“a morte é a possibilidade mais
própria da presença.”
Martin Heidegger edifica no seu projeto filosófico uma busca pelo
sentido do ser em geral. O que faz com que ele tenha que elaborar uma ontologia
fundamental, mas, para isso, ele deve esclarecer, antecipadamente, o ser da
presença segundo uma analítica existencial da presença, entendendo-se presença
como o ente existencial que denominamos homem, mas que, em Heidegger, não se
fundamenta como sujeito, o que demanda outra questão que não cabe aqui discutir.
Uma vez que nós humanos, enquanto os únicos entes que se dão como
presença, também somos os únicos entes para os quais se dá a morte,
ontologicamente compreendida, somos então tal presença singular como um ser-para-a-morte.
Não cabe aqui, pelas dimensões da resenha, levantar todas as hipóteses e
categorias tematizadas em Ser e Tempo, mas sim nos concentrarmos no sentido
possível que pode ser dado à presença a partir das definições do
ser-para-a-morte, dadas por Heidegger no primeiro capítulo da segunda seção de
Ser e Tempo.
Quando Heidegger pergunta pela totalidade do ser da presença, ele está
também, e ao mesmo tempo, perguntando pelo fim deste ser ou pela morte como fim
deste ser. Ou seja, uma vez que a presença é o único ente que se dá num mundo
ou como ser-no-mundo, ela, uma vez que pode antecipar seu ser-para-a-morte no
anteceder-se-a-si-mesma que determina o seu ser, está diante da possibilidade
extrema de sua existência, e que define a sua existência como finita, para além
de sua constituição ôntica ou bio-fisiológica.
A morte da presença é uma morte existencial, é a impossibilidade de
todas as possibilidades, ou a possibilidade extrema da impossibilidade. Toda a
existência da presença se determinará neste limite de seu fim no seu
ser-para-a-morte.
“No centro dessas considerações acha-se a caracterização ontológica do
ser-para-o-fim em sentido próprio da presença e a conquista de um conceito
existencial da morte” (Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.311). Portanto,
Heidegger, ao tematizar a morte, considera que há a necessidade de uma
compreensão existencial do fenômeno, uma vez que, para Heidegger, a morte está
eivada de concepções difusas que não chegam ao cerne ontológico da questão,
limitando-se, quando muito, no seu aspecto ôntico ou, por outro lado, numa
metafísica da morte segundo teodiceias ou teologias da morte.
Heidegger, ao analisar a morte da presença, constata que, para si mesma,
a presença não pode fazer uma experiência concreta de sua própria morte. No
entanto, a presença pode ter acesso objetivo em relação à morte dos outros,
onde o findar de uma outra presença é experimentada por nossa presença, uma vez
que toda presença tem uma de suas determinações como ser-com os outros.
Portanto, a presença que deixou de existir no mundo ainda é mais do que
um ser simplesmente dado, já que, no mundo circundante e passível de ocupação,
tal presença que deixou a existência ainda está em relação com outras
presenças, no culto que lhe é devido como um modo de uma preocupação
reverencial dos que a presença morta deixou no mundo. Isto quer dizer que o
ser-com os outros ainda está vigente, mesmo com a morte desta presença. Pois é
“a partir do mundo que os que ficam ainda podem ser e estar com ela.” (Heidegger,
Ser e Tempo, 2006, p.312).
“Esse ser-com o morto não faz a experiência do ter-chegado-ao-fim do
finado. A morte se desvela como perda e, mais do que isso, como aquela perda
experimentada pelos que ficam. Ao sofrer a perda, não se tem acesso à perda ontológica
como tal, sofrida por quem morre. Em sentido genuíno, não fazemos a experiência
da morte dos outros.” (Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.313). A questão que se
coloca é sobre o sentido ontológico da morte de quem morre. Temos que, então,
para tal, nos voltarmos para a nossa própria presença, “ninguém pode retirar do
outro a sua morte” (Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.314). “Cada presença deve,
ela mesma e a cada vez, assumir a sua própria morte. Na medida em que é, a
morte é, essencialmente e cada vez, minha. E de fato, significa uma
possibilidade ontológica singular, pois coloca totalmente em jogo o ser próprio
de cada presença.” (Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.314)
Então, a presença não pode compreender ontologicamente a morte dos
outros entes dotados de presença, tal experiência ontológica está reservada no
seu próprio ser-para-o-fim ou ser-para-a-morte que é inalienável de si mesma, a
morte é de cada presença e não pode, portanto, ser compartilhada, uma vez que,
em Heidegger, a morte é o fenômeno pelo qual a presença se singulariza e toma a
morte como a morte dela e não de outros.
