Numa noite chuvosa de Londres, meio que no fim da turnê de
seu último álbum “Power”, o astro do rock, The Thin White Duke, sentia a
decadência em seu sangue, seu vício em cocaína ganhando uma troada galopante. A
vida de Thin, pelo menos nos cinco anos que se passaram, desde seu debut “The
King”, era uma vida vazia de sentimentos, mas cheia das emoções produzidas pelo
estrelato e pela anestesia contínua de pó, ele tinha certeza de que sua morte
era uma questão de tempo, e meio que não se importava muito, seu produtor, Jimi
Jones, estava exausto com o astro, e somente depois daquela turnê caótica do
“Power”, deu um ultimato para Thin : se você quer ficar vivo, desista de ficar
o dia todo com os olhos vidrados na cocaína e em seu jejum intermitente de
leite e pepinos.
Thin vivia como um zumbi acordado, quase não dormia, mas era
como se estivesse num constante transe de indiferença diante do mundo, viajando
profundamente para dentro de si mesmo e se perdendo no labirinto de sua própria
alma, flertando com a loucura e a paranoia. Sua mulher, Dalila Braun, não o
censurava em nada, pelo contrário, era bem mais alucinada que o próprio Duke,
como se, àquela altura, isso fosse possível, mas Dalila era uma máquina que não
parava em lugar nenhum, sempre entrando nas ondas do Duke como alguém num
parque temático que não tinha fim.
A mansão em Londres, com dez quartos, fruto das turnês e
álbuns bem sucedidos do Duke, vivia largada por uma rotina de loucura e
indisciplina, era um caos em que viviam três cachorros, três gatos, um jabuti,
um papagaio, um coelho, uma cobra e Dalila e o Duke. A piscina, talvez, fosse a
única coisa bem cuidada da casa, uma estufa vivia suja, a cozinha vivia cheia
de restos de comida, que só Dalila fazia, pois o Duke vivia em seu jejum já há
pelo menos três anos, e não se sabe como o Duke conseguiu sair vivo da turnê do
Power, cheirando, sem dormir e sem comer.
O Duke, desde que tinha começado as gravações de seu álbum
“Power”, estava fissurado em Nazismo, começou a ler o Mein Kampf nesta época. Via
Leni Riefenstahl, O Triunfo da Vontade, e sonhava com uma arte forte e heroica,
já tinha esta ideia para seus próximos álbuns, e mesmo mergulhado no pó, vivia
um momento criativo que poderia ser chamado de seu auge como artista. Conseguia
chegar a um estado extático só de colocar as valquírias no volume máximo, e se
sentia na marcha de uma grande conquista artística que viria com o seu próximo
álbum. Foi ao seu estúdio na sua mansão, e lá foi criar, enquanto Dalila
pintava seus quadros sem sentido na sala, com um forte cheiro de skank que ela
fumava enquanto pintava.
Jimi Jones foi à mansão do Duke depois que este lhe ligou e
disse que tinha feito a melhor música de sua vida. Jimi foi lá e saiu do
estúdio do Duke radiante, era a composição de “Station To Station”, o Duke
disse que tinha lido sobre cabala e misturou tudo com seu delírio de nazismo e
cocaína, e tinha saído aquela obra-prima em três dias de criação e decupação.
Jimi Jones, que estava reticente e muito preocupado com o consumo cada vez mais
descontrolado de cocaína do Duke, desistiu de fazer pressão e comprou a ideia
de deixar o Duke compor em meio ao caos e à alucinação produzida pelo pó. O
Duke disse que já estava pensando no álbum inteiro dentro de sua cabeça, que
seu trabalho braçal só seria o meio de organizar estas ideias que já tinham
surgido prontas em seus últimos dias no estúdio caseiro.
O Duke, naquele dia, decidiu marcar uma festa comemorativa na
sua mansão, mas somente com seus músicos, o guitarrista Bon Bailey, o baixista
Page Jordan e o baterista Luke Donn. Dalila, que cozinhava bem, ia fazer uma
mistura de camarões com uma salada doida que ela chamava de “Miss Braun”, e que
tinha os pepinos que o Duke usava como dieta rigorosa. O Duke ia usar seu terno
branco indefectível, seu gel para seu cabelo platinado e seu gestual robótico
de superstar afetado pelo pó. Dalila foi para a cozinha e, como desta vez iria
ter visita e festa, ela deu uma limpada na cozinha e varreu um pouco a sala, e
o Duke resolveu tocar bateria naquela tarde na sala mesmo, enquanto Dalila
fumava e varria meio que toscamente, enquanto um dos cachorros latia loucamente
diante do barulho ensurdecedor da bateria do Duke, e a cobra serpenteava entre
os bumbos numa cena surreal.
Jimi Jones também era o convidado, além dos músicos da banda
solo do Duke, pois o produtor era meio que o juízo entre os caras, coisa que
faltava ao Duke, que era um criativo forte, mas sem juízo nenhum, vivia do
talento milagroso que tinha, mas sua vida era um caos, e a turnê de Power tinha
sido o reflexo perfeito deste estado mental e de alma do Duke, uma nave
desgovernada, mas que emitia sons dançantes mesmo assim. O Duke gostava de Jimi
Jones, e muito, pois era como um pai desde o seu debut, mesmo que Jimi brigasse
muito, e fosse muito exigente, mas que, ao fim, era seduzido sempre por uma
ideia inusitada do Duke, que sempre fazia Jimi pensar que a loucura era o
caminho da morte, mas, enquanto isso não acontecia, a música não parava e
ficava cada vez melhor, e ele cedia ao Duke depois de mais um insight do louco
cheirador.
A bateria do Duke ficou montada na sala, ele pensava em tocar
jazz na sala até um pouco antes dos convidados chegarem, botou o Kind Of Blue,
mas logo mudou para uns bebops com baterias maníacas, estava inquieto, e então
colocou rock, o que gostava mais então era um Elvis do início, passou para
Rolling Stones, e tentou tirar na bateria um Charlie Watts meio paranoico, não
deu muito certo, seu negócio era a guitarra base, e o cachorro, que estava
alucinado a tarde inteira, pulou em cima dos pratos da bateria, derrubando o
Duke, que teve uma convulsão de riso, enquanto a sua cobra fugia para a
cozinha, aonde Dalila preparava a sua “Miss Braun”.
