Demian cuidava de um restaurante que tinha um cabaré nos fundos, a sociedade do local era dividida com uma senhora da elite, metida e ríspida, de nome Cleonice, e que tinha outros negócios. Ela tinha informado a Demian sobre a vinda de uma comitiva muito séria até o restaurante, este que tinha o nome de A Barca, com o cabaré tendo sido batizado de Atlântida.
As noites em Atlântida eram tórridas, que àquela altura já tinha virado um ambiente esfumaçado em que se misturavam gângsters e uma prostituição meio velada do lado de fora e escancarada do lado de dentro do cabaré. O restaurante, por conseguinte, agora servia mais como uma fachada, em que a hora do almoço era bem frequentada, geralmente por executivos e advogados.
A vida ia bem para Demian, ele recebia bons dividendos, mas ainda tinha muita coisa que ele não sabia sobre Cleonice, e uma aura sinistra em torno dela produzia uma especulação sobre Demian, em que ele tentava discernir o que era verdade e o que era imaginação.
Cleonice tinha um filho problemático, que tinha enfrentado uma prisão por fraudes financeiras, e agora trabalhava no cabaré de caixa e curador, bebia muito, e a proibição da venda de bebidas alcoólicas pelo governo de Sauer, então presidente pelo Partido Conservador, jogara todo um mercado na ilegalidade, já há 7 anos e 7 meses.
A chamada Lei Seca acabou causando prejuízos iniciais aos empresários da bebida, mas de uns 6 anos para cá, produzindo um mercado clandestino de tráfico de bebidas alcoólicas que explodiu e os lucros deste crime atingiam cifras estratosféricas, sem falar nos lucros com as festas clandestinas que eram regadas a vinho, uísque, vodka etc.
Portanto, o que era proibido em condados específicos e interioranos agora se estendia como uma proibição por todo o país de Colombo, e um mercado ilegal de tráfico de bebidas, sobretudo cerveja, vinho e uísque, crescia exponencialmente, e o clímax desta história ficava na cidade de Buffalo, onde se localizavam o restaurante A Barca e o cabaré Atlântida, mais precisamente num bairro vizinho do centro da cidade, de nome Remington.
Já corriam nos jornais notícias sobre os assassinatos, massacres e putschs de bares clandestinos, a maioria com a assinatura de uma tal “gangue feliz” (happy gang), e que ainda não se sabia o nome de seus líderes ou líder supremo, pois a investigação do Bureau From Judgement estava bem perdida e tentando ligar pontos que estavam em curto circuito.
Os putschs em bares, diferente dos ataques com submetralhadoras feitos pela cidade de Buffalo, acabavam com pauladas e barradas de ferro, garrafadas, pancadaria generalizada, e a destruição do local, com um vandalismo extremamente violento, além do roubo da carga e das bebidas dos bares clandestinos, pois os grupos menores do tráfico estavam cedendo à tal “gangue feliz” (happy gang), pois ficaram com medo da violência deste grupo.
Também se tinha notícias de pauladas e espancamentos em ruas específicas, atingindo civis ou comerciantes, e muitos faziam a lei do silêncio, além de se especular sobre tais pessoas estarem sendo extorquidas para não sofrerem mais consequências.
A tal comitiva que tinha sido chamada por Cleonice, por sua vez, era para tratar da venda de bebidas no cabaré. Demian ficara sabendo que o cabaré, depois de muito tempo resistindo ao assédio dos traficantes de bebidas, tinha cedido um espaço para as noites de lá para a venda de cerveja, vermute, uísque, vodka, vinho, licores e o famigerado absinto, que nos negócios de bebidas proibidas estava com preços astronômicos.
O representante da tal comitiva era um tal de Baptiste, ou melhor, Norman Baptiste. Ele chegou à recepção do restaurante A Barca muito bem vestido, com terno, chapéu, um lenço azul escuro na lapela, um ar dândi, e quando chegou perto de Demian, no balcão principal do restaurante, Demian sentiu um denso miasma de enxofre, parecendo fósforo queimado, e que vinha da aura enigmática deste dândi Baptiste. Este tirou o chapéu e se revelou um cabelo loiro e meio grande, e seus olhos verdes pareciam penetrar na alma de Demian com uma curiosidade mórbida e maliciosa.
Este cheiro de enxofre causou a Demian pequenos engulhos que ele disfarçou, e sua cabeça girava em tentar entender o que era aquilo. A conversa passou por saber a frequência do restaurante, em que Demian esclareceu a Baptiste que tudo poderia ser condensado entre executivos e advogados, e Baptiste revelou seu plano de corromper profissionais liberais, no trabalho de documentos falsificados, para driblar a burocracia fiscal e lavar dinheiro.
Então Baptiste perguntou se Cleonice tinha avisado a Demian do que seria tratado dali para a frente, e Demian disse que não, então Baptiste foi direto e disse que o estabelecimento tinha sido comprado por ele, e que ali serviria para lavagem de dinheiro, pediu perdão a Demian por este não ter sido avisado, uma vez que Demian era sócio apalavrado do estabelecimento, não tinha seu nome no registro jurídico do município, na vara comercial e, portanto, Cleonice decidiu se adiantar no trâmite com o dândi.
Baptiste, junto com a aquisição do restaurante e do cabaré, disse que tinha arrendado também três empresas de consultoria financeira e mais uma de roupas e artigos para festas. Demian se sentiu coagido, contudo, cedeu, e Baptiste disse para ele ficar frio, pois nem ele e nem Cleonice perderiam participação nas ações e na sociedade, ou seja, os dividendos estavam garantidos para ambos, agora com o bônus de dinheiro entrando a rodo do comércio ilegal de bebidas alcoólicas.
Feita a colocação sobre o que já tinha sido acordado entre Baptiste e Cleonice, Demian agora também estava ciente das mudanças que ocorreriam no restaurante e no cabaré. Demian se sentia corrompido, mas incapaz de reagir, ao vislumbrar a cifra astronômica das bebidas e das festas, e já estava vendido, pois somente nos últimos anos tivera uma vida normal do ponto de vista financeiro, mas já olhava para cima, e o alto, agora, cheirava a álcool.
Na entrada do hall agora se ouvia latidos, apareceu um homem baixinho e gordo, de terno e bengala, com cara de periquito, pele bem branca, já com certa idade, óculos redondos e esfumados, que avançou até o balcão, no que Demian percebeu que o cachorro era um vira lata de porte médio, idoso, com um olho que tinha uma catarata em estado avançado e a falta do outro olho. Baptiste apresentou então a Demian o gordo também dândi, de nome Tom Brand, e o cachorro que se chamava Panda.
Baptiste esclareceu que Panda tinha sido atacado por três dobermans quando jovem e perdera a órbita direita neste ataque e agora estava cego, pois a catarata no olho que sobrara já não poderia mais ser operada. Panda era um cachorro vira lata de pêlo cinzento, por fim, um cão idoso, cego e sem um olho.
A comitiva então finalmente chega, eles iriam almoçar em A Barca, e Cleonice já tinha avisado ao cozinheiro que seria tudo por conta da casa, para celebrar o acordo com Norman Baptiste. Era uma comitiva engravatada, uns doze homens, três bem altos e fortes, e duas mulheres bem bonitas, como se fossem secretárias daquela comitiva, com roupas de cores quentes e batom vermelho.
Baptiste disse que Panda ficaria no quintal do restaurante, amarrado a um poste da garagem, enquanto a comitiva iria almoçar. Demian estava intrigado, pois aquele gordo baixinho também parecia ter se perfumado com enxofre, e Demian tentava encontrar uma explicação racional para aquele miasma e não achava resposta nenhuma.
