PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

domingo, 26 de junho de 2016

FRIEDRICH HÖLDERLIN E SEUS POEMAS DA ERA PRÉ-ROMÂNTICA – PARTE II

Do período que vai de 1799 a 1802, na obra de Hölderlin, temos poemas como “A Terra Natal”, que traz em seu interior as dores de amor, a distância e a vontade de retorno, tal como nos versos que abrem o poema “De ilhas distantes,/ logo depois da colheita,/Volta alegre o marujo ao seu plácido rio;/Assim voltaria eu à pátria se tivesse/Colhido tantos bens quantos males colhi.” Esta primeira estrofe inaugura o conflito novo do poeta, comparado ao marujo que volta ao rio, assim quer Hölderlin voltar à sua pátria, e logo em seguida há sim a cisão ou junção, como queiram, do desejo vivo e morto de amor e dor, este paradoxo que não carrega só poetas, mas todo ser humano que entra em tais embates, com aviso ou desaviso, não importa. Segue o poema, com profunda nostalgia: “bosques/De minha juventude, prometeis, quando/Eu voltar, devolver-me a paz de antigamente?”, aqui há uma paz perdida, as ilhas distantes são o paraíso perdido de Hölderlin, sua juventude, o poeta morre um pouco, a saudade aqui não aparece como virtude de reencontro, mas como pura nostalgia de algo inatingível, pois a nostalgia é uma idealização, uma espécie de idílio da juventude que só é lembrada como algo bom, esquecendo-se de seu aspecto terrível e penoso, que todos sabemos.
A idealização de Hölderlin cabe aqui como uma ilha que só existe como paraíso perdido no seu poema e nas suas ideias. E o poema finaliza com: “Os que outorgam o fogo celeste,/Os deuses, nos dão também a dor sagrada.”. Aqui, o fogo, dádiva dos deuses, também será a fonte de dor da humanidade, como o pecado original de Prometeu, e não do homem adâmico, e neste contexto mítico, mais uma idealização nostálgica, consumindo-se nas “penas do amor”, como uma instância da “dor sagrada”, então a dor ganha caráter sagrado, aspecto criador, assim como o fogo praticamente criou o Homem como o conhecemos, e então a dádiva dos deuses, tanto quanto a alegria báquica, prepara o caminho posterior de toda a poesia de Hölderlin.
É o que já está patente no poema “O adeus”, uma das pedras angulares da lírica amorosa de Hölderlin, que é uma daquelas “pequenas peças” que conseguem expressar o destino completo do poeta, e isto condensado em quatro ou oito versos, em que aparece toda a história de um amor excepcional, e tão cedo repleto de melancolia, mas por seu caráter excepcional, um tipo de amor essencial, ou seja, não episódico, ímpeto no qual o poeta vincula seu ser à totalidade da existência, aos grandes e simples fenômenos da natureza. Neste poema é tematizado o momento em que a “lei de bronze” do casamento burguês, arte incompleta, vence a sacralidade do amor do poeta e sua Diotima (“nós/em cujas almas um deus impera”) desencadeando o sofrimento expiatório dos amantes, e que funciona como verdadeiro e doloroso testemunho de um tempo mítico e idílico em que não havia separação entre os homens e os deuses. Hölderlin coloca Diotima como mais um apêndice seu com o mundo do mito, de algo que existe só nas suas ideias, antecipando o karma comum do romantismo que surgiria logo a seguir no cenário literário e filosófico alemão.
”Meio de vida”, por sua vez, que é um dos textos mais traduzidos de Hölderlin. Antecipa todo um tempo vindouro, talvez por ser um poema moderno avant la lettre, um lampejo em toda a superfície romântica na qual Hölderlin passearia com sua Diotima mitificada. “Meio de vida” é mais uma curva nova e imprevista de sua trajetória, liberdade intransitada que só se repetiria a seguir já nos seus poemas da loucura. E, em “Meio de vida”, Hölderlin leva o leitor até a “ventura de adivinhar pouco a pouco”, como postularia Mallarmé tantos anos depois. Com prodigiosa economia de meios, desenvolvem-se as virtualidades do título do poema através de uma série de referências eminentemente objetivas a frutas, flores, lago, muros, bandeiras, que se revestem de uma aura alusiva tanto mais eficaz quanto menos imediata. Se trata, no poema, da referência simples e enxuta de toda a modernidade que nos tempos de Hölderlin nem sequer existia, uma vez que ainda estávamos na iminência do romantismo alemão, etapa histórica anterior ao fenômeno moderno, sendo este poema de Hölderlin um ato espontâneo, portanto, e não um plano novo para a sua poesia.