Dalila estava empolgada, também gostava muito de Jimi, pois
ele era a referência do Duke para tudo. E tudo que fazia o Duke se sentir bem,
Dalila aprovava como se fosse com ela mesma. Dalila fez a sua salada doida
“Miss Braun”, que também levava pimenta além dos pepinos, e no fim da tarde ela
e o Duke esticaram uma carreira para comemorar “Station To Station” e a alegria
que tivera Jimi ao ouvir a nova música do Duke. A composição era longa, mas
seminal, forte, e tinha o refrão mais potente da história criativa do Duke,
Dalila pediu para o Duke tocar no teclado e depois na guitarra base, e ouvindo,
já dentro do estúdio caseiro, acendeu seu quinto skank do dia, matou a fome com
barras de Hersheys amargos, depois foi à cozinha e preparou um brownie com um
pouco de haxixe, tacou para dentro e foi tirar uma siesta até as oito da noite.
A festa estava marcada para dez, mas começaria mesmo às onze da noite, e
provavelmente o primeiro a chegar seria o Jimi, sem dúvida a única pessoa com
juízo que entraria na mansão naquela noite.
Deu seis da noite, o Duke entrou numas de ouvir Sly and The
Family Stone no talo por meia hora, dançou perdido no meio da sala com um dos
cachorros, um dos gatos subiu em cima do som e ficou lá como se não houvesse
amanhã, a cobra continuou amarfanhada atrás das roupas sujas na área anexa à
cozinha, e em cima da mesa da cozinha estava a salada “Miss Braun”, um trabalho
feito por Dalila, e que era a sua grande invenção, junto com suas pinturas meio
expressionistas que pareciam uma alucinação de Murnau depois de uma viagem bem
anestesiada de opiáceo. Dalila dormiu como um anjo nu, tinha tirado a roupa
toda depois da suadeira na cozinha, e o Duke terminou sua dança com o Sly e foi
escrever uma letra nova no seu estúdio caseiro, enquanto bebeu leite puro sem
parar, quase dois litros.
O Duke escreveu uma letra nova que seria a da sua música
“Golden Years”, e ele já conseguia transformar em matéria palpável o que estava
dentro de sua cabeça desde que ele retornara de sua turnê caótica do álbum
“Power”. O Duke então saiu de seu estúdio, já eram oito da noite, Dalila
acordava meio tonta, e o Duke fumou um free base, pó e skank enrolados num cone
gigantesco, ligou o som e botou desta vez um Grand Funk, também no talo, e
dançou com um dos cachorros no meio da sala em cima de um tapete persa
carcomido e com marcas de pegadas de cachorro e pequenos arranhões de gatos, e
ele olhava vidrado para os diversos quadros espalhados pela sala, pinturas de
Dalila que estavam secando e esboços e desenhos por todos os lados em que se
olhava, Grand Funk tocando, e o Duke se sentindo um dançarino que gostava de
música negra e flertava com ideias nazistas ao mesmo tempo, coisa que só fazia
sentido na sua cabeça alucinada de pó.
Deu onze da noite e a campainha tocou, o Duke foi abrir e era
seu pai artístico Jimi Jones, ele deu um abraço em seu protetor e já ofereceu
um uísque, que era a única coisa que o Jimi consumia, pois não fumava e muito
menos cheirava, coisa que irritava nele e que o Duke fazia como um suicida. O
Duke foi e pegou o uísque e serviu caubói como o Jimi gostava, e o produtor
então perguntou o que o Duke aprontara mais no estúdio, e o Duke mostrou parte
da letra do que viria a ser Golden Years e a melodia que o Duke ainda fazia só
com a voz, e que Jimi, impressionado, adorou, e ficou mais uma vez no dilema de
não censurar o Duke pelas suas loucuras, pois criativamente o grande Duke
estava intacto. Dalila foi e trouxe a salada “Miss Braun”, que o Jimi já
conhecia e sabia ser uma salada bem aromática e apimentada, e viu que o Duke só
comia os pepinos da salada, e perguntou ao Duke se ele ainda vivia em jejum, no
que o Duke disse que vivia há uns anos só com pó, pepino e leite. Dalila trouxe
mais um litro de leite que era para o Duke, enquanto Jimi degustava a “Miss
Braun” e dava uns goles no seu uísque puro caubói.
Meia-noite, os três músicos da banda do Duke chegaram, e eles
ainda não sabiam da existência de “Station To Station” e o Duke disse que faria
uma surpresa na sala com seu teclado, Bon, Page e Luke ficaram curiosos, mas o
Duke primeiro ofereceu cerveja aos músicos, e Luke foi cheirar uma carreira com
o Duke que, já meio alucinado, disse que havia tocado bateria a tarde inteira e
que continuava péssimo baterista, mas que era viciado no barulho todo, ainda
mais depois de um free base. Ele disse ao Luke que se não fosse algumas dicas
do mesmo, ele, o Duke, seria ainda pior no seu barulho sem sentido, pois
arranhava algo de jazz somente por ter observado Luke nos últimos anos, e que
rock só saía de suas baquetas como uma simulação desajeitada de um Charlie
Watts depois de um acidente nuclear em que o cérebro do Duke era uma
metamorfose que pensava tocar bateria enquanto espantava seu gato e fazia seu
cachorro ficar nervoso.
Dalila aperta um skank e oferece aos músicos da sala, ela
disse que a salada “Miss Braun” só fazia mais sentido depois de um bom skank.