Demian também percebeu que a mão da bengala de Tom tinha uma imagem que parecia a cabeça de uma entidade demoníaca, havia dois olhos vermelhos cravejados na cabeça de diabo da bengala e Demian achou tudo muito estranho. Parecia Pazuzu ou algo parecido, uma entidade babilônica.
Demian, durante o almoço da comitiva, foi dar uma olhada em Panda na garagem, e o cachorro peidava e grunhia feito um porco, o cheiro de enxofre era insuportável e Demian mais uma vez se segurou para não imaginar ou ficar especulando, queria deixar a tal ideia do miasma para lá, concluindo que poderia ser qualquer besteira que pouco importava.
Quando Demian voltou, foi servido cordeiro ao molho de menta para a comitiva, e depois doces do leste europeu, quando um dos membros da comitiva, de uma hora para outra, subiu na mesa, e declamou uma parte de Macbeth de Shakespeare, a citação que se encerra dizendo que a vida é uma história contada por um louco, repleta de som e fúria e que não significa nada.
O cara estava engravatado e tinha uma aura bem histriônica, mas num sentido meio sinistro, cético, quase suicida, e essa foi a impressão indelével que os sentidos de Demian tinham captado daquela cena estrambótica em meio de um almoço. Este declamador histriônico tinha cabelos negros e grandes, óculos escuros e redondos e uma cara meio vampiresca, seu nome era César Layne, e parecia bastante afetado e pedante.
No fim da declamação este César Layne deu uma breve sapateada e saltou da mesa com um salto mortal, caindo em pé, ao lado da mesa em que estavam as duas mulheres da comitiva, que pareciam apreciar o espetáculo inusitado. E uma das mulheres, Laetitia, parecia estar sempre num tipo de transe místico, e olhava tanto para Baptiste como para Layne, com volúpia e tensão sexual.
A percepção de Demian sobre aquelas figuras estranhas se misturava a seu olfato que perseguia que diabo de miasma de enxofre era aquele, e ficava pensando no Panda, um cão velho, quase morrendo, que era criado por aquele Baptiste, que colocara seus olhos verdes e sinistros para cima dele, ao se apresentar no restaurante.
A afetação de César Layne soara estranha, pois além do pedantismo, existia uma arrogância, parecia imitar os gestos de quem herdara o mundo sem esforço, e falava alto, erguia brindes postiços, e tinha Baptiste como uma espécie de ídolo e que lhe exercia uma ascendência espiritual auto evidente.
Mesmo com aquela banca toda, Demian telefonou para Cleonice, e acabou se convencendo outra vez de que a venda do restaurante e a entrada de bebidas iria deixar todo mundo rico, e que Baptiste tinha bala na agulha e já dominava quase todo o comércio de bebidas alcoólicas em Remington e por toda Buffalo.
Os escrúpulos de Demian estavam enfraquecidos, ele se testou por duas vezes e o resultado foi que ficar rico era uma oportunidade que ele não teria mais, teria que ser com o comércio ilegal de bebidas alcoólicas ou nunca mais.
Se dizia que muitos dos vereadores tinham sido comprados para se manterem em silêncio e derrubarem qualquer iniciativa legislativa de indiciar ou prender o grupo de Baptiste. A sanha assassina do grupo também intimidava a maioria dos juízes, que recebiam ameaças, com exceção de dois ou três, se destacando o juiz criminal Thomas Mancini, um neto de italianos que tinham fundado uma trattoria e uma loja que vendia frios no centro de Buffalo e que prosperaram, o que possibilitou que Thomas estudasse Direito e passasse no concurso de juiz criminal.
A quantidade de oficiais e delegados comprados em Buffalo pela tal “gangue feliz” (happy gang) já se tornara colossal, e o poder judiciário era o último bastião o qual a carga da tal gangue ainda não havia derrubado, pois a resistência deste grupo de juízes já tinha desafiado iniciativas financeiras, comerciais, ameaças de morte, de matar família, filhos etc.
Baptiste ficava especialmente irado quando o assunto entrava na seara destes tais juízes incorruptíveis, chegando ao ponto de, em uma dessas reuniões de cúpula da gangue, Baptiste ter quebrado uma mesa caríssima e ter dado um tiro fatal na cara de um sabujo insignificante que trabalhava para a gangue. O tiro fatal foi dado gratuitamente, pois o pobre diabo nem tinha se manifestado sobre nada.
César Layne, geralmente, era quem se reunia a uns capangas para sondar os bairros da periferia de Buffalo para tentar arrumar álibis que pudessem incriminar o tal grupo de juízes, mas era como procurar agulha num palheiro, parecia que eles eram inatingíveis do ponto de vista legal e moral.
A saída era, talvez, armar situações que pudessem comprometê-los, e Layne estudava, junto com Laetitia, possíveis armações, sobretudo para cima do tal juiz criminal Thomas Mancini, e eles teriam que ter uma boa ideia, pois além da capacidade intelectual, este juiz era reconhecido em Buffalo também pela astúcia com que resolvia problemas e concluía diversas situações.
Thomas Mancini era o mesmo homem que prendera uma gangue anterior, há uma década, do tráfico de armas, também em Buffalo, em que caíram todos de uma vez, depois de uma investigação discreta e silenciosa, com uma força tarefa de inteligência e escrutínio, e que teve um efeito devastador sobre aquele grupo de bandidos, que foi instantaneamente extinto quando a casa caiu.
Quanto à notória astúcia de Mancini, é claro que Baptiste já sabia disso, e se havia alguém à sua altura na guerra que se travava em Buffalo, era este oponente até então incorruptível. E os outros dois juízes, Jean McCarthy e William Clarke, que seguiam a escola de Mancini, foram alunos do mesmo no doutorado em Direito Penal e Processual Penal, e também eram obstáculos no caminho de Baptiste e de sua gangue feliz (happy gang).
O corpo de investigadores também estava bem azeitado, e os furos da gangue feliz eram inúmeros, o problema era furar o cerco de subornos e de silêncios comprados por toda parte, o que dificultava e obstruía o que poderia já estar à luz do dia, pois era uma miríade de fios soltos sem a devida costura, um quebra-cabeças macabro que Mancini estava determinado a derrotar, e para isto precisava de um fio de Ariadne para amarrar o labirinto das ocorrências, ou seja, um trabalho de inteligência que demandaria um sangue frio e uma paciência de Jó.
Por sua vez, o presidente da Câmara dos Vereadores de Buffalo passou a ter encontros quase que semanais com Norman Baptiste e Tom Brand, alguns testemunharam que no restaurante Fox, um dos mais caros de Buffalo, entre drinks e conversas, M. Elliot, o vereador, levava umas maletas cheias, junto com seus assessores, e a carga era colocada na parte de trás de sua caminhonete, sem o menor constrangimento ou cerimônia.
Jean McCarthy, junto com o Bureau From Judgement, presidido pelo então delegado Adam Jones, procediam com investigações sobre o vereador, e de sua possível ligação com a tal “gangue feliz” (happy gang). A caça era por provas de ilícitos para abertura de inquérito por parte do Bureau, mas nada até então tinha sido provado, como McCarthy desejava, apenas relatos insuficientes para ligar os pontos.
Tom Brand, o gordo de óculos redondos era o cara que cuidava do financeiro da gangue terrorista, ele parecia estar sempre com um olhar risonho, irônico, e fumava desbragadamente um cachimbo que volta e meia sacava de sua cigarreira. Baptiste, por sua vez, era da linha de frente da esquadra e era o chefe do bando, o mais sanguinário e o mais cruel, e as histórias de execuções extremas em violência se multiplicavam desde a ascensão da gangue feliz (happy gang).
