PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

sábado, 5 de novembro de 2016

VENTOS SALINOS

Que o vento boreal, na noite do pântano,
nos dê o alento que o sol clama.
Estes cantos silvestres, destinos da pena
ao lupanar e plenilúnio, que no púlpito
se concentra e arma a esquadra mortal.

Que a sina desta pena-poeta
se molhe no rio castanho
de um delta na luz abscôndita,
que de luzir os sinos nas trevas
conclamem a esquadra qual nau fria,
e o vento inóspito e boreal
recomece a aventura-poeta.

Balouçam os cantos do mar, peixes graúdos
são salgados sobre as doze tábuas
de madeira de lei, um cedro libanês
e um ocre de vinho antigo,
de lume ao altar o cais imorredouro,
e o vento sinistro a sussurrar
os segredos praianos do mergulho,
e a plêiade do cibório enleva el fuego.

Por detrás dos miasmas do mártir
eclode a magia dos ribeirinhos,
e um mar netuno revela suas estâncias,
os mimos da montanha lhe gritam,
os carinhos das cordilheiras lhe cantam,
juntos, sol e estrela, o canto se expande
com labor de sal e fortuna, que mar adentro
revigora o primeiro marujo do silêncio,
e rutila a miragem no fim da pintura.

Mortal campo, que a semeadura perfeita
rejubile os corpos em suas reentrâncias,
e o passo longo que vai ao além
recobre as notas deste suspense,
e quebranta, portanto, as vigas
e colunatas sob o friso solar.

Manta, túnica, toga,
vestais se enformam na dança,
Deméter fecunda nasce aurora,
e a dança da bacanal sussurra
novamente o torvelinho de amor
que se funda em mar e oceânides.

Flutua seu regente, Saturno silencia
em anéis de futuro com o matrimônio
fervilhante de que o cosmos delineia,
contrito, o peito vigoroso que honra
e pátria às armas dão o sopro,
e que de coração aberto resgata
dos lodaçais os poetas bêbados.

Senhora das partidas, remos e trirremes
remontam o mapa geográfico
de uma cabeça de cão,
e a península e o istmo
e todas as ilhas e recantos
e toda a falésia do porto.

Entrementes, os poetas já sóbrios
fazem da lira os cantos nobres,
e vivificam as sombras com luzidio
som e doce melodia ao largo
da grande muralha de sol e suor,
e o corpo balouça como fúria
nos risos trágicos de cantorias vetustas.

Lamenta o velho em solo árido,
e os anjos vão lhe buscar
no canto do cisne,
pois de morte clama o peito revirado
dos doridos campos da vivência,
numa última gota de vinho
que cai ao velho seu mármore
e fortaleza diante do céu em breve.

E o cume já afoito, tem lacônico
o grito do guerreiro, que desce
da esquadra e enfrenta a malta
titânica que de ferro e aço
aponta a lança funesta,
mas do langor do poeta este canta,
e a rapsódia já cantada de mnemosyne
encanta todo o campo no qual fadas
voam em ventanias púrpuras
no último sonho de glória
da pena-poeta que cai bem
ao fim da melodia que ecoa
no infinito ignoto.

E o fundo da pintura, na via sacra
dos poetas verdes da mata,
refulgem nas cartas longínquas
que o historiador silvestre
dá voz a tais faunos libertinos
que do estranho mundo espiritual
se encontram com os arcanos marítimos
da luta de epopeia e sal.

31/10/2016 Gustavo Bastos    

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