Ela colocou então um ácido no prato de pepino que seria servido ao Duke, e o
Duke sabia que às vezes Dalila gostava de botar alucinógenos misturados na
comida dele, e ele não ligava, pois sua cabeça girava em torno do pó, sendo que
o ácido geralmente era só capaz de fazer o Duke querer ouvir Jefferson
Airplane, o seu LP do “Surrealistic Pillow”, mas que logo ele botava pó na
cabeça e já queria ouvir o “Sticky Fingers” ou o “Beggars Banquet”. A salada
“Miss Braun” ganhava contornos impressionistas para o sentido da gustação
depois do skank, e o guitarrista Bon Bailey, que já havia provado a salada
algumas vezes, disse que daquela vez Dalila tinha caprichado na pimenta, Bon
repetiu o prato e disse que a “Miss Braun” falava com suas papilas gustativas
como um transe gastronômico que ele disse que nunca tinha sentido antes, de
fato, e “Miss Braun” agora fazia sentido para Bon como a música que ele tocava
todo dia em sua guitarra, Dalila estava certa.
Começa de fato a festa e o Duke traz seu teclado para a sala e
toca sua composição nova “Station To Station”, Luke fica louco, dá mais uma
carreira numa pura boliviana e sai pulando alucinado até o jardim, Bon Bailey
diz que aquilo era o que Duke buscava e não sabia, era a melhor coisa que lhe
tinha acontecido depois de toda a bagunça da turnê bem sucedida de Power (um
paradoxo entre caos e sucesso). Page Jordan fica emocionado e começa a chorar,
o Duke ri, Dalila dá outra risada e Jimi Jones comemora batendo palmas. Jimi
Jones dizia que o melhor álbum da carreira do Duke começava a ser gestado
naquele momento, não tinha erro, Power era um sucesso magnífico, mas o que
começava com “Station To Station” seria uma verdadeira obra de arte. Luke volta
do jardim junto com um dos cachorros da casa e começa a viajar paranoicamente,
o pó não havia lhe batido bem, e ele começa a admirar as pinturas de Dalila de
uma maneira histriônica e até sinistra. Dalila resolve lhe dar um calmante
tarja preta que ela bota num suco de laranja, o Luke cai duro e dorme.
A noite avança entre uísque e cocaína, o Duke consome uma
quantidade inacreditável de pó da melhor qualidade, e Jimi Jones sempre se
perguntava como o Duke nunca tinha tido uma overdose na vida, pois já desde o
debut que o Duke havia escolhido a cocaína como a sua droga cotidiana, desde a
manhã até de noite, todos os dias. O Duke dava entrevistas e ele se revestia de
uma aura sinistra, adrede, muitas vezes, para se colocar como a persona que
havia criado para a mídia, um ser aristocrático, com palavras precisas e
robóticas, criando um mecanismo em que o Duke, com poucas colocações, conduzia
o entrevistador para onde ele bem entendesse, invertendo a razão da entrevista
para a sua vontade e não a do entrevistador. O Duke usava esta técnica psíquica
sempre sob o efeito da cocaína, como um mestre que coloca as suas regras sem o
oponente perceber o que está acontecendo.
O Duke então toca “Station To Station” na sala desta vez com
a sua guitarra Gibson, faz a base e chama Bon Bailey para solar, Page Jordan
chora de novo, e Luke roncava no sofá depois da tarja preta dada por Dalila.
Jimi Jones começa a ficar ligeiramente bêbado de uísque e começa a circular
dançando com dois cachorros na sala entre as pinturas de Dalila, ele vê um dos
esboços com a imagem do Duke estilizada e acha aquilo genial, uma boa ideia
para uma capa para o álbum, ele diz para Dalila desenvolver aquele esboço de
guache em uma pintura acrílica ou talvez algo mais solto com estêncil. Dalila
também era muralista, e em um dos muros da mansão tinha uma imagem do Duke meio
metamorfoseado em forma de ditador dando um discurso com um público no fundo em
movimento uniforme, como uma horda de fanáticos em fila e em marcha para uma
guerra mundial.
O efeito do ácido desta vez bate forte no Duke e ele sai para
o jardim, mergulha na piscina já duas da manhã e começa a ter uma alucinação de
que a água estava ficando amarela, no meio disso ele vê o espírito de um
soldado nazista na borda, com um rifle, ele se assusta, sai da piscina e vai em
direção do mural em que ele está aparecendo como ditador, e vem à sua cabeça as
cenas dantescas da estética pretensamente clássica que ele via no Triunfo da
Vontade. O tal soldado foi algo que ele viu ou achou que viu e durou dez
segundos. Ele gritou para Dalila tirar ele dali, de frente do mural, pois
começou a imaginar um discurso inflamado de Hitler e que sua leitura de Mein
Kampf o deixara obcecado pela imagem de poder que começara com seu disco Power
e que ele teria que finalizar em seu próximo álbum, era um misto de medo e
pavor com fascinação e auge de loucura pela ideia de guerra e conquista.
O Duke volta para a sala e tem a ideia de colocar o filme
nazista para rodar, Jimi Jones não gostava daquela história toda do Duke com
segunda guerra, mas já tinha comprado esta loucura a partir dos delírios já
realizados e bem sucedidos do álbum Power. Os outros músicos eram um pouco
alienados para entenderem o fascínio do Duke e a ojeriza de Jimi e faziam o que
sabiam, que era tocar seus instrumentos. Bon Bailey meio que sabia da história
toda do filme e achava um tanto horrível a morte de Hitler e toda a história de
Nuremberg e dos mortos desovados em Auschwitz, e parecia para ele que o Duke
ficava naquela mais pela estética e sua aplicação na música do que por
convicção política, o que provavelmente não era, o Duke adorava música de
negros e aquela sua ideia era bem estética, ele pensava na música e na parte
gestual e teatral do nazismo, para ele política era tão indiferente quanto ele
pensar sobre problemas sociais, ambientais etc, Duke era um milionário e um
hedonista, o nazismo para este hedonista era para a sua estética, ele vivia
para a sua música, e não tinha escrúpulos com o progresso de sua arte.
Quase no fim da sessão de Triunfo da Vontade, Jimi resolve se
despedir, o Duke ficou preocupado, mas Jimi disse que não conseguia suportar
aquela peça de propaganda mesmo cheio de uísque na cabeça, e diz que queria
marcar um ensaio para Station To Station e a finalização de Golden Years para a
banda tocar em seu estúdio profissional, o Duke, que sempre ouvia tudo do Jimi,
aquiesceu e disse que não faria mais o Jimi enfrentar suas histórias de
nazismo, só na gravação das músicas, coisa que o Jimi já tinha visto na
gravação do Power, e sem conflitos graves.
