PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

quarta-feira, 5 de junho de 2013

NEURASTENIA NA CALÇADA

   Venho observando, aqui em Copacabana, certos elementos da grande fauna do que posso chamar de personagens que eu pude identificar nas minhas andanças pelas calçadas do bairro, e acho que tais personagens estão presentes em qualquer bairro de metrópole. Mas, aqui em Copacabana, eles se tornam evidentes, chegou um dia e tive esse "insight", que é reflexo de muitas caminhadas por aí.
   Geralmente, posso andar apressado pelas calçadas de Copacabana, e eu, como um desbaratinado driblador, identifico, como se fosse numa corrida com barreiras, algumas figuras típicas das calçadas do bairro, que são, por sinal, seres universais da cidade grande.
   Estou a caminho do ponto de ônibus, para ir ao trabalho, e me deparo com o primeiro personagem, o zigue-zague. O zigue-zague é aquela pessoa, que quando você quer ultrapassá-la na calçada (e olha que as calçadas de Copacabana geralmente são largas), elas têm a incrível capacidade de fazer a façanha de pender para ambos os lados da calçada ao mesmo tempo. Ou seja, você vai à direita e o zigue-zague também, numa fração de segundos você vira para a esquerda, e o zigue-zague já está lá, fazendo uma diagonal para o mesmo lado, é um personagem difícil de aturar quando se está com pressa, acabamos indo para a beira da rua para deixá-lo para trás, e o zigue-zague parece que tem um radar que quando surge alguém tentando deixá-lo para trás, eles têm esse "surto de pêndulo".
   O segundo personagem é um coletivo, ou seja, o "fileirinha", ou seja, o grupo de pessoas que andam de mãos dadas fazendo uma horizontal fechando a passagem da calçada, em passos lentos, só para te irritar mais ainda. Os "fileirinha", geralmente, andam em grupos de 3, 4 ou mais pessoas. Os "fileirinha", além de andarem a passos lentos, não têm o desconfiômetro de que, com suas horizontais de mãos dadas, estão obstruindo as vias de circulação das calçadas, mais uma vez a saída é dar uma passada zangada pela beira da rua. Os "fileirinha" são a alma hippie das calçadas, fecham tudo num clima de paz e amor, todos de mãos dadas, como se não estivessem numa cidade grande, em que o tempo é a coisa mais importante.
   O terceiro personagem é o "ziquizira", e este pode ser uma designação minha, um tanto politicamente incorreta, pois se trata geralmente de pessoas já debilitadas ou envelhecidas, que andam a passos de tartaruga nas calçadas, verdadeiras múmias das calçadas. Os "ziquiziras" são parentes próximos dos zigue-zagues, e nem sempre são velhos ou debilitados, podendo ser incluídos nessa classe, também, os malas, lerdos, que andam devagar sabe-se lá porquê. Os "ziquiziras" são mais fáceis de ultrapassar, pois, apesar de lerdos, não fecham as calçadas como os "fileirinhas" e nem pendem para lá e para cá como os "zigue-zagues", podendo, com um raciocínio rápido, serem facilmente deixados para trás. Lembrando que todos nós poderemos ser um desses um dia, mas por pura limitação física, e não por inveterada "malice".
   Outro personagem, talvez o mais irritante de todos, é o "observador" ou o vulgo "poste". Este não está nem aí para a hora do Brasil, é um turista das calçadas, fica no meio da passagem olhando para o nada, ali, paradão, como se não houvesse amanhã, enquanto a roda viva passa por ele, e ele ali, no meio de tudo, pensando longe como uma lesma paralítica. Também são fáceis de serem ultrapassados, pois são inofensivos, e não fazem o estrago incalculável dos "fileirinhas". Mas são também dotados, tais como os "fileirinhas", de total ausência de desconfiômetro.
   Mais um personagem, sumamente irritante, é o "bracinho", ou seja, aquele personagem da calçada que gosta de andar com os braços para fora, nem sempre precisam estar com alguma bolsa, eles ocupam o espaço de outra pessoa na calçada só com um braço, são insuportáveis, às vezes tem que pedir licença, se você estiver numa calçada mais estreita. Também são fáceis de ultrapassar, se você pensar rápido.
   Outro fenômeno curioso e corriqueiro das calçadas é o famoso "chuta que eu chuto", ou seja, aquele momento em que você se depara com uma pessoa na tua frente e você e ele alternam para o mesmo lado pelo menos umas três ou quatro vezes até decidir no par ou ímpar quem vai pra um lado e quem vai pro outro pra sair do impasse e continuar o caminho. Esse fenômeno é bem interessante de como a "Lei de Murphy" funciona bem, quase nunca o "chuta que eu chuto" se resolve rápido, pois a tendência murphiana leva aos dois lados em oposição a tomarem as mesmas decisões simultaneamente provocando tal impasse.
   E o único indulto que faço, eu, o desbaratinado driblador, é com as criancinhas. Posso estar à mil, mas a minha visão periférica é eficiente, criancinhas são as únicas que eu perdoo nas minhas andanças pelas calçadas, o resto são dores de cabeça. Mas, nem sempre estou com pressa, só que, nos dias em que se anda rápido, por aqui em Copacabana, um dia, estava por aí, e uma mulher virou o braço e quase dá uma braçada na minha cara, eu esquivei, e não disse nada, mas deu vontade de xingar e tudo, mas sou um cara, hoje, mais civilizado. E por falar em civilidade, tem uns pedestres na esquina da Tonelero com a Siqueira Campos, ao lado do metrô, que são verdadeiros suicidas, eles passam entre os carros, com uma pressa que, eu, que ando rápido, não compreendo, tem uns ali que, me perdoem, mereciam morrer atropelados, aquela esquina é uma vergonha. Mesma esquina em que, um dia, vi um bêbado deitado na rua, onde passam os carros em velocidade, e ninguém tomava uma atitude, eu, passando ali, levantei ele à força e fiz ele deitar na calçada, isso é Copacabana! Um belo caldo cultural e antropológico.

05/06/2013 Crônica
(Gustavo Bastos)
   

Nenhum comentário:

Postar um comentário