“A Nova Hollywood foi um sonho de uma década”
O Exorcista, de
William Peter Blatty, teoricamente baseado em fatos reais, chegou às livrarias,
os americanos estavam prontos para uma história de possessão demoníaca, já
saturados dos banhos de sangue do Vietnã, da Universidade Estadual de Kent e de
Manson. O livro virou best-seller. E a Warner começou a procurar alguém para
dirigir O Exorcista. Blatty, que escreveu o roteiro e também era o produtor do
filme, mandou um exemplar do livro para Bogdanovich, junto com uma dedicatória
pedindo a ele para dirigi-lo, ele recusou. Foi então que Blatty se lembrou de
William Friedkin, que entendia como alguém que não se limitava nos costumes e
etiquetas de Hollywood, e Blatty usou com Friedkin o mesmo subterfúgio que
fizera com Bogdanovich, e deu certo, Friedkin se entusiasmou com o projeto. Na
época, entretanto, O Exorcista parecia impossível de ser feito, os efeitos
especiais necessários, como, por exemplo, levitação, possessão, poltergeists,
iam muito além do que se fazia de cinema até então. Ou seja, Friedkin corria um
sério risco de cair no ridículo, mas ele não se intimidou. E, no filme, ele
teve direito ao corte final. E fechou um elenco de atores bons, que incluía Ellen
Burstyn, no papel da mãe, Chris McNeil. Escolher alguém para o papel de Regan,
a menina possuída, foi mais difícil. Na época que Linda Blair foi entrevistada,
tinha 12 anos. Ficou com o papel.
Friedkin, antes de O
Exorcista, teve dificuldades para se interessar por um roteiro, em abril de
1967, quando Good Times estreou, anunciou à Variety que “o filme narrativo está
morrendo e não interessa a mais nenhum diretor sério (...) A nova plateia de
cinema, me dizem, tem menos de 30 anos e está interessada nas experiências
abstratas. (...) Duvido que alguém consiga me dizer sobre o que é Blow-Up,
Julieta dos Espíritos, A Guerra Acabou ou os filmes dos Beatles.” Atacou a
indústria e suas produções caríssimas, e jurou manter os orçamentos de seus
filmes em um milhão de dólares ou menos. Porém, logo depois dirigiu um projeto
de 5 milhões de dólares, Quando o Strip-tease Começou, para a United Artists,
com um roteiro coescrito por Norman Lear. Ralph Rosenblum, que depois seria
montador de filmes para Woody Allen montou Strip-tease e ficou aborrecido e
intrigado com a “agressividade e arrogância” do diretor. Os executivos dos
estúdios tinham rotulado Friedkin de gênio, e Hollywood estava na fase
“adoramos-os-jovens”, então ele parecia agir como se estivesse num altar.
Depois de dirigir o
filme Rapazes, Friedkin foi aconselhado por Hawks: “Não sei por que você quis
fazer um filme desses. As pessoas não querem ver filmes sobre os problemas dos
outros ou nenhuma merda psicológica dessas. Querem histórias de ação. Toda vez
que fiz um filme assim, com um monte de caras do bem contra os caras do mal,
tive um sucesso enorme, se é que isso interessa a você.” Aquelas palavras
impressionaram Friedkin, que disse: “Realmente fiquei pensando nelas (...) Eu
teria embarcado numa trajetória de fazer filmes tipo Miramax, obscuros, antes
até que existisse uma Miramax. Mas tive essa epifania de que não estávamos
fazendo filmes para pendurar na porra do Louvre. Estávamos fazendo filmes para
divertir as pessoas (...) Foi como se alguém tivesse me dado uma chave para a
qual eu ainda não tinha a fechadura, foi o que me levou a fazer Operação
França.” Na época deste filme, Friedkin discutia com Coppola e outros caras
sobre o rumo que o cinema iria tomar. Isto é, o caminho de Godard, Fellini,
documentário, realismo de rua ou formalismo, ou ainda, voos da imaginação.