Bon Bailey, por outro lado, estava empolgado com Station To
Station e disse que o próximo ensaio da banda seria estupendo, ele levaria uma
garrafa de vodka para tomar depois do ensaio, e o Duke, irônico, falou que ia
levar seu pó boliviano para melhorar a voz e amortecer os dentes. Todos se
despediram quatro da manhã, e depois que todos saíram, o Duke disse para Dalila
o que tinha visto quando mergulhou na piscina de madrugada, e Dalila disse que
tinha sido o ácido, mas o Duke começou a achar que tinha alguns espíritos
perdidos na sua mansão, Dalila não levou aquilo muito a sério e até achou meio
hilário agora o Duke falar sobre fantasmas, ainda mais na borda de uma piscina.
O Duke acorda logo sete da manhã, dormia muito pouco, e logo
estica uma carreira e bebe dois litros de leite puro. Dalila passa a manhã toda
dormindo, acorda meio-dia e pede uma pizza por telefone, estava cansada da
cozinha na noite de ontem, com mais um sucesso de bilheteria de sua “Miss
Braun”. Jimi Jones liga para a mansão do Duke à uma da tarde e lhe diz que
estava agendado um ensaio da banda para a próxima semana, o Duke lhe diz que
iria tentar finalizar “Golden Years” antes de entrar no estúdio profissional
novamente, e garantiu a Jimi que não seria muito difícil, ele já tinha toda a
melodia na cabeça, só faltava letra e fazer os acordes certos para a nova
música ficar eficiente, não muito longa, direta, ao contrário do teor épico de
“Station To Station”, uma música relativamente longa.
O Duke decide se enfurnar no seu estúdio caseiro a tarde toda
e sai de lá só de noite com a música “Golden Years” toda pronta e liga eufórico
para Jimi Jones e disse que já tinha feito tudo e que faria uma terceira música
se desse tempo até o ensaio, Duke disse que faria um pré-ensaio no seu estúdio
caseiro só com o baterista Luke, pois não tinha uma ideia precisa da bateria,
já que era um arremedo de baterista, que gostava de tocar na sala para
enlouquecer seus cachorros. O Duke liga para Luke e diz para naquela noite
passarem “Golden Years” a limpo, pois a melodia e a música já estavam prontas,
faltava a cozinha ficar aderente com tudo, o Luke poderia dar uma arredondada
no que o Duke só tinha na cabeça como som de bateria. O Luke disse que ia para
lá às oito da noite e ficou confuso, pois teve uma certa amnésia da noite
anterior, o Duke gargalhou e disse que tava tudo bem, que a Dalila tinha
batizado seu suco com calmante e que o Luke tinha caído duro como uma tora
tombada.
O Luke chega oito da noite, encontra o Duke todo paramentado,
terno branco, gel e levando um dos quadros de Dalila para dentro do estúdio, um
quadro pintado a óleo com imagens de foo fighters e um sol psicodélico
avermelhado, em cima um rosto na nuvem, um algodão amarelado, e o rosto meio de
perfil, insinuando um tipo de deus desconhecido, com uma aura em torno da
cabeça em azul cobalto. O Luke olha e diz que não sabia a razão do Duke levar o
quadro para dentro do estúdio, já que eles iam tocar e não pintar, o Duke riu e
disse que a pintura era somente para decorar o ambiente enquanto eles tocavam e
compunham, Luke achou aquilo doido, mas parou de fazer perguntas.
Luke bota fogo na bateria do Duke, achava a bateria dele
animal, melhor que a dele, e sempre levava esta para o estúdio profissional
quando iam ensaiar ou gravar. O Duke resolve chamar Dalila para ver o trabalho
do Luke na bateria e explicar o motivo do Duke pirar com jazz quase toda tarde
com a bateria no meio da sala, era culpa de seu amigo Luke. Luke consegue fazer
o trabalho todo de bateria para “Golden Years” naquela noite, onze da noite e a
música estava finalizada, pronta para ser ensaiada pela banda junto com o épico
“Station To Station”. O Duke dá por
encerrada a sessão naquela noite, o Luke se despede e vai para casa.
O Duke resolve mergulhar na piscina naquela noite, desta vez
não tinha tomado ácido, estava até sóbrio, tinha cheirado a última carreira às
seis de noite, e já batia meia-noite, ele mergulha pelado na piscina, nada sem
parar, e quando resolve descansar numa das bordas, aparece o seu coelho branco,
ele faz carícias em seu coelho, ele adorava o coelho, era seu animal preferido
da casa, Dalila traz uma jarra de leite para o Duke beber, e ele resolve
cheirar três carreiras potentes seguidas, o pó vai ao seu cérebro, e o Duke
fica eufórico, volta a nadar sem parar, como um atleta olímpico em surto.
Depois de dar inúmeras nadadas de ida e volta na piscina, ele
então olha para a borda e vê que o coelho branco continuava lá, e seus olhos
vermelhos olhando firme e diretamente para o Duke. Dalila, a esta altura, na
sala, coloca um som alto de música que ela gostava e chamava de profana, o
debut do Coven, tocando Black Sabbath, e nisto o coelho se levanta e começa a
se equilibrar com os dois pés, o Duke olha e sabia que não tinha tomado ácido e
nem nada, o coelho fica estático mais um minuto, em pé, o Duke resolve nadar em
direção do coelho, chega até a borda, e o coelho resolve andar, desta vez com
as quatro patas no chão, numa direção incógnita, o Duke sabia que tinha um
porão no fim do jardim, ele sai da piscina e segue o coelho, o Duke não sabia o
que estava acontecendo, mas o coelho vai andando, e o Duke meio que perde a
noção do tempo seguindo seu coelho.
