PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

SINAIS DA TERRA PERDIDA I

SINAIS DA TERRA PERDIDA


I – O DELÍRIO DAS ROSAS

Há de convir, caros amigos, que a noite urge de ideias mágicas.

Parado ao poste um soldado toca o trombone,

E seu ímpar ar de guerreiro assume as formas da noite.

Pega um cigarro, e de um breve toque, diz à amada

Os seus anseios de fortuna.



Medra entre as cavalarias o toque de recolher.

O bom soldado há de ser um cavalheiro,

Cortejando uma boa dama para a sua felicidade,

Num rio esbelto que molha

Os chifres de um tão belo demônio.



Com o sinistro rei dos pórticos, à espera da nuvem preta,

Ele tem de carregar os cânceres mesquinhos,

Na morbidez insana do amor mal falado

De seus delírios,

Quando roubava uma flor do jardim que havia no céu.



De má fama vivem os anzóis,

Com as fardas sujas de sangue coagulado,

Que beijam a carcaça do soldado

À meia-noite.



Tudo é belo, e o mais belo é o cantor da noite,

Temendo que a lua escape ao sino das trovoadas.

Há de convir, caros amigos, que a noite urge de ideias mágicas.

Como num sonho alto e súbito,

Pus-me a escrivinhar sob a lareira,

E os inúmeros e infindáveis calores

Tomavam a forma de um capataz.

Os trabalhos da pedregosa estrada,

Longe dos mosteiros,

E perto dos silvícolas,

À base de chicotes e mármore,

A tudo apinhado de pedregulhos,

Que os sentinelas ulcerosos

Brotavam das telas daquele cenário desolado.



Era uma noite sitiada dos mistérios milenares,

Que o Tarô, e nem mesmo as Runas,

Ou tais patifarias de bolas de cristal,

Poderiam decifrá-la.



Eis-me soldado, que de rugas converte a juventude.

Pois dava o sinal para os marginais:

“Está tudo sitiado, tomamos a várzea.”

Eram as mulheres, um atoleiro bem prazeroso.

Estando as casas em volta do cerco,

Pura ruína, puro sol carcomido,

De velas derretidas,

Queimando a barbárie dos anos.



Óbvio é o meu prisma,

E dei um tanto de virgens,

Mais um tanto de vagabundas,

Mais outro tanto de esposas,

E um amontoado de solteironas

Atrás de maridos cruéis.



Ó tropa! Fui soldado da quermesse.

E o delírio cai severo, o amor

É todo este mistério.

Meus senhores, minhas senhoras,

Divirtam-se!

É meia-noite, sim!

A cidade está tomada.



Os cadáveres são os meus amores.

Eu vejo a mão da guerra nas minhas visões.

Uns mais esbeltos, são soldados românticos.

A sinistra forma da beleza

É uma receita de ilusões brilhantes.



O que brilha à noite?

Não resistam aos cantos.

Oráculo desolado.

Os Tarôs, e os ciganos videntes?

Não, meus amigos, tais cartas

Não decifram a noite,

Esta noite maravilhosa!

Vos digo: A cidade está tomada,

Já dispersei os demônios que dançavam.

Vou beber cerveja.

Vou fumar cigarros.

Falar asneiras impopulares.

Teorias sem começo ou sem rabo.

Tropeçar no farol da alegria.

Ó mundana canção!

É a noite da saturnal!



Meus calores hão de suar.

Estive farto de toda magreza.

Quero encher a taça!

Meus troféus são papéis queimados.

Poemas cuspidos no bueiro dos azares.

(Eu, que sou a noite eterna).



Teria o mistério à noite se revelado?

Mas tudo se guarda.

À noite, uns impostores sem gládio morrem,

Guerreiros mártires cheios de sonhos e ambições.

Uns outros beberrões.

À beberagem, meus comparsas!



Eu? Me satisfaço no sabor oportuno.

Há de convir, caros amigos, que a noite urge de ideias mágicas.

Sai o batalhão por esta noite tumultuada,

São os rincões a ver navios.

O Bem se cria, neste asfalto deprimido.



A cidade está tomada,

Meus anjos, meus marginais,

Meus doutores!

Última miragem no castelo,

Última sensação.

Eu que nem fui um homem,

Pois que sou fantasma.



A cidade está tomada,

Digam os mordazes e os loucos.

Tudo silencia ou tudo grita?

À meia-noite tudo está tomado de prazer.

Eis-me aqui:

Soldado que não acredita em baralhos.

Pois viria então, a peste que diz:

“O louco”.

Eu esqueceria.

Mas, vem me dizer este último choque de mitologia:

“Está esperando tua amada sem se dar conta,

Está esperando tua amada na dor da busca,

Está esperando o que sempre quis ...

Tua linda amada que flutua na noite.”