PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

quinta-feira, 16 de abril de 2020

GURUS E CURANDEIROS – PARTE XXV


“Não tenhais medo. Eu não vos faço mal. Lúcia: - Donde é Vossemecê? - Sou do Céu.”

As aparições de Fátima se referem a um ciclo intenso de aparições marianas que ocorreram durante o ano de 1917, e que se localizaram em Fátima, Portugal. No dia 13 de maio de 1917, três crianças, Lúcia, que tinha 10 anos, Francisco, de 9 anos, e Jacinta, então com 7 anos, afirmaram ter visto uma senhora que brilhava muito, mais do que o sol, sobre uma azinheira, quando elas apascentavam um rebanho na Cova da Iria, próximo da aldeia de Aljustrel.
A vidência mais forte era de Lúcia, que conseguia tanto ver, como ouvia e falava com a aparição, Jacinta via e ouvia, e Francisco conseguia ver, mas não ouvia. Tal aparição da Virgem Maria se repetiu durante os cinco meses seguintes, com importantes mensagens ao mundo, e na sua aparição principal, em 13 de outubro de 1917, a aparição se apresentou como a “Senhora do Rosário”.
Lúcia, mais tarde, documentou tais aparições, e fenômenos que as precederam ou que ocorreram depois destas, com manuscritos que começaram a ser escritos em 1935, que foram intitulados Memórias I, II, III e IV. Em Aljustrel habitavam os pastorinhos, pequena região com apenas 25 famílias, e as crianças não frequentavam a escola, com uma criação muito beata, incluindo histórias de aparições de Nossa Senhora.
Antes das aparições marianas em Fátima, as crianças relataram que houve aparições de um anjo, num conjunto de três visões, fenômenos estes que permaneceram inéditos até 1937, quando Lúcia as divulga no texto Memória II, mas são nas Memórias IV que aparecem as Orações do Anjo, em 1941, tais aparições do anjo se deram em 1916. Lúcia também narra três outras visões que se deram em 1915 “uma como que nuvem mais branca que a neve, algo transparente, com forma humana. Era uma figura, como se fosse uma estátua de neve, que os raios do sol tornavam algo transparente", que ela viu com duas outras pastorinhas, e a imagem desapareceu logo em seguida.
Em 13 de maio de 1917, ocorreu a primeira aparição mariana, após dois clarões que pareciam relâmpagos, em cima de uma pequena azinheira, se pode observar que “era uma Senhora vestida de branco e mais brilhante que o Sol, espargindo luz mais clara e intensa que um copo de cristal cheio de água cristalina, atravessado pelos raios do sol mais ardente", descreve Lúcia. "A sua face, indescritivelmente bela não era nem triste, nem alegre, mas séria, com ar de suave censura. As mãos juntas, como a rezar, apoiadas no peito e voltadas para cima. Da mão direita pendia um rosário. As vestes pareciam feitas só de luz. A túnica era branca e branco o manto, orlado de ouro que cobria a cabeça da Virgem e lhe descia até aos pés. Não se lhe viam os cabelos nem as orelhas.".
Se seguiu o diálogo : “Nossa Senhora: - Não tenhais medo. Eu não vos faço mal. Lúcia: - Donde é Vossemecê? - Sou do Céu. - E que é que Vossemecê me quer? - Vim para vos pedir que venhais aqui seis meses seguidos, no dia 13, a esta mesma hora. Depois vos direi quem sou e o que quero.” Se seguiu o diálogo, com mais detalhes, até que, segundo Lúcia, “em seguida começou a elevar-se serenamente em direção ao nascente até desaparecer na imensidade da distância. A luz que a circundava ia como que abrindo um caminho no cerrado dos astros".
Em 13 de Junho de 1917, foram 50 pessoas ao local das aparições, e ao meio-dia, os videntes observaram um clarão, alguns viram que o topo da azinheira, durante a aparição, pareceu curvar-se sobre um peso, a troca de palavras entre Lúcia e a aparição foi ouvida por outras pessoas apenas como um sussurro, como um zumbido de inseto. E segue o diálogo : “Lúcia: - Vossemecê que me quer? Nossa Senhora: - Quero que venhais aqui no dia 13 do mês que vem, que rezeis o terço todos os dias e que aprendam a ler. Depois, direi o que quero. Lúcia pediu a cura de um doente. - Se se converter, curar-se-á durante o ano. - Queria pedir-lhe para nos levar para o Céu. - Sim, a Jacinta e o Francisco levo-os em breve. Mas tu ficas cá mais algum tempo. Jesus quer servir-se de ti para me fazer conhecer e amar. Ele quer estabelecer no mundo a devoção ao meu Imaculado Coração.”