A TERRA NATAL

De ilhas distantes, logo depois da colheita,
Volta alegre o marujo ao seu plácido rio;
Assim voltaria eu à pátria se tivesse
Colhido tantos bens quantos males colhi.

Margens queridas que outrora me criastes,
Acalmareis as penas de amor? E vós, bosques
De minha juventude, prometeis, quando
Eu voltar, devolver-me a paz de antigamente?

Junto aos frescos riachos, onde vi as ondas
Brincando, e ao rio, onde vi barcos deslizando,
Logo estarei; e vós, montanhas tão fiéis,
Que outrora me amparastes, limites seguros,

Venerandos da pátria, da casa materna,
Dos abraços carinhosos de irmãos e irmãs,
Logo vos saudarei, e vós, sempre leais,
Envolvei-me para que, como enfaixado,

Meu coração se cure; mas eu sei, eu sei
Que penas de amor não se curam tão cedo.
Acalanto algum consolador, cantado
Por mortais, irá tirá-las do meu peito.

Os que outorgam o fogo celeste,
Os deuses, nos dão também a dor sagrada.
Por isso, ela dura. Sou um filho da terra
Feito, ao que parece, para amar, sofrer.

O ADEUS
(Terceira versão)

Se achávamos prudente e boa a separação,
Por que ela nos assustou como um assassinato?
Quão pouco de nós sabemos, nós
Em cujas almas um deus impera.

Traí-lo? A ele que foi quem primeiro nos deu
Vida e sentido? A ele que, gênio tutelar,
Sempre encorajou o nosso amor?
Eu jamais poderia traí-lo.

Crê, todavia, tratar-se de outra falta o mundo
Que se atém a outra lei de bronze, outro dever.
E, dia a dia, insidiosamente,
O hábito corrói a nossa alma.

Isso eu já sabia; desde que, informe e enraizado,
O medo veio separar os homens dos deuses,
Deve, expiando-o com seu próprio sangue,
Morrer o coração dos amantes.

MEIO DE VIDA

Com pêras douradas
E mil rosas silvestres
Pende a terra para o lago,
E vós, meigos cisnes
Bêbados de beijos,
Meteis a cabeça
Nas águas sóbrio-sacras.

Ai de mim: onde achar,
Se inverno, as flores, onde
O brilho do sol
E as sombras da terra?
Erguem-se os muros
Mudos, frios: tatalam
As bandeiras ao vento.

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.

Link da Século Diário:  http://seculodiario.com.br/29337/17/friedrich-holderlin-e-seus-poemas-da-era-pre-romantica-parte-ii




