PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

domingo, 9 de agosto de 2020

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A VONTADE GERAL, A LEI E O LEGISLADOR

Rousseau pensa o contrato social como uma solução para o problema fundamental de toda comunidade humana, que é a conciliação entre liberdade e obediência, tal associação serve para que os homens, que atuam como cidadãos na vida social, possam recuperar a liberdade que tinham no estado de natureza. Tal contrato social teria a capacidade de que todos obedecessem sem ninguém comandar, todos são livres sob este contrato, todos servem sem ter senhor, e tal obra é da Lei, pois é a ela que devemos a justiça e a liberdade.

O que será dito como o prodígio da lei é o acordo entre obediência e liberdade, e tal se realiza na noção de Soberania, que tem como essência, por sua vez, a vontade geral. Rousseau nos diz que a soberania é o exercício da vontade geral. Em Rousseau, por conseguinte, a legitimidade política depende da vontade geral.

Rousseau começa a sua definição de vontade geral diferenciando esta da vontade particular, este que se move por preferências pessoais, e a vontade geral que tende ao interesse comum, e que deve ser o verdadeiro motor do corpo político, uma vez que ocorra isto a vontade geral se torna a vontade do todo.

Rousseau, em seguida, distingue a vontade geral da vontade de todos, pois a vontade geral se liga ao interesse comum somente, e a vontade de todos visa o interesse privado e é nada mais que a soma de vontades particulares. A vontade geral, portanto, é mais o interesse comum, ela é sempre a mesma, e não é geral por ser de todos, não interessa o número de votos que ela expressa, mas sim o interesse comum que une estes votos.

A vontade geral é a essência da soberania, e ela mais se manifestará quanto mais se mantiver ativa, isto é, quanto mais for contínuo o seu exercício, através da participação do cidadão nas deliberações coletivas, a vontade geral dirige o Estado na medida em que é sempre consultada e que responda a esta consulta. A vontade geral, em Rousseau, se expressa no consenso coletivo obtido pela participação permanente do conjunto dos cidadãos nos assuntos da comunidade, ela parte de todos para aplicar-se a todos igualmente.

Rousseau, uma vez tendo estabelecido como princípio fundamental que é soberana somente a sociedade que é dirigida pela vontade geral, ele se volta para o corpo político e sua dinâmica social, ou seja, ele vê a necessidade de dar a este corpo político movimento e vontade pela legislação. O corpo político ganha este movimento através de um governo que tem como tarefa zelar pelo cumprimento da cláusula essencial do contrato, e dar vontade é dotar este corpo político de um sistema de leis fundamentais que fixem o conteúdo concreto da vontade geral.

As leis são atos da vontade geral, atos estes que são expressos pelo conjunto dos cidadãos no exercício do interesse público, as leis são as condições da associação civil, e o povo que se submete a estas leis deve ser seu verdadeiro autor, isto deve resultar das chamadas “luzes públicas”, o que se dá pelo debate público aonde se pode depreender a verdadeira vontade geral da comunidade.

Nasce a necessidade de um legislador, este que deve ter uma clara consciência dos problemas comuns e intenções honestas, ele aparece aqui como razão encarnada. Se o povo não é capaz de fazer o que manda o bem público, pelas próprias luzes, depende de uma declaração expressa do bem através das leis, por conseguinte, entre o povo e a multidão cega existe um abismo a ser transposto pela intervenção de um indivíduo excepcional, este que é o legislador.

O legislador é aquele que ousa empreender, com capacidade, mudar a natureza humana, transformando cada indivíduo, por si mesmo, de um todo perfeito e solitário, em parte de um todo maior do qual, de certo modo, este indivíduo recebe sua vida e seu ser. Alterar a constituição do homem para fortificá-la, substituir a existência fixa e independente por uma existência parcial e Moral, transformar o homem independente e natural em uma parcela do todo social, é o que Rousseau chama, no Emílio, de desnaturar.

A missão do legislador é pois fixar o bem público. Desnaturar é, desta forma, uma ação ou educação política. Rousseau, no entanto, adverte que aquele que redige as leis não deve ter o direito legislativo. O povo não pode abdicar deste direito incomunicável. 

A PROPRIEDADE

Rousseau desenvolve sua ideia de propriedade intimamente ligada ao surgimento da desigualdade social, isto vemos no Discurso Sobre a Desigualdade, e no Contrato Social, Rousseau argumenta que todo o sistema de legislação de qualquer associação política tem dois objetivos principais : a liberdade e a igualdade. É uma sociedade constituída sobre estes dois princípios que se perseguirá permanentemente o bem público.

É no Contrato Social que Rousseau estabelece os princípios de uma verdadeira comunidade política, negando a sociedade que ele chama como um pacto dos ricos, a sociedade que deu origem às desigualdades. Contrariamente a Locke, que a considera um direito natural, para Rousseau, a propriedade só surge com o estado Civil, pois é ele que a legitima, e que a diferencia da mera usurpação.

Para Rousseau, o homem primitivo, vivendo solitariamente a sua relação com a natureza, não tem um direito no sentido jurídico sobre as coisas de que se apossa premido pela necessidade da sobrevivência. Trata-se de um direito baseado na conservação. Será somente com a divisão das terras que se acrescenta o direito sobre as coisas com a respectiva exclusão de outros. Estando a lei da natureza baseada apenas no instinto de conservação, ela implica unicamente uma relação entre o homem e a natureza.

Num momento seguinte, com o início da construção das cabanas, o direito do primeiro ocupante se consolida como consequência de uma atividade pessoal que Rousseau ainda não chama de trabalho. Este direito é atribuído mais propriamente às construções que ergue do que sobre a terra. O direito sobre as habitações, no entanto, assume uma certa permanência anteriormente não observada. Contudo, ainda não é um direito exclusivo em relação a terceiros.

Somente com a divisão das terras é que emerge uma espécie diversa de direito diferente do direito natural fundado no instinto de conservação. Trata-se, no entanto, ainda, de uma lei sem sanção, por implicar um direito não reconhecido socialmente e, portanto, a única forma de garanti-lo é através de represálias contra aqueles que não o respeitam.

Nesta etapa o direito de propriedade é ainda insuficiente e, por uso, constantemente ameaçado. A posse contínua o fortalece, mas apenas o poder estatal, finalmente, é quem pode garanti-lo. Num segundo momento é que fica assegurada a posse como legítima. É o momento da convenção e que, na origem de nossa sociedade, representa o instante de transformação de usurpação em verdadeiro direito.

A propriedade baseia-se essencialmente sobre uma convenção, mas esta não é a sua fonte originária. Ela só se define completamente, enquanto direito, com a instituição do Estado que tem por objeto legislar sobre esse direito individual que é reivindicado no estado de natureza.

Contudo, ao contrário da tradição jusnaturalista, Rousseau se recusa a ver a propriedade como uma instituição benfeitora da humanidade, não pensa que o papel da convenção seja apenas constatar um direito natural como queria Locke. A propriedade é, ao contrário, colocada em questão como fonte de miséria e de horrores.

 

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.

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