PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

quarta-feira, 11 de outubro de 2017

SWINGING LONDON

“a Swinging London que era um dos pontos de convergência em que a arte em geral se movia”

Swinging London é o termo que foi cunhado numa edição especial da revista semanal norte-americana Time, em abril de 1965, e que designava um cenário de forte efervescência cultural, sobretudo de moda e música, que surgia na Londres da segunda metade da década de 1960, com o termo swinging podendo ser traduzido por palavras como vibrante, descolado e arrojado, termo levantado pela editora-chefe da revista de moda Vogue, Diana Vreeland.
Temos aqui a nomeação de numa nova atitude moderna contra o conservadorismo britânico familiar e tradicional, em que o cinema também terá vez, documentando toda esta cena na qual surgiria o que viria a ser chamada “Juventude”, e que explodiria para o mundo, muito bem exemplificada pela chamada Invasão Britânica de Beatles e cia nos EUA, outro aspecto desta virada cultural que Londres tomaria à frente no chamado pós-guerra.
Por sua vez, a Swinging London também foi o cenário em que Mary Quant revolucionou a moda mundial com a minissaia em 1967. Moda que, por sua vez, também era ditada por lojas como a Biba, e também por outras lojas que envolviam as ruas que ficariam famosas como a Carnaby Street. Moda que também incluía a ascensão de supermodelos como Twiggy, Jean Shrimpton e Veruschka, retratadas pelo icônico fotógrafo David Bailey, o qual inspiraria Michelangelo Antonioni no filme Blow Up, que seria o fotógrafo protagonista do filme.
A Swinging London que também contava com a presença do movimento mod, que envolvia a música, podendo ser citada como uma das bandas icônicas desta cena o The Who. Atitude musical de um rock que vestia ternos e que se expandia junto com todo o movimento de moda e de renovação artística que colocava Londres na vanguarda daquela segunda metade da década de 1960, energia intensa que também incluía bandas como Small Faces, mas que era um movimento que logo seria eclipsado pela psicodelia hippie americana.  
É em meio a esta cena londrina que Antonioni irá filmar seu filme-cult Blow Up, filme em que estará presente toda a moda, música, e mídia em geral que compunha a Swinging London, um conjunto de moda jovem, composto por músicos, fotógrafos e modelos, ditando o rumo do Zeitgeist de então, citando novamente aqui a cultura mod como um desses movimentos que fazia Londres brilhar, mas que tinha um egocentrismo vazio de esclarecimento que era um cenário de consumo bem retratado na imagem das supermodelos, figuras que irão povoar Blow Up junto com o arrogante fotógrafo que é protagonista da trama.  
Portanto, Antonioni se via com um material riquíssimo para trabalhar em seu filme, egresso de sua famosa Trilogia da Incomunicabilidade e do esgarçamento final desta experiência, no seu trajeto ainda na Itália, por sua vez, com seu excelente filme Deserto Vermelho. Com Blow Up, por sua vez, Antonioni é testemunha de uma vida e moda londrina que vivia sua primavera e que era agora a renovação que o cinema de Antonioni descobria e buscava, o que seguiria depois na devastação americana de Zabriskie Point, e depois com Chung Kuo.  Mas o chamado Zeitgeist retratado através da Swinging London é a matéria preciosa do documento que se torna Blow Up, e que é lançado no Reino Unido em janeiro de 1967.
O filme tem como origem e inspiração o conto do escritor argentino Julio Cortázar “As Babas do Diabo”, com o filme modificando um tanto o modo em que o fotógrafo se coloca na trama, mas que tem a cena de um assassinato como mote tanto no conto como no filme, com Blow Up, no que tange ao aspecto fotográfico, sendo considerado também um filme que funciona como uma série de fotografias sobre uma série de fotografias, com o diretor Antonioni manipulando seu personagem fotógrafo, que, por sua vez, manipula suas modelos ao seu bel prazer.  
Como dito, o filme tem como uma das inspirações do mundo real o fotógrafo de moda David Bailey, em que o ator Hemmings faz um personagem que é retratado como um sujeito autocrático e pretensioso, como um tipo debochado em relação ao próprio trabalho, numa postura irreverente que é fiel ao que representava o chamado “Terrible Three”, grupo formado pelos três fotógrafos David Bailey, Terence Donovan e Brian Duffy, imagens perfeitas dos anos 1960, em que tudo é condensado no personagem fotógrafo de Hemmings.
A postura de extrema sexualidade da relação entre fotógrafo e modelo é bem retratada também por Antonioni em Blow Up, numa abordagem neste sentido intencional e com uma objetividade que busca o tempo todo ser autêntica na forma tratada, pois a tensão do corpo sensualizado das modelos e a atitude autocrática do fotógrafo faziam o que era chamado de fotografia “New Wave” dos anos 1960, com o disparo rápido da câmera do fotógrafo no filme sendo a imagem fiel do método fotográfico de David Bailey e, por conseguinte, do Terrible Three.
E, falando nos filmes New Wave, temos que Bailey se dizia influenciado por filmes como Jules et Jim do cineasta francês François Truffaut, uma vez que o movimento cinematográfico teve como inspiração a fotografia de moda da época, e os experimentos e técnicas elaboradas e desenvolvidas no cinema europeu, por sua vez, alimentaram também as revistas de moda. A fluência e o movimento da fotografia de moda podem, por sua vez, ser identificadas no ritmo inquieto dos filmes de Jean-Luc Godard, sendo então a relação entre fotografia de moda e cinema na época um cenário de mútua influência, e com a Swinging London que era um dos pontos de convergência em que a arte em geral se movia como uma unidade de atitude que poderia bem ser chamada de Juventude.

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.

Link da Século Diário : http://seculodiario.com.br/36103/14/swinging-london

Nenhum comentário:

Postar um comentário