“Medo e Delírio é o coração do Sonho
Americano pulsando no perigo e na adrenalina.”
Li o livro “Medo e Delírio em
Las Vegas” (uma jornada selvagem ao coração do sonho americano) de Hunter
S.Thompson e logo em seguida assisti ao filme de 1998 baseado no livro. Gostei
de ambos. Tanto o livro como o filme retratam bem uma época pós-hippie, o ano
era 1971.
Como quem leu o livro sabe,
os fatos relatados são reais, não sei se um pouco romantizados, acho que não,
apesar do recurso metafórico, em certas passagens, para descrever as viagens de
drogas que os dois principais personagens do livro têm durante o decurso da
história. Viagens que vão de haxixe, mescalina e LSD até éter e adrenocromo.
Meus caros, Hunter S.Thompson, criador da narrativa de estilo transgressor e
revolucionário batizada de jornalismo gonzo, era o que podemos chamar de um
típico “doidão”.
Hunter é nomeado para fazer
uma cobertura jornalística em Las Vegas de uma corrida de motocicletas, a Mint
400. E, como se vê ao começarmos a ler o livro ou a ver o filme, Hunter não é
um jornalista padrão, seus métodos de trabalho vão logo se mostrar heterodoxos
ao extremo. A viagem a Vegas vai se transformar numa épica de drogas e viagens
alucinadas e circunstâncias bizarras e engraçadas, para não falar perigosas.
Hunter e seu advogado de “raça samoana” vão se aventurar na estrada. Alugam o
Grande Tubarão Vermelho, um imenso conversível vermelho da Chevrolet. Aí começa
a aventura gonzo rumo a Las Vegas a 160 Km/h no deserto.
Eles seguem rumo ao Sonho
Americano, dentro do conversível um arsenal de drogas e bebidas, ... One toke
over the line ... era o itinerário que eles seguiriam para ver se era tudo
verdade, se enfim conheceriam o Sonho Americano. Ao som de “Sympathy for the
Devil” no último volume eles dão carona a um garoto que encontram na estrada no
meio do deserto, logo começa a piração, Hunter rememora como recebeu a
incumbência de cobrir aquela matéria, como pegou o conversível e juntou as drogas
para levar na viagem, mas depois de umas loucuras, como uma viagem de morcegos
voando em volta dali, o garoto se assustou e saiu do conversível, ficou no meio
do deserto, ali era encrenca, pensaram Hunter e o advogado, mas seguiram
adiante.
Enfim, Hunter e seu advogado
chegam ao hotel Mint, Hunter chega até a recepcionista, completamente
transtornado, e se intitula Raoul Duke, o advogado contorna a situação com a
recepcionista. Hunter estava louco de ácido, logo começa a viajar com lagartos
e poças de sangue, um zoológico de répteis. Eles vão para o quarto. Logo depois
vão, então, para o evento do Mint 400, e a cabeça do advogado de Hunter cheia
de éter e ácido. Finalmente, porém, Hunter vai cobrir a matéria. Era a quarta
edição anual da Mint 400. Logo em seguida saem as motos, de dez em dez, e somem
numa nuvem de poeira. Depois os dois vão a um cassino atrás do “Sonho
Americano”. Quando volta ao quarto do hotel, Hunter vê seu advogado na
banheira, submerso em água verde. Ao lado da banheira, um rádio ligado na
tomada. Hunter logo percebe que seu advogado tinha mastigado uma folha de ácido
inteira, e no rádio estava a fita de Surrealistic Pillow da banda Jefferson
Airplane, o advogado surta e pede White Rabbit, era uma viagem suicida, seu
advogado queria novamente White Rabbit, e no clímax em que o coelho corta a
própria cabeça queria que Hunter jogasse o rádio dentro da banheira, Hunter
fingiu jogar o rádio e atirou uma laranja na banheira como uma bala de canhão,
seu advogado começou a berrar enlouquecido, mas Hunter, a esta altura, já tinha
tirado o rádio da tomada e colocado pilhas.
Depois, a imprensa demanda
nova tarefa a Hunter, cobrir a conferência nacional dos promotores públicos num
seminário de quatro dias sobre entorpecentes e drogas perigosas. Era uma
matéria para a revista Rolling Stone. Um jornalista gonzo numa conferência
misturado com mil policiais de todos os cantos dos Estados Unidos para discutir
sobre o problema das drogas, dessa vez num Cadillac branco ao invés do Grande
Tubarão Vermelho. “Se os Porcos estavam se reunindo em Las Vegas para uma
importante Conferência sobre Drogas, nada mais justo que a cultura das drogas
mandasse representantes.” Disse Hunter.
Hunter volta ao quarto do
hotel e encontra seu advogado nu com uma menina que parecia bem nova e fica
irado, o nome da garota era Lucy e estava cheia de pinturas do rosto de Barbra
Streisand, levam ela para o aeroporto louca de ácido e mandam ela para o hotel
Americana.
Os dois vão à suíte do hotel
em que estavam para a conferência, e aí começa a maior viagem, “Extrato de
pineal”, Hunter toma adrenocromo (as glândulas de adrenalina de um corpo humano
vivo) e logo depois começa a ter uma viagem alucinógena ouvindo a voz de Nixon
na TV repetindo a palavra “sacrifício”. No dia seguinte, os dois vão à
conferência sobre drogas trabalhar. Depois de ouvir um punhado de asneiras
sobre drogas das autoridades, os dois ficam de saco cheio, deixam a conferência
e descem para o cassino.
Mais alguns percalços e tudo
termina. Hunter conclui a sua jornada atrás do Sonho Americano, mas não chega a
conclusões definitivas, a busca continua, Hunter passou seu tempo em loucuras
com drogas para talvez ter a percepção do que seria o Sonho Americano, mas no
caminho o que conta são os percalços, e a aventura. Não podemos levar uma vida
comum, a vida tem que ser extrema, como extrema é esta narrativa gonzo de Medo
e Delírio, um registro que é mais do que drogas e piração, é o coração do Sonho
Americano pulsando no perigo e na adrenalina. Comparando o livro com o filme,
sinto que o filme levou isto mais para o lado do humor ou da comédia, com os
excelentes Johnny Depp e Benito Del Toro, mas o livro é mais visceral, sem
dúvida, e um conselho: por favor, leiam o livro antes de ver o filme.
Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
Link da Século Diário: http://www.seculodiario.com.br/exibir.php?id=4172&secao=14
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