Estes polos não pareciam distantes, na visão de Friedkin, pois ao ver Z, de
Costa-Gavras, ele viu que uma história verdadeira era tão emocionante como
qualquer ficção. E esta técnica do documentário influenciou a realização de
Operação França.
Por sua vez, o
lançamento de O Exorcista foi uma porrada, embora os críticos tenham se
dividido, com Kael detestando o filme. Porém, os executivos da Warner se
surpreenderam com o sucesso de público, sendo este filme um divisor da
indústria, assim como foi O Poderoso Chefão.
Paul Schrader
escreveu um roteiro chamado Taxi Driver, história de um taxista que culmina num
banho de sangue. Brian De Palma leu o roteiro e enviou ao produtor Michael
Philips, e Scorsese queria dirigir o filme, mesmo que ainda parecesse
impossível fazer com que um estúdio se comprometesse integralmente com um
roteiro tão sombrio, violento e pouco comercial. Mas, depois de Schrader ter
aceitado Scorsese no projeto, Philips decidiu que Scorsese trouxesse o ator De
Niro para o mesmo. Enquanto isso, as filmagens de O Poderoso Chefão II
começaram no dia 23 de outubro de 1973. E no mesmo ano, Richard Zanuck e David
Brown haviam pagado 175 mil dólares pelos direitos cinematográficos de Tubarão,
um livro de Peter Benchley, filme que teria Steven Spielberg como diretor.
No início, Spielberg
achou o projeto comercial demais. Ele queria um filme que não deixasse uma
marca na bilheteria, mas na consciência das pessoas. “Existem duas categorias:
filmes e fitas.”, ele explicou ao produtor. “Eu quero fazer filmes.” E Brown
respondeu usando o argumento de Bluhdorn com Coppola: “Olha só, esta pode ser
uma fita, mas é uma fita grande. Muito grande. Depois dela você poderá fazer todos
os filmes que quiser!” Em 20 de junho de 1975, a Universal lançou Tubarão em
409 cinemas, igual a O Poderoso Chefão, e ao final de suas respectivas
passagens pelo circuito, ao fim, O Poderoso Chefão totalizou 86 milhões de
dólares, O Exorcista, 89 milhões, e Tubarão os superou com 129 milhões de
dólares, um recorde que permaneceu até Star Wars de George Lucas.
Com Tubarão, a
indústria mudou mais uma vez, percebendo o valor de lançamentos amplos. O
número de cinemas cresceria, a publicidade maciça na televisão, aumentando os
custos de marketing e distribuição, diminuindo a importância de críticas em
veículos impressos, tornando impossível um filme crescer gradual e lentamente,
encontrando sua plateia à força, ao invés de pela simples qualidade. E, além
disso, Tubarão despertou o apetite corporativo por lucros rápidos, o que
significou que dali em diante todos os estúdios queriam que todos os filmes
fossem Tubarão.
Nesta altura,
Spielberg se tornou o diretor mais aclamado dos Estados Unidos. Embora o autor
do livro, Peter Benchley, que lhe fizera duras críticas no Los Angeles Times,
dissesse que Spielberg não tinha “nenhum conhecimento da realidade fora do
cinema. Sua cultura inclui apenas filmes B. (...) Um dia (ele) ainda será
conhecido como o maior diretor da segunda unidade dos Estados Unidos.” (Segunda
unidade é uma equipe secundária que durante a produção de um filme se dedica às
cenas sem atores, apenas de ambientação e ação). E Benchley acertou, Spielberg
se tornou o maior diretor de segunda unidade dos Estados Unidos, e a influência
dele e de George Lucas foi tão grande na indústria que todo filme feito por um
estúdio tornou-se um filme B e, pelo menos para os grandes blockbusters de ação
que hoje dominam a produção dos estúdios, a segunda unidade tomou o lugar da
primeira.
