PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

SONHOS MUNDANOS


Ruminando os sonhos de Paris
um dia parei num pub londrino.
Escapei das adagas chinesas,
um conto do samurai em Kioto
passou pelas minhas ancas,
no norte eu sepultei uma caveira,
no solo da Grécia eu beijei os pés
de Sócrates com a cicuta nos dentes.

Tropas norte-coreanas avançam
nas estepes da Mongólia,
Vladimir Putin delira
com uma vodka em Moscou,
esqueletos de judeus são
desenterrados em Varsóvia,
o caos da neblina em Cuzco
adora o sol e o centurião
das terras vermelhas
corre com seu desespero
de gritos de guerra.

Sou um louco, passeatas cobrem
o mundo de protesto,
Occupy Wall Street atira
no Tea Party,
sonhos como os meus nunca
se realizarão,
estarei em Jerusalém
numa caverna em que Jesus
meditou e onde fora batizado.
Meu poema será apenas um sopro.

26/12/2011 A Lírica do Caos
(Gustavo Bastos)

O SOCORRO DAS ALMAS

Socorrei-me dos amores mal vividos,
do que não se pode evitar.
Socorrei-me da falsa modéstia
e de suas falsas adulações.

Socorrei-me da mentira que destrói
a vida e faz dela um fragmento.
Socorrei-me das doenças do coração
em que o afeto se parte ao meio.

Socorrei-me do vazio existencial
do qual a filosofia se cumpre sem beleza.
Socorrei-me da hipocrisia que desmantela
a mente e se afunda nas aparências.

Socorrei-me dos dias perdidos, do tempo perdido.
Socorrei-me, meu Deus, das idiossincrasias
que o poeta tanto ecoa num silêncio
em que os versos se tornam sublimação
de todos os esquecimentos.

Socorrei-me, musas, do pendor funesto
das vastas canções e do cárcere
da alma, a tão íntima solidão
em que o coração fenece
e já não vive de felizes momentos
que se foram numa juventude
onde o que sabíamos
era que o sentido da vida
poderia nos salvar.

26/12/2011 A Lírica do Caos
(Gustavo Bastos)

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

CORAÇÃO MALDITO

http://www.megaupload.com/?d=Y2EBS72W Este é o link para o meu livro Coração Maldito para download gratuito, arquivo em pdf, em breve postarei outros, abraços.

domingo, 18 de dezembro de 2011

Meus outros blogs

Fiz um blog no wordpress, pra quem me vê por aqui, pode também me ver por lá:
http://purplehazes.wordpress.com
E tem ainda o blog coletivo do blogger:
http://comotornaropaco.blogspot.com
E pra quem curte rock e pensamentos soltos, tem meu tumblr::
http://artepoetica.tumblr.com
Enjoy fellas!

PONTA DE FACA


           
   Luz de triunfo nos alvos cimos
   E o canto nas ilhas selvagens
   Como o céu vivo da estrela
   Ao mundo quando renasce o trovão

   De certo modo enfrentei nas costas
   As enchentes dos ouros dos bronzes
   A idade da arma da bomba
   Os olhos sangrentos da triste época

   É uma luz sanguinária dos exércitos
   Ante o declínio do reino pacífico
   Uma lagoa de prazer sob os miseráveis
   Um banquete para o horror

   No coro das feiras mortas
   Alimentos podres da força bruta
   Como um ditador bravo
   Um tirano asno de total poder

   Quem é estrondo e barbárie
   Aos quatro cantos do mundo
   O que é genocídio
   Qualidade do homem estúpido de hoje

PRETENSÕES JUVENIS



   Eu me preparo para tudo
   Em um segundo,
   Mas não sei nada do que deveria saber,
   Eu não sei mesmo quem sou,
   Tal o que fui não interessa,
   Como foi a ingenuidade
   Ainda possuída
   Que virou maldade
   Exorcizada.

   Sob medida para matar,
   Para roubar, desespero da noite,
   Sublime primeiro riso,
   Eu achava nobre
   Admirar a brutalidade,
   Combate de forças,
   Velocidade,
   Toda a cidade destruída.

ENSAIO SOBRE A INQUIETUDE


   Miséria do mundo
   De noite as ruelas
   Os cadáveres
                   Eu vim desavisado
   Tanta chance tive
                   Joguei-as no vento
   Eu tenho mais agora
   E tanto mais depois.