A população periférica de Buffalo se encontrava assustada e acuada, enquanto os bairros nobres ficavam livres desta dor de cabeça, uma vez que havia um acordo financeiro com políticos para deixar as áreas nobres de Buffalo fora das rondas que a gangue feliz realizava diariamente, praticando roubos, assassinatos e sessões de espancamento e vandalismo.
Ainda se dizia pelas más línguas coisas como descrições sobre rituais privados e que a crendice dizia se tratar de encontros satanistas e de magia negra, o que ninguém ainda sabia se era verdade, uma vez que tudo era desmentido e ridicularizado como crendice popular. O clima em muitos dos bairros mais pobres de Buffalo, portanto, era o pior possível.
A proibição de venda de bebidas alcoólicas por decreto federal foi irredutível quanto às possibilidades do regramento combater diretamente as gangues ilegais, pois o legislador colocou tudo na conta das federações e municipalidades, pois estas é que deveriam proceder ao voto e aprovação de portarias, regulações, decretos legislativos, leis complementares, investimentos na segurança e no poder de polícia, e demais dispositivos para controlar o avanço do crime organizado da bebida alcoólica.
O xerife do condado que envolvia Buffalo, Liechtenstein, Nova Caledônia e Brunswick tinha virado uma peça decorativa, e a guarda do condado não servia mais para nada, com altos índices de aposentadoria e pouca reposição. A gangue feliz fazia negócios com pequenos bandos destas outras cidades do condado, lucrando por participação.
Nova Caledônia, por exemplo, recebia quantidades homéricas de uísque escocês, de um canal de Glasgow, e uma grande parte era revendida para Buffalo, com lucros divididos entre distribuidores ilegais e a gangue feliz (happy gang) que, por sua vez, ficava com todo o lucro dos bares e restaurantes de Buffalo, na venda direta ao consumidor.
A justiça criminal e o Bureau From Judgement eram as únicas instâncias de combate ao crime que sobraram intactas da cooptação e do poder corruptor da gangue feliz, e a guarda do condado, com seu xerife de circo, era apenas um esqueleto de eras passadas, uma piada que tinha virado uma sinecura, pois estava esvaziada em suas funções.
César Layne, por sua vez, tem a ideia de colocar Laetitia de isca para seduzir o juiz McCarthy, que estava divorciado há dois anos, e tentar pegar documentos ou papéis importantes para chantagear o tal juiz. Mancini, por sua vez, estava movido em uma força tarefa para desbaratar os depósitos e armazéns de bebidas da gangue feliz, uma vez que envolvia uma miríade de receptadores, distribuidores, capangas, meganhas corruptos, setor portuário, transporte por trilho e rodovia, subornos, burlas em documentos e na burocracia, maquiagem de mercadorias etc.
César Layne conhecia um funcionário de uma empresa de televisores cujo dono era um amigo próximo do juiz McCarthy. Layne marcou uma visita, junto com Laetitia, a propósito de negociar uma comissão na venda de televisores, em nome de Norman Baptiste, e lá ele apresentou um referencial de uma empresa de fachada que tratava de componentes de televisão.
No caso da gangue feliz, estas empresas de fachada envolviam dezenas de offshores para lavagem de dinheiro, de nome Consult, nome fantasia que era usado para duas dezenas destas empresas de fachada, para despistar investigações, enquanto os nomes registrados oficialmente pareciam compor uma coleção enfadonha de nomes compostos de escritórios de registro civil ou algo que remetia a gabinetes burocráticos, de cansar a vista de qualquer detetive.
Depois da primeira conversa, Layne e Laetitia e o empresário, eles marcaram um jantar, e Laetitia disse ser fã do juiz McCarthy, que era para o tal empresário convidar o juiz para este jantar de gala, em que também participaria Norman Baptiste, como dono da Consult. Nesses dias, rolava o boato de que o chefão da gangue feliz estava fazendo “rituais de consagração”, pois queria se lançar futuramente na política e virar prefeito de Buffalo. Se ouviam batucadas, gritos e grunhidos nos fundos da mansão de Baptiste, em um bairro nobre da cidade, e alguns vizinhos achavam que era maluquice, que aquele pessoal que entrava e saía da mansão eram cada vez mais esquisitos, mas tudo tolerado, desde que a vizinhança não fosse incomodada por aquelas pessoas, pois era um entra e sai fodido.
Havia festas, jantares, rega bofes vespertinos, e agora estes supostos rituais de consagração. A movimentação na mansão era frenética, e a vizinhança nem desconfiava que ali morava o chefão da gangue feliz que estava tocando o terror em Buffalo. Contudo, muitos dos bebedores de uísque e destilados moravam nestas mesmas mansões e frequentavam os bares e restaurantes comprados pela gangue.
Depois do encontro com o tal empresário de televisores, ficou marcado para A Barca o encontro de César Layne, Laetitia e este empresário e o juiz McCarthy, dentre outros convidados de Layne para despistar as intenções do jantar. Foi servido pato, depois veio muito vinho, com César Layne subindo na mesa e fazendo a declamação de Hamlet, contudo, com a afetação neoclássica de um raciniano cheirando a mofo, em que quase simulou um afogamento à moda de Ofélia, mas Laetitia deu o sinal de que já estava bom.
Por sua vez, César Layne olhou e percebeu que o juiz já estava hipnotizado pela divina vampira, e era questão de tempo para a dama da noite entrar na mansão do juiz divorciado, fazê-lo dormir profundamente com fentanil e fazer uma busca pelo cofre e senha, além de documentos importantes que envolvessem a investigação da gangue feliz e demais informações.
Depois daquele vinho todo, apareceu Tom Brand, este discretamente jogou um pó branco na bebida do juiz, era “angel dust”, e bateu com sua bengala com cabeça de Pazuzu na cabeça de César Layne em sinal ritualístico, uma espécie de código interno da gangue feliz. O gordo sorria ironicamente, para variar, e pediu um sanduíche com carne de porco e laranja, ao passo que bebia um rum de pirata servido especialmente para ele, uma reserva que ficava nos fundos de A Barca.
McCarthy já entrava em transe, e Laetitia o alisava na cabeça e nas pernas. César Layne conversava desbragadamente com outros convivas da gangue feliz e o juiz mal imaginava estar entre seus inimigos, pois toda a sua investigação atual envolvia os crimes cometidos pela gangue feliz e seu objetivo era capturar Norman Baptiste, que só imaginava de descrições borradas, pois ele circulava por vezes na Câmara dos Vereadores, mas saía incólume, era um assassino em série e tinha a ficha limpa, um passado sem antecedentes criminais legalmente falando, o que era tanto uma façanha como um absurdo, era um dos maiores furos da Bureau From Judgement, e que estava custando caro para a população civil de Buffalo.
E ali em A Barca, eles conversavam entre si usando seus nomes falsos, que mudavam de tempos em tempos. Os sinais, por sua vez, no clima da cidade de Buffalo, não eram muito bons. Uma onda de suicídios começou no bairro de Lancaster, periferia de Buffalo, pois em uma semana, doze pessoas se mataram com arma de fogo, duas se jogaram na linha do trem, onze se jogaram de prédios, com mais quinze que morreram ao tomarem veneno e duas mulheres que ligaram o gás do apartamento, e mais uma que enfiou a cabeça no forno de gás, e um cara que matou a mulher, os filhos e se matou com um tiro na cabeça.
