PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Conexão-Metrópole

Da pétala da flor à cidade sonhada,
cai uma lágrima com uma carta
despida com ardor.

A cidade refulge dinâmica
sua própria fome,
a cidade sem anestesia
explode como um vulcão.

A eutanásia de sua imensa
aglutinação morre
na defecção inesperada,
seu ar poluído corroendo
o desvão da madrugada,
o morro morre no morro,
o grito não salva ninguém.

A cidade é uma flor negra
de augúrios putrefacientes,
o crack e a remela
convivem com prédios
e mansões.

Este é o Rio torto,
o mar morto
de Ipanema
com seu baile
de bundas boas
e pedintes de esmolas
tomando foras.

06/04/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)

Soneto dos Mortais

(soneto decassílabo sáfico)

Gerações vão passar no tempo fundo,
quando terríveis ventos caem ao longe
semeando lírios na violeta donde
a vida nasce no violento mundo.

A força da poesia virá veloz
com maestria e têmpera voraz de música,
perto do níveo campo em terra túmida
que em pranto sóbrio descobriu seu algoz.

Nada fiz para tanto, mas teria
feito, se assim me fosse claro vidro,
como se olhassem fundo em parca via.

Minha canção sofre e desanda lúgubre,
tal é o delírio santo e lasso em frio,
que na sua mística, deseja o fúnebre.

06/04/2011 Sonetos da Eternidade
(Gustavo Bastos)

Desalinho

De sangue o teu enlevo,
cara sedutora dos meus versos
é a mesma feroz poesia
do meu desalento.

Lento o passo se dá
em desalinho,
passo longo ou curto,
é o mesmo caminho.

Do meu enlevo de corpo nu
se faz a seda da filosofia,
o corpo reluz quando navega
absorto no mar.

Eu dei às minhas lápides
fulgurações de vinho
ao poeta que ruge
no seu amor fraco
e temor de morte.

A morte é o temor
ao contrário.
Da mesma flor
que tu me roubaste
o rubor do sonho
se esfarelou.

Sou o delírio da vida
no mundo da sombra,
sou poeta da minha honra.

06/04/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)

domingo, 3 de abril de 2011

SOBRE O TEMPO E O RENASCIMENTO

Nem o tempo e nem o silêncio do tempo

me trazem o significado do devir,

o tempo é o vem ser de todo momento.



Eis na noite e no dia

o tempo circular da Terra

e sua rotação,

eis os anos também

de sua translação ao redor

da luz solar.



Harmonias universais são canções pitagóricas

e sua mística dos números.

Atrás das falácias e dos sofismas

de um grande retórico,

a Hélade se afirmava posteriormente

como sonho platônico

em sua Idéia do Bem.



O tempo, sal da vida,

se compunha no devir,

mas Parmênides queria o imutável,

o ser puro.



Condensando-se no Corpus Aristotelicum

toda uma faina de naturalista e filósofo

de todas as frentes e dimensões.



Alexandre traspassou os fracos de ânimo,

sua guerra se emoldura no tempo

de morte e intuição de vitórias.



Minha terra, meu sol.

Toda a História Antiga

foi um refinamento

de formas aliadas

aos palimpsestos

de toda uma época.



Diria ser epicúreo o

meu prazer,

não dizendo ser a aceitação estoica

o meu canto resignado,

nem tampouco a pirrônica suspensão

do juízo.



O que se atrela ao tempo do meu vivido

são os víveres e a celestial

proeminência do pensamento

em sua inaugural leveza

de criar o seu próprio saber.



Eu pensei socraticamente

por fim numa essência da realidade

em que se deu o fim da vida

em cicuta e noite sem fim.



Agora então eu afirmo o devir

e digo que o ser puro

não é senão ordem fictícia,

pois o que se dá é o tempo

e somente o tempo,

vida, morte e renascimento.



20/06/2009 Gustavo Bastos

NUM ÁTIMO DA NOITE POÉTICA

De mãos à obra o poema se decifra,

qual luz ampla e transcendente,

das mãos cabe ao crepúsculo

o caos e a mordedura.



Cavalga meu poema no sal do mar.

Vislumbra no horizonte o seu bacanal

e o amor desliza desbundado

em noite carnal.



Seu azul é brisa e a morte já não é

de então o sonho buscado.