Heidegger, a partir desta constatação, parte para o seu objetivo
precípuo quando tematiza a morte, qual seja, a possibilidade de uma
interpretação ontológica da morte. “O que cabe é buscar na própria presença o
sentido existencial de seu chegar-ao-fim e mostrar que esse ‘findar’ pode
constituir todo o ser desse ente que existe.” (Heidegger, Ser e Tempo, 2006,
p.316).
Através da morte, Heidegger, quer chegar à totalidade do ser da
presença, e o que ocorre é que com a analítica da presença como
ser-para-a-morte chega-se à singularidade de cada presença, pois a morte é uma
experiência única e da qual não se pode escapar. “O chegar-ao-fim encerra em si
um modo de ser absolutamente insubstituível para cada presença singular.”
(p.316) Esta é a conclusão lógica de Heidegger, como presença que sou, só posso
ter a morte como a minha morte.
“Há na presença uma ‘não-totalidade’ contínua e não eliminável, que
encontra seu fim com a morte. Mas será que se deve interpretar como pendente o
fato fenomenal de que esse ainda-não ‘pertence’ à presença enquanto ela é?”
(Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.316) Ora, para Heidegger, o ainda-não da morte
da presença não é necessariamente uma pendência, uma vez que o ser-para-a-morte
define ontologicamente a própria presença no seu ser próprio. Então, somente
podemos dar este ainda-não como pendência numa concepção imprópria do
ser-para-a-morte da presença, o que se vê na cotidianidade que oculta a morte
existencial.
“A falta enquanto o que está pendente, não
proporciona, de forma alguma, a determinação ontológica do ainda-não que, como
morte possível, pertence à presença.” (Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.317).
“Esse ente não possui, absolutamente, o modo de ser do que está à mão dentro do
mundo. ... A presença sempre existe no modo em que o seu ainda-não lhe
pertence.” (Idem).
A presença, segundo o que diz Heidegger acima, não se determina tal qual
um ente à mão no mundo circundante das ocupações, portanto, não pode ser objeto
de coisificação, nem ser tomado como ser simplesmente dado, interpretando-se
erroneamente a sua morte como um ainda-não pendente e não como uma essência do
ser da presença.
Será que a morte, a que chega a presença, é uma completude? Com a morte
a presença completou o seu curso? Mas terá a presença com a morte esgotado suas
possibilidades específicas? Não lhe terão sido justamente retiradas estas
possibilidades? A presença, na maior parte das vezes, finda na incompletude ou
na decrepitude e desgaste. “Findar não diz necessariamente completar-se.”
(Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.319). Então, vem a questão: “Em que sentido a
morte deve ser concebida como findar da presença?” (Idem).
Heidegger afirma que a morte não é uma completude do existir do ser da
presença, ou seja, ela não é um arremate de tudo o que se viveu enquanto
presença, não há relação de necessidade entre a morte e a completude ou
plenitude de uma determinada vida do ser da presença. Não há um fim do caminho
percorrido pela presença, já que tal fim do ser-para-a-morte da presença se dá
o tempo todo na sua existência. “Na morte, a presença nem se completa, nem
simplesmente desaparece, nem acaba e nem pode estar disponível à mão.”
(Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.320).
“Da mesma forma que a presença, enquanto é constantemente, já é o seu
ainda-não, ela também já é sempre o seu fim. O findar implicado na morte não
significa o estar-no-fim da presença, mas o seu ser-para-o-fim. A morte é um
modo de ser que a presença assume no momento em que é.” (Heidegger, Ser e
Tempo, 2006, p.320). “Enquanto ser-para-o-fim, o findar reclama um
esclarecimento ontológico haurido no modo de ser da presença.” (Idem). “A
caracterização do fenômeno em questão (ainda-não ser, findar, totalidade) só
terá êxito em se orientando, de forma precisa, no sentido da constituição
ontológica da presença.” (Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.321). “A
interpretação analítico-existencial positiva da morte e de seu caráter de fim
deve obedecer ao fio condutor da constituição fundamental da presença”
(Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.321).
