O anarquismo se constituiu como um tipo de Filosofia política e prática de ação social que cresceu pela Europa durante a segunda metade do século XIX até os anos 30 do século XX. Atualmente, o anarquismo vem sendo recuperado, tal como se vê em movimentos de protesto pelo mundo, em que formações como os Black Blocks vêm tomando vulto desde a década de 80 do século passado.
Para pensar sobre o anarquismo, torna-se impossível tomá-lo como um corpo doutrinário, uma vez que tal prática de ação política e social nunca foi hierarquizada ou teve um poder central. Muito pelo contrário, a autogestão social e a organização sindical descentralizada foram as formas que surgiram do seio do movimento, que sempre foi caracterizado por não ser feito por um único grupo ou orientação, mas pelo pluralismo de métodos e de atitudes.
Se podemos reunir um ponto em comum de todos os movimentos anarquistas que surgiram, o que se vê é que o anarquismo sempre foi uma atitude de negação de qualquer tipo de autoridade, numa valorização da liberdade a todo custo. Liberdade radical que sepulta qualquer tentativa de abarcar o anarquismo como doutrina política.
O anarquismo terá seis princípios básicos de teoria e de ação: autonomia individual, autogestão social, internacionalismo, ação direta, associações operárias e greve geral. Nestas frentes, o anarquismo sempre foi uma atitude de enfrentamento pela liberdade, ou seja, uma atitude libertária contra a estrutura do Estado (o anarquismo nega o Estado, luta pelo seu fim), e também contra a exploração capitalista, nascendo no seio da Internacional socialista entre os marxistas, com os quais entrará em conflito.
Todo anarquista luta por uma nova sociedade, o indivíduo e sua liberdade são as tônicas que fazem o movimento, o anarquismo é uma teoria sociopolítica que se constrói como movimento social e que se funda como prática histórica, onde vale mais sua aplicação prática que as teorias que a compõe. O anarquismo é, sobretudo, uma condição de luta pela liberdade que seria realizada pela organização solidária entre os homens. O conceito errôneo de que todo anarquismo se refere à baderna ou a atos violentos destitui o sentido libertário e evolutivo em que o indivíduo solidário com seu semelhante é o ponto de inflexão da verdadeira revolução social anarquista, onde há o fim da autoridade, pela figura do Estado, e a ação direta se faz mais pela organização federalista, pela forma de sindicatos descentralizados pela autogestão social, do que pelas ações performáticas de anarquistas individuais em atentados duvidosos ou o puro vandalismo.
A ação terrorista de alguns não seria a forma de operação do anarquismo tomado em seu sentido amplo, pois os principais pensadores do anarquismo, tal como Kropotkin, reprovavam ações de "lobos solitários", tais como as que ocorreram durante o desenvolvimento do movimento durante a segunda metade do século XIX, em que anarquistas individuais praticaram atentados contra autoridades e até imperadores, o que podemos ver em figuras daquela época como Louise Michel e Ravachol. O movimento mais intelectual do anarquismo, tinha mais a ação direta no sentido não da violência, mas da ação transformadora, através de uma organização solidária, e não de práticas terroristas que, na opinião de alguns mestres anarquistas, manchavam o anarquismo como pura violência desordenada, e não como ações sociais independentes de hierarquia, pelo fim das instituições, e pelo fim do Estado e de toda autoridade, numa afirmação de liberdade incondicional.
O sentido do anarquismo como desordem se deu, sobretudo, pelo advento da Revolução Francesa, e sempre foi usada para dimimuir o movimento organizado que surgiu já quase um século mais tarde. O senso comum sempre associou o anarquismo como ação direta pela violência, esquecendo-se do conceito amplo de ações e atitudes que envolve toda prática social anarquista, onde a solidariedade é o ponto que funda a via transformadora, tendo na liberdade seu meio e seu fim. O que importa para o anarquismo é a afirmação da liberdade individual, numa transformação evolutiva da sociedade, que se destitui das instituições, de suas autoridades e hierarquias.
O movimento difuso pela via sem centro e sem gerência hierarquizada é o movente da utopia de um homem melhor pela ausência do Estado, figura histórica que deve ser superada pela pura solidariedade entre os homens e pelo federalismo de grupos diversos em cooperação mútua, numa sociedade nova, surgindo com os valores libertários, e se sobrepondo aos valores do autoritarismo, um homem que tem na sua evolução pela solidariedade o fundamento da nova sociedade anarquista, em que a autogestão social supera a organização institucional, e onde não há mais uma autoridade, mas sim, grupos descentralizados que compõe o tecido social e que não têm mais a representação de um poder de cima para baixo.
No anarquismo, não há mais poder organizador, e sim federações cooperando entre si, e onde a liberdade é o valor supremo, o que implica necessariamente, no anarquismo, a implosão de toda hierarquia, tudo se torna horizontal, não há mais mando e obediência. O anarquismo se caracteriza por um espontaneísmo de uma humanidade que só se melhora e evolui, naturalmente, pela via transformadora da ação direta pela liberdade, e pela organização federalista de cooperação e solidariedade, compondo no tecido social, grupos que não necessitam de um poder central.
Na geração espontânea, tornada possível pelo fim do Estado e da autoridade, de um homem liberto e solidário, é que reside a fé e a esperança anarquistas, num viés evolucionista de uma sociedade que pode ser melhor quando o valor a ser propagado é o da liberdade de iniciativa e o fim do poder constituído. O fim das injustiças sociais é o fim do poder e do Estado. O anarquismo é a liberdade transformadora como prática social em uma rede de grupos ou federações que formam a sociedade nova sem Estado. A liberdade anarquista é o valor social gerado por esta forma de organização social, e na liberdade, para o anarquista, nasce a solidariedade entre os povos.
A utopia anarquista ainda vive neste nosso século, e não se faz pela ação direta violenta somente, mas pela constituição de ações transformadoras libertárias, que visam ao bem comum, e que não precisam ser violentas. O anarquismo pacifista, por exemplo, prescinde de ações radicais, centrando seu interesse na propagação de novos valores libertários e não-violentos de uma sociedade mais solidária, em que os homens podem atuar pelo bem comum, sem precisar esperar o aval de instituições organizadas, e sem ficar refém do poder. O anarquista arregaça as mangas e vai à luta pela liberdade, o que não pode ser unicamente a depredação de símbolos capitalistas, como se faz nos Black Blocks. A prática libertária é muito mais ampla e consciente que a violência direcionada, temos recursos de ações e práticas que vão muito além da performance midiática e violenta desses novos anarquistas que parecem mais fascistas que libertários.
Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
Link da Século Diário: http://www.seculodiario.com.br/exibir.php?id=9584&secao=14
mto bom o texto meu primo! e concordo plenamente com a "via pacifista" q o anarquismo, ao meu ver, deve ter! - marcelo cunha
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