   Que venha a nova revolução,
   Revolucionar o espírito,
   Para os homens e mulheres
   De bem,
   Eu nem conquistei o mundo,
   Nem vou mudá-lo,
   Nem tenho ousadia,
   O sabor da carnificina
   Me pegou dormindo
   E foi embora,
   Eu muito sofri e muito desesperei,
   Há dias que o tumulto interior
   Põe de volta novas alternativas
   Para mim,
   Eu saberia notá-las
   Com a percepção aguda
   Da estratégia,
   Conseguir enfim o que se quer,
   Quanto o que puder
   Fazer para ter o bem e a felicidade.

   Discordei da lei da morte,
   Pois é a vida
   O que posso dizer que é o real,
   Cotidiano real da vida,
   Eu me vi entre a vida e a morte,
   Sou uma nova alma
   Concebida ao paraíso.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

ANARQUISMO POÉTICO

Quero encontrar-me com os temores.
Quero enfiar-me numa lápide.
Quero a grandeza brandindo
seus grunhidos punks.

O rock`n`roll mentecapto
é o horror da jovem escola
                 meus dentes cravam
                              no sol de amanhã
                                         sou este grito

A pátria cruel
                desarma
                          o fel
sou astuto comedor de ópio
sonhador vagaroso do inferno

Sou absinto trevas emoções abortadas
              creio em vinhos e formol
A imortalidade da alma faz seus funerais
                  o grito do momento
                              é o herói decapitado

Quanta honra na pena do poeta
quanto sangue na onda do
                           profeta poeta
                           vidente
                           sorridente
A morte me escapa e eu vivo como um zumbi
quero rock`n`roll uma overdose e a glória
                     da anarquia!

11/12/2011 A Lírica do Caos
(Gustavo Bastos)  

FATAL POESIA

Solto enevoado grito de discórdia,
a quantas anda a poesia?
Deste farol cem mil vezes repetido
se entoa o verso e faz calar
tudo o que me cala.

Eu vi, testemunha do ódio,
a fria rouquidão
do vento embriagado
de chuva.

O corpo reluz, o tempo se vai,
a morte me acompanha,
a vida se matiza de flores,
as cores, os sabores,
todos os odores,
sensorial rotina
que urge o que é.

Em frangalhos o desmemoriado
poeta ... que nuvem balouçante
ruma à sua vinha secreta?
Que musa sonhará ser bela
em tal verso nu?

As horas passam como mistério,
o desvelo da sorte
é o enorme vão
de minha autoria
que então encontra
sua vaga fatal.

11/12/2011 A Lírica do Caos
(Gustavo Bastos)

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

SENTIMENTO

Sentimento é palavra esparsa,
que designa muitas coisas,
e que a maioria associa
com amor ou paixão.

O que sentimos de tudo que urge
neste mundo de contradições
pode ser ditoso ou fúnebre.

Cada coisa que fazemos,
as escolhas e os acontecimentos,
os dias e as noites que
se sucedem ...
não há território seguro neste mundo
para o que passa no coração.

Sentimento é palavra vaga,
designa coisas que amamos
ou tememos,
suscita miragens e delírios
perigosos, anuncia
um vazio que quer ser
preenchido ...

que seja de rosas,
que seja de violetas,
que seja de orquídeas,
num jardim de paz
em que a alma se refaz
e o poeta já não chora ...

Sentimento é palavra gasta,
mas que nunca se esgota.

09/12/2011 A Lírica do Caos
(Gustavo Bastos)

A CHAVE DO MISTÉRIO

A chave do céu no compasso
das estrelas cansa o sonho

Diuturno o véu se rasga
e o poeta se esfacela

Todos os vis delírios da bruma
doloridos temerários insurgentes
               no fóssil descavado
               o soluço na penumbra
               e o caos
                          do horror das métricas
               sem medidas

               Corro muito rápido
               parece que quase morro
               mas o intenso de mim
                               é um sopro

Naufraguei em velas de tempestades
o sorriso se espantou desperto
               eu estive perto
               da ruína do esquecimento

Lembrei que sobrou sentimento
sentido de toda lida
quando o sol acorda
no coração de quem
          sonha

09/12/2011 A Lírica do Caos
(Gustavo Bastos)

RESSOANDO ENIGMAS

Enfim a eternidade não chegou
Sou o que faço de mim
ou o que a vida faz de mim?

No girar do tempo
              caio em claustro
suspiro no húmus da terra
                 e o horizonte
            longe
circunspecto longevo
a eternizar no mármore
        a imagem diluída
de toda poesia

Como um mergulho no âmago do meu ser
       vejo espessa camada de memória
me atrevo e me acovardo
                no mesmo balanço
do enigma das nuvens

                 De súbito uma música ...
                 o que fiz e de que fui feito
                 do que fizeram
                                   nada resta

O sepulcro foi violado
              e a verdade nua se fez luz
macabro é o espetáculo dos
                       meus tentáculos
                       buscando poesia ...

