“algumas empresas estatais serão colocadas à venda pela Lei de Bases”
A Lei de Bases, mais a reforma tributária que o Senado pretende votar em seguida, são os pilares da reforma liberal do governo Milei na Argentina. A Lei de Bases, a primeira legislação libertária aprovada pelo governo Milei concede, por sua vez, poderes legislativos ao presidente até 2025, ou seja, Milei poderá tomar decisões por decreto sem consultar o Congresso.
Contudo, os poderes não são absolutos, uma vez que o governo não interveio e nem dissolveu cerca de quinze organizações públicas, e estas fazem parte ainda de uma garantia, pelo governo Milei, de financiamento através do Plano Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação.
Estes poderes de decreto do presidente se dá pela declaração pela Lei de Bases de uma “emergência pública em questões administrativas, econômicas, financeiras e energéticas”. Os decretos, contudo, serão controlados por uma Comissão Legislativa Bicameral, decidindo pela necessidade e urgência de tais decretos.
Outra proposta que faz parte da Lei de Bases é o Rigi (Regime de Incentivo a Grandes Investimentos), este prevê benefícios fiscais, aduaneiros e cambiais por 30 anos a projetos com valor superior a US$ 200 milhões, como forma de incentivo para grandes investimentos no país, tanto nacionais como estrangeiros, no longo prazo, com estabilidade regulatória e proteção contra abusos do Estado.
O governo Milei afirma que o Rigi servirá para atrair capitais para dinamizar a economia da Argentina, pois os projetos beneficiados por este regime poderão receber isenções ou reduções fiscais e facilidades administrativas de aprovação e implementação.
Tal regime se destina sobretudo a setores estratégicos para o desenvolvimento do país como energia, mineração (incluindo aí o lítio), agricultura e infraestrutura. Tais incentivos, segundo o governo Milei, se devem às constantes crises econômicas e defaults (suspensão do pagamento da dívida) que fizeram com que investidores vissem com desconfiança qualquer atuação na Argentina.
A crítica se dá que tais incentivos irão privilegiar as multinacionais estrangeiras em detrimento das pequenas e médias empresas argentinas, que hoje são responsáveis por 70% da geração de empregos no país. A ex-presidente Cristina Kirchner, por exemplo, já alertou que o Rigi representará uma exploração de recursos naturais do país por empresas estrangeiras, o que significará a prática de uma economia extrativista sem geração de valor agregado.
Além disso, algumas empresas estatais serão colocadas à venda pela Lei de Bases, com duas empresas que serão privatizadas, que serão a Intercargo, de serviços aeroportuários a companhias aéreas, além da Energia Argentina S.A. (Enarsa), que faz prospecção e exploração de jazidas de hidrocarbonetos, além de realizar o transporte e o armazenamento de combustíveis.
Por sua vez, a Aysa (Água e Saneamento Argentinos), a Belgrano Cargas e Logística, a Sociedade Operadora Ferroviária e a Corredores Viales estão como concessão privada. Por fim, continuam integralmente pertencentes ao Estado a YPF, estatal argentina de petróleo, a companhia aérea Aerolíneas Argentinas, e também os meios de comunicação públicos como a Rádio e Televisão Argentina.
A Lei de Bases, segundo interpretação do governo Milei, tem como objetivo a modernização do regime trabalhista, incentivando o crescimento do emprego formal privado, e se cria uma nova figura trabalhista que é a do trabalhador independente, este que poderá ter colaboradores, o que significa que um empreendedor poderá ter até cinco pessoas trabalhando para ele sem formalização de contrato e relação de dependência, o que os críticos logo apontam como caminho para o aumento da precarização do trabalho na Argentina.
No plano internacional e diplomático, por sua vez, Milei radicaliza uma orientação que já foi do então governo Menem, e se alinha de forma absoluta aos Estados Unidos, tendo como outro parceiro principal Israel, repetindo o gesto de Trump ao planejar também mudar a embaixada da Argentina para Jerusalém Ocidental, assim como o ex-presidente norte-americano fez com a embaixada de seu país em 2018. Milei, quanto a Israel, foi um dos poucos líderes mundiais a defender as ações deste país em Gaza integralmente.
Quanto à China, a Argentina não conseguiu renegociar uma dívida que mantém com Pequim de US$4,9 milhões contraída pelo governo anterior de Alberto Fernández, e que tem seu vencimento no meio deste ano. O governo Milei também não conseguiu renovar um swap (troca) de moedas, este que permitiu à Argentina fortalecer as escassas reservas internacionais que ainda mantém, mesmo com uma viagem realizada para a China em abril deste ano.
Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
Link da Século Diário :
https://www.seculodiario.com.br/colunas/governo-milei-final
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