O tempo vai passando, e na verdade ele e o coelho estavam
girando em elipses pelo jardim, até que o coelho vai em direção de uma árvore,
perto da entrada do porão, o coelho não falava, mas era como se insinuasse ou
apontasse para o Duke entrar no porão, ele entra, havia um ano que ele não
entrava no porão, ele entra e vê um monte de quinquilharia, começa a revirar
aquele monte de coisa velha e encontra, em meio da bagunça, uma foto de seu
pai, que tinha morrido há uns dez anos, e nisso aparece, flutuando, quase no
teto do porão, uma imagem lusco-fusco de uma figura desconhecida, o coelho
entra no porão, esbarra em uma estante no porão, e cai no chão um relógio de corda,
a imagem some no meio da poeira levantada com o esbarrão que o coelho e o
próprio Duke dá no meio da quinquilharia, o relógio estava quebrado, mas
apontava meia-noite, o Duke olha para seu coelho, este pega uma correntinha de
ouro na boca que também estava no porão e sai correndo para o jardim, o Duke
resolve tentar consertar este relógio de corda, e tenta entender aquilo como um
tipo de enigma que ele iria decifrar na hora certa.
A semana passa, chega o dia do ensaio da banda, o Duke
resolve levar aquele relógio de corda parado na meia-noite no bolso de seu
terno branco como um tipo de amuleto, uma dica louca de seu coelho, e ele sabia
que era um tipo de delírio controlado, como quando estava sob efeito de pó, o
que era mais comum para ele do que estar sóbrio. Ele traz para o estúdio as
composições de “Station To Station”, “Golden Years” e “Wild Is The Wind”. Chegam
Bon Bailey, Page Jordan e Luke Donn, Jimi Jones vai para a mesa de canais,
arruma a sala, o som, os captadores, tudo pronto, e o ensaio vai bem, dura toda
a madrugada, até o amanhecer, e sete da manhã a banda e Jimi saem pelas ruas de
Camden Town para comemorar, andam pelas ruas com garrafas de uísque escocês, o
Duke como um tipo de alienígena com terno branco numa manhã em que o sol nascia
laranja.
Aquela manhã é de uma felicidade suprema, já anunciando o que
seria um álbum novo auspicioso, a obra-prima do Duke, certamente, e que ele
muito dificilmente poderia repetir, pois teria que sobreviver a si mesmo pelos
próximos anos, e sua vida hedonista e de devoto da cocaína era um perigo
constante ao qual ele se jogava como um cometa perto de se chocar contra um
asteroide. O Duke sente naquela manhã com seus amigos de banda, e seu pai
espiritual, Jimi Jones, uma euforia de felicidade verdadeira, regada a uísque
escocês, uma alegria genuína de quem vivia da própria criatividade e liberdade,
de quem tinha alcançado grandes conquistas e tinha mais pela frente. O Duke
olha para o baterista Luke e o abraça forte e diz que aquela felicidade era um
momento especial e que o Duke sabia que poderia não se repetir, pois seu flerte
com a morte era cada vez mais real. Jimi Jones sabia muito bem da sombra que
cercava a aura espiritual do Duke, e o nome deste demônio todos sabiam, cocaína.
Anoitece, o grupo eufórico se mantém unido durante aquele dia
todo pelas ruas de Camden Town, eles vão direto para um pub e lá resolvem beber
cerveja e sentar numa mesa para abrir um jogo de pôquer, Jimi Jones dá um banho
em todos da mesa e fatura todas as fichas em duas horas, todos desistem e
decidem voltar para o balcão para beber cerveja e fumar charutos. O Duke vai ao
banheiro cheirar cinco carreiras seguidas e volta com o olhar pegando fogo,
pede uma dose de bloody mary e vira numa talagada só, fica eufórico e decide
tocar ao vivo no pub naquela noite, um show surpresa e improvisado, a banda vai
junto, naquela noite em um pub de Camden Town o Duke e sua banda tocam ao vivo
e somente quem estava dentro do pub fica sabendo, não vira nem notícia de
jornal, somente uma semana depois, com três fotos de um fotógrafo que bebia
cerveja no balcão do pub naquela mesma noite. A noite se encerra no pub, a
última música é “Station To Station”, devidamente ensaiada e trabalhada, um
êxtase de cerveja, charuto e pó, naquele pub enfumaçado e com cheiro forte de
álcool por toda parte.
Jimi Jones, na semana seguinte dos primeiros ensaios e depois
da felicidade extrema de todos em Camden Town, começa a organizar a gravação do
álbum, o Duke começa a compor as outras músicas para este novo álbum ao qual
ele já tinha batizado, seria “Station To Station”, o nome da música e abertura
do álbum, seu épico longo e poderoso. O Duke vai para a sua mansão, se enfurnar
no seu estúdio caseiro novamente, ficaria a semana toda compondo e combinou de
ensaiar com a banda neste seu estúdio caseiro na sexta de noite. Naquela semana
o Duke exagera no consumo de cocaína e passa três dias seguidos sem dormir,
compondo maniacamente, faz mais três músicas, o álbum, em sua concepção geral,
já se encontrava quase pronto, o Duke certamente precisaria de umas ideias do
Luke para a bateria e, voilá, tudo já estaria no gatilho para começar as
gravações do álbum no estúdio profissional com a produção certeira de Jimi
Jones.
Jimi Jones disse que não poderia ir naquela sexta para a
mansão do Duke, mas que passaria lá no sábado de tarde para tomar um chá com o
Duke. O Duke só vai dormir na quinta de noite, mas já acorda às cinco da manhã
de sexta todo empolgado, pois a banda passaria lá no seu estúdio caseiro, seria
um misto de trabalho com diversão, logo de manhã ele abre uma garrafa de uísque
e cheira cinco carreiras seguidas, fica com os olhos vidrados e pega sua guitarra
para tocas todas as suas novas composições na sala já naquela tarde, e seu padrão
maníaco estava à toda, só numa tarde ele toca guitarra, violão, baixo e
bateria, enlouquecendo seus cachorros, enquanto um dos gatos subia em um dos
armários da sala e ficava quase com a cabeça no teto, meio que curtindo o caos
sonoro que o Duke produzia na sala, reverberando um som de rock pesado e
inspirado.