OS BANDOLEIROS DE FRIEDRICH SCHILLER, TEMPESTADE E ÍMPETO NO TEATRO

“A força da peça foi imensa, seu impacto intenso, iluminando no palco alemão o terror de uma nação em frangalhos”
INSPIRAÇÃO PARA A PEÇA
Friedrich Schiller nasceu no ano de 1759 na cidade de Marbach, sul da Alemanha, e faleceu em 1805, em Weimar. Começou a escrever Os Bandoleiros, sua peça de estreia, provavelmente no ano de 1777, quando ainda não havia completado 18 anos, e publicou-a em meados de 1781, em edição própria e anônima.
Schiller inspirou-se, para escrever “Os Bandoleiros”, na leitura de um conto de Christian Daniel Schubart, intitulado “Por uma história do coração humano” – uma variação da parábola do filho pródigo. A peça “Os Bandoleiros”, por sua vez, é marcada pela influência do Sturm und Drang (movimento romântico alemão, também conhecido por titanismo) e carrega, além de ser uma das fundações do movimento citado, junto com o Werther de Goethe, uma gama variada de referências que vão das tragédias de Shakespeare à obra do jovem Goethe, aos poemas de Klopstock e a vários escritores clássicos. E podemos flagrar também, no texto da peça, os conhecimentos de Schiller a respeito do pietismo, da mitologia grega, da Bíblia e da medicina, e com isso tudo junto, vemos Schiller produzir uma obra selvagem, drástica, cheia de dinamismo, vigor, e que corrobora as palavras inspiradas tempestade e ímpeto, bandeira do movimento novo da Alemanha literária.
IMPACTO DA PEÇA
A força da peça foi imensa, seu impacto intenso, iluminando no palco alemão o terror de uma nação em frangalhos, fragmentada, e a imagem de Schiller ficou para sempre ligada à imagem de sua primeira obra “Os Bandoleiros”. E, mesmo que sua obra tenha continuado e se tornada de um valor gigante, digna de seu gênio, professando então, o classicismo de Weimar, junto com outro baluarte de nome Goethe, e isto já na fase tardia de sua obra, Schiller seria sempre lembrado pelo fulgor juvenil e titânico de “Os Bandoleiros”, pela fúria selvagem, pelo ímpeto e pelo desespero de sua peça de estreia, Schiller, como se diz, começa sua história literária e teatral já chutando a porta, no melhor sentido, e sua arma é o choque e a expressão hiperbólica, digna do Sturm und Drang.
No começo de 1781, por sua vez, a Alemanha perdia Gotthold Ephraim Lessing, o grande autor e, sobretudo, o grande dramaturgo da literatura alemã da época. Foram muitos os que profetizaram a morte de seu Shakespeare. Poucos meses depois, no entanto, a primeira resenha jornalística – publicada no jornal de Erfurt – sobre a peça Os Bandoleiros já sentenciava: “Se um dia pensamos ter um Shakespeare alemão, então é este”. Ao mesmo tempo em que a Alemanha lamentava a perda de Lessing, o grande educador da pátria, ganhava um autor que marcaria profundamente os rumos de sua dramaturgia. Lessing encerrava um ciclo, Schiller e Goethe começavam outro, todas as restrições métricas de um Racine, por exemplo, implodem na explosão romântica, na mesma cepa numerosa de personagens que havia no teatro elisabetano, por exemplo, e na amplitude geográfica de construção de cenas e cenários.
A peça finca raízes profundas na história da Alemanha da época e é açulada pela experiência pessoal do autor, pois embora seja histórica, era uma peça também subjetiva. Com o lançamento de Os Bandoleiros, por sua vez, se diz que as perucas empoadas de uma época afetada e nobre caíam moribundas e mofadas, os castelos de cartas de um século perdido foram ao chão, entrava-se na beira do novo século XIX já com um novo despojamento que arrancaria as paixões mais brutas de seu sossego. A Alemanha, esfacelada em mais de trezentos principados – atrasada política e economicamente -, era obrigada a fixar os olhos no horror de sua própria história.
CARACTERÍSTICAS DA PEÇA
A peça é um ataque surpresa, se podemos citar aqui a catarse aristotélica das tragédias gregas, se tratou disto exatamente na representação cênica de “Os Bandoleiros”, era um tipo novo de experiência que a Alemanha jamais havia visto e vivido. Apresentava força no golpe, um ímpeto dramático inigualável, é uma peça de texto, extensa em matéria de letras, mas que na cena é choque certo. O que era jovem, viril e fogoso triunfava de modo definitivo com a obra de Schiller.
A peça era desmedida e forte, avassaladora como só havia sido a prosa do Werther de Goethe – obra irmã no titanismo -, mas, em comparação ao infortúnio de Werther, romântico suicida, “Os Bandoleiros” é um libelo político, mais agressiva na crítica porque arrancava os heróis do isolamento e levantava os panos da hipocrisia social em que a Alemanha vivia. Todo o problema do estilhaçamento territorial da nação alemã aparecia como fosso político e social, e uma disputa de irmãos, a luta entre revolução e conservadorismo ganha empenho romântico, ímpeto tempestuoso, ações e falas hiperbólicas, cada movimento da peça é um soco.
Tudo na peça é ímpeto, tudo é arranque. Os movimentos não são suaves. Quando alguém se levanta, dá um salto. Quando alguém se afasta, o faz correndo. A sucessão de golpes é interminável e intensa. O tema da liberdade, por sua vez, é motivo condutor de toda a obra de Schiller, já aparece forte e soberano em sua primeira peça. E a expressão da liberdade é Karl von Moor, já com seu lema fundamental de uma mentalidade drástica: Liberdade ou morte. Assim como a marca do tacão absolutista, por sua vez, aparece registrada inteira em seu irmão, Franz von Moor, o hipócrita, ardiloso e invejoso que tenta até mesmo seduzir Amália, apaixonada por Karl. Maximilian, o pai dos dois, é a bondade – meio cega, já fraca e decadente – de uma época que agoniza.