Como dito acima pelo próprio Heidegger, para se ter uma ideia ou uma
compreensão adequadas da morte existencial da presença ou de seu
ser-para-a-morte, é necessário que, para tal, tenhamos em conta uma analítica
ontológica do modo de ser da presença, que é, por sua vez, fundamento para a
compreensão de si mesma no sentido dado pelo findar ou pelo ser-para-a-morte
como sua essência e totalidade. Tal afirmação não constitui petição de
princípio, uma vez que o próprio Heidegger nos alerta em Ser e Tempo da
circularidade dos raciocínios de seu empreendimento, não há, portanto, qualquer
contradição em dizer que o ser-para-a-morte se compreende numa analítica existencial
da presença e vice-versa, o modo de compreensão é unificado.
“No sentido mais amplo, a morte é um fenômeno da vida. Deve-se entender
a vida como uma espécie de ser ao qual pertence um ser-no-mundo.” (Heidegger,
Ser e Tempo, 2006, p.321). “No âmbito da ontologia da presença ... a análise
existencial da morte subordina-se a uma caracterização da constituição
fundamental da presença.” (Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.322). Temos aí,
novamente, a relação do fundamento da presença como o seu ser-para-a-morte, a
essência da existência em Heidegger se define, portanto, na morte existencial.
“A interpretação existencial da morte precede toda biologia ou ontologia
da vida. É ela que fundamenta qualquer investigação histórico-biográfica e
psico-etnológica da morte. (Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.322). Temos aí,
então, que a ontologia da presença como uma interpretação existencial da morte
precede toda cognição acerca de seu conteúdo ôntico. Ou seja, a morte
existencial precede na compreensão heideggeriana as suas implicações cotidianas
ou da natureza de um conhecimento constituído.
“Caso se determine a morte como fim da presença, isto é, do
ser-no-mundo, ainda não se poderá decidir onticamente se, ‘depois da morte’ um
outro modo de ser, seja superior ou inferior, é ainda possível.” (Heidegger,
Ser e Tempo, 2006, p.323). “Interpretando-se o fenômeno meramente como algo que
se instala na presença enquanto possibilidade ontológica de cada presença
singular, a análise da morte permanecerá inteiramente ‘neste mundo’.” (Idem).
“A interpretação ontológica da morte ligada a este mundo precede toda
especulação ôntica referida ao outro mundo.” (Ibidem). “A análise existencial
precede as questões da biologia, psicologia, teodicéia e teologia da morte....
A morte é uma possibilidade privilegiada da presença.” (Ibidem).
Nas citações heideggerianas acima fica evidente que o pensamento de
Heidegger é anterior no sentido ontológico do termo, sua análise existencial
antecipa-se em relação aos significados ônticos ou cognitivos possíveis, sendo
então uma analítica ontológica radical da presença e sua relação constante com
a sua morte existencial.
“Por outro lado, a análise não pode ater-se a uma ideia da morte,
cogitada ao acaso e arbitrariamente. Somente uma caracterização ontológica
prévia do modo de ser em que o ‘fim’ se instala na cotidianidade mediana da
presença é que pode guiar este arbítrio.” (Heidegger, Ser e Tempo, 2006,
p.323).
“A morte é uma possibilidade ontológica que a própria presença sempre
tem de assumir. ... Nessa possibilidade, o que está em jogo para a presença é
pura e simplesmente seu ser-no-mundo. Sua morte é a possibilidade de poder não
mais ser presença. Essa possibilidade mais própria e irremissível é, ao mesmo
tempo, a mais extrema. Enquanto poder-ser, a presença não é capaz de superar a
possibilidade da morte. A morte é, em última instância, a possibilidade da
impossibilidade pura e simples da presença. Desse modo, a morte desvela-se como
a possibilidade mais própria, irremissível e insuperável. ... Essa
possibilidade existencial funda-se em que a presença está, essencialmente,
aberta para si mesma e isso no modo de anteceder-a-si-mesma. Esse momento
estrutural da cura possui sua concreção mais originária no ser-para-a-morte.”
(Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.326).
Heidegger deixa claro que há uma necessidade existencial da presença
assumir o seu ser-para-a-morte como o único caminho possível para uma
compreensão de sua essência e determinar, deste modo, como a presença deve
lidar de forma adequada com esta possibilidade extrema da morte, uma vez que na
cotidianidade isto é ocultado na impessoalidade.