A cobra não dá o ar da graça, fazia praticamente um mês que
ela se enfurnara na área anexa da cozinha, no meio da roupa suja. O coelho, que
era o mascote do Duke, desde aquela noite estranha do porão, estava perdido pelo
jardim, comendo as cenouras que ficavam espalhadas pela grama, pois Dalila
vivia picando cenoura e alface e jogava tudo pelo jardim para alimentar o
coelho e as formigas que apareciam ou insetos diversos que ela sabia que saíam
da floresta que ficava ali perto, e volta e meia aparecendo uns micos para os
quais ela deixava cigarros, de propósito, nas mesas do pátio, para eles
roubarem.
Chega a noite de sexta, Luke Donn chega todo paramentado, com
um terno preto, ele diz que seria para contrastar com o indefectível terno
branco do Duke, Page Jordan aparece com um terno vermelho e Bon Bailey com um
terno azul escuro, o Duke achava aquela ideia genial e que seria usada para a
próxima turnê da banda depois de realizada a gravação, edição, mixagem e
masterização do álbum “Station To Station”. Os músicos, naquela sexta, vão ao
estúdio caseiro do Duke ensaiar, cada um com um terno de uma cor, uma viagem
cromática que faz o Duke levar uns quadros estilizados de Dalila para decorar o
ambiente enquanto eles passavam e tocavam as novas composições para o álbum “Station
To Station”.
O ensaio flui muito bem, tudo bem organizado, pois o Duke
vivia se chapando, mas nunca perdia o fio da meada do que queria fazer, e sempre
alcançava seus objetivos artísticos. O Luke fica eufórico, mas naquela noite
não usaria cocaína, tinha parado desde a última festa em que Dalila teve que
batizar o seu suco para ele dormir. Termina o ensaio, Dalila leva umas garrafas
de uísque para dentro do estúdio e serve a sua salada doida “Miss Braun”,
caprichada na pimenta e com pepinos temperados separados para o Duke sair de
seu jejum de monge drogado.
O Duke estica mais cinco carreiras enormes de pó, cheira com
a voracidade de uma fera que estava pronta para devorar o mundo novamente na
sua próxima turnê. O Duke então entra numa espécie de transe e tenta fazer
previsões maníacas sobre o que seria a tal turnê, e se diverte horrores
especulando em cima da ideia que a banda teve dos ternos coloridos e de como
aquilo seria um padrão cromático sui generis para uma banda que apresentaria
uma obra-prima. O Duke, que já tramava na sua cabeça maquiavélica as
entrevistas que ele daria, sempre jantando os entrevistadores incautos com suas
colocações meio cortantes, mas sem serem grosseiras, com a sua técnica de
cocainômano senhor da situação e que se sentia cada vez mais o dono do mundo.
Depois de uma longa conversa animada dentro do estúdio
caseiro, regada a uísque, os músicos saem da toca e vão para a sala, o Duke
estica desta vez sete carreiras, cheira uma atrás da outra e vira um shot de
conhaque em dois segundos, pega a sua guitarra base, pluga e toca um Stones
louco, Brown Sugar, se empolga, larga a guitarra e começa a fazer meneios
imitando o Micky Jagger, o Luke ri e se diverte com a cena e tira uma foto com
uma câmera que ele havia levado, o Duke então resolve posar como o The Thin
White Duke, numa pose de estátua grega, e pede para o Luke registrar também. O
Duke então pega um de seus gatos e o coloca sobre o bumbo da bateria, pede para
o Luke tirar foto do gato enquanto o Duke, alucinado, estourava uma champanhe,
molhando todo o tapete persa e partes da parede colorida pintada por Dalila.
Dalila sai da cozinha com mais uma porção generosa de sua “Miss Braun” e toma
um ácido logo em seguida, apertando mais um skank, que ela adorava.
O Duke disse que naquela noite ele ia fazer meneios de Jagger
como um tipo de teatro, meio que fica viciado naquilo a noite toda, o Luke registrava
as caras e bocas do Duke e resolveu também tirar fotos das pinturas de Dalila
com o Duke fazendo poses desengonçadas em torno dos quadros e dos esboços que
ficavam espalhados pela sala num caos absoluto. Page Jordan resolve ficar
fumando maconha deitado no sofá e pega no sono, o Duke disse que todos poderiam
dormir lá na sexta e sair no sábado, que Jimi iria conversar com ele, o Duke,
neste sábado, com certeza alguma ideia prática para a gravação e a turnê
subsequente. Bon Bailey não estava muito bem, parecia que o uísque estava
fazendo seu mundo girar e foi vomitar no jardim, o Luke sorrateiramente tirou
uma foto quando Bon passava branco que nem uma vela em direção do pátio para
aliviar seu mal estar. A “Miss Braun” é servida, e quem devora a salada é o
Luke, que estava numa larica brava depois de fumar um cone bem apertado por ele
mesmo.
Bon Bailey volta, vai para o sofá e cai no sono, dividindo o
espaço com Page Jordan, que a esta altura babava dormindo e roncando como um
trator, e Dalila tendo acessos de riso quando seu ácido começava a bater forte,
uma vontade irresistível de rir e gargalhar só de olhar para a cara do Duke,
coisa que ficava incontrolável quando o Duke fazia as suas imitações de
dancinha de Mick Jagger. Enquanto isso, o Luke raspava a porção enorme de “Miss
Braun”, só sobrando fiapos de folha perdidas pela mesinha perto do sofá no
centro da sala. Dalila e o Duke saem correndo e se jogam na piscina, Dalila
mergulha e vai para o fundo, nada sem parar, volta para a superfície e disse
que ia atrás do coelho no jardim, ela some da vista do Duke, que começa a
lembrar da noite estranha no porão com seu coelho.