Em 20 de junho de
1975, mesmo dia em que Tubarão tornou-se um marco na história do cinema, Artie
Ross foi convidado para jantar na casa de Judy Schneider em Palm Drive. Artie
tinha herdado o tanque de óxido nitroso de Brackman e o usava regularmente. A
ideia era que quanto mais gás se inalava, melhor o barato. A maioria das
pessoas segurava a máscara de borracha contra o nariz, de modo que, se
desmaiassem, elas apenas cairiam no chão. Mas Artie costumava colocar a máscara,
prendendo-a com a correia. Muitos alertavam Artie que aquilo era perigoso. E,
no começo da noite, Blauner passou pela casa de Artie sem avisar, e encontrou
um cara tombado de joelhos, para a frente. Ele levantou sua cabeça e viu que
era Artie, com uma máscara de gás. Ele tinha morrido de uma overdose de óxido
nitroso. A morte de Artie poderia ter interrompido a corrida louca de maconha
para ácido para cocaína para freebase no final daquela década. Era um presságio
da futura morte de John Belushi. Mas Bert e seus amigos não ligaram. E pode até
ter sido o fim da moda do óxido nitroso, mas Bert instituiu uma Artie Party
anual no aniversário da morte dele, em que todos tomavam drogas. Ainda existia
uma devoção completa às drogas.
Por sua vez, com a
BBS moribunda, a mudança da guarda na Warner e na Paramount, os dois estúdios
responsáveis pelos filmes-chave da década, e o surgimento da CAA, 1975 foi um
ano crucial para a indústria. Tubarão despertou o apetite dos estúdios por
blockbusters e lançado a era das maciças promoções de televisão, e as carreiras
de alguns dos maiores diretores do início dos nos 1970 já estavam em ruínas. O
mito Bogdanovich veio abaixo, Mike Nichols teve três fracassos seguidos,
Nashville de Altman teve um desempenho medíocre. O caminho da desconstrução de
gêneros escolhido por alguns desses diretores alertava que o tamanho da plateia
para os filmes da Nova Hollywood podia ser bem menor do que eles supunham.
Taxi Driver, por sua
vez, estreou no Cinema 1 de Nova York no dia 8 de fevereiro de 1976, e o filme
surpreendeu a todos se tornando um sucesso comercial, e também teve críticas
positivas. Kael adorou o filme e compreendeu que, apesar de todo o realismo
urbano que Scorsese herdou de Cassavetes e Godard, ele tinha um lado católico,
um expressionismo wellesiano que dava às ruas de Nova York a mesma intensidade
alucinógena que Coppola obteria com o seu Vietnã nas Filipinas (Apocalypse
Now).
Por outro lado,
George Lucas estava preocupado porque o seu Star Wars tinha estourando o orçamento
e achava que o filme não daria dinheiro. O filme seria, segundo ele, “uma
tentativa consciente de criar novos mitos.” Como Spielberg, Lucas queria ser
levado a sério como artista, receber o tipo de atenção que os críticos
derramavam sobre Coppola e Scorsese. Ele disse a Friedkin que havia feito em
Loucuras de Verão uma versão americana de Os Boas Vidas de Fellini, e se
perguntava por que nenhum crítico havia notado. Friedkin então pensou: “Meu
Deus, ele se acha o máximo. Esse cara acha mesmo que foi isso que ele fez?”
Depois de suas
experiências traumáticas com a Warner e a Universal, George Lucas queria que
Star Wars fosse produzido por sua própria empresa, e na sua obsessão por
controle, também insistiu em reter os direitos à música e os lucros das vendas
do álbum da trilha sonora, assim como direitos de continuação, e finalmente,
manter os direitos do merchandising. Até Star Wars, o merchandising era uma
fonte de renda banal, e Lucas atinou para a importância disso. George Lucas
achava que faria mais dinheiro que Coppola com seus brinquedos, que demoravam
18 meses em criação, fabricação e distribuição, embora alguns dissessem que a
esta altura todos já teriam esquecido o filme. E era óbvio que não daria para
ganhar dinheiro com continuações, e os direitos, portanto, não valiam muito, a
não ser que o filme fosse um gigantesco sucesso, o que muitos não acreditavam.