Uma outra onda de suicídios começou também, em duas semanas, nos bairros de Monrose e de Condor Streets, além das igrejas de Nossa Senhora das Dores, Santa Rita e a igreja Potsdam, uma das maiores e mais famosas de Buffalo, serem queimadas criminosamente, e ainda em Monrose teve um incêndio criminoso de um condomínio que abrigava pessoas com problemas mentais, e o efeito foi devastador.
A imprensa de Buffalo procurava não mistificar os fatos, mas o clima era diabólico. A gangue feliz continuava fazendo ações violentas, desta vez com explosões de bancos, e o medo dominava a periferia de Buffalo. A fortuna acumulada pela gangue feliz agora era colossal. Mas, mesmo assim, o Bureau From Judgement era incorruptível.
O delegado, que presidia o Bureau, prendera um dos enviados da gangue feliz que fizera a proposta milionária de corrompê-lo, numa prisão em flagrante. O interrogatório, contudo, foi um fracasso, pois o tal enviado não abriu o bico, e duas semanas depois foi encontrado morto na cela com diversas facadas no peito.
As notícias de Lancaster eram chocantes, e duas semanas depois duas igrejas do bairro, a principal de Lancaster e uma igreja antiga do período colonial foram queimadas criminosamente, e nas sacristias das igrejas que foram vandalizadas, por sua vez, se podia ver pichações satânicas e símbolos nazistas.
O Bureau From Judgement abriu uma investigação sobre os incêndios criminosos. Em Lancaster, que vivia o caos, mais três pessoas se jogaram na linha do trem e duas se mataram com veneno. Na Condor Streets, em três semanas, oito pessoas se mataram com arma de fogo, uma se matou após um ritual satânico, e um vocalista de uma banda conhecida em Buffalo se jogou do prédio, além de mais cinco que também se jogaram do prédio.
O bairro de Lancaster agora ficava igual ao de Condor Streets e Monrose, com jovens que andavam de preto pelas praças, usando toucas e machados. Um clima de delinquência se expandia por Lancaster e já atingia as barbas do bairro vizinho de Alphaville.
Na semana seguinte ao ataque de igrejas, uma sinagoga e uma mesquita de Lancaster foram queimadas criminosamente e uma capela no alto de um monte foi vandalizada e pichada. E três dias depois um rabino foi assassinado numa praça em Lancaster, e em seu braço estava lanhado um símbolo da suástica.
Esses garotos de Lancaster também estavam arrumando arruaças com jovens de Alphaville e brigas de gangue contra meninos de Condor Streets e Monrose. Haveria uma série de shows em três dias em Lancaster e algumas autoridades já estavam com as barbas de molho. Os seguranças que seriam contratados eram de uma empresa de nome Consult, sim, a mesma que tinha como donos a Gangue Feliz. A prefeitura sequer podia imaginar que este CNPJ era uma verdadeira cilada e que este contrato poderia se configurar numa catástrofe. Estes shows seriam no final do bairro de Lancaster, em que havia um enorme descampado que era um conjunto de armazéns do início do século XX que tinham sido abandonados e a prefeitura arrendou para eventos diversos.
Por sua vez, o plano de César Layne e Laetitia dá certo, e foi feita uma devassa no apartamento do juiz McCarthy. Centenas de documentos probatórios de crimes financeiros, faturas, documentos de investigação, memorandos, minutas de ações policiais, fotos de suspeitos etc, agora estavam sob o controle da gangue feliz, e na parede da sala de McCarthy estava pichado de vermelho palavras como “otário”, “pederasta” e “juiz de merda”. Na cabeceira do quarto e da cama de McCarthy foi deixado um pote de fentanil e uma carta sem digitais, apenas com a frase : “Da próxima vez exibiremos a sua cabeça à população de Buffalo, como nos tempos do suplício!”.
Estava agora se organizando os tais shows no descampado de Lancaster, que seria a primeira edição do Festival de Lancaster. Muitas autoridades estavam ciosas e preocupadas, o clima naqueles bairros não era bom há meses e parecia haver uma certa azáfama e afobação para que aquilo tudo acontecesse. Se sentia um cheiro insuportável de amadorismo no ar, mas o prefeito autorizou o evento e depois de uma discussão áspera com o subsecretário de segurança, este foi exonerado e voto vencido na aprovação do evento, pois este traria lucros para os organizadores e para a prefeitura de Buffalo.
Dois dos organizadores do Festival de Lancaster, os produtores Tom Dimas e Everton Rusk pareciam deslumbrados com as próprias ideias, sem muito medir ou perceber as consequências. O clima de deslumbramento ainda tomava parte do público que fazia fila para a compra de ingressos, que era feita no armazém de número oito lá no descampado enorme no final de Lancaster, no local em que seria realizado os shows. O negócio só começou a tomar ares mais realistas ao invés do clima de festa e de sonho quando apareceram alguns dos seguranças contratados, que eram membros da força bruta da gangue feliz, disfarçados de empregados de segurança de eventos da tal empresa Consult. E também quando apareceu a rapaziada arruaceira que andava de preto e de correntinha pelas ruas de Lancaster também para comprar ingressos.
O pessoal que andava colorido e deslumbrado saiu pela tangente quando esta molecada apareceu, pois eles eram os principais suspeitos das queimas de igrejas e episódios de vandalismo ocorridos em Lancaster, Condor Streets e Monrose. Quanto a McCarthy, este ainda tentava se recompor do baque quando, uma semana depois, mesmo estando acompanhando de seu staff de três seguranças armados, um carro preto com vidros escuros passou rente ao seu e disparou uma saraivada de tiros contra o seu carro, matando um dos seguranças, o motorista, e McCarthy tomou oito tiros na cabeça, morrendo na hora, e os outros dois seguranças escaparam ilesos.
O carro dos assassinos do juiz saiu cantando pneu e sumiu em direção de Alphaville, depois de uma correria desesperada de transeuntes pelas ruas de Monrose, onde o juiz tinha acabado de responder a uma diligência inesperada. Era uma queima de arquivo, pois o juiz agora sabia da fisionomia de alguns dos membros da gangue feliz, sobretudo de Laetitia e César Layne. César Layne, por sua vez, mandou a força bruta da gangue feliz invadir o apartamento do juiz assassinado, quebrando e bagunçando tudo, para simular um furto, como um meio de explicar o sumiço de documentos importantes e confidenciais que Laetitia tinha conseguido depois de dopar o juiz com fentanil.
A notícia da morte do juiz corre por toda imprensa e população de Buffalo, e a gangue feliz agora estava cada vez mais em evidência na imprensa de Buffalo, redondezas e por parte de Colombo, a notícia é que acontecia uma guerra de gangsters em Buffalo, tudo por causa do tráfico ilegal de bebidas alcoólicas.
Por sua vez, dias depois do assassinato de McCarthy, muito comemorada pela gangue feliz, com direito a uma festa milionária num clube caro de Buffalo patrocinado por Norman Baptiste, com toda a gangue feliz e apaniguados presentes, a Bureau From Judgement consegue realizar a primeira baixa na gangue feliz, pois em Liechtenstein é feita uma derrubada de depósitos e armazéns clandestinos de bebidas alcoólicas, de propriedade da gangue feliz, graças ao trabalho incansável do delegado Adam Jones, e a derrubada do local não é feita sem um tiroteio generalizado contra os vigias e seguranças da gangue feliz que tomavam conta do lugar.