Ser-para-a-morte: em existindo, a presença já está lançada nessa
possibilidade, portanto, a morte não é algo suplementar ou ocasional. Ou seja,
a existência autêntica e plena reconhece o fato da morte existencial como
indispensável tanto para a compreensão do que é a presença como, uma vez
compreendendo o ser da presença, nos encaminhemos, com isso, para a compreensão
do sentido do ser em geral, já que este é o grande projeto filosófico
heideggeriano.
“É na disposição da angústia que o estar-lançado na morte se desvela
para a presença de modo mais originário e penetrante. A angústia com a morte é
angústia ‘com’ o poder-ser mais próprio, irremissível e insuperável. O próprio
ser-no-mundo é aquilo com que ela se angustia. O porquê dessa angústia é o puro
e simples poder-ser da presença.” (Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.326 e 327).
Ou seja, tal angústia é a própria certificação da morte como algo inexorável e,
portanto, é como se a angústia fosse a chave para a compreensão do
ser-para-a-morte propriamente dito. Isto é, com a angústia toda fuga da morte
se desvanece.
“Que, numa primeira aproximação e na maior parte das vezes, muitos de
fato não sabem da morte, isso não pode ser aduzido como prova de que o
ser-para-a-morte não pertença de maneira geral à presença. Isso apenas mostra
que, numa primeira aproximação e na maior parte das vezes, a presença encobre
para si mesma o ser-para-a-morte mais próprio em dele fugindo.” (Heidegger, Ser
e Tempo, 2006, p.327) (Obs: na decadência de um empenhar-se no mundo das
ocupações anuncia-se a fuga da estranheza, isto é, do ser-para-a-morte mais
próprio). “Existência, facticidade e decadência caracterizam o ser-para-o-fim,
constituindo, pois, o conceito existencial da morte.” (Idem).
“Pertencendo originária e essencialmente ao ser da presença, o
ser-para-a-morte deve também ser comprovado na cotidianidade – embora numa
primeira aproximação, de maneira imprópria.” (Ibidem).
O próprio da cotidianidade é o impessoal, constituído na interpretação
pública expressa na falação. ... O teor público da convivência cotidiana
conhece a morte como uma ocorrência que sempre vem ao encontro, ou seja, como
‘casos de morte’. ... ‘A morte’ vem ao encontro como um acontecimento
conhecido, que ocorre dentro do mundo. ... A fala pronunciada sobre a morte diz
o seguinte: algum dia, por fim, também se morre, mas, de imediato, não se é
atingido pela morte.” (Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.328) Ou seja, uma vez que a compreensão cotidiana
do ser-para-a-morte encobre o seu sentido originário e cabal de fim
existencial, temos que o impessoal invade tal reflexão e determina a morte como
a morte de ninguém, não há um pensar na morte como algo irremissível, a morte é
algo banal do qual não se tem o sentido, morre-se o tempo todo no mundo
circundante mas isto não atinge a presença enquanto tal.
“O impessoal não permite a coragem de se assumir a angústia com a morte
... o que cabe é a tranquilidade indiferente frente ao fato de que se morre. A
elaboração dessa indiferença superior aliena a presença de seu poder-ser mais
próprio e irremissível.” (Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.330). Fica claro aqui
o sentido alienante em relação à morte existencial da cotidianidade para
Heidegger.
“Numa primeira aproximação e na maior parte das vezes, a presença se
atém faticamente a um ser-para-a-morte impróprio. Como se haverá de
caracterizar ‘objetivamente’ a possibilidade ontológica de um ser-para-a-morte
em sentido próprio? (Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.336). “Ser-para-a-morte em
sentido próprio não pode escapar da possibilidade mais própria e irremissível
e, nessa fuga, encobri-la e alterar o seu sentido em favor da compreensão do impessoal.”
(Heideggger, Ser e Tempo, 2006, p.337). O que Heidegger quer dizer nestes
trechos é que a fuga para o impessoal da cotidianidade é inútil em relação ao
sentido próprio do ser-para-a-morte, podemos postergá-lo, mas não evitá-lo,
podemos ignorá-lo ao máximo, mas um dia tal situação existencial tomará o que
lhe é próprio e devido na sua irremissibilidade. Lembrando que “a morte enquanto algo possível
não é um manual e nem algo simplesmente dado possível, e sim uma possibilidade
de ser da presença.” ( Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.338).