O Duke nada um pouco, boia e pensa em várias coisas ao mesmo
tempo, ele então nada mais um pouco, se põe na vertical, de pé dentro da água e
tem a sensação de ver a água da piscina ficando amarela de novo, ele olha para
a borda da piscina, novamente vê um soldado nazista com um rifle, ele dá um
grito e achava que aquela aparição ia lhe dar tiros, ele começa a nadar para o
outro lado, olha novamente para a mesma borda em que estava a aparição, e não
havia mais nada. Nisso Dalila volta com cenouras e o coelho no colo, o Duke diz
que viu novamente o tal fantasma, e Dalila desta vez não ri, começa a levar um
pouco a sério a tal história, pois era a segunda vez, e se tratava da mesma
figura, algo bem estranho e incomum, mesmo com Dalila não tendo uma crença
definida, não se dizia nada, nem crente e nem ateísta, o Duke se dizia ateu,
mas começava a ter estes delírios com fantasmas nazistas, que ele ainda não
entendia o que era.
Quando dá três da manhã, Dalila e o Duke saem da piscina depois
de uma longa conversa meio surreal, tanto sobre fantasmas como sobre coisas que
só faziam sentido sobe efeito de ácido, e na sala todos já dormiam, os dois vão
para o quarto e o Duke lembra que seu pai espiritual Jimi Jones viria amanhã de
tarde lá para tomar um chá com ele e talvez falar com ele sobre coisas
profissionais como o próximo álbum e a turnê deste álbum, o Duke então dá boa
noite para Dalila dizendo que o álbum “Station To Station” seria o melhor
momento do Duke e de sua banda, e que o Jimi poderia morrer feliz a partir
dali, sua missão com o Duke estava sendo cumprida com sobras. Os dois dormem,
desta vez com Dalila levando o coelho para dormir no quarto. Na sala, uma
bagunça infernal, e os três músicos, Luke, Page e Bon dormindo e roncando,
chapados de mais uma noite maníaca com o Duke e a Dalila.
Chega sábado de manhã, Page Jordan acorda logo cedinho, com o
Duke já desperto, pois o Duke praticamente não dormia, e quando acordava, já
colocava pó para cheirar e bebia leite como um bezerro. Page Jordan se arruma e
sai logo, falando que depois queria saber como foi a conversa do Duke com Jimi,
Luke acorda logo em seguida, se arruma e também sai, Bon Bailey dorme um pouco
mais, almoça lá e depois também sai, logo em seguida Dalila acorda e vai
terminar um quadro que ela estava pintando há uma semana. O Duke resolve tocar
violão na sala até o Jimi chegar.
Quando o Jimi chega, o Duke vai preparar o tal chá, e os dois
conversam longamente, sobre passado, presente e futuro, que Jimi mais uma vez
se sentia muito preocupado com a saúde metal e física do Duke, mas não
adiantaria muita coisa, a relação do Duke com a cocaína se tornara umbilical já
fazia alguns anos, sobretudo desde o debut “The King”. Jimi volta a fazer
vários e insistentes alertas para o Duke, mas entra por um ouvido e sai pelo
outro, e os dois então passam a falar sobre álbum e turnê, coisa que empolgava
o Duke e o colocava radiante. Jimi então diz ao Duke que as gravações no
estúdio profissional do álbum “Station To Station” começariam em duas semanas e
durariam um mês.
Passam as duas semanas e a banda começa finalmente a gravar a
obra-prima “Station To Station”, com o Duke especialmente inspirado e cada vez
mais movido a cocaína, coisa que assustava toda a banda, pois o Duke ficava
altivo, imponente, e parecia que não tinha limites para o bem e para o mal,
mas, criativamente, a coisa funcionava como um tipo de feitiçaria. Neste
ínterim, Dalila liga para o estúdio e diz que queria falar com o Duke, ela diz
que tinha tido uma ideia sobre aquela história do Duke com fantasmas nazistas,
ela chamaria uma bruxa para passar na mansão e fazer uma desobsessão da piscina
da mansão. O Duke achava aquela ideia genial e pediu para fazer mesmo, pois
aquele fantasma nazista tinha que sair de lá, e que não queria mais ver a água
da piscina ficando amarela. O Duke, depois de saber da ideia de Dalila, volta
então ao seu trabalho no estúdio, com Jimi Jones tocando o terror, brigando, e
o Duke como um operário, obedecendo cegamente o que seu pai espiritual mandava,
exceto quando o Jimi tentava interferir no uso desenfreado de cocaína do Duke.
O Duke volta da primeira sessão de gravação, a primeira
música estava gravada, “Golden Years”, a próxima seria a épica “Station To
Station”. O Duke então chega na mansão e Dalila avisa que na manhã seguinte a
tal bruxa faria o trabalho de desobsessão da piscina da mansão. Chega a manhã e
nove horas a tal bruxa chega, uma loira com cara de roqueira, parecendo a
vocalista Jinx da banda Coven, ela estava toda de preto, como um tipo de
roqueira satanista, e aparece com uns equipamentos de radiestesia, incensos,
amuletos, livros de oração e imprecações, diversos tipos de ervas e uma
quantidade colossal de sal grosso. A tal bruxa sósia da Jinx então começa as
suas rezas em latim, ela grita, sussurra, assobia, faz grunhidos, rola no chão,
incorpora uma pomba-gira, derrama champanhe na água da piscina, cobre toda a
borda da piscina com sal grosso, passa a fazer a radiestesia em volta da
piscina e diz que sente uma forte presença maligna e que o aparelho disparava
acusando uma presença pesada e angustiada.
A bruxa então acende os incensos e joga flores e ervas na
água da piscina, quando ela pega mais uma quantidade colossal de sal grosso,
ela joga tudo na água da piscina, a água então instantaneamente começa a
borbulhar e ferver, era uma cena surreal, e nisso ela incorpora novamente,
desta vez uma entidade da floresta, que expulsa o espírito da piscina, a entidade
diz que quem estava cercando a piscina era um soldado alemão que havia se
suicidado no cerco de Berlim, e que achava que o Duke poderia ser o novo
Hitler. A piscina ferve durante bons vinte minutos e então a bruxa faz umas
orações e a água volta a ficar calma e tranquila. Dalila agradece a bruxa e
paga uma boa quantia e a bruxa garante que o tal espírito já havia tomado outro
rumo, e que estava sendo doutrinado pela entidade da floresta que ela havia
incorporado.