O tiroteio foi intenso, com inúmeros barris de uísque e vinho estourados por balas de revólver e submetralhadora, e uma imensa quantidade de bebida alcoólica inundando o pátio externo aos depósitos e armazéns, formando rios de vinho, uísque, vodka e vermute. O que a Bureau From Judgement reparou é que nos barris de bebidas alcoólicas tinham selos com o nome de Norman Baptiste, e com títulos de gosto duvidoso, como “The King”, “Murderer” e “Lucifer of Buffalo”, “Belzebuth”, dentre outras bizarrices.
Eles tiraram fotos e levaram para a sede da Bureau, no centro de Buffalo, e a Bureau agora intensificava as investigações, com esforços conjugados ao trabalho astuto do juiz Thomas Mancini que, para variar, trabalhava num silêncio de uma frieza terrível.
Norman Baptiste fica sabendo da destruição dos depósitos e armazéns de Liechtenstein na manhã seguinte, realiza uma reunião de emergência, e tal reunião dura três horas, com Baptiste aos berros, socando a mesa, quebrando copos e cinzeiros na parede, dando um tiro num vaso de plantas, mandando um sabujo ser espancado até a morte, ali mesmo na reunião, e ao fim ordena uma caça da gangue feliz para matar o delegado Adam Jones, e em seguida queimar a casa do juiz Thomas Mancini, como um aviso.
A ideia de sequestrar a esposa do juiz ou sua filha foi refutada por Baptiste, sugestão do gordo Tom Brand, que vivia cada vez mais endemoniado e falando em línguas estranhas, com alguns membros da força bruta achando que o gordo tava endoidecendo etc. Norman Baptiste ainda não queria matar Mancini por um tipo de honra, queria ser prefeito de Buffalo na cara do juiz, para assim poder humilhá-lo. E os boatos dos rituais diabólicos entre aquela patota de Baptiste, Brand e Layne só aumentavam, a lenda era de que havia um pacto com espíritos malignos em troca de poder e dinheiro, incluindo até rituais em que se sacrificavam pessoas.
Para aumentar o ódio de Baptiste, por sua vez, o delegado Adam Jones, presidente da Bureau From Judgement, ordena a prisão do presidente da Câmara do Vereadores de Buffalo, o M.Elliot das maletas, pois a investigação fora concluída e então decretada de ofício a prisão do corrupto vereador, que era o principal canal da gangue feliz com a classe política de Buffalo.
M.Elliot passa por um interrogatório, não fala nada, não abre o bico, contudo, um mês depois é encontrado morto na cela pendurado pelo pescoço por uma teresa de lençol branco. A perícia, subornada pela gangue feliz, conclui por suicídio. Uma semana depois, Adam Jones é fuzilado dentro de casa, enquanto assistia TV com sua esposa, que é mantida incólume e chocada. E a casa do juiz Thomas Mancini pega fogo enquanto os moradores viajavam no feriado. Norman Baptiste se dá temporariamente por satisfeito.
Enquanto isso, o inquérito que tinha sido aberto por medida do agora juiz assassinado McCarthy, depois de seu desfalque em sua casa por Laetitia e cia, é silenciado e arquivado depois de um polpudo suborno de detetives dentro da própria Bureau From Judgement que foram comprados.
A parte incorruptível, por sua vez, da Bureau, herdou uma diligência de Adam Jones, que visava fazer uma desova de armas da gangue feliz, o que culminou com uma ação pela manhã, também em Liechtenstein, mas agora numa croca periférica e extremamente pobre e insalubre, onde havia uma vila colonial abandonada, habitada por viciados, e que servia de depósito de armas.
Foram apreendidos fuzis, submetralhadoras, lança-granadas, drones, caixas lotadas de projéteis, um mundaréu de pistolas automáticas e revólveres de diversos calibres, caixas com armas brancas como facas, adagas, canivetes, machados e até cimitarras, um negócio bizarro, e novamente os tais selos em que estavam escritos “Lucifer of Buffalo”, “The King”, “Belzebuth” etc.
Era uma quantidade colossal de armas, e estas foram encaminhadas para o QG do Exército de Colombo localizado em Buffalo, e que reunia os conscritos em serviço militar obrigatório, sargentos e postos maiores da hierarquia, incluindo o general e comandante da região, Hermann Lott. O Exército serviu de local de armazenamento das armas pois era este que fazia o controle de armas em Colombo, centralizando o cadastro em que as armas eram registradas e se tornavam legais, separando o que era de venda controlada e o que era de uso restrito.
O tal festival de três dias no descampado de Lancaster começa. A dupla de produtores Tom Dimas e Everton Rusk andava deslumbrada, sobretudo com o line up que conseguiram angariar, muito devido ao lobby de um empresário da música de Colombo, que tinha muito poder e era tio avô de Tom Dimas, pois ele tinha gravadora e influência sobre produtores e a indústria cultural fonográfica.
Bandas neo hippies e alternativas predominaram no line up, e a ideia desta primeira edição do Festival de Lancaster era o lançamento de uma plataforma para a música de rock alternativo. De tarde, antes de começar o primeiro dia de shows do festival, apareceram uns filhinhos de papai, hipsters dos bairros de Humble Sea e Patson, que gostavam de citar bandas que ninguém nunca tinha ouvido falar, mas que ouviam também o mainstream do puro suco de pop alternativo ou pop punk.
Depois, ainda durante a tarde, apareceu a galera felizinha e colorida da onda neo hippie, com pedacinhos de cogu psilocibina no bolso. Além dos meninos de preto que circulavam por Lancaster, Alphaville, Condor Streets e Monrose, principais suspeitos dos incêndios criminosos de igrejas em Buffalo. E por fim, veio a empresa de segurança particular, cujo nome fantasia era Consult, que era nada mais que membros da força bruta da gangue feliz que iam fazer um bico de segurança de show naqueles três dias de festival.
O primeiro dia de shows corre ligeiramente bem, mas com muitas reclamações sobre o preço de bebidas e comidas, a qualidade da água mineral e de banho, os banheiros químicos, com alguns destruídos, alguns problemas ainda pontuais de violência dos seguranças contra o público, e um cheiro insuportável de xixi e merda nas laterais do show, nas duas últimas horas da primeira apresentação de line up, que foi quando algumas dezenas de banheiros químicos foram vandalizados e cinco queimados.
No segundo dia, os produtores dão uma entrevista para a televisão e são questionados pelos problemas do primeiro dia, mas o nível de deslumbramento de Tom Dimas e Everton Rusk evitavam que eles fossem tematizar os problemas, só falando das virtudes do festival, da beleza, do encanto, num tipo de discurso hippie requentado, eles pareciam a rapaziada colorida de psilocibina que era uma das tribos do festival e só queriam falar de “coisas boas etc”.
O segundo dia é o mais calmo, com uma predominância de bandas de rock alternativo e pop punk no line up. Mas as reclamações do dia anterior se repetiram. E no terceiro dia o caldo entornou. O line up era mais agressivo, com bandas ao gosto dos meninos de preto etc. O resultado foi que começaram incidentes de violência dos seguranças contra o público, sobretudo com pauladas nas costas e na cabeça. Pessoas sangrando que tinham apanhado dos seguranças eram levadas para os postos médicos montados no descampado.
Foi anoitecendo e as reclamações sobre preços de bebida e comida, a qualidade da água mineral, que agora o público alegava estar com cocô, os banheiros químicos fétidos, sem limpeza nos intervalos dos dias de festival, lojas com camisas com preços fora da realidade.
Com todos os problemas apresentados, a postura de negação da realidade dos produtores do festival culminou com um surto no público, e os banheiros químicos foram vandalizados e queimados, as lojas de camisas e souvenirs foram vandalizadas e saqueadas, além de torres de TV em chamas, e grandes fogueiras por toda parte, além de seguranças surtados batendo em todo mundo. Um caos e um fracasso retumbante que caiu sobre as cabeças dos produtores Tom Dimas e Everton Rusk.