Lá vai nuvem, estofo e céu,

coroar meus bálsamos de seu plano geométrico

de faces, vai por onde eu vou

com o delírio da noite,

após o seu crepúsculo de alma vadia.



O poema é o decifrado da urgência

que escreve,

uma bandeira se desfralda

como grito de vida e diz:

"Sou uma imagem de pássaros,

relvas e delírio de bravura!"



Com o seu azul o poema nasce

e eu sou o seu mensageiro

nas rodas e cirandas

do espaço sidéreo

em que a obra é poema de pedra

e cascas dos meus átimos inspirados.



12/06/2009 Gustavo Bastos

DO QUE NÃO SEI

No mundo em que o poeta é proscrito,

nascedouro das ilusões,

bate o coração do exílio.



Quem és tu, romântico e arrojado?

Vai para as antologias

beber sedução,

vai para as rimas que são suas amigas

beber a canção.



Se tu soubesses quão profunda

é a chaga de um assassínio consumado,

certamente não perderias o teu tempo

com metafísica e assombro.

Pois é aqui na vida vivida

que a sombra desfalece,

o mar se exaure,

e a vida se rejubila.



Certamente, então, dirias que o poeta

não se multiplica pelos seus escritos,

mas que se reduz aos seus escritos.

E agora tu não sequer vislumbras

qual é a sede que tudo encanta

ao poeta morto e ao poeta vivo,

um poema de amor

e outro poema de desamor,

um poema estrepitoso

e outro poema conciso,

uma longa declaração artística

no peito de um delirante,

enquanto a calma

é o silêncio,

e a fuga a poesia.



12/06/2009 Gustavo Bastos

INVENÇÃO DO CONHECER

Quando chegar o dia propício,

inventarei um novo saber,

isento e profícuo,

cheio de virtude e paciência,

que não tenha o espírito de sistema,

mas uma moral profunda

como o oceano que nos cerca.



Darei aos meus irmãos

o saber que se tem na arte,

tal arte que corre de mãos em mãos

para anunciar o porvir

de uma música dos girassóis,

e a nuvem já não será pesada,

mas branca penugem de sábia composição.



Para os louvores à lua,

darei à sorte dos seres

a perfeição de uma praça pública

em que este saber será moldura de prazeres

e o quinhão da inteligência

na sua plenitude.



De um barco à outro na grande remada,

de margem à margem no belo rio,

poderei cantar totalmente assombrado

todas as minúcias

dos recônditos da minha alma,

e num seio de sabedoria e prudência,

animar as maiores danças

do que sente o coração.



23/05/2009 Gustavo Bastos

BELEZA SOBRE A MESA

Por tudo que perdi, nos dias passados,

restou-me a vida com a clareira

do futuro.



Eis que vi, depois da primavera,

um ato nobre sobre o orgulho ea presunção,

foi clareando a percepção

dos sabores,

como num relance

se abriu o hemisfério,

norte e sul

dos baluartes.

Depois da chaga que lembrava

o tempo do vício,

uma liberdade despontou

no céu chapado

de vívidas paixões.



Foi então que o poeta acordou

e o infinito dos versos

se encantou

de belezas martirizadas

no matiz do verão.



18/05/2009 Gustavo Bastos

OBSCURIDADE

Donde flutua o corpo da revolta,

já lá não faz de mim refeição da carne.

Posto uma vez o meu espírito,

dele compreendo nódoas, equimoses

e dores servis.



Agora, por agora, neste instante,

vem o bálsamo acomodar relíquias literárias

no meu doce recinto,

sento-me à beira dos escritos,

levanto com os pés, e a cabeça pensa

pelas beiras de caos, sabedoria e pó.



Ditam-me peripécias os falcões,

as águias e os gaviões

ditam-me suas aventuras.

O que sei bem na vida é o sábio

planar da gaivota sob o sol da existência.



Por que esperar a dádiva?

Que alma terá prazer na eternidade

e não na carne?

Por que deveria eu me purificar

para ter paz ditosa e um amor fraternal?

Quantas serão, enfim, as noites

que passarei numa filosofia de terras solitárias?



Ora, sei bem pouco da eternidade,

é o que me faz ignorante

como a mais obscura criatura

deste mundo.



17/05/2009 Gustavo Bastos