Em 13 de Julho de 1917, houve então a terceira aparição, uma nuvem pequena pairou sobre a azinheira, o pai de Jacinta e Francisco, por sua vez, ouviu um sussurro, novamente como se fosse de insetos, os videntes viram um reflexo de luz, e em seguida Nossa Senhora. Segue o diálogo : “Lúcia: - Vossemecê que me quer? Nossa Senhora: - Quero que venhais aqui no dia 13 do mês que vem, que continuem a rezar o terço todos os dias, em honra de Nossa Senhora do Rosário para obter a paz do mundo e o fim da guerra. Continuem a vir aqui todos os meses. Em Outubro direi quem sou, o que quero e farei um milagre que todos hão de ver para acreditarem.”
Lucía pede então à Nossa Senhora a cura do filho paralítico de Maria Carreira, e a aparição responde que não lhe curaria e nem lhe tiraria da pobreza, mas lhe daria os meios de ganhar a vida. E aparece outro enfermo querendo ir logo ao céu, e ela lhe diz para esperar, que não tivesse pressa, que sabia quando o havia de buscar. A estes diálogos se seguiu a primeira parte do segredo, “A Visão do Inferno”, com imagens terríveis dos demônios e almas do inferno, com gritos e gemidos de dor.
Em seguida a esta primeira parte, tem a segunda que é “O Imaculado Coração de Maria”, e ela diz que para salvar as almas do inferno, Deus quer estabelecer no mundo “a devoção ao meu Imaculado Coração”. E ela segue : “Se fizerem o que eu disser salvar-se-ão muitas almas e terão paz. A guerra vai acabar, mas se não deixarem de ofender a Deus, no reinado de Pio XI começará outra pior. Quando virdes uma noite, alumiada por uma luz desconhecida, sabei que é o grande sinal que Deus vos dá de que vai a punir o mundo de seus crimes, por meio da guerra, da fome e de perseguições à Igreja e ao Santo Padre.
Para a impedir, virei pedir a consagração da Rússia a meu Imaculado Coração e a comunhão reparadora nos primeiros sábados. Se atenderem aos meus pedidos, a Rússia se converterá e terão paz, se não, espalhará seus erros pelo mundo, promovendo guerras e perseguições à Igreja, os bons serão martirizados, o Santo Padre terá muito que sofrer, várias nações serão aniquiladas. Por fim o meu Imaculado Coração triunfará. O Santo Padre consagrar-me-á a Rússia, que se converterá, e será concedido ao mundo algum tempo de paz. Em Portugal se conservará sempre o dogma da fé.” A isto segue-se a terceira parte do segredo, “O atentado ao Papa”, com uma narração também intensa e chocante.
No dia 13 de Agosto, no dia que seria a da quarta aparição, as crianças videntes não puderam chegar até a Cova da Iria, eles foram raptados por um republicano anticlerical e maçon que queria saber o segredo que eles guardavam. No local da cova se juntou uma multidão, e por volta de meio-dia se ouviu um trovão, veio um relâmpago, e uma pequena nuvem pairou sobre a azinheira. Seguiu-se a isto fenômenos de coloração sobre as pessoas, as árvores e o chão. O tal maçon, no entanto, não conseguiu obter o segredo das crianças videntes.
No dia 19 de Agosto de 1917, Lúcia, junto com Francisco, e seu irmão João, numa propriedade em Valinhos, perto de Aljustrel, viram alterações atmosféricas, e Lúcia então viu Nossa Senhora por um reflexo de luz, também sobre uma azinheira. E se seguiu o diálogo : “Lúcia: - Que é que Vossemecê me quer? Nossa Senhora: -Quero que continueis a ir à Cova da Iria no dia 13, que continueis a rezar o terço todos os dias. No último mês farei o milagre para que todos acreditem.” Em 13 de setembro de 1917, antes da aparição principal de outubro, se deram outros fenômenos sobrenaturais.
(continua)

Link recomendado : O milagre de Fátima - Aparição de Nossa Senhora de Fátima parte 1 : https://www.youtube.com/watch?v=X1jXFxXxYHc&t=7s

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.







terça-feira, 14 de abril de 2020

O FILÓSOFO

O discurso racional, quando
vira um tratado, se perde
em viço do que poderia
dizer de vida,

oh, os sofismas são estes
outros estratagemas e ardis,
que aos tolos fascina e engana,
e que os sapientes tomam
em ironia e, logo,
lhes dão um tombo,

certo ar sagaz faz de nós,
filósofos, arteiros do
raciocínio, a fiar
a afiada faca da razão,
com primor e elegância,
quando caem os palhaços
verbosos, enredados
nas aporias de suas
estultícias.