A prefeitura então tomou medidas drásticas, com pessoas presas, outras processadas. O evento virou um escândalo na TV sem precedentes e um golpe terrível para os planos de reeleição do prefeito, que depois de demitir o subsecretário, que não recomendou a realização do festival, agora engolia seco o desastre. E uma segunda edição do festival ficou completamente fora de cogitação, obviamente.
E depois de um mês de baixa nas estatísticas, começou uma nova onda de suicídios nos bairros de Lancaster, Condor Streets, também em Alphaville, e a igreja de Potsdam, em Monrose, que tinha sido queimada, e reinaugurada há duas semanas, depois de um trabalho multidisciplinar, envolvendo até especialistas em relíquias e restauradores dos melhores do mundo, amanhece vandalizada, com objetos quebrados, e pichações com alusões à morte e satanás etc, além de suásticas e palavras de baixo calão.
Um dos sacerdotes que tomavam conta da sacristia de Potsdam, dois dias depois deste ataque de vândalos, se enforca em sua cela religiosa com um lençol, provavelmente tomado por um desgosto profundo. Protestos contra a violência em Buffalo começam a pipocar por diversos bairros, o que finalmente configurava uma reação civil contra aquele estado de coisas, sobretudo o nome gangue feliz, que corria como pólvora e se tornara o principal problema de Buffalo.
Depois das baixas de Adam Jones e McCarthy, agora a gangue feliz iria retaliar a Bureau, desta vez em relação ao desfalque de armas, que representava, na escala da gangue, um quinto do que eles tinham, apesar de ter mais o triplo encomendado que viria de navios no portos de Brunswick e da Nova Caledônia, com estivadores cevados com dinheiro da gangue feliz para liberar a mercadoria, junto com os toneis e barris de bebida alcoólica que também vinha de navios da Escócia, da Rússia, da França, da Itália, etc.
Com a Itália havia uma sociedade ainda em gestação junto à máfia siciliana, sobretudo para o incremento do tráfico de armas, também com armas sendo vendidas para terroristas do Oriente Médio e da Indochina, o que viria a ser um novo passo no faturamento da gangue feliz, desta vez em parceria com os mafiosos da Sicília.
Por sua vez, a retaliação é feita na sede da Bureau, no bairro nobre de Patson. A sede é metralhada, e depois explodida, e no mesmo bairro dois bancos são roubados e explodidos, o que rompera a casca da violência da gangue feliz apenas em bairros de classe baixa, e os eventos de bancos roubados e explodidos se tornariam agora a praxe em bairros nobres de Buffalo.
Por fim, três detetives da Bureau são seviciados e mortos queimados, no que chamaram de ritual de magia negra do tal líder Norman Baptiste, o estranho e tétrico chefão da gangue feliz. E diversas ameaças anônimas começaram a pipocar na Bureau, e agora na imprensa, que a gangue feliz agora tentava silenciar. Também apareceram ameaças na polícia, contra a Câmara de Vereadores, além de ameaças de morte ao prefeito etc.
Depois desta vingança contra a Bureau From Judgement, Norman Baptiste organiza uma festa em A Barca, e que se estenderia pelo cabaré Atlântida, na tal sociedade com Cleonice e Demian. E mais uma nova onda de suicídios cobriu em mais um mês diversas mortes por enforcamento, envenenamento, pessoas se jogando de prédios, abrindo o gás para se sufocarem ou explodirem suas casas ou apartamentos, suicídios por armas de fogo, superdoses de medicamentos, pessoas que se jogaram na linha do trem, além de cinco suicídios ritualísticos que pareciam ser de magia negra, sendo um feito por um vocalista de uma banda de metal extremo que residia no bairro de Monrose.
Continuavam os incêndios criminosos, atingindo igrejas, comércio, sinagogas, mesquitas, escolas, um museu de História Natural, uma biblioteca pública, e uma tentativa de incêndio da Câmara dos Vereadores que foi debelada graças a uma denúncia anônima.
Os chamados meninos de preto circulavam por estes bairros e eram os principais suspeitos, pois parecia uma onda de jovens delinquentes e não ações da gangue feliz, que agora parecia mais entretida em roubar e explodir bancos em bairros nobres como Patson, Rumble Sea e Melrose.
E surgia em Lancaster um fenômeno bizarro de jovens moças sendo supostamente possuídas por entidades demoníacas, eram relatos de possessões, combustões espontâneas, poltergeists e levitações que parecia uma histeria coletiva daquele bairro que sofria a maior onda de suicídios de Buffalo, além de sofrer incêndios criminosos por meses, no que só havia duas igrejas funcionando no bairro, pois eram vigiadas por segurança particular pagas por moradores do bairro.
Padres foram convocados às pressas para fazerem o exorcismo daquelas moças, um relato dizia que um padre morreu de hemorragia durante um exorcismo de uma menina que levitava e falava latim com voz rouca. A clínica psiquiátrica principal de Buffalo, localizada no bairro nobre de Rumble Sea decidiu acolher estas moças como pacientes para tratamentos adequados, mas coisas estranhas de fato aconteciam, objetos cortantes voavam, uma telecinese generalizada era comum nos corredores da clínica, e a situação era um mistifório de crendices e ceticismo disputando teorias diversas sobre o caos em que viviam.
Por sua vez, começa a festa comemorativa das baixas na Bureau, que se inicia com um grande almoço em A Barca, e que tem as tradicionais afetações de César Layne, a liderança de Norman Baptiste, e Tom Brand que, conhecido pela alcunha de “o gordo”, que agora parecia estar numa trip particular em que já não falava coisa com coisa, o gordo, com sua bengala de entidade babilônica, agora se via com fantasmas imaginários, fantasias de morte, e sua saúde física, além de sua deterioração mental, também estava em decadência, ele parecia um louco fanfarrão, mas que agora virara uma caricatura, um tipo de palhaço triste de circo, mas que na verdade estava mergulhando progressivamente nas trevas da loucura.
Laetitia tinha uma espécie de status junto com a outra das musas da gangue feliz, Titania, e agora ela tinha se casado há uma semana com Norman Baptiste, numa cerimônia secreta com doze convidados. O relato de um pajem é que tinha sido feito um pacto meio doido que ele não tinha entendido direito, mas que parecia “coisa do diabo etc”.
O almoço em A Barca é farto e a noite no cabaré Atlântida virou um paraíso para a força bruta da gangue feliz que, financiada por Norman Baptiste, escolheram as putas diversas do lupanar que era aquilo, e se mandaram para os quartos de cima, numa bacanal paga pelo chefe. E no meio da festa, César Layne, bebaço, pede a palavra e começa a fazer uma digressão sobre os benefícios de ser insensível à dor e ao sofrimento, sobre o fanatismo nazista, no que tascou um áudio com um discurso inflamado de Hitler em Berlim, de seu celular, e que muitos da gangue feliz pareciam ter delírios molhados com o antigo regime derrotado pela grande guerra, ao passo que alguns ficaram constrangidos, como Demian, que começava a perceber que aquilo ia muito além de uma organização criminosa stricto sensu.
