos sônicos, bem legal, e muito doido também, pois os caras deram umas deixas na gravação que fiz com o Voodoo Lounge, e minha ideia amadureceu em três semanas intensas, era misto de jazz com hip hop, algo suave e beirando uma psicodelia sônica que está no contemporâneo, longe de cataclismos de Moog datados ou engenhocas valvuladas nostálgicas ou simulacros, para todo mundo fumar maconha e fingir que está em Woodstock, uhuuuh!, e esta coisa toda”. MX-G parecia mais um operário, um mecânico, meio professor pardal, do que alguém muito louco que vivia movido a mescalina, MD e produtos voláteis.
MX-G deu a deixa, quando o repórter perguntou : “É bem ultrapassada esta confusão entre criatividade e consumo de drogas, o que acontece é que tem as histórias da La Vendetta e toda a lenda em torno das raves e das festas da Fusion, e eu ando com ela (La Vendetta), e mistura uma crendice de que todo mundo que é criativo tem que ser muito doido e viver chapado de LSD como se estivesse em Monterrey, lá em 1967 etc.”
A Frame, por sua vez, era uma revista que estava ficando bem popular entre a juventude de Mega e de outras cidades grandes, e tinha virado uma fonte de dinheiro para o grupo Klaxon, que agora tinha um ativo tão forte quanto a inserção do The Movement na Fusion e no projeto do parque de Dismaland, o que colocava o espectro de criação artística de Mega chamado Falcons dividido entre duas vertentes principais, o The Movement e o Klaxon, já chamando a atenção de Dayton, que queria capitalizar tudo e virar um acelerador para aqueles diversos artistas e suas criações, como alguém que vivia numa terra avançada e de oportunidades, pois ele via aquilo como investimento, longe do atraso de jerks empreendedores de milho e de trigo que cultivavam uma relação atrabiliária com a arte desde sempre.
Em Dismaland, por sua vez, era preparada a inauguração do parque. Vindos do Tívoli, os amigos retardados Fred e Royce um dia encontraram MX-G na rua e perguntaram do tal parque, eles meio que ficaram pasmados e puxando o saco, falando das pinturas de estêncil, enquanto MX-G, que tinha trinta coisas para fazer, sorria simpaticamente, falando pouco, até achar uma deixa para deixar os jovens ali, e tocar a agenda para a frente. Uma hora que Royce começou a falar de ácido, MX-G falou “ah, tenho que falar com La Vendetta disso, inclusive, valeu, até mais!”.
A inauguração teria o título de “A viagem do mago”, e funcionaria como uma intervenção-ensaio, e os brinquedos temáticos não foram divulgados, era um segredo bem guardado. Contudo, La Vendetta foi com Dayton para que ele visse as novidades no parque, e ele disse que iria investir naquilo, que era diferente, sem afetações pretensamente infantis, meio horror show etc. Dayton vivia cada vez mais nos bairros boêmios de Mega, e abriu um escritório de sua empresa no bairro de Platina, onde ficava o parque Dismaland e um dos principais ateliês do The Movement, liderados por MX-G e Chalk Boom.
Enquanto isso, no centro de Mega, na área de prédios financeiros, espelhados, Chalk Boom se encontrava pendurado a 60 metros, fazendo um mural enorme, um paredão de um prédio em que ficava um dos principais escritórios de Dayton. Com várias armações empilhadas, equipamentos de segurança, máscara etc, Chalk Boom sacudia um arsenal de sprays, e aos poucos se definia a imagem de um parque temático, era Dismaland, mas numa versão fictícia, com seres alados e um sol psicodélico no topo. Também havia formas geométricas e pós-cubistas que compunham o paredão, em que cores quentes e cítricas dominavam o cenário do que até então tinha sido um pálido paredão cinza claro.
Depois de fazer trabalho de DJ no chamado Festival Rocca, em Stone, que durou sete dias, La Vendetta marcou uma reunião com outros DJs e dois produtores, um deles era da Fusion e a questão era a de montar as tendas da Fusion numa primeira edição em Mega, mais exatamente no mesmo terreno em que ficava o parque Dismaland. La Vendetta disse que depois da inauguração levaria a equipe para visitar o local e estudar junto com um mestre de obras as condições para adaptar a festa dentro do próprio parque. Em comparação ao terreno de Stone, que era de um fazendeiro, e que envolvia um resort e um imenso campo de golfe, o terreno em que ficava o parque Dismaland também era grande, mas comportava um terço do espaço aberto que havia na fazenda de Stone, o que diminuiria o número de pistas temáticas, por exemplo.