14/04/2020 Gustavo Bastos

ROCK`N`ROLL

Tinha um som velho sony
que tocava meu rock
e eu era um menino,

aos meus CDs e K7s
todo o meu mundo
pulsava dentro
de uma guitarra,

moleque cabeludo
que vivia errante,
alegre vivente,

hoje que tenho a justa medida :
a música que pulsa,
me enleva, me carrega
na direção certa,
um ar glorioso
e vitorioso
que o rock
me proporciona
o tempo todo.

14/04/2020 Gustavo Bastos

O HOMEM INCÓGNITO

À estação fria em que
desce o homem incógnito,
sua pasta e sua veste,
que lhe denodam o labor,
viril em sua seta,
como um mártir,

desce à rua amalgamada
de gente, toda sorte
de intempérie, todos
os vícios cercando
seus passos vivos,
ele escapa dos venenos
e cultiva a virtude,

ele, como a testemunha ocular
de seu próprio esforço,
de sua inteligência,
senhor de sua ciência
e de sua sapiência,

este homem incógnito,
que some pela rua,
não mais o vi,
mas sei que é
um ser admirável.

14/04/2020 Gustavo Bastos 

VILLON

De seu testamento, ao patíbulo
dos juízes, e sua célebre
"balada dos enforcados",
o poeta maldito e marginal
que fundou a poesia moderna
de França ao fim da Baixa
Idade Média,

têmpera cáustica, destino que
não se soube, de seu paradeiro
o rastro, sua obra documentada
e bem traduzida por Swinburne,

no roubo ao tesouro
do Colégio de Navarra,
à sua absolvição da forca,
desterro de Paris,
a perder-se em suas musas
incógnitas e policromáticas,

Villon, este canalha
das letras bandidas,
fumando em sua balada
variegada e um rondó firme,

Villon que em seu espanto
matou o sacerdote
ao fim de sua pena.

14/04/2020 Gustavo Bastos

CONQUISTA DO INÚTIL : O CAMINHO COMPLEXO DE HERZOG PARA REALIZAR FITZCARRALDO


“O que lemos neste relato sui generis de Herzog é de como um sonho maluco pode enfrentar tanta adversidade”

