PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

sábado, 6 de novembro de 2010

BORN TO BE BLUE



Coração de pedra, não tenho que dizer

se tenho algo a dizer sobre os teus sonhos.

As cortinas se fecham depois do ato final

de nossas vidas.

Espero por um momento mais sóbrio e mais sério,

para que eu leve o meu lema de ser sábio

mesmo nas horas de socorro e desespero.

Eu creio que me perdi em alguns instantes

e tive a insanidade como a minha companheira.

Me fechei ao sol e ao verão dos meus olhos.

Deixei que a lua cheia sofresse seus mistérios sobre mim.

Coração de pedra, quando se foi o teu veneno

eu apenas aprendi a ser mais para mim mesmo,

olhando os dias de tolice do ócio

em que a chuva cai sem eu chorar,

olhando o poema e a saudade

que eu quis perto do meu calor de paixão,

para no fim cair como neve

no inverno dos sentimentos fingidos

de uma felicidade a qual ignoro o destino,

sei de mim o pouco que tenho a dar

senão o poema contínuo

da sede do sangue e da liberdade

senão os infinitos versos

da pena que traz ali o seu alvo

como numa noite azul e preta

do futuro que me cai dos olhos.



25/02/2009 Gustavo Bastos

(ouvindo Chet Baker - born to be blue)

AUTOCURA

Na face negra da noite

a sombra se matiza em cor escura,

onde estará o meu norte,

onde a cura?



Diante da escuridão da noite

eu entendo o sentido da morte,

corpo feito do sangue que um dia morre

e que vem ao brio da luta enquanto vivo

a vida da guerra e da vitória.



Sou quem vaga na noite escura,

sombra de mim como um meu duplo

que vagueia num sonho de névoa

e acorda para uma nova labuta.



Na face da morte continuo a viver,

e na vida nada se pode perder,

eu sei da minha cura,

esquecer o passado e fazer o futuro.



19/02/2009 Gustavo Bastos

TESTEMUNHO DA VERDADE

Dar-vos-ei meu testemunho:

sou filósofo, na esfera e no labirinto

mordi a minha valentia adolescente

e me tornei homem pacífico.



Quando a nau voltar de sua viagem,

estarei à salvo numa nova equipagem.



Eu voltarei do surto psicótico

com membros de aço

e o sustento que me dá a razão.



Sou filósofo e tenho na metafísica

o meu segredo dileto da existência,

tenho com a bruma uma relação de irmãos,

tenho com as mulheres uma admiração profunda.



Deste prontuário se fazem a doença e a cura,

se erigiu numa forma plácida

toda a riqueza do lume fosfóreo

e terminante da nau perdida.



Dar-vos-ei o poema:

toda a brutalidade e a suavidade,

como contrários conflitantes

de uma mesma alma.



15/02/2009 Gustavo Bastos

O ETERNO EM MIM

Amor por ti sem aurora,

refaz o dia cintilante de rumores

sobre um futuro próspero e feliz.



Devagar assoma para o lado da beatitude,

e ensina ao teu amor a amar deveras

seus sentimentos em flor d`alma.



Consequência natural é o ser feliz

sem perguntar ao autor do drama

se ele também o é.



Na sombra de uma árvore compõe

a sua grande epopeia visceral,

e navega pelos delírios de carnaval.



A carne que te assusta te completa,

e completa também a pura alma do trovador,

e se esmera em compor um canto absoluto

de forte paixão arrebatada

com o desejo reto

de uma grande anunciação,

o destino pronto ao esmero

de sua costura perfeita,

o destino levitado de meditada fúria

e amor gigante pelo sinal da cruz.



Eis que o meu túmulo terá uma cruz

e uma pirâmide,

e na lápide estará escrito:

"O eterno Deus morou em mim."



14/02/2009 Gustavo Bastos

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

HAICAI - XVI

O desdém por tudo
é como viver sem dono
e acabar desnudo.

01/11/2010 Livro de Haicais
(Gustavo Bastos)

HAICAI - XV

Me deixe fazer
de conta que não há afronta
para o meu lazer.

01/11/2010 Livro de Haicais
(Gustavo Bastos)

HAICAI - XIV

Venho lhes contar
que eu não sou um ser do verão,
sou inverno polar.

01/11/2010 Livro de Haicais
(Gustavo Bastos)

HAICAI - XIII

Na noite de trevas
demônios nascem risonhos
e morrem sem tréguas.

01/11/2010 Livro de Haicais
(Gustavo Bastos)

Elegias Existenciais - III

E o vinho da eternidade
habita no coração da saudade
onde o mistério emana
eflúvios sulfúricos
de um poema escuro
como a noite,
e que de estrelas longínquas
ecoa toda a sua eternidade
em versos fúnebres
de loucura e terror.

Da noite escura do inferno
nasce um demônio vermelho
de fogo e desvario,
ele corre pelo silêncio
trevoso do martírio,
cresce entre os detritos
do apocalipse,
e de sombras se alimenta.

A elegia do ébrio demônio
se anuncia pelo poeta morto
que não sabe da luz do dia,
e que na noite faz orgia.

Eis o tempo sepulcral
que a solidão ébria
descansa temerária
pelos seus pecados.

01/11/2010 Elegias Existenciais
(Gustavo Bastos)

O corpo indizível

Que vou adivinhar em teu corpo querido?
A sombra da pálpebra desfalece
em sonhos rotos na fuligem do tempo,
o massacre do sol nos toma a roupa rasgada
que a vida um dia cantou.

Febre e delírio no monte de areia,
o tempo recobrando sua nuvem de poeira
sob estrelas do infinito da luz.

Poetas brigam entre os bordéis,
os corpos gritam nus sob as fogueiras
do ar terrível do inferno,
e o pecado grassa nestas narinas
de fumaça e enxofre,
o abismo se torna imortal
como a flor murcha do diadema,
acordam virgens e o manancial
do terror aflige o desdouro.

Entre os ventos tempestuosos
das águias de prata,
surge imponente
a terra varada
por morticínios
e virtudes.

O que adivinhar da vida que
está na carne mortal?
Somente o indizível da lembrança.

01/11/2010 Delírios
(Gustavo Bastos)