Dayton, por sua vez, que era o único de fora da equipe original que tinha visto toda a montagem do parque de Dismaland, faz a inauguração de seu mural no centro de Mega, e Chalk Boom acaba contratado por uma construtora que estava com um imenso condomínio quase pronto para venda, mas que o dono da construtora teve a ideia de contratar o grafiteiro para que os paredões dos prédios fosse preenchido com grafites gigantes, no que Chalk Boom teve que montar uma equipe de vinte grafiteiros muralistas para dar conta do recado, e depois de pronto o trabalho, o tal condomínio foi inaugurado, num bairro novo e projetado de Mega, com extensões enormes, avenidas para todos os lados, de nome Parque Novo, e o condomínio com o nome de Bella Vitta.
MX-G, por sua vez, faz mais uma intervenção política de estêncil, em que o prefeito de Mega aparece em uma caricatura e cédulas voando. Tal trabalho ficava na entrada de um túnel num bairro decadente de Mega, de nome Carmelita, e a divulgação foi feita no dia seguinte no site do The Movement, e que ficou como banner do site por um mês. O prefeito tenta dissimular e convida o The Movement para um trabalho com a prefeitura, além de MX-G ser convidado para um encontro com o prefeito na sede da prefeitura, o que é recusado com um post na rede social, no reply do perfil do prefeito, feita pela arroba do The Movement, com o seguinte recado : “Não”, seguido de um emoji de vômito. Dayton adora, pois sabia que o prefeito era um cara encruado e atrasado, pois celebrar contratos em Mega era enfrentar um cipoal burocrático infinito, e uma súcia de funcionários letárgicos e infelizes que travavam tudo. Dayton dizia que os caras “só faltavam bocejar no telefone etc”.
Chega então o dia da inauguração de Dismaland, e que seria o tal evento temático “A viagem do mago”. Royce e Fred, a dupla de amigos idiotas, começam a se empolgar e separam um ácido para cada um. La Vendetta preparava uma abertura musical e depois uma feira de roupas e acessórios de sua loja, com muitos de seus trabalhos de serigrafia, que agora eram prensados em série por uma equipe, com ela dando as ideias criativas e práticas. A tal viagem do mago se referia, por sua vez, à seção principal de brinquedos de Dismaland, e que seria a primeira apresentação do parque, para depois mostrar os outros brinquedos, que tinham outros temas e pegadas.
Duas horas da tarde de sábado, abrem as portas do Dismaland. O bairro de Platina estava com vários banners de divulgação, além de alguns outdoors com o logo do parque e desenhos, preços, e uma agenda já definida para três meses. Tudo muito rápido, pois a divulgação de datas só foi liberada na quinta, dois dias antes da abertura dos portões, sendo que antes só havia banners com o logo e quase nenhuma informação, além de outdoors propondo enigmas. Jovens, adultos e crianças aparecem. Na entrada estavam vendedores autorizados, pois a organização conseguiu bloquear o acesso de ambulantes, e era tudo linkado com a empresa de eventos que se associou aos produtores e idealizadores do parque, era um ambiente extremamente controlado, bem organizado, com gente experiente, até do que se fazia na Fusion, por exemplo.
A venda de bebida alcoólica era proibida tanto na entrada como dentro do parque, e dentro do parque havia franquias de lanchonetes e um restaurante, além de um espaço com bebedouros e banheiros gratuitos. Tickets para cada brinquedo eram vendidos no local ou por aplicativo, os preços eram bem salgados, mas se tratava de um projeto caro, custoso e ambicioso. Ninguém ali estava a passeio, ainda se tratando do pessoal do The Movement, que já estava tabulando com Dayton, o empresário mais antenado de Mega. Também havia uma franquia em que se vendia doces, pipoqueiros e vendedores de algodão doce, pessoas contratadas com tanquinho de refrigerante, água, suco e mate, além de locais para fotos instagramáveis, com cenários montados e pessoas fantasiadas que trabalhavam no parque.
O pessoal entra animado, e La Vendetta apresenta um set mais pop em relação ao que ela fazia em raves, e consegue lotar a pista, que era um gramado, com caixas de som em cada canto, e depois com as falas de MX-G, a própria La Vendetta e Chalk Boom, além de um produtor, este que também atuava na Fusion, e uma divulgação do The Movement, como a marca por trás da Dismaland, já anunciando a parceria com a festa Fusion e um agendamento que foi apresentado ali na hora.
