PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

sexta-feira, 15 de março de 2013

FRAGMENTO OPOSTO

Gritando, porque a noite é farta,
vai, poeta! Não ande ao sim
e não estanque no não,
não beba licores,
se afogue no mar,
veja o que vê,
dance o que dança,
ferva o orvalho
em tua pena!

Gritando, porque o dia é farto,
vai, poeta! Se perca quando em vez
e se encontre desde sempre,
beba a alma pálida do álcool,
não caia no rio que te leva,
leve ao lago o que te espera,
ria do que não se vê,
não dance se não o sabes,
e esfrie o orvalho
às duras penas!

14/03/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos) 

POEMA FUGITIVO

Fugir, qual fuga desatada,
morrer no nada,
e no nada se fartar.

Fugir aos mares, deixar os lares,
fugir da família,
ser e não ser
ao tempo que me
foge.

Perder-se por se achar
perdendo-se,
fugindo à perdição
e dos horrores da guerra,
fugir à solidão eterna,
fugir nos campos,
gritar no vazio
do silêncio da lua,
se unir aos selvagens,
uivar como na hora incerta
do devaneio,
fugindo do tema principal,
fugindo num verão
sem paradeiro,
estrada de terra batida
com vento na cara,
fugir para o fim
do mesmo dilema,
amar a fuga
como se ama
o poema.

14/03/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)

FLOR IMACULADA

Nau imperturbável, que sopra o vento
no poente, lua que é porta reluzente.
Vejo o teu ser na sombra
do corpo morto,
jazigo de minha entranha,
fogo do meu espanto.

A nuvem, serpente de brasão,
desce ao caos do holocausto,
um novilho e seu sangue,
na dor da prata da lua
como antecâmara da alvorada.

Vai a flor a cada instante,
lembro-me do fulgor
com que ia tal estrada,
flor de melancolia
morre desusada,
nua flor da fria noite,
qual flor imaculada.

14/03/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)

IMPERMANÊNCIA

Nem mais como antes,
jovem folguedo,
serei como és.
Nem mais agora,
subirei ao convés,
e nem ficarei a
teus pés.

Nem mais um instante,
nem todo o sol,
nem toda a terra,
nem as fases da lua,
nem a vida desperdiçada,
nem a morte almejada,
nem o silêncio do pensamento,
nem a flor da beleza,
nem os cabelos negros,
nem o tempo voltar,
nem a dor partir,
nem a calma da praia,
nem o amor de um canalha,
nem as frases soltas,
nem o claro enigma,
nem as almas,
nem os insetos,
nada!
nada!
nada!
nada permanece.

12/03/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)

HORA INESPERADA

Já vai alta a hora!
Em tua pacata solidão ...
Poeta! Pensa! Voa!

Já quem sabe de si
o mais que deseja,
já qual nave no tempo,
já sóbrio, a contento.

E és nu, tal o corpo pleno,
e a sede mais cara.
És nu, como a alma em febre,
e a loucura mais macabra.

Estou em ti o tempo todo,
qual flor rotunda
no revés do fogo,
qual serpente onipresente
em tua fome de ouro.

Já vai alta a hora,
descansemos.

Já está na hora
de partir,
qual começo
de nova era.

12/03/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)

O CUIDADO DE TUDO

O cuidado, apreço fértil da compaixão,
medita e vai adiante,
vai adiante, no entanto.
Vai adiante, apesar de tudo.

A prece firme que na poesia habita,
é como caudaloso rio que passa
por todos os lados da questão
e não a responde, a reforça.

O cuidado das palavras
habita o inaudito,
como vaga extraordinária
se planeja diante do
ordinário.

E se faz a festa, como celebração
das virtudes, como lamentação
das desditas.

Afunda e medita o bravo barco
no mar bravio,
em plenilúnio se perde
e afoga a dor,
em aurora cai como arrebol
na flor do tempo.

12/03/2013 Êxtase
(Gustavo Bastos)