Coppola, tendo agora
O Poderoso Chefão II como melhor que o primeiro, deixou seu ego explodir. Sua
carreira brilhava como triunfo triplo: como roteirista, produtor e diretor. Ele
tinha muito poder agora. Pode-se dizer, até mesmo, que nem Welles em seu auge,
quanto Spielberg, receberam a aclamação generalizada concedida a ele. E ele
tinha apenas 35 anos. E então, Coppola decidiu fazer ele mesmo Apocalypse Now.
O roteiro, livremente baseado no livro Coração das Trevas, de Joseph Conrad,
contava a história de um coronel boina-verde renegado chamado Kurtz, marcado
para execução pelo Exército, a narrativa era contada pelos olhos de Williard, o
oficial enviado para matá-lo.
Por sua vez, quando
se fez a conta, o custo final de Stars Wars ficou em 9,5 milhões de dólares,
com mais alguns milhões adicionais para cópias, anúncios e divulgação. Em
apenas três meses acumulou 100 milhões de dólares. A novelização, lançada sem
muito alarde pela Bantam, chegou ao quarto lugar na lista de best-sellers em
paperback, vendendo dois milhões de exemplares, e em novembro de 1977, Star
Wars superou Tubarão, tornando-se o filme mais rentável de todos os tempos, com
193,5 milhões de dólares. Star Wars transformara a Fox num estúdio de sucesso,
o que garantiu a Lucas fazer um acordo extorsivo para a continuação Star Wars,
O Império Contra-ataca.
Star Wars acordou os
estúdios para a importância do merchandising, mostrando que a venda de livros,
camisetas e bonecos podia dar lucros, e as investidas de Star Wars no
merchandising, em vez da simples promoção do filme, ganhou vida própria e
rendeu além de 3 bilhões de dólares em direitos de licenciamento quando a trilogia
Star Wars foi relançada em 1997.
A genialidade de
Lucas estava em remover a ideologia marxista de um mestre da montagem como
Eisenstein, e juntar a montagem com o apelo popular da cultura americana. Star
Wars fundou o cinema de momentos, de imagens, de estímulos sensoriais cada vez
mais dissociados de uma história, facilmente traduzido em videogames. Na
realidade, o filme era um salto para os anos 1980 e 1990, a era dos videoclipes
não narrativos e videocassetes que permitam ao espectador ver filmes de um modo
não linear, surfando as cenas de ação com a tecla “avançar”.
No final das contas,
Lucas e Spielberg reverteram as plateias dos anos 1970, que haviam se
sofisticado, com uma dieta de filmes europeus e da Nova Hollywood, às
simplicidades da Era de Ouro do cinema, anterior aos anos 1960. Eles estavam,
como Kael disse, infantilizando a plateia, com som e espetáculo, longe de
ironias, estética, autoconsciência ou reflexão crítica.
Lucas, naturalmente,
rejeita a ideia de que Star Wars tenha arruinado o cinema americano,
argumentando: “Star Wars não matou ou infantilizou a indústria do cinema (...)
Os filmes-pipoca sempre foram os de maior sucesso.” A ideia era a de que os
blockbusters, também, subsidiavam muitos filmes menores. Lucas continua: “Do
bilhão e meio de dólares que Star Wars fez, metade, 700 milhões de dólares, foi
para os donos de cinema. E o que os donos dos cinemas fizeram com esse
dinheiro? Construíram multiplexes. Uma vez que tinham todas as telas, eles
precisavam pôr alguma coisa nelas, o que quer dizer que filmes de arte que
passavam em lugares mínimos no meio do nada de repente estavam sendo exibidos
em grandes cinemas, e começaram a fazer dinheiro. E uma vez que eles começaram
a fazer dinheiro, surgiram Miramax e Fine Line, e os estúdios ficaram
interessados, e agora existe uma saudável indústria do cinema de arte que não
existia vinte anos atrás.”
