PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

segunda-feira, 29 de junho de 2015

LUTA DOS ARES DE FAUNO

   Dentro de mim mora um abismo, calei profundamente sob um prisma de eras. Na época acima que o livro dos sofismas acirrava o ânimo, eu pequei e voltei da tempestade. Os ócios se viravam muito bem, e a estrela d’ alva ronronava sob manto azul celeste. Cada enigma porfiava rútilas sacadas. O vão da propaganda enunciava ritmo e som que faz a pena vibrar. Os muitos casos se unem na via férrea que emana do sol e colide com o mar. Vai ao templo, lutar Cartago sem muros, cidadelas de Rodes, Cós e Naxos ricas, permutando com Lacônia e fachos vivazes de hilotas. Nem tanto ao Mar Egeu, que ao caos Adriático, que morre no Tirreno, que se atira Safo do penhasco em Mitilene. Vai e doura ao topázio, morte e vida, causas e nexos dos vinhos e tempos aos dizeres de Córdoba, fundo metal gótico sob campanha, ócio na Galícia, vinho e suor no calor de Tripolitânia. Na vã filosofia nascia o território delta, fulgor e espanto brotavam com luzes na arfante rua dos areópagos. Nos dias que julgavam em pórticos, um vate gótico serpenteava com o rigor mortis de uma espadada. Cada tempo subia nos ares do mar morto, sem sal ao rio, com bruto sabor a saída ao Mediterrâneo.
   Conheci agora a palavra machadada. Lembrei agora da palavra noite virada. Noite-poeta tarda de trôpega com o linho azul sedento de lã. As estórias correm, vulto e calor são o ar místico que não vive na penumbra. As quedas do violeiro trazem notas de partituras doidas, me banho na alma, me detenho no farol, Alexandria, Constantinopla, O Mar Cáspio, Calcedônia com o ferrenho sol do Mar de Mármara. Eu corro pelo deserto com o blues de salto mortal com viés futurista. Me tenho em meu karma, danço e sofro como um renunciante. O mar alto é delta com fogo em alfa.
   Andei nas lutas sôfregas, tardo e lasso, como se vê no gládio em que a fera feria, vento e líquidos esparsos aspergidos, ásperos, temerários, renascidos, rotos, enfadados. Luto com rinhas, com ninharias. Luto com verdor na alma, castelo bruto do passo da prosa. Luto infame como um misterioso rito de corpo em bandeira vermelha. Na capa de meu disco mora uma guitarra, rente ao ébrio passa um poeta, eis que de ébrios e poetas o mapa grego registra Efialte e Péricles, com vigor passa um lance de Dionisos, rito e emplastro, em Delfos.
   Na rua de pedra eu corro, socorro os sãos, revelo os loucos. Na vida um rito se emana por toda parte, e o sol inclemente perfura a retina com seu segredo lisérgico, fadas de botas e duendes com caras de anão. Os mundos paralelos em que a História tem seu terrível soco impresso em Akasha. Não tem nada mais que a fruta uva e laranjas e maçãs e a vida frutuosa, com caldos, com lanternas, com desterros, farpas endemoninhadas, regatos filosofais, livros em pedra de cal com vinho sobre as têmporas. Lá, ou saiu o demônio ou acordou o anjo, não importa, Jano retinto mesmeriza com vate duplo em face de enigma. Zeus troveja por sustos, e o elenco é firme como um relógio, poeta mecânico sem mácula indelével, poço de riso, manta adubada em cogito totalizante, amplo com as esferas em harmonia com a própria mente espiritual, Hendrix sonhava com as pupilas dilatadas, o rock troveja vigor e erro, a música não cala nada, passo meu passaporte com o mar violento de minh`alma.
   As notas fundidas em aço potente: há em vão nada em vão, há tudo em sorte com manto persisto, o corpo vigora com ares de fascínio, levo-me ao tempo absoluto que me detém vivo, a alma recobra o pensamento esclarecido, sapere aude, rigor e fortuna na paz atônita que vem como templo e oráculo, cada dia mais ainda levitado, dando ao desdém furibundas e jocosas deambulações. Eu venho por detrás da chuva, por cima da tempestade, dentro de um sol intuitivo que brilha sunshine por todos os lados, sol eterno que pulsa qual quasar sempre espanto, mais acalanto que sol em pranto, dada a figura, toda a ventania volta sempre à Hélade, já edifiquei com a autoridade vasta de um campo de trigo, já fiz os registros necessários da empreitada, pintura de estultos, esculturas de incapazes, poemas de dramáticos, com a funda bacanal de Téspis.
Logo: chega ao esteta vinho e brio, com ardor e langor, dada à fortuna, encimada no sol pestilento que rebate no vinho da alma com segredo e desvelamento das coisas findas ou nunca fundadas. O fundo mais que tempo, o templo mais que futuro, o fulgor que aterra em Roma, Diocleciano matando cristãos, o urro de Calígula nas delirantes praias, manda o vento corroer toda a ferrugem nas belonaves, manda naves aterrissarem com todas as luzes estroboscópicas como uma orgia de luzes e cores. Todo o manto da sensação, grande Deus da droga, eviscera seus amantes, delira seus devotos, leva embora de overdoses. Pulo e salto com rebotalhos no chão, pulo e canto com espantalhos com vozes de rusgas, como se a asa de fibra renunciasse sem mais, e ao contrário, com festa e flor poetas se refazem, se recobram, e beijam o mundo com um abraço.
   Não há litígio aonde mora a filosofia, não há enfado que na poesia não morra. O poema não mais triste, não mais doente, a cabeça ao passo largo que a alma expande, lenho e fúria que não dizem nada, e dizem tudo em amálgama, como o raio violeta se expande verde, e os olhos veem. O verde que se veste de azul, e o vermelho que sorri com seu rosa. O mar que ora vai verde e ora azul, o diamante que é denso, cor de vidro quando explode. Na massa craniana moram ritos do Espírito, e com o lagar bem semeado Borgonha e Alsácia-Lorena viram o tempo com florais, clima temperado, as dunas de sal, os emblemas, os vinhedos, os carros de carruagem, a técnica lírica de escrever, passo dentro e não mais rente, o trôpego poeta cai e levanta, o sol nascente d`aurora permeia tudo o que há, o universo, meu grande sol com cor celeste de galáxia, todas as coisas do mundo em cores alteradas como prisma e mandala. “O Louco” da carta de Tarô de Marselha com a saia cigana que nunca ousou me humilhar, com o denso sabor que cai nas figuras de geômetras que descansam na Academia.
   Tomem um chá de glândula pineal, tomem os ares imaginários que flutuam com o sentido da vida, lembro de cada corpo, e os tenho em estima, todos irmanados com filosofia de sol no peito, como anjos espantados com o meio-dia, como luz e som com cores e a acústica que faz tudo brilhar com graça infinita. Eu vou ao mar, e o mar vem até a mim, até a Filosofia vira loucura de Poesia, e os viços correm com a mão na pena, eu levo toda estrela com o tempo vivido de ares mais náuticos que podem emanar do mar, oceânide que levita, mares de fogo nas minhas visões, deltas e alfas, fogo na bruma da anarquia, todos os sentidos em harmonia com o senso de justiça, a alma grega com o termo de razão tão apreciado, logo o mar de sempre com a total fortuna dos adventos de que a arte é tão pródiga. Leve o lenho, e se aqueça no fogo universal.

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.


29/06/2015 (poema em prosa) 

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