Werner Herzog volta de Manaus para Iquitos, ele sente a sensação de ter que continuar com algo que saía do controle, que logo não seria administrável. As incertezas povoavam a cabeça do cineasta, ele tinha dúvidas sobre atores, a ideia de um navio montanha acima, o novo acampamento, o tamanho todo do empreendimento e sua organização, a questão do envolvimento dos índios na filmagem, o problema financeiro, e mais uma lista de coisas. E ele, por fim, vê do avião, ao retornar a Iquitos, o tamanho colossal da floresta, toda a sua vastidão.
Herzog, neste contexto, entre suas várias preocupações, recebe notícias ruins de Cuzco, por parte de César Vivanco, nesta cidade havia documentos na burocracia sobre o rio Camisea que Lima não reconhecia. Em Iquitos, todos que trabalhavam junto com Herzog se encontravam exaustos, os figurantes não apareciam, e no relato de Herzog, ele diz que Izquerdo vomitou o dia todo, houve novo posicionamento acerca dos processos, o que reanimou Herzog, contudo, ainda não tinham sido assinados os contratos de Robards e Jagger.
Nestes dias estranhos, temos aqui o relato de Herzog sobre o clima que no qual estava envolvido : “Dia parado, úmido. Inação combina com inação, nuvens nos encaram, grávidas do céu, a febre domina, larvas crescem assumindo formas gigantescas. A floresta é obscena. Tudo é pecado, por isso o pecado não se destaca como pecado. As vozes da selva estão caladas, nada se move, e sobre tudo paira uma fúria lenta, imóvel. As roupas no varal não querem secar. Como se houvesse um acordo secreto, as moscas se reúnem, as barrigas inchadas e brilhantes, repentinamente sobre a mesa.”
E Herzog nos dá uma visão geral de como se dão estas condições sui generis de sua filmagem e de como as coisas se dão, neste contexto : “Nos pouco dias em que estive ausente, os figurinos e equipamentos pareceram se desintegrar assim como, segundo Uli, toda a produção, já que W., totalmente desorientado, parece só enxergar o navio. Além disso, ele perdeu toda a visão de conjunto e perspectiva. Aconteça o que acontecer, quero tentar não adiar o início das filmagens, psicologicamente isso seria catastrófico. Como para o general Patton, só uma coisa importa : mais para a frente as coisas se ajeitam; organização, logística e tudo o que é secundário vai se adequar à dinâmica.
E, aqui, dou a palavra novamente para Herzog, que continua seu relato espantoso : “Ainda não há eletricidade. A noite caiu sobre a terra. O que aconteceria se a floresta murchasse como um ramalhete de flores? À minha volta morrem insetos; para morrer, eles se deitam de costas. (...) A correnteza em alguns malpasos diante do rio Camisea parece ser forte demais para o nosso barco. “Então boa noite”, ribomba em minha cabeça como se fosse um sino, e, para acompanhar, raios ricocheteiam acima das silhuetas das árvores, Henning deveria chegar esta noite com algum dinheiro, mas fiquei sabendo que ele só vai chegar no sábado.
Não temos mais nada aqui, e o problema é que alimentos precisam subir o Camisea urgentemente, aparelhos precisam ser providenciados em Lima e os empregados precisam ser pagos. (...) Ao ser chamado ao telefone na casa em frente, caí da escada que leva à minha cabana. Foi um daqueles telefonemas estranhos que perguntavam por nós, em que alguém que eu não conhecia tentava me explicar que eu era um maluco, um perigo para o público.”
Segue o relato : “Aniversário de Henning. Caos nos figurinos. Izquerdo, com quem Gisela gritou em alemão, pediu demissão no mesmo instante; pelo menos ele vai estar em casa no Natal. Bill Rose, ao que tudo indica, bêbado, passou de Miami um telegrama desconexo, com rudes ofensas a Alan Greenberg e sua demissão – no entanto, ele nem começou a trabalhar conosco. Alan mandou me dizer que B. lhe telefonara sem motivo e sem aviso, ameaçara-o de morte e demonstrava confusão mental.
No campo, em Camisea, armou-se uma terrível tempestade. O temporal arrancou árvores gigantescas, que destruíram completamente algumas casas. Em uma peça teatral que foi recentemente encenada pelos impetradores do tribunal contra mim, em um teatro estudantil e contando com a participação de alguns índios de Cenepa, segundo Henning, eu sempre apareço com um charuto enquanto filmo, e o que escapou à atenção de todos foi que até agora eu ainda nem filmei. Tudo isso faz parte dos arabescos diários.”
Mick Jagger chega a Iquitos, parece meio deslocado, suas malas não haviam chegado, ele as enviou a “I-Quito”, está bem humorado, e diz que Robards e Adorf “lhe confessaram que haviam escrito seu testamento, afinal iriam trabalhar na selva.” E Herzog segue enfrentado problemas enormes, no que segue seu relato : “Nosso iluminador fez um gato, de maneira audaciosa e visível para todos, no cabo elétrico principal lá fora na frente do novo quartel dos equipamentos. Tudo lá passou a ter energia elétrica de repente. A companhia elétrica nos prometeu, durante semanas, todos os dias, que faria a ligação – nunca mandou ninguém.
Caos no México, assim do nada. A agente de lá dispensou todos os atores e membros da equipe, anulou os contratos e afirma que o fez depois de um telegrama nosso. Lucki pega o avião ainda hoje de Miami para o México para colocar as coisas em ordem de novo. Com atraso, o Caterpillar vai ser despachado de navio do porto de Miami; ele deve seguir de lá para Lima/Callao e depois, por terra, para Pucallpa até o rio Ucayali, e daí em uma chata pelos rios Urubamba e Camisea. Em termos de prazo, isso pode significar uma catástrofe.
Durante dias, o carregamento com os holofotes e a câmera tampouco pôde ser encontrado, já que não foi possível o avião não pousar em Iquitos, em razão de uma tempestade, e teve de voltar para Lima. Lá eles descarregaram tudo, então um avião quebrou e depois tudo ficou preso na alfândega, porque a companhia aérea Faucett não conseguia mais achar os Airway Bills. Os brasileiros, atores e equipe de som, vão chegar atrasados, porém : rio acima o Narinho II navega mais rápido do que pensávamos, e mais : dizem que a greve geral deve ser cancelada.”
Aqui se desenha a sensação de caos e descontrole que Herzog teve nesta sua ideia de filmagem, ao partir para a sua realização, talvez algo sem precedentes na vida de um cineasta, pois dispensou toda técnica de estúdio e decidiu enfrentar a maior selva do mundo, a vasta floresta amazônica, um relato que, como disse nos textos anteriores de Conquista do Inútil, revela uma mistura curiosa de romance naturalista com temas práticos de nuances da direção de cinema.
O que lemos neste relato sui generis de Herzog é de como um sonho maluco pode enfrentar tanta adversidade, quando as coisas se dão, e hoje o filme Fitzcarraldo ser um objeto cult e o livro de Herzog um documento não apenas de curiosidades naturalistas, como muitas vezes pontuei em meus textos, mas uma realidade bem objetiva da vida na floresta, e também, o  mais importante, o documento de uma filmagem e das impressões de um cineasta em seu trabalho.