Contudo, Scorsese e
Altman têm uma visão mais sombria: “Eles não estão subsidiando coisa alguma”
diz Scorsese. Eles são tudo e isso é tudo o que existe. A pessoa que tem algo a
dizer num filme tem que fazê-lo por 50 dólares. Eles estão sufocando todo o
resto.” E Altman: “No verão passado eu tentei achar um filme para ver, então
fui a dois multiplexes em Beverly Hills. Todas as telas estavam exibindo O
Mundo Perdido – Jurassic Park, Con Air – A Rota de Fuga, O Casamento do Meu
Melhor Amigo e A Outra Face. Não havia um único filme que uma pessoa
inteligente pudesse dizer: ‘Esse eu quero ver.’ Tudo se tornou um grande parque
de diversões. É a morte do cinema.” Marcia Lucas concorda: “Tenho nojo da
indústria americana de cinema, agora. Havia tantos filmes bons, e uma parte de
mim acha que Star Wars é em parte responsável pela direção que a indústria
tomou, e me sinto muito mal com isso.”
E Apocalypse Now, o
projeto que poderia colocar Coppola como o salvador da Nova Hollywood, não fez
o mesmo sucesso que O Poderoso Chefão ou sua continuação, e a crítica ficou
dividida. Os críticos ficaram fascinados pelos primeiros dois terços do filme,
mas o último terço, bombástico e inconclusivo, não funcionou. Coppola não soube
o que fazer com Kurtz no filme, e esta sua incapacidade impediu que o filme
fosse uma obra-prima. E, diante do triste espetáculo dos diretores da Nova
Hollywood, muitos, naquele momento, com suas vidas e carreiras destruídas,
Howard Hawks simplesmente disse: “O antigo sistema dos estúdios funcionava
porque não podíamos cometer excessos, não podíamos simplesmente sair fazendo
tudo o que queríamos.”
A United Artists,
que finalmente aprovara Touro Indomável, o qual seria dirigido por Martin
Scorsese, tendo De Niro como astro, estava às voltas com os preparativos para O
Portal do Paraíso, dirigido por Cimino que, cheio de si com seus Oscars,
teimoso e tão megalomaníaco que fazia Coppola parecer um santo, tinha ganhado o
direito de estourar o orçamento, desde que cumprisse o prazo para o lançamento
no Natal de 1979. Só que o perfeccionismo de Cimino não tinha limites, e logo
ficou claro que sua filmagem era excessivamente lenta. Cimino rodava dez,
vinte, trinta tomadas de cada cena e mandava revelar quase todas. E o orçamento
só aumentou. E o Directors Guild of America tinha passado novas regras segundo
as quais só se podia demitir um diretor por justa causa, e na realidade era
impossível tirar alguém de um filme, então os executivos da United Artists
decidiram, com Cimino, pelo menos chegar até o fim do túnel. Bach e Field
estavam tão obcecados em se tornar os caras que estavam fazendo “um filme de
Michael Cimino” que simplesmente deixaram-no deitar e rolar. Quando finalmente
se encerrou a filmagem, num trabalho de autor de meses, Cimino tinha 457 mil
metros de filme, o que dava 220 horas, e mandou revelar 396 mil metros. A
United Artists já estava entalada com Apocalypse Now, e agora a revista Time
chamava O Portal do Paraíso de Apocalypse Next.
A esta altura,
Scorsese começou a fazer Touro Indomável, e teve a sorte, digamos, de jamais
ter emplacado sucessos gigantescos como O Poderoso Chefão e Star Wars. E como
ele não tinha mais nada a perder, isso fez com que ele rompesse com o estilo
hollywoodiano convencional, permitindo que ele realizasse o melhor trabalho de
sua carreira. E Touro Indomável estreou no dia 14 de novembro de 1980, só que a
United Artists estava preocupada demais com O Portal do Paraíso para dar uma
campanha promocional necessária a Touro Indomável. O filme de Scorsese foi um
fracasso de bilheteria.