Cleonice estava encantada consigo mesma, no caso às custas de Baptiste, que transformou o restaurante numa referência e como premiado em disputas gourmet etc. As roupas de Cleonice, até então uma senhora pálida, com uma vida comum, parecia agora afetar uma vida de perua louca, rica, cheia de joias, pulseiras, e uma mansão kitsch, de gosto duvidoso, com candelabros, colunatas, jarros, plantas, animais empalhados, frisos escalafobéticos, armários de madeira, pinturas rococó de Watteau, bordados pastel, azul claro e porcelanas histriônicas. Um mundaréu que tinha como grand finale anjos e gárgulas compondo a amurada da grande casa secular e que representava um monumento inconsciente do kitsch, uma “obra-prima”.
Ali na festa também se celebrava a união de César Layne e Titania, que agora formavam o núcleo duro da gangue feliz, junto com Norman Baptiste e Laetitia. “O gordo”, como terceira força deste pacto, agora definhava e era tolerado como uma presença virtual, pois não era mais útil para a gangue feliz, sendo bem cuidado pelos serviços prestados, ele que estava tendo as despesas médicas pagas por Baptiste, que incluía exames caros e remédios também com preços elevados. E com a decadência da saúde mental de Tom Brand “o gordo”, a questão já não era mais “se”, mas sim quando ele seria internado para tratamento.
Demian, por sua vez, estava impressionado com aquele conjunto de gente da gangue feliz, ele não imaginava que aquilo tudo era tão sinistro, e viu num canto do Atlântida, com uma coleira amarrada a uma das mesas, o cachorro Panda, que admiravelmente ainda estava vivo, mas, agora, além de emanar um miasma de enxofre, peidar e grunhir, tossia ferozmente, parecia um cachorro velho com enfisema. Volta e meia aparecia alguém da força bruta da gangue feliz e lhe dava linguiças, bacon, e mais um monte de porcarias que não se sabia como aquele cachorro ainda não tinha morrido em meio daquela gente.
Demian tinha ganhado também uma vultosa quantia de dinheiro nos últimos meses, e era o gerente geral de A Barca e do Atlântida. Ele quase não tinha gastado o dinheiro, e planejava deixar o cargo em poucos meses e se mudar de país. Contudo, precisaria convencer a gangue feliz, o que, traduzindo, teria que conversar com Norman Baptiste sobre o assunto. Demian achava que conseguiria esta transição, uma vez que seu negócio era o bar e o cabaré e não exatamente uma participação direta na gangue feliz, com deveres de lealdade eterna etc.
Enquanto rolava a festa em A Barca e no Atlântida, mais uma daquelas festas caríssimas da gangue feliz, as investigações avançavam por parte da força tarefa formada e idealizada pelos juízes Thomas Mancini e William Clarke, e muito do banco de dados erguido por Adam Jones na Bureau foi assimilada à análise de dados que se estendia pela nova investigação.
Esta nova investigação estava indo fundo, nas entranhas do sistema, sobretudo no que tinha sido aparelhado pela corrupção, e imagens captadas por câmeras da cidade, tentando identificar e cruzar dados de membros da gangue feliz, tinha por desiderato, principalmente, fazer cair seus cabeças, que eram Norman Baptiste e César Layne, o que seria o começo do fim da tal gangue feliz, e simultaneamente derrubar todos os seus membros, que eram os paus mandados da força bruta. Transações financeiras, empresas de fachada e nomes falsos também estavam no escopo da investigação e estava se montando um grande mapa, um quebra-cabeças, e que estava sendo estudado profundamente pela dupla de juízes criminais Thomas Mancini e William Clarke.
Um dos resultados da festa no Atlântida foi um coma alcoólico do filho problema de Cleonice, que na verdade era um inútil que fingia trabalhar no cabaré, mas ficava fazendo palavras cruzadas, jogando no computador ou vendo putaria na internet etc. Este era o seu expediente de meio turno de tarde no Atlântida, pois Cleonice sabia que seu filho único de pai ausente era um merdinha que vivia na lei do menor esforço e terminaria dependendo dos outros, então que fosse dela.
Este merdinha então vai para o pronto socorro com coma alcoólico e descobre lá uma cirrose hepática em estado avançado que o mataria em três meses. Tom Brand, “o gordo”, por sua vez, tinha tomado uma quantidade colossal de Yellow Sunshine e começou a delirar e ter alucinações, tendo que ser retirado por uma ambulância que o levou para uma clínica psiquiátrica para tratamento.
Demian então espera uma semana após a festa para marcar uma visita ao escritório de Norman Baptiste, que era uma de suas poucas empresas verdadeiras, a empresa de venda de caixões de nome Covenant, e que estava tendo um faturamento altíssimo em Buffalo por mérito da gangue feliz e pelos bandos de jovens de preto que se matavam nas ruas e as ondas de suicídios que se alternavam em Buffalo.
A conversa entre Demian e Norman Baptiste é afável e termina sem uma resposta de Baptiste sobre a demanda de Demian. Contudo, Baptiste faz um convite a Demian para um jantar em sua mansão, onde Demian entenderia tudo, uma vez que Norman Baptiste disse que simpatizara com ele e sua sinceridade e curiosidade.
Portanto, Demian preferiu arriscar e falar a verdade de suas intenções, mesmo sabendo se tratar de uma organização extremamente violenta. O resultado poderia ser um soco na mesa ou o que aconteceu, Norman Baptiste comprou o barulho, pois achava que cada um tem que logo dizer a que veio ao invés de peidar na farofa. Por tal razão que, volta e meia, um sabujo rodava nas reuniões de cúpula, pois eram seres insossos com sangue de barata e que vendiam a bunda ao dar um elogio fácil, um agrado, que na verdade era algo pegajoso feito por lacaios que, de súbito, tinham como vicário o alvo de suas bajulações.
Eis que chega a noite do jantar. Era uma mansão que ficava em Melrose. Norman Baptiste fez questão de mandar um chofer buscar Demian e levá-lo ao local. Tudo certo, Demian entra na tal mansão e sente calafrios, e o tal cheiro insuportável de enxofre que sentira ao ver Baptiste e Layne pela primeira vez, só que desta vez como um ar sufocante.
Demian começa a suar frio e Baptiste manda uma serviçal lhe dar água e que aquilo era normal para uma pessoa “não iniciada”. Demian perguntou em que ele deveria ser iniciado, só que Norman Baptiste disse para Demian aguardar. Logo aparece na sala principal, de pé direito descomunal e extensão enorme, Laetitia. Depois aparece Titania, que só não era uma irmã de sangue de Laetitia por obra da natureza, pois eram muito próximas, antes mesmo delas conhecerem Norman Baptiste e César Layne.
Havia uma quantidade enorme de empregados que trabalhavam naquela casa, e isto incluía um mordomo, que conhecia todos os gostos e manias de seu chefe, Norman Baptiste. Contudo, nenhum daqueles empregados faziam parte da gangue feliz e mantinham um pacto de silêncio sobre tudo o que acontecia por uma razão bem catita, senão todos eles morreriam, até mesmo o mordomo, que era o camarada mor do líder da gangue feliz até a página 3.
Demian, devido a ter corrido um risco imenso, ser tomado por esperto perante a gangue feliz, ou seja, ganhar dinheiro e depois tirar o corpo fora, levou um bônus, no entanto, pois tinha ganho a simpatia de Baptiste, este que sempre preferiu ouvir de pessoas que elas tinham interesses ao invés de escrúpulos, que pensavam em si e não nos outros. Assim, Demian, ao pensar em si, teve uma anuência brutal de Norman Baptiste.