O Duke então mergulha na piscina naquela mesma noite e nada
mais de fantasmas de nazistas na borda da piscina, o trabalho de desobsessão da
piscina havia dado certo, e ele bebe uísque tranquilamente naquela madrugada,
nadando e depois cheirando umas carreiras, enquanto Dalila fumava skank e
deitava acariciando o coelho na beirada da borda. Ela ri e diz que o Duke tinha
sido confundido com Hitler pelo tal fantasma suicida. O Duke ri, mas estava
aliviado de não ter mais aquelas visões perturbadoras.
A tal bruxa realmente era muito boa, tinha dado uma queda no
tal fantasma. E o mais interessante é que, depois disso, o Duke continuava
cético e ateu, mas que tinha visto algo diferente e assustador. Dalila, que não
sabia muito bem no que acreditar ou não, nem ligava para nada, mas se
precisasse da tal bruxa, não teria dúvidas de chamá-la para qualquer
emergência. A bruxa tinha deixado seu livro autoral com Dalila, “a dama dos
sete raios”, um misto de mitologia e espiritualidade, que Dalila leria
vorazmente ainda naquela semana que a bruxa tinha passado ali e feito a piscina
ferver e borbulhar, literalmente.
Na semana seguinte continuam as gravações do novo álbum, e
Jimi Jones queria que tudo saíssem perfeito, coloca o Duke e o resto da banda
sob pressão para entregarem o melhor trabalho musical de suas vidas, e o Duke
obedecia, assim como os outros três músicos, pois em todos os álbuns tinha sido
a mesma coisa, brigas e estresse, mas tinha dado tudo certo, e desta vez, como
se tratava do melhor material da banda, a coisa ficou mais insana ainda, Jimi
Jones parecia um ditador no estúdio, e o Duke, que tinha esta história de
simular um tirano com a sua imagem estilizada de The Thin White Duke, nas mãos
de Jimi Jones não passava de um soldado raso ou apenas um recruta que tinha que
tomar sustos a toda hora. O Duke e a banda gravam a música que era a abertura e
o título do álbum, “Station To Station”, mais uma vez a comemoração foi nas
ruas de Camden Town, todos com garrafas de uísque na mão, e foram para o pub
beber e fumar, e o Duke usou cocaína até o dia seguinte, chegando na sua mansão
e comendo os pepinos que estavam na mesa da sala em meio à “Miss Braun”
preparada por Dalila.
As gravações continuam pelo mês e são concluídas com êxito,
Jimi Jones agora passa para a edição, mixagem e masterização. O álbum é lançado
depois de três meses das gravações e fica nas paradas rapidamente, com a música
mais comercial do álbum, “Golden Years”, tocando em todas as rádios de rock.
Jimi Jones então organiza as datas da turnê mundial, que começaria na Europa e
depois iria para os Estados Unidos. O Duke cheirava cada vez mais, como se isso
fosse possível, e os esporros de Jimi Jones eram cada vez mais ríspidos com o
Duke, que ficava assustado, mas estava dominado pelo ímpeto que a cocaína lhe
dava. “Golden Years” vira fenômeno radiofônico, e a música “Station To Station”
como a maior obra feita pelo Duke.
A turnê então começaria em Londres e iria para Paris e depois
Berlim, para seguir para Roma e depois Madri. Os shows em Londres são todos
sold out, um sucesso, com o Duke tocando e cantando alucinado de pó, mas com
uma performance brilhante e histórica, com tais shows registrados para um filme
futuro. A turnê segue para Paris e é mais uma série histórica de shows e
performances de Duke. E então a banda chega em Berlim, aonde o Duke tinha esta
história meio maluca com o nazismo, eles chegam para os shows em Berlim, e a
cidade fascina o Duke, que já havia estado lá na turnê do Power.
São realizados dois shows épicos em Berlim, a banda estava
num hotel de luxo, e as festas foram orgiásticas, o descontrole do Duke com a
cocaína estava cada vez mais intenso, e depois do segundo show a banda vai para
o backstage, nisto entram jovens para visitar os músicos da banda, muitas
meninas, e uma de treze anos, chamada Christianne F. vai direto ao Duke e diz
que era uma fã dele, que ouvia tudo o que ele lançava e pediu para tirar umas
fotos com o Duke, ele é bem gentil e tira fotos com todos os jovens e com
Christianne F., ela então diz que tem um presente para dar para o Duke, é um
saquinho com um pó branco que ela diz que é speed, uma mistura de cocaína com
heroína e disse que aquilo faria o Duke voar.
Ele tira as fotos com Christianne F. e guarda o saquinho no
bolso. Depois de terminada as sessões de fotos no backstage, o Duke vai para um
dos banheiros do camarim, ele então estica a carreira de speed e cheira, passa
um minuto e o Duke começa a ter convulsões, ele delira e grita por socorro,
Luke, o baterista, entra correndo, e fica em pânico, chama a ambulância, ela
estava a caminho, mas cinco minutos depois do socorro ser chamado, o Duke tem
uma parada cardíaca, um minuto depois uma parada respiratória, e passa um
minuto e o Duke vem a óbito, era meia-noite em ponto, a ambulância chega três
minutos depois, tenta reanimar o Duke, mas era tarde, a turnê se encerra tragicamente,
“Golden Years” tocando nas rádios, e “Station To Station” como o grande álbum
do Duke, e a música “Station To Station” como o documento principal deixado
pelo Duke na Terra.
Link recomendado :
https://www.youtube.com/watch?v=QymJI00mlSs
Conto – Contos Psicodélicos – Volume Um – escrito em 20, 24 e 25/01/2020.
https://www.youtube.com/watch?v=QymJI00mlSs
David Bwie - Station To Station (Christiane F ) 1980 - new edit, remastered HD : https://www.youtube.com/watch?v=QymJI00mlSs
Conto – Contos Psicodélicos – Volume Um – escrito em 20, 24 e 25/01/2020.
Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
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