A PEÇA E SEUS PERSONAGENS
A peça “me custou família e pátria”, disse Schiller, que teve então que abandonar sua cidade e os seus por causa dela. A experiência dolorosa do autor incompreendido só fez contribuir no primor da obra, que, se leva algumas imperfeições inescapáveis típicas da precocidade, já traz a marca do gênio, o que se consumaria em grandes feitos durante sua vida teatral. No prefácio à primeira edição de Os Bandoleiros, por exemplo, Schiller diz que o texto era mais uma história dramática do que uma peça teatral. A peça foi montada com êxito na Alemanha um sem-número de vezes, mas nela se percebe com nitidez que na Europa o teatro é feito também para ser lido. Ou seja, a riqueza do texto, de caráter hiperbólico, é ainda um feixe matizado extremamente dramático, é um teatro de autor e não de diretor, mas possui todas as virtudes da cena por ter carga dramática de sobra para tal.
E, embora haja falhas na peça, nenhuma delas é grave. Lembrando que Schiller começou a escrever a peça quando tinha apenas 17 anos. Em relação aos personagens, por exemplo: Amália é, segundo os críticos e o próprio Schiller, a personagem mais incompleta da peça. O próprio autor confessa que em seu claustro forçado que viveu na Escola Militar, sob o jugo do Duque de Württemberg, não lhe havia sido dado conhecer mais de perto a beleza do sexo até a época em que escrevera a peça. Assim, Schiller transforma Amália numa sonhadora etérea, de pouca vida, talhada nas frases do poeta alemão Klopstock, que aliás se ajustam a seu caráter vago e quase apenas espiritual. Schiller usa e abusa de Amália para evocar Klopstock na sua fala durante todo o texto da peça.
As figuras paralelas, por sua vez, são bem compostas e têm um final adequado à sua conduta. Schweizer é o sujeito firme e fiel e isto tem efeitos dramáticos em que o drástico entra como grande elemento de cena do romantismo alemão. Roller é o impetuoso confiável e também pagará o preço. Schufterle um pássaro destinado ao patíbulo, e Spiegelberg, a grande figura da peça, quando se diz, sobretudo, do texto em si, pois seu gesto e sua expressão caudalosa enriquecem a peça deveras, e que se trata de personagem fanfarrão, brejeiro, covarde e traiçoeiro, um mandrião em meio ao bando, aliás, o mais esperto e traquina. Esses personagens são desenhados com precisão – embora não sejam descritos -, apenas por meio de suas falas e ações. Não há aqui a famosa descrição psicológica, uma vez que estas figuras já aparecem em contextos definidos de ação direta, assim como a própria peça, desde o princípio, já está inserida na ação sem momento introdutório.
A entrada de Kosinski no fim do terceiro ato, que vem a encaminhar o desenlace da tragédia, é até bem encaminhada. Mas sua situação, e a referência forçada a uma outra Amália, são artificiosas por demais e pouquíssimo sutis, parece um deus ex machina meio atrapalhado do jovem autor. E quando Karl, ainda disfarçado, volta a falar com Amália na segunda cena do quarto ato e diz que o nome de sua amada também era Amália, a peça chega a adquirir virtudes de jogo, algo de teatral para além do texto parece eclodir. Há também expectativas frustradas, como aquela em que Franz ameaça Amália com o claustro e a moça aceita impávida, mas, ao invés de se tornar freira, logo aparece vivendo normalmente no castelo do então senhor Franz von Moor. Para complicar, há a referência poética de Karl ao véu de freira que a moça teria usado (ela “me sacrificou sua coroa de santa ...”). Tudo porque numa primeira versão da peça – a respeito da qual sobraram apenas depoimentos e referências – Schiller planejava de fato levar Amália ao claustro.