“O ser para a possibilidade enquanto ser-para-a-morte, no entanto, deve
relacionar-se para com a morte de tal modo que ela se desvele nesse ser e para
ele como possibilidade. Apreendemos, terminologicamente, esse ser para a
possibilidade como antecipar da possibilidade.”(Heidegger, Ser e Tempo, 2006,
p.339). (obs: morte = possibilidade da impossibilidade da existência).
“Enquanto antecipação da possibilidade, o ser-para-a-morte é que possibilita
essa possibilidade e que a libera como tal.” (Idem).
“Ser-para-a-morte é antecipar o poder-ser de um ente cujo modo de ser é,
em si mesmo, o antecipar. Ao desvelar numa antecipação esse poder-ser, a
presença abre-se para si mesma, no tocante à sua possibilidade mais extrema.
Projetar-se para seu poder-ser mais próprio significa, contudo: poder
compreender-se no ser de um ente assim desvelado: existir. A antecipação
comprova-se como possibilidade de compreender seu poder-ser mais próprio e mais
extremo, ou seja, enquanto possibilidade de existir em sentido próprio.”
(Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.339/340). Enfim, “a morte é a possibilidade
mais própria da presença.” (Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.340). Portanto, é
através desta antecipação que é possível para a presença se desgarrar do
impessoal, é no seu sentido próprio de ser-para-a-morte irremissível que a
presença supera a letargia existencial da ignorância do impessoal.
“A morte não apenas pertence de forma não indiferente à própria
presença, como reivindica a presença enquanto singular. A irremissibilidade da
morte, compreendida no antecipar, singulariza a presença em si mesma.” (Idem).
Entende-se, aqui então, que a presença se singulariza através de sua morte, é a
sua essência como ser-para-a-morte que lhe dá uma identidade existencial
diferente de todas as outras e imune da homogeneidade medíocre do impessoal.
“Ao se delimitar no projeto existencial o
antecipar, tornou-se visível a possibilidade ontológica de um ser-para-a-morte
em sentido próprio. Com isso, surge também a possibilidade de a presença
poder-ser toda em sentido próprio, mas somente como uma possibilidade
ontológica.” (Heidegger, Ser e Tempo, 2006, p.344). “Apesar disso, esse
ser-para-a-morte existencialmente possível permaneceu, do ponto de vista existenciário,
uma suposição fantástica. A possibilidade ontológica de a presença poder-ser
toda em sentido próprio nada significa, porém, enquanto não se demonstrar, a
partir da própria presença, o poder-ser ôntico que lhe corresponde.” (Idem).
No trecho acima fica evidente que o projeto filosófico heideggeriano, no
que concerne à morte existencial, que é, por sua vez, um findar ontológico,
precisa de uma confirmação ôntica, o que demanda uma outra reflexão que não
cabe aqui demonstrar, uma vez que a própria reflexão heideggeriana não se
esgotou na obra Ser e Tempo que, como muitos sabem, é um projeto inacabado, mas
é a sua abertura existencial ou ontológica, sua obstinação por edificar uma
ontologia fundamental, que torna tal obra indispensável para a reflexão da
filosofia contemporânea.
Feita uma reflexão acerca do sentido do ser-para-a-morte na analítica
existencial da presença em Heidegger, temos que, no modo em que ela se dá, ela
é uma contribuição valiosa para que possamos ir além do ôntico e do cognitivo
quando se fala de existência ou do que é humano como presença e não como
sujeito cognoscente.
O grande avanço de Heidegger, no tocante aos seus questionamentos, é que
ele vai além dos antigos e dos modernos no sentido ontológico, o que não quer
dizer que Heidegger seja infalível, uma vez que seu projeto ficou por se
completar, o que não é um demérito, mas um motivo para que não fiquemos
satisfeitos com Ser e Tempo, já que o sentido do ser em geral, que era o
projeto original de Heidegger, terminou no início do longo caminho de uma
ontologia fundamental, qual seja, a analítica existencial da presença.
Gustavo Bastos, filósofo e
escritor.
Link da Século Diário : http://www.seculodiario.com.br/22048/14/o-ser-para-a-morte-em-heidegger
Olá gostaria de ver o poema vejo um sol diferente como as lendas do oriente vem um som diferente com o silêncio dos amantes que no interior dessa casa pertence a cada um...
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