(continua)

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.










  

segunda-feira, 13 de abril de 2020

A LUTA DAS CORES

Nos acontecimentos do mundo moderno
as cores lutam para brilhar
e para não morrer,
um amarelo ácido que
tenta se agarrar ao sol,
o vermelho que das bocas
tenta se manter vivo,
o azul que do céu
tenta se segurar
contra as trevas,
laranja que ao melhor
dia do arrebol
cuida para não
virar noite eterna,
o verde que na floresta
e no campo luta contra
o fogo, o rosa que
da rosa tenta não
murchar em vão,
o branco da paz
que se assusta
e tenta evitar a guerra,
o preto da grande áfrica
que luta contra a fome
que grassa fora da
riqueza do petróleo,
e a transparência que,
nas almas boas,
luta contra os ardis
que se camuflam.

13/04/2020 Gustavo Bastos

O SAL DO MAR

Na frente, defronte
ao marulho da praia,
descansa minha paz
que não cessa,
deste sereno canto
que faz poesia,

para lá das altas montanhas,
no frio do gelo e da chuva,
também mora o meu poema,
dou uma de doido e canto-danço
duzentos versos de sol e chuva,

volto à praia, meu sacrário de sol,
minha potência de luz,
a ver do mar meu mistério
misturado ao sal.

13/04/2020 Gustavo Bastos

APENAS UM POEMA

Que, ao meio do caos,
do burburinho, da azáfama,
eu fiz deste poema
um instante silente,
uma meditação.

Que, das horas prenhes
de sol, este poema
lhe dê aquele
alento de que
"eu estou aqui".

Que, de sempre que ver
todo o campo pela
frente, em seu vasto
futuro, diga a este
poema : "eu estou aqui".

Para, quem sabe,
o que este poema
tem a levar
deste mundo,
seja apenas
um sorriso simples
de quem gosta
da vida.

13/04/2020 Gustavo Bastos

TEORIA DA LOUCURA

Quantos delírios cabem
na palavra loucura?
E a sabedoria lúcida,
dentro dos descaminhos
que a loucura apresenta,
sucumbe exangue.

Todos os tipos de delírio
e alucinação, a este
cabedal completo,
tratado da doença mental,
é que é o estatuto
do fenômeno e que funda
a palavra loucura.

A arte, um tipo diferente
de fenômeno, poderia ser
também um tipo diferente
de loucura, delírio e
alucinação lhe carregam
ao seu fim supremo,
a revelação divina.

13/04/2020 Gustavo Bastos

O MAR NOBRE DO SOL

Ao pequeno sinal do pássaro,
com a relva sob a luz
da cruz sagrada,
se estende na praia
o sangue e o navio,
a paz celeste
e o doce marulho,

com a minha túnica,
e minhas visões
das almas floridas,
caio na dança do sol
sob intenso fogo,

lá, ou aqui, sempre
o vivo sonho que
me eleva o corpo
ao céu,

e a ver este pássaro
na voz rouca do marulho,
vejo o mar em seu
espanto nobre.

13/04/2020 Gustavo Bastos