Uma das falhas mais cabais da peça, no entanto, é a condução final do personagem Maximilian, pai de Karl e Franz. Personagem ambíguo em matéria de densidade, pois, embora seja bem construído em sua bondade, fraqueza e cegueira decadente – que ademais testemunham a agonia de uma época -, o personagem é praticamente esquecido ao final. O velho Moor para de falar a certa altura e se despede da peça sem adeus. Um furo que Schiller em seu ímpeto não se desculpou, o velho Moor tem um caráter definido, embora fraco em demasia, e simplesmente evapora no fim da peça.
ALCANCE DO TEXTO
No mais, os monólogos da peça são maravilhosos, poéticos, filosóficos – e surpreendentes quando lembramos que seu autor nem tinha vinte anos. Tanto Franz e seu arrivismo criminoso, forjado num materialismo e num racionalismo nauseabundos, quanto a desilusão libertária e incontida de Karl proporcionam frases lapidares. O alcance filosófico e literário do teatro do então bem jovem Schiller já revela alguém que tinha tanto o conhecimento necessário como o poder de intuição suficiente para o empreendimento que deu em “Os Bandoleiros”. Karl e Franz são os opostos mais bem resolvidos de todo o texto.
Karl e Franz, aliás, são dois personagens inteiriços. A peça em si é bem construída, se vista de modo global. As cenas se sucedem consequentemente e se encaixam umas às outras à perfeição. O ápice é encaminhado depois de vários golpes sucessivos. Assim como nos templos de Ésquilo, a tragédia permanece ligada ao destino na peça do autor alemão. O mundo de Schiller, no entanto, é judaico-cristão e é a justiça divina que acaba por vencer ao final, restaurando a ordem – um tanto vaga – depois do sacrifício. O eco da tragédia grega também aparece em Schiller aqui como catarse, o que pode também ser entendido com a palavra terror. Tempestade e ímpeto, por sua vez, tem tudo a ver com a ideia antiga de Aristóteles de catarse como objetivo do teatro trágico.
TEXTO DE SCHILLER SOBRE OS BANDOLEIROS
O AUTOR AO PÚBLICO
(por ocasião da primeira encenação)
Obs: texto do próprio Friedrich Schiller sobre a peça, na íntegra.
“Os bandoleiros ... a pintura de uma alma grandiosa e perdida .. armada com todos os dons para a excelência e com todos os dons ... perdida. O fogo desenfreado e as más camaradagens deterioraram seu coração, levando-o de vício a vício até que, por fim, ele se encontrava à cabeça de um bando de incendiários assassinos. Atrocidades se juntavam a atrocidades, despencava de abismo em abismo, vivendo todas as profundezas do desespero ... Mas elevado e venerável, foi grandioso e majestático na desventura e através da desventura melhorado, trazido de volta à excelência ... Um homem desses haverá de ser chorado e odiado em Moor, o bandoleiro, amado e detestado.
Franz Moor, um tipo sorrateiro, pérfido e hipócrita ... desmascarado e dinamitado em sua próprias minas.
O velho Moor, um pai demasiado fraco e concessivo, por intermédio de seus mimos fundou a perdição e a desgraça de seus filhos.

Em Amália as dores do amor exaltado e as torturas da paixão dominadora.
Não será sem horror que as pessoas haverão de lançar olhos na economia interna do vício e reconhecer que nem mesmo as tentativas de dourar a pílula da sorte, são capazes de matar o verme interno da consciência ... e ver como o terror, a angústia, o arrependimento e o desespero trabalham pesado às suas costas, picando-lhe nos calcanhares ... Que o espectador chore hoje ante o nosso palco ... que trema ... e que aprenda a dominar sua paixões sob o jugo da religião e do entendimento; que o jovem acompanhe com horror o fim de uma vida dissoluta e desenfreada; que também o homem não parta sem a lição da peça, ou seja, de que até o malvado faz uso da mão invisível da cautela como instrumento de suas intenções e juízos e que até o mais confuso nó do destino pode ser, por incrível que pareça e para espanto de todos, desatado.”

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.

Link da Século Diário:  http://seculodiario.com.br/29340/17/osbandoleiros-de-friedrich-schiller-tempestade-e-impeto-no-teatro