“A solução para o suicídio anômico estaria, segundo Durkheim,
nas corporações”
Émile Durkheim se dedicou à criação de uma ciência sobre a
sociedade que fosse independente da Psicologia, da Filosofia e das ciências
naturais, seu empenho foi em fundamentar um método para esta nova ciência, esta
era a sua busca para edificar um objeto próprio para a Sociologia, se tornando
um dos pensadores mais importantes desta área de estudo da sociedade. Durkheim
construiu seu pensamento na virada do século XIX para o XX.
Durkheim empreendeu, como sociólogo, uma pesquisa social em
que os fenômenos sociais eram entendidos
como concretos, um dado, em que o pesquisador busca se manter neutro em relação
às próprias concepções e pressupostos, e se concentra numa pesquisa baseada em
dados concretos, remetendo a uma objetividade do mundo empírico. Durkheim, por
conseguinte, define como conteúdo de sua pesquisa o que ele vai chamar de fatos
sociais.
Para Durkheim, os fatos sociais são definidos, segundo ele :
“toda maneira de fazer, fixada ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo
uma coerção exterior; ou ainda, toda maneira de fazer que é geral na extensão
de uma sociedade dada e, ao mesmo tempo, possui uma existência própria,
independente de suas manifestações individuais”.
Além de manter a neutralidade, e também tratar o fato social
como coisa, para Durkheim, o sociólogo deve levar em consideração a consciência
coletiva dos indivíduos. A consciência coletiva sendo compreendida como “o
conjunto das crenças e dos sentimentos comuns à média dos membros de uma mesma
sociedade”, segundo Durkheim.
Tomando este método de estudo dos fatos sociais segundo uma
orientação que parte da consciência coletiva como origem dos fatos sociais,
Durkheim se debruça sobre o tema do suicídio. Durkheim, então, afirma que o
suicídio não tem uma causa individual, mas uma causa social, e então Durkheim
tenta compreender o suicídio definindo o que é este fenômeno.
O ponto que Durkheim levanta em sua pesquisa, por
conseguinte, é que o suicídio é entendido como um fenômeno que varia numa razão
inversa em relação com a coesão social, e parte desta pesquisa as três
categorias de suicídio que Durkheim vai tematizar, portanto, que são : o
suicídio egoísta, o suicídio altruísta e o suicídio anômico.
No tema do suicídio egoísta, Durkheim cita a questão da
confissão religiosa como causa e balizadora deste tipo de suicídio. Segundo
Durkheim, os países católicos e judeus possuem uma maior coesão social,
portanto, Durkheim registra nestes países uma taxa menor de suicídios, ao passo
que em países de confissão predominantemente protestante, com um individualismo
mais forte e uma menor coesão social, estes índices de suicídios são maiores.
Outro exemplo de causa para o suicídio egoísta dado por
Durkheim está no caso dos homens solteiros, divorciados e as viúvas, o que
Durkheim nos diz do papel da família como um esteio que evita estes tipos de
suicídios, com o indivíduo assumindo responsabilidades, tendo funções dentro do
núcleo familiar. Pois, quando este indivíduo se afasta da família, para
Durkheim, ele perde o sentido da vida, pois não tem mais a proteção da
instituição familiar. Portanto, quando o pertencimento a grupos se enfraquece,
os suicídios egoístas aumentam, contexto no qual a individuação se intensifica
e a coletividade se enfraquece.
No caso do suicídio altruísta, Durkheim cita as sociedades simples,
tomando como exemplo os velhos guerreiros bárbaros que se matavam ao ficarem
doentes e fracos, pois não podiam mais defender o seu grupo. Outro exemplo,
este nas sociedades mais complexas, é o suicídio do soldado que se sacrifica
para salvar seu colega de farda, se matando também por vergonha de perder uma
batalha. No suicídio altruísta, ao contrário do suicídio egoísta, temos o
elemento de coesão social atuando como motivação do ato, e não a individuação
excessiva, como no suicídio egoísta. Portanto, o suicídio altruísta busca
preservar ou salvar a coesão social.
O último tipo de suicídio definido por Durkheim é o suicídio
anômico, que, para ele, está mais presente na sociedade industrial moderna, que
é quando Durkheim nos fornece a definição que diferencia o que ele chama de
solidariedade mecânica, e a transição desta, na sociedade moderna, para o que
Durkheim chama de sociedade orgânica, nesta que Durkheim afirma estar a
consciência coletiva e a moral enfraquecidas.
O enfraquecimento dos laços sociais nas sociedades orgânicas,
que são as da modernidade industrial, decorre de uma divisão do trabalho que
diminui a identidade de seus membros, realizando um processo de individuação,
perdendo a coesão deste mundo do trabalho que existia nas sociedades simples,
em que havia uma solidariedade mecânica, em que tudo se move em conjunto no
mesmo sentido, em que os movimentos dos indivíduos estão ligados
inextricavelmente ao grupo a que pertencem.
Por sua vez, com a especialização que houve nas atividades
modernas, decorrente de uma nova divisão do trabalho, de caráter industrial,
Durkheim vai afirmar que nas sociedades complexas a consciência coletiva perde força
e ocorre o que ele vai chamar de anomia social, numa solidariedade que Durkheim
vai chamar de orgânica, que não é mais baseada em consenso moral ou no apego do
indivíduo à coletividade, pois aqui o trabalho passa pela especialização, o que
leva à individuação, diminuindo a consciência coletiva, e gerando o suicídio
anômico.
A solução para o suicídio anômico estaria, segundo Durkheim,
nas corporações, pois estas seriam formadas por um corpo de indivíduos de
diferentes confissões religiosas e posições políticas que exercem um
determinado tipo de trabalho na sociedade visando o bem estar desta,
recuperando o sentido de bem comum perdido pela anomia, através desta reforma
institucional, na qual as instituições voltam a um funcionamento normal, quando
Durkheim nos diz : “é preciso, sem afrouxar os laços que ligam cada parte da sociedade
ao Estado, criar poderes morais que tenham sobre a multidão de indivíduos uma
ação que o Estado não pode ter”. As instituições devem caminhar junto com o
Estado, neste auxílio à coesão social, em que exista um bom funcionamento
da sociedade.
Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
Blog : http://poesiaeconhecimento.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário