PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

quinta-feira, 5 de julho de 2012

ROSAS DEMUDADAS

Sentimento esparso no
canto do rouxinol,
arrumei os afazeres
desta época lamentável,
os acordes soam
emocionais em demasia,
queria um ritmo bruto,
não uma flor.

Ossos quebram na voz do trovão,
com rosas demudadas
em visões extáticas,
alma em cantata viciada,
algo acontece na letra do céu,
um livro revira a noite astuta,
eu compro ingressos
para ver poesia falada
enquanto tomo
a bebida de brisa
no tomo final
da obra.

Quantos róseos violáceos
anuncia?
Quantos rumores sobre
a mídia no chão?
Energia vital é um bem
que não se dissipa à toa,
a vida regenera sem
ser só de estrelas,
mas de terra farta.

03/07/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)

BOITATÁ

Eu fui jovem
comedor de ópio,
natureza espantada,
eu nasci morrido
vivendo,
eu lutei a vida inteira
pela voz do encanto,
corri o mundo inteiro
no sustento dos meus
fatos irrisórios,
notas soltas
em noites revoltas
onde andava
pelo caos
abduzido
por um boitatá
na floresta
viral
dos prazeres.

03/07/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)

DIÁRIOS DISTRAÍDOS

Festança sonora
na lua bonita,
vem de um torpor
de carros,
ferraris, porsches,
fuscas, opalas,
morte.

Eu compro com dez reais
uma dose de veneno,
uma liturgia demoníaca,
um farol apagado,
uma boa promessa
desfeita.

O sangue tipo AB+
vicia em heroínas,
virulentas febres,
pratos de carne,
fatias de pão,
água benta,
metais acrílicos,
laxativos
de cores,
filmes B
para distrair
e um diário
sobre segredos
existenciais.

03/07/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)

ERVA MALDITA

Sinto pena das artimanhas
de uma propaganda
que já nasceu
fracassada,
doses de ilusões
numa montanha
imaginária.

O fracasso da poesia
desperta o riso,
um riso falso
de um falso
estupor,
balançando nas nádegas
de um sistema
que fede
a notícias.

Dá um cheiro na cocaína,
faz o dinheiro entornar
no coração que para
no esquecimento,
ilusão, ilusionistas,
falsos moralistas,
a natureza é amoral,
ela ignora o certo e o errado,
e a erva nasce
do entusiasmo
de Deus.

03/07/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)

quarta-feira, 4 de julho de 2012

A VOZ DA TERRA

Com a voz da terra,
levas de matilhas
rosnam na época
vindoura
doa altares
de sangue índio.

O vermelho pélago
do fundo obscuro,
a terra malvada
que canta
encantada
de fúria
e arte de giz,
risca na tumba
da filosofia
a vida e a obra
escarlate
de um que pensou
em obras
e litanias.

A chuva na paz celeste,
memorial da chuva
no campo,
queria o mártir
na senda violenta
dos poemas,
um grito para um poema,
e uma poesia no silêncio.

Revezavam na vigília
os atabalhoados
da investigação.
Corroía de ácido fúlgido
o vinho potente
das armas,
fuzis de delírio
pelo canto alto
da gaivota
ao coração
que sofria.

Restou a indômita vinha
pelos cantos da ribalta,
noite de espetáculo
no costume de ser sempre
o que se é,
e sendo encarnado
em pensamento,
pensa o ritmo
da pena
como se fosse uma faca
cortando e fatiando
o poema
como um sonho
sem nada a dever
a todos que dele
se nutrem,
a faca da poesia
é uma pena que não tem
 pena de ninguém.

A voz da terra, arado
filosófico,
ventre movediço,
partitura sem limite,
renunciou aos sombrios
atavios do suspiro
parvo de sonhadores
sem projetos,
de vigas sobre
terreno maculado.

Mas a vida foi maior,
com a veia explodida
de tanto verso
sem aviso
na paisagem
insólita
dos degraus
aos céus
e das quedas
aos infernos.

A poesia foi maior,
a vida foi a poesia
e a poesia foi a vida
sem saber separá-las
na faca que escrevia.

27/06/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)

SONHADOR

O mar estava na miragem
da dália afogada,
o socorro da nau semeava
olhos de tâmara
na onda vermelha
dos rubis apaixonados.

A praia murmurava sonho
de areia branca,
pálidas baleias
ecoavam
no cio
o ventre marítimo
dos ares fulminantes.

As sereias do mar envoltas
em suas escamas,
trazem flores náuticas
do sonho violáceo.
Urtigas no outro convés
sonham os corsários.

Vejo sempre-vivas na escansão
e no ritmo dos aquíferos,
refletem no espelho d`água
o frêmito do acaso.

Rouxinol do vento
sopra no astrolábio
das estrelas sondadas,
eu via o brilho delas.

Barcos na nuvem recostados,
poesia do vitral
nos nenúfares
dos sonhos vítreos,
vejam com calma plácida
a canção feérica
de suas vozes
ritmadas.

A flor d`alma anuncia
luz na copa densa
de uma madeira
vigorosa,
lenho de mil anos
na ronda de seus
exploradores,
grito da queda
ao vício da floresta.

O mar estava denso,
partia-se o coração
da alma ao lado
da finitude,
os corpos se intercalavam
na sinfonia
dos horizontes,
uma paz angélica
se fazia
no silêncio
da salvação.

O encanto das formas
em música de câmara
ressoava no labirinto
das almas,
a canção dos violeiros
refulgia nas dores
da serenata,
uma sombra fugia
de pavor
dos amores cantados
pelo acorde choroso
dos cantores,
e a dor de poesia
se libertava
no caos da orgia
de sons
nos tambores.

A poesia efusiva
da vitória sobre
a morte
felicitava
os enamorados
na senda criada
pelos artistas
na noite que mirava
às gaivotas
do mar
escuro.

Uma selva romântica
para a emoção
dos menestréis,
roncava na sala
a tuba maestra
tão rejeitada,
os detratores se calaram
sob a pena capital
da fúria divina,
os cantores se apaixonavam
pela nova poesia
que saltava da veia
inspirada.

A última nota da farsa
media o silêncio
vertiginoso
dos olhares
tortos,
poeta era selva
de calor
nas pontadas
do amor
selvagem,
não era ilusão
e nem miragem,
era um soco na cara
dos parvos
que tramavam
o desatino,
era a arte bruta
dando um salto mortal
nos rumores vigiados
pela malta divorciada
da negação.

Os senões foram amordaçados
em canções extasiantes,
as fontes inegáveis
do corpo
jorravam
na virtude
a liberdade
sem fim
dos olhos
da eternidade,
uma flor de saudade
edulcorava
a canção
da fada
que delirava
encantada
com tanta emoção.

O desejo amortecia
a queda da morte
pelo infinito que rugia
feito fera
na dor revirada
do poeta
e sua pena.

27/06/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)

ECONOMIA MORTAL

15.000 fuzis.
150.000 cartuchos.
A senda está posta,
lâminas de aço,
bens de capital,
o maquinário está
posto.

Veste-se o bravo soldado,
os dólares correm
nos precipícios
do Federal Reserve.
Uma louca joga cartas de Tarô
à beira do Rio Ganges.
Shiva ritualiza
um novo nirvana
de setores escorchantes
da velha economia,
o mar salgado
das ilhas polinésias
grita ao IPCC
suas mortes anunciadas.

Naves sem tripulantes
eliminam terroristas
no Paquistão,
Osama está morto?
Tudo que sei é que nada sei.
As fortalezas dos marajás
estão intactas
em Bollywood.

27/06/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)

DREAMS OF THE CASTLE

Nunca mais o sonho noiteiro,
vejo que vim de terra arrasada,
o coração no asfalto retinto,
vigiado por mil poções
e magias de terror.

As dálias azuis
eram o romance
sem rumo,
pronto ao abate
do cais miserável,
olho pressentindo
a nuvem,
carne de miragem
nos fotogramas
da máquina
de tortura,
uma vã passagem
avançando o sinal
overrated
by the fools.

Time is going to my dinner,
I`m terribly fucked
and I had lost
my wisdom
in a crap
of money,
my dreams
cannot
work.

Tinha-se uma arte de fachada,
estudos sobre olhares vazados
vazios tortos
numa névoa
alucinada
sem história
ou conhecimento,
desconheci o dia final
da desrazão,
não saberei enfim
do que se passou
comigo
atenazado
à dor,
não quero saber,
I felt my guts
burning
in my brain
during
my crazyness,
don`t save me
from these
castles,
eu construí
um imenso
mural
de miríades
fotogênicas
da sonhada
paz mundial.

27/06/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)

DOSE TARDIA

Vamos tomar um drink,
meu amor.
Já está tarde.
Já está tarde.
Logo cedo teremos
que nos separar.
Vamos tomar um drink
no silêncio da praia
numa madrugada calma
contemplando
o silêncio de nossos lábios
e a cumplicidade
de nossos olhares,
logo depois
estaremos separados,
ilhas mortas,
enfado de vícios,
vozes loucas
na histeria
da paixão,
seremos irmãos ignotos,
fontes de novas ilusões
nos trarão
novas esperanças,
e aquele dia na praia
desaparecerá
como uma ficção
que passou
na neblina,
pois era tarde,
e cedo tínhamos
que ir.

27/06/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)

PORNOPOEMA

Eu esperei, na noite calma,
a tua voz.

Entrei, desesperado, pela porta
fora de hora,
atrasado.

Conversei com o porteiro,
vi que o dia azul
tinha passado,
uma chuva de cartas de amor
sem destinatários
invadiu aquele
ambiente
de azul-miasma.

Notei, na minha pasta,
anotações de que não
me lembrava,
poemas de jovem sem dor,
poemas sem fim
na cauda de um
cometa.

O verso ainda pálido,
inconsistente,
cheio de fissuras
e nuances
distorcidas,
o poema era esguio
e afobado.

Olhei os desenhos
que pareciam grafites
num lusco-fusco.
Vi, de relance,
ao fechar a pasta
com os cadernos
velhos,
mulheres de biquíni,
e eu, novo ainda,
porém velho de alma,
numa esperança vadia
vazia que valeria
três noites
ou uma visita
ao hospício.

Eu enlouqueci de tesão,
o poema-saia não saía
de minha cabeça.
Me enfurnei no caos
do meu quarto,
e como um jovem imberbe
perdi três horas
numa vigília
de pornografia alemã,
com meus relógios
invertidos
na sala de espera
da solidão,
e a vida sacrificada
em nome de nada.

27/06/2012 Libertação
(Gustavo Bastos)