O jantar é servido depois de uma longa conversa envolvendo Demian, Baptiste, Laetitia, Layne, Titania, e mais alguns membros da gangue feliz, todos da cúpula, pois em tais reuniões íntimas o pessoal da força bruta não participava, uma vez que eram massa de manobra e uma classe inferior na hierarquia, serviam para os eventos violentos, e na verdade eram empregados de Norman Baptiste, pé rapados, a maioria vinda da ralé, e que iam atrás de status e dinheiro fácil. Pessoas sem nobreza, sem formação e sem refinamento, o oposto do dandismo de Norman Baptiste e de César Layne, que se diziam de origem tradicional, descendentes de antigos proprietários de terras etc.
Foi servido muito vinho, e uma entrada, e depois três opções de pratos principais, em que cada um poderia se servir, e ao fim uma sobremesa e aí sim Norman Baptiste coloca As Valquírias de Richard Wagner no talo e diz que a gangue feliz estava prestes a tomar o poder, que o desiderato seria a sua candidatura a prefeito de Buffalo.
Depois veio César Layne e começou a ler um trecho de um grimório, e o cheiro de enxofre que nauseou Demian, quando entrou na mansão de Norman Baptiste, agora virava um tipo de miasma marrom e amarelado que passava a dominar a atmosfera da grande sala, à medida que César Layne lia o tal grimório, que ele dizia ser de uma edição inglesa rara, feita por um copista que teve acesso a um mago negro etc.
Criou-se um círculo no meio da sala, e uma bandeira com um pentagrama de ponta a cabeça desceu do teto, e outra bandeira com uma suástica desceu de outro lado da sala. Demian ficou horrorizado e em pânico, mas teve que se conter e fingir fleuma. Ele só pensava se sairia vivo daquele espetáculo e logo percebeu que aquilo era uma cerimônia satanista, com ecos de nazismo, fascismo e de pensamento totalitário. O cumprimento nazi era utilizado na tal reunião, e uma progressiva histeria espiritual tomava conta da tal cerimônia, em que conjurações, ritos ditos em latim, alternando com colocações sinistras de Norman Baptiste culminaram com clarões, além de vultos andando pela sala enorme, que Demian podia ver a olho nu e sem bem crer no que via.
Se acenderam as velas vermelhas, um novilho foi sacrificado, e Norman Baptiste mandou apagar as luzes da sala enorme. Tudo ficou iluminado pelas tais velas vermelhas, e um coração de boi foi colocado como oferenda à Satanás, junto com comida, farinha, ossos, dinheiro, ouro, armas de fogo, armas brancas, e cruzes gamadas de metal, tudo em vasilhas de barro, e então começou a ocorrer uma perturbação em Norman Baptiste, que começou a grunhir a palavra Belzebuth, depois citou outros nomes de potestades, e seu rosto parecia o de um demônio quando Demian se voltou para focar em Baptiste e seu estado psíquico e mediúnico.
Era um ritual de consagração para a conquista de poder, e Laetitia, neste ínterim, trouxe uma taça com sangue de novilho que foi bebida por Norman Baptiste numa talagada, foi aí que a entidade que tomava o seu corpo se materializou, com seu ectoplasma, e disse que era um dos maiorais do grande vale em que Buffalo estava sendo sugada. Norman Baptiste tomou a forma de um tipo de demônio, e César Layne, por sua vez, estava com uma cara sinistra, também incorporado por um maioral das trevas e que tinha sido um dos cabeças no nazismo alemão décadas atrás, mas sem se identificar, no entanto.
Demian fica apavorado. A tal entidade disse para Demian ficar calmo, pois seu caminho já tava definido pelo oculto. Norman Baptiste, seu cavalo, já tinha algo em mente para ele. O tal ritual se encerra com a desmaterialização da tal entidade maligna de Norman Baptiste e este volta a si, e se sente pronto para ser o futuro prefeito de Buffalo etc.
Demian é convidado para um café da manhã dois dias depois por Norman Baptiste, e este lhe informa que seu desejo de deixar o país seria realizado. Ele receberia uma nova identidade, uma vez que as investigações que Thomas Mancini estava empreendendo uma hora chegaria em A Barca e no Atlântida, e até isso ocorrer Demian estaria com outro nome e outra vida lá nas Maldivas.
Com o dinheiro que já tinha, dava para Demian ter uma renda razoável, sem excessos, mas com conforto e comodidade. E então sua viagem foi antecipada, pois Norman Baptiste nunca tinha visto um cara marcar um encontro com um chefe de gangue e falar que queria sair fora e se dar bem. Então foi exatamente o que Norman Baptiste fez, despachou Demian para viver tranquilo nas Maldivas.
Nisso continuavam correndo as notícias sobre suicídios e agora incrementadas pelas possessões demoníacas em moças jovens de Lancaster, com uma tendo matado uma freira de hemorragia ao lhe enfiar um crucifixo na boceta. E os relatos de levitações, telecinese e combustões espontâneas se repetiam. Poltergeist, por exemplo, era algo relatado cada vez mais em Lancaster e agora também em Alphaville. Por sua vez, os tais meninos de preto estavam começando a ser detidos, e as provas de serem incendiários começavam a aparecer.
Demian é levado por um chofer para a sua fuga no aeroporto de Rumble Sea, e tudo dá certo, agora ele seria um tal de Norman Hilton que morava nas Maldivas. Nunca que as tais diligências dos tais juízes criminais o pegariam, ele de fato tinha se safado. As investigações da dupla de juízes criminais, Thomas Mancini e William Clarke avançavam rapidamente na sua base de dados, um cruzamento insano de informações que tinha sido acelerado com auxílio da inteligência artificial.
Uma grande devassa simultânea em toda Buffalo estava sendo planejada meticulosamente. A análise de dados formava um mapa de ações a serem tomadas ao mesmo tempo pela tal força tarefa, para que ninguém escapasse. Passam dois meses e é acionada as chamadas Ações Diretas, em que uma miríade de pessoas foram processadas ou presas em flagrante.
O restaurante A Barca e o cabaré Atlântida são fechados e Cleonice é presa, depois da apreensão de bebidas alcoólicas que estavam encaixotadas, em barris e para venda. A mansão de Norman Baptiste em Melrose foi tomada. Parecia que tudo estava dando certo, mas, por um grande corpo de advogados e manobras jurídicas, Norman Baptiste consegue responder em liberdade aos vários processos, e um julgamento seria feito, mas ainda havia uma disputa jurídica insana e uma tática avassaladora de recursos protelatórios emperrando a prisão definitiva de Norman Baptiste. E Laetitia engravida em meio a estes processos.
Contudo, a chamada Lei Seca de Colombo é revogada por pressão popular, e em poucos dias toda a fonte de renda da gangue feliz vira pó. Sem poder pagar seus advogados, Norman Baptiste é finalmente preso, mas não pelos assassinatos, que ainda dependia de decisões judiciais, mas por ter rodado no Fisco, com sonegação de impostos na tal empresa Covenant que vendia caixões.
Dois meses depois de ser preso, Norman Baptiste entra num estado de demência mental, parecendo uma criança de cinco anos. César Layne também é preso pouco tempo depois, também por problemas fiscais, além de Laetitia e Titania. E Laetitia tem seu filho na prisão,
Corre o boato maldoso de que o filho de Laetitia com Norman Baptiste era um “bebê diabo”, o que rendeu semanas de assunto para a imprensa marrom de Buffalo. Até que o assunto morreu e Norman Baptiste afundou em sua demência até morrer, ainda na cadeia, de câncer no pulmão. Laetitia foi solta anos depois e sumiu de Buffalo para sempre. Thomas Mancini e William Clarke, depois do sucesso das Ações Diretas, declinaram dos inúmeros convites para entrar na política e continuaram como juízes criminais até se aposentarem.
Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
Conto pronto em 27/10/2023
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