Entrei com olhos de fogo na esteira rolante dos desejos perigosos, um de cada vez com a luxúria do inferno do gozo catando poemas em versos escatológicos. Eu vi a membrana de minha vesícula borbulhar chagas de Cristo numa garrafa de vinho tinto em busca de sonho intenso como fuga na noite em que encontrei o Olho na busca infinita de todas as paixões. Eu pus fogo na minha roupa como vela vermelha acendida com tumores de carteados de boemia e vasta febre de tórridas vidas. Eu velei o meu corpo na anterioridade dos fatos consumados, brigando com a natureza pelo pote de ouro imaginário, eu deti a minha verdade com vísceras de anarquia e testemunhei o abrir do dia como aurora em putas esporradas de faces de nuvem e chuva de porra. Ali, na vinha apaixonada do deserto, eu lutei com falcões na minha genitália, eu lutei com nervos e fraturas expostas como ritmo de Jazz quando pega o cara na vida de uma porrada que mata um tigre. Na noite de caminhos sem fim, os camaradas da faculdade rugiam como idiotas cultuando o óbvio e escalando a academia do saber como bravos operários sem horizontes, na capa de seus livros eu via se repetir um mantra sem sonho na conformidade de suas mentes vazias como um pesadelo de fúria semeada com vigor de estrada perdida, a minha estrada eu não perdi, joguei fora os livros e seus velhos mantras e fui viajar com o esqueleto ardendo com carne e verdade absurda de poema revoltado de tudo e de todos, eu parti numa nau alquebrada com convés de lama e proa de loucura, eu parti para o mundo desconhecido da vagabunda magia de atravessar o poço profundo da alma e encontrar no transe de maconha uma paisagem de xangrilá como um levante de devaneio em meio ao caos da cidade, brigando com mendigos e xingando os carros, avançando sobre a turba e fracassando no fim do dia, remoendo terrores e descobrindo a distância como única passagem para a o infinito.
A vida escapa sempre, sempre queremos a vida, mas a sofreguidão enuncia suas verdades tolas como labirinto sem saída, como fulgor de tédio na tarde dos ternos sem perigo. Eu amo o imprevisível, e numa dessas danças sem roda eu quase entrei no hospício como um ventre sem rumo e como um vomitador de estrelas incompreendidas. A estrela era mágica como uma febre cardíaca de estilhaço de almas, a loucura da vigília me espantava e eu fugia a pé ouvindo rock pesado no volume máximo com horror de tudo como era, com medo das máquinas de tortura e com uma raiva explodindo nos olhos do absurdo. Eu roubava lojas, quebrava janelas, trepava com putas na praia, xingava a televisão, amaldiçoava a propaganda, negava o sucesso, cuspia nos jornais, chegava no fim da noite e dormia na rua, acordava todo empapado de sangue e nem lembrava que tinha perdido a minha carteira com dinheiro e documentos, andava perdido pela nuvem mística dos poetas, desejava ser um profeta da luta inglória, um santo sem vitória, um inseto venenoso, um leão da vida naufragada, um riso escroto de discórdia, um poeta na vida e na dor, um poeta mais que poeta, um poeta que entrou na poesia, uma poesia que fundou o poema total, a víscera total, a lesma contra a ordem e a moral, um divagador sobre o rompimento final e suicida com os costumes milenares, um arauto do livro nunca publicado, um poeta sem apodrecer sozinho na veia virada de noite insone, um anátema que sonha voar num lance doido como ácido lisérgico inoculado diretamente no terceiro olho, um doador de órgãos depois de uma overdose, um guerreiro que odeia a luta do inferno do dinheiro, um amontoado de poemas que se perdem no caminho, um tarado perseguindo colegiais depois de tomar porrada de um halterofilista, um ganhador de loteria que doa tudo para uma igreja neopentecostal, um chorume depois de abortar todos os filhos, um traficante de remédios proibidos depois de uma festa de jovens transviados, um senhor de idade e respeitável com a sabedoria de um monge tibetano, um poeta tibetano, um poeta renunciante e uma garrafa com o segredo da filosofia primeira.
A vida explode como bomba atômica na prosa esverdeada, os anarquistas viram lâmpadas de verdades finais, a vida verdadeira é a anarquia, a verdade final é o caos e a liberdade, a liberdade é a palavra quando ela surge na poesia, eu luto ferozmente com a liberdade e a poesia, luto com todas as minhas forças para explodir como poesia, para demolir como poesia, para voar como poesia, para me vingar com poemas de todas as cores e de todos os tons, luto como um herói romântico, luto com o peito de revolta e de força como um ator mambembe pela estrada infinita, venho com a espada na noite eterna de meu feroz sonho de poeta! Venho com a História nos meus dentes. Tenho um milhão de planos de explosões, explodo como dinamite na rocha do pensamento, fico na espreita com o coração de floreio na onda ideal, espero o dia ideal, as flores ideais, a poesia como ideal, e não aceito o horror de nunca fincar bandeira para ter o lugar que é descrito pelos mundos paradisíacos, vou ao paraíso, o paraíso é a minha pena, a palavra é o mundo florido e torto de um idiota ideal, de um pastiche terrível como troça enfadada, um lixo musical conduz o caos da energia, a quântica redefine o calor dos poemas, e a vida explode para quem explode com ela.
13/09/2012 A Lírica do Caos
(Gustavo Bastos)
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