O set de La Vendetta dura exatamente uma hora, começando e terminando pontualmente, sem enrolação, e o evento segue, tem a abertura dos brinquedos do setor principal, que eram os que estavam ativos, pois havia mais dois setores ainda por inaugurar e um novo que estava sendo negociado para Dayton entrar como investidor, sem no entanto virar sócio, pois não queria interferir nos rendimentos que estavam indo para o The Movement, que também era de seu interesse, uma vez que ele queria tornar toda a Falcon numa pool, como uma aceleradora, mas agora com assessoria e supervisão empresarial.
A viagem do mago começa, eram, dentre diversos brinquedos, um trem que entrava num castelo, e ali se contava uma história fantástica, o mago era um dos últimos bonecos a aparecer no túnel, e se podia escolher itinerários diferentes, juntando um total de cinco enredos diversos quando se entra no túnel e seus acessos laterais. Um bate-bate bizarro, que, entre alguns carros, personagens fantasiados faziam uma bagunça, trollando os outros carros. Um carrossel que parecia um cenário de horror cósmico, com pintura decadente de propósito, uma montanha-russa em que se podia jogar lá do alto vômito de mentira, um plástico verde e uma bisnaga com geleca verde que caía do alto pelos que entravam para o brinquedo, o que tinha o ticket mais caro do parque. Um número de luz e sombras em que aparecia uma bruxa também fazia parte do conjunto de atrações, e no fim era uma correria desenfreada. Um lago artificial que tinha seres míticos e de terror também fazia parte da paisagem, onde o usuário podia usar um pedalinho e tirar fotos daquelas figuras fantasiadas. E num jump principal, de um elevador que caía, que ficava no centro do parque, na frente, se passava uma espécie de teatrinho em que estavam o tal mago e alguns outros personagens.
Por volta de quatro da tarde chegam Fred e Royce ao Dismaland, cada um tinha tomado uma bicicletinha e quando deu cinco da tarde bateu o negócio e os retardados ficaram rindo e falando merda, fazendo comparações esdrúxulas com o Tívoli etc. Fred dizia que “os artistas do Dismaland começaram lá no Tívoli, eu vi, eu era pequeno, e tinha a dancinha da conga hahahaha”, ao que Royce respondeu “não seja idiota, a conga é que começou lá no Tívoli e agora tá que nem uma quenga desempregada hahahaha”. Fred atinou “o tal mago, falaram que ele voa, e ele voa, não é Royce?”, ao que Royce responde “sim, ele voa, tem suspensórios e eletrodos que ficam na bunda dele e ele voa”. Fred pergunta : “E as fadas?”, ao que Royce responde : “Eu vi uma saindo do banheiro, com um quite de maquiagem, ela brilhava de rosa e de vermelho, acho que o ácido bateu hahahaha”. Fred : “Agora a viagem do mago vai durar, e ele tá todo lacrado pela bunda, é um ator! hahahaha!”.
MX-G viu os dois jovens passando e lembrou do dia na rua e pensou “caramba, esses moleques são muito chatos, deixa eu acelerar meu passo”, foi até a administração do parque, que era um escritório que ficava dentro de um contâiner, e lá conversou rapidamente com La Vendetta, pois Chalk Boom já tinha ido embora, pois estava dirigindo a equipe de muralistas do condomínio no bairro do Parque Novo e tinha que encerrar os trabalhos do dia por lá. A conversa foi fechar questão sobre a segurança do parque, pois os brinquedos tinham sido vistoriados e aprovados, os guias eram habilitados, tudo funcionando, no caso restava assinar o contrato com a segurança privada de uma empresa que cuidaria da vigília do parque e contra problemas disciplinares entre usuários de brinquedos, e foi escolhida a empresa, pois a equipe disponível ali no dia era provisória.
O dia segue bem, anoitece e o parque fecha às oito da noite. Fred e Royce entram nos brinquedos todos, tinham tickets para tudo, comeram as bobagens das lanchonetes, o ácido durou até de noite, e no fim Fred disse “o bate-bate, acho que vi um vampiro lá, ele estava com sangue na boca, ele dirigia que nem um doido”, Royce responde “claro idiota, ele era um ator, também tinha prego na bunda dele, para ele ficar lá preso no bate-bate, o sangue era suco de groselha, para ele ficar lá fingindo que era perigoso, mas era a porra da groselha, bebidinha de bambi, hahahaha!”. Fred atinou “hahaha, groselha, bebida de moça, coloca um tang rosa, hahaha, bebe e faz cara de mau, hahahaha, se o mago beber groselha ele vira fada hahaha” Royce responde “se o mago bebe groselha, os suspensórios e os eletrodos que ficam na bunda dele começam a beliscar e ele começa a gritar hahahahaha”. Aí chega um segurança e manda os dois retardados embora, pois o parque estava fechando e já estava tudo vazio.