Quanto a O Portal do
Paraíso, os filmes que poderiam ter acabado com a era da Nova Hollywood foram O
Comboio do Medo, Apocalypse Now, 1941 ou mesmo Reds. Pois, em termos de ambição
e orçamento, Cimino não fez nada que Friedkin, Coppola, Spielberg ou Beatty não
tivessem feito. Só que O Portal do Paraíso era tão produto da década de 1970
quanto Touro Indomável, e também fracassou. E, despida de sua credibilidade, a
United Artists, àquela altura, tornou-se o símbolo de um sistema desacreditado,
obcecado com o diretor e, nas suas ruínas, subiria a Paramount, que
reinventaria a roda. Portanto, foi O Portal do Paraíso que deu fim à Nova
Hollywood. O baque foi imenso, e Coppola disse: “Houve uma espécie de golpe de
estado depois de O Portal do Paraíso, iniciado pela Paramount.”
O novo regime da
Paramount deu início a um processo que transformaria toda a produção de filmes
em Hollywood. Ex-executivos de televisão, Diller e Eisner tinham um modo
televisivo de pensar que deixaria uma marca indelével em todo o processo de
produção cinematográfica, focalizando uma única ideia, uma única imagem, para a
promoção de filmes. Agora, os lançamentos deveriam ter uma história que pudesse
ser condensada num comercial de TV de trinta segundos.
E então, dali para
frente, os filmes pareceriam com histórias em quadrinhos, e às vezes
literalmente, como nos filmes de Superman e do Batman. Tal fenômeno ganhou a
alcunha de “High-concept”, que passou a denominar os “filmes-eventos”, criados
especialmente para mobilizar grandes plateias. Os estúdios voltaram a controlar
os filmes, só que agora como um grande negócio, com uma mentalidade
empresarial. Os produtores voltaram a tomar conta do processo criativo, mas
agora seguindo o lucro. E foi aí que os custos de produção estouraram. E, cada
vez mais, os estúdios relutavam em se arriscar com projetos que não pareciam
garantir um enorme retorno de investimento. E a distribuição então guiou a
produção, acompanhado do fenômeno dos cachês inflacionados das grandes
estrelas, criando o que foi chamado de “star system”. E, com isso, neste
imediatismo do lucro, o primeiro fim de semana passou a ser tudo para o
mercado, é este período que determina, daqui para frente, a sobrevida de um
filme no circuito.
Na indústria
cinematográfica, agora, o improviso e a criatividade autoral davam lugar ao
cálculo racional da rentabilidade de um filme, inaugurando, nos anos 1980, a
mentalidade da sequência. Os filmes, muitas vezes, eram criados para gerar
continuações. E quando isso começou, entramos numa era de super-heróis bombados
com esteroides que incluíam, por exemplo, o Superman, Schwarzenegger, Stallone,
e até Bruce Willis.
E ocorreu algo
sinistro, falando da Nova Hollywood. Enquanto os diretores americanos das
primeiras fases de Hollywood ainda trabalhavam aos 60 e 70 anos, e às vezes
passavam disso, como os diretores estrangeiros Buñuel, Kurosawa, Fellini e
Bergman, os diretores americanos dos anos 1970, com raras exceções,
consumiram-se rapidamente como fogos de artifício, depois de uma explosão
brilhante. Eram eles: Friedkin, Bogdanovich, Ashby, Scharder, Rafelson e Penn.
Apenas Scorsese, e em menor escala, Altman, se recuperaram. Só Spielberg ia de
sucesso em sucesso. E George Lucas colocou Star Wars como o seu destino.
E agora, mesmo com
uma perspectiva sombria, apareceram lampejos nos anos 1980, como Oliver Stone e
os irmãos Coen, e nos anos 1990, como Quentin Tarantino e Atom Egoyam. Mas,
isso não é nada que suplante o domínio dos blockbusters, deixando pérolas como
Fargo serem feitos a troco de nada. Como Altman disse: “Cansa ficar pintando
seus quadros e indo para a rua vendê-los na esquina por um dólar.” E os
independentes só são um nome, podem, a qualquer momento, serem engolidos e
corrompidos pelos estúdios. A Nova Hollywood foi um sonho de uma década e, mesmo agora com o ditame do lucro, é parte da
história da indústria cinematográfica americana.
Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
Link da Século Diário: http://seculodiario.com.br/22729/14/a-nova-hollywood-dos-anos-1970-parte-2
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