MX-G, que saiu do contâiner por último, chegou a ver os dois moleques indo embora e pensou “puta que pariu!”, e chegou até o segurança e perguntou se estava tudo bem, sem mencionar os moleques que já tinham saído do parque sem vê-lo. Depois ligou para La Vendetta, Chalk Boom e Dayton e todos comemoram que tinha ido tudo bem e dado tudo certo na inauguração do parque, e que tinha lotado de gente, com uma porrada de tickets, lanches e bebidas não-alcoólicas vendidas, souvenires vendidos, camisas, bandeiras, pôsteres, fotos nos cantos instagramáveis etc. O próximo passo era garantir o tal evento “a viagem do mago” pelos próximos meses até a abertura do setor B e do setor C, para, finalmente, concluir o que seria um setor D, feito em conjunto com Dayton.
Chalk Boom, um mês depois, conclui o trabalho coletivo no Parque Novo e coloca o The Movement para comprar dez apartamentos do tal condomínio, na verdade, com desconto de 75%, feita pela construtora, sendo que ele ia morar em um, e MX-G ia alugar outro, com outros membros da equipe de Chalk Boom alugando ou morando. O caixa do The Movement pingava cada vez mais e eles decidem comprar a revista Frame do grupo Klaxon. Parecia que o movimento era de engolfar toda Falcons, que era descentralizada, e criar uma única administração central, criando uma discussão interminável com Dayton, que queria comprar tudo e fazer um pool, um hub.
MX-G e La Vendetta, principalmente, estavam ambiciosos, mas ao mesmo tempo receosos de dispensar a experiência de Dayton para os negócios. Chalk Boom era a favor do hub e que não queria perder tempo e virar um “homem da maleta” e ficar só com duas horas para grafitar etc. Mas, por sua vez, MX-G, que já estava milionário com sua arte urbana de estêncil, pois era um fenômeno gigantesco, estava pensando em expandir o The Movement e aumentar a sua influência na vida cultural de Mega, comandando e centralizando todos os eventos e intervenções.
Depois de três reuniões, e com MX-G irredutível diante das propostas e sugestões de Dayton, o empresário desiste e disse que MX-G “iria se arrepender etc” pois “não sabia o que estava fazendo e que não entendia nada de negócios”. O tal hub ou pool, então, não sai do papel, e MX-G dá início ao movimento predatório de englobar todos os movimentos que formavam a Falcons e comprar e colocar a nomenclatura “The Movement”, aproveitando para registrar a marca em seu nome, colocando La Vendetta como sócia minoritária, com 33% das ações, ele tendo 51%, e Chalk Boom seria acionista por direito adquirido, com 11%, e os outros 5% com pequenos acionistas. Chalk Boom, mesmo sendo o terceiro maior acionista, avisou a MX-G que não queria saber de assuntos administrativos e que se concentraria em sua atuação em Mega com a sua equipe de muralistas. MX-G então ficou como presidente do The Movement, e La Vendetta como secretária executiva. Dayton, por fim, saiu bufando da última reunião com MX-G, e falou : “cara, você ainda vai se foder”. A esta altura, a tal edição da Fusion em Mega já tinha ido para o vinagre.
Mas o negócio era que tanto o Dismaland como a aquisição da revista Frame tinham sido lances de mestre, e Dayton teve que engolir seu ego de maior empresário de Mega (era o que ele pensava, mas tinha ao menos duas dezenas de empresários tão bons como ele pela cidade). Parecia que o mau agouro de quem se amuou ao ser preterido não tinha funcionado, e La Vendetta, que era ex-namorada de Dayton, ainda encontrava a figura, mesmo sabendo que ele tinha virado desafeto de MX-G, pois agora os dois se odiavam mutuamente, era um caminho sem volta. E MX-G vivia fazendo troça do tal hub, que era para Dayton aparecer, pois não era artista, “não sabia fazer porra nenhuma”, segundo MX-G. Dayton então, com suas empresas burocráticas, pela visão de MX-G, deixaram o empresário na vontade, e pior, quem aparecia era MX-G, com o Dismaland e a Frame.
O que rolava não era um tino empresarial de MX-G, mas a natureza de seus empreendimentos, que atraía muita gente, e a revista Frame, por sua vez, que vendia bem sem nunca ter precisado sucumbir à mediocridade, era uma revista de arte conceituada e que ganhava prêmios. Dismaland, por sua vez, com um conceito ousado, até contra-intuitivo, pois poderia espantar pessoas mais suscetíveis, ficava cada vez mais concorrido e funcionava de terça a domingo, só fechando na segunda para manutenção e faxina. MX-G não era um contador, nem um administrador formado, fazia o que queria fazer, e dava certo. La Vendetta, por sua vez, percebia cada vez mais o ranço de Dayton e conclui que a tese de MX-G era verdade, que Dayton tinha tentado aparecer e não conseguiu, e que devia agora lamentar o fato de ser somente empresário, sem dons artísticos. MX-G ouve a conversa de La Vendetta e ironiza que ela “tinha descoberto a pólvora e que agora podia acender uma pira ou fabricar uma espingarda”. La Vendetta acaba se afastando gradualmente de Dayton, até que o contato esfria e cada um vai para seu lado.
Foram feitas então as inaugurações do setor B e do setor C do Dismaland. O setor B que virou o “Vale dos Fantasmas” e o setor C que ficou com o nome “Os animais fantásticos”. O tal setor D foi um projeto que chegou a ser desenhado em prancheta, fizeram várias versões, mas esta parte do terreno ficaria para um parque aquático que foi arrendado pelo The Movement para um consórcio especialista no tema, de nome AcquaPlay, e ali puderam faturar para outros projetos de arte, sem relação com o Dismaland. O The Movement, depois de expandir a tiragem da Frame, também decide, de súbito, vender a revista, que acaba sendo repassada para uma editora de nome Vecchi, que transforma a Frame, em pouco tempo, num tabloide pop xexelento, enquanto MX-G embolsa grande parte do dinheiro da venda, sem reinvestir no The Movement. Tal venda da Frame nunca foi explicada ou justificada, somente com o argumento de que o “Dismaland teria franquias, os projetos de arte estão se multiplicando etc, mas nada relacionado à venda em si, que foi a morte da revista”.
O fato era que MX-G estava com diversos bens, entre casas, apartamentos, sítios, casa de praia, iate, lancha, residências no estrangeiro, com uma vida de nababo que ele explicava ser da “prosperidade do The Movement e de seus trabalhos de estêncil”, mas a proporção de aquisições de bens e de patrimônio era tanta, que alguns começavam a se questionar. La Vendetta não reclamava, pois também parecia estar se dando bem, e Chalk Boom, que ficava por fora, resolve contratar um escritório de advocacia para fazer uma sindicância das contas dentro do The Movement.
A sindicância conclui que na contabilidade havia desvio no faturamento e na distribuição de dividendos, gastos do Dismaland que valiam uma fortuna que, em dois anos, não caberia nem em cinco parques daquele. Muito do dinheiro eram de notas ocultadas, como recibos diversos, além de contratos em que os valores estavam acima do valor real. Chalk Boom rompe a sociedade e entra na justiça pela indenização de todos os acionários do The Movement, e a treta vira notícia em Mega. Dayton fica sabendo de tudo e manda um recado por telegrama para MX-G, dizendo : “eu disse que você ia se foder”. MX-G fica irado, pega uma motocicleta e vai até o prédio em que Dayton morava com a atual esposa e uma filha pequena e invoca Dayton para descer para ver “quem ia se foder”. Dayton liga para a polícia e grava o recado agressivo de MX-G, repassa como ameaça física, e MX-G é detido, levado para a delegacia e sai depois de pagar fiança.
Depois de uma disputa na justiça entre advogados de MX-G e de La Vendetta, de um lado, e os acionistas lesados junto a Chalk Boom, de outro lado, o processo entra em trânsito em julgado pela condenação de MX-G e La Vendetta por apropriação indébita, desvio de dinheiro no The Movement, falsificação e fraude de recibos, além de serem obrigados a ressarcir os acionistas lesados com uma indenização milionária que, por sua vez, obriga MX-G e La Vendetta a negociar o Dismaland, que depois de um auge que durou cinco anos, sobretudo depois das inaugurações dos setores B e C, desde que começaram as disputas judiciais, tinha entrado em decadência, e agora o que era um projeto criativo de horror cósmico, parecia de fato uma peça de terror decadente, prestes a fechar e ser interditado. A sua venda não dá em nada e o parque vai a leilão tendo um deságio monumental de 70%. O Dismaland é comprado por Dayton, que manda colocar o parque abaixo. No dia em que foi feito todo o desmanche do parque, lá estavam Fred e Royce, de frente ao parque, e de Fred cai uma lágrima furtiva, e de Royce surge um sorriso triste e uma lágrima que sai na hora em que implodem o setor de “A viagem do mago”.
Conto pronto em 08/10/2024
Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
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