09/12/2011 A Lírica do Caos
(Gustavo Bastos)      
       

domingo, 4 de dezembro de 2011

PLATEAU


                                 
   Tudo rolou sem parar, quando da chegada do grande Homem.

   O dilúvio se fez em cima dos facínoras,
   Tempestades cruéis de sangue e lodo,
   Firmou-se o fim das Eras, o fim que a Guerra não teme.

   Mas, o grande Homem, o Todo Poderoso indignou-se ao sabê-lo,
   Fez do barro um desgraçado ... o pavio estourou a bomba!

   Quem nos fez ardilosamente? Quem nos sanou da Loucura?

   Lodo e sangue! Música aos tímpanos, ludíbrio!
   Morreu ontem um imbecil sarnento, um gigolô na esbórnia.
   Desde o núncio fanfarrão, o Verbo se fez carne, uma carne podre deveras!

   Os bois eram os homens, os párocos eram os sub-homens.
   Pois o quê? Homem! Este ser estapafúrdio e desregrado,
   Por mais aguilhoado e temerário que seja! Um dia só em minha vida ...
   E o apocalipse, não ... era uma visão idiota.
   Visionário, poeta, uma raça de infortunados, uma raça amaldiçoada,
   Tal os peles-vermelhas, os negros.

   Eu sou pernóstico, assíduo no pedantismo, colaborador da balbúrdia.
   Vou aqui e ali, no profundo do desdém do mundo, iníquo.
   Que é a Música? Que é o Dilúvio? Que é a minha máscara?
   Basta de jogos! Um cego que vê! Assim mesmo, joguete.

   Não saberei a pronúncia das línguas celestes,
   Lá, eles são mudos e meditativos.
   Mas aqui é treva, a treva sanguinolenta dos prazeres do corpo,
   Eu o renego, mas em que porrete?
   Lá vai, Profeta! Morra de uma vez!
   Um livro, pois, que é a vida, mas a vida grandiosa!

BAIXEZA


                       
   No trânsito escaldante arde a esperança do limbo
   Quase como a quermesse e a caverna e o inferno
   Que borbulhavam o asfalto asfixiante
   No qual a boca sedenta se embriagava.
   O mais inconsequente sonho
   Possuía o meu tempo, eu saía pela madrugada
   Debaixo do mundo estrondo do espaço sanguinolento
   Das larvas que me roíam a alma por dentro.

   Eu sentia que um milagre seria o maior susto
   E o século que veio na caveira do novo milênio
   Que subiu ao histérico relógio do tédio
   Deixava-me fantasmagórico como o bruxo
   Com suas carnes indecentes
   No pavio do desespero.

   Eu medi cada verme em minha roupa
   E fiz um despacho na podre masmorra
   Dos estéreis torturados,
   Gozei no mistério da morte
   Que os olhos amantes
   Tomariam o melhor cálice de vinho
   Para o pássaro que voou para um lado
   Bem de lá da vida submersa.
   Eis-me na poesia como um corvo
   Um abutre um comedor de fezes.
   Seria grande artilharia atrás dos funerais
   O meu desdém.

O SINISTRO


                 
   Leve-me daqui para sempre o infinito
   Que destrói o mar de barco casco infernal,
   Para que a memória se divirta como o sol mergulhará
   Em toda entranha puxando do vácuo o tumor
   A desdenhosa queimadura dos delírios e o mal
   Silente ornato da flor crua do selvagem morto
   Acidente em meu jardim de cemitério.

   Quero ser o refém dos gritadores dos alcoólatras
   Das mocreias dos vampiros das guilhotinas
   Que serão toda a vítima, toda a metralhadora
   Quando solto o soco nas caras vagabundas,
   Sempre quem verá o verão indo por meu coração
   Ao fascínio da onda arrebatada do altar negro
   Que os demônios tateiam cegos.

   Leve-me, ó Senhor, do veneno que adormece
   No temporal das inspirações, contarei os suicidas
   Os traumas as revelações dos doentes mentais,
   Matarei os profetas,
   Seriam os horríveis sábios assassinados
   E a musa um passeio sob a noite do sinistro.

   Leve-me, ó Diabo, demolindo mundos
   Eu chorarei para beber sangue
   Como o fogo que me dará vida nova,
   Eu até o eterno o mar
   Que é o amor que fugindo da miséria
   Se saciará num banquete de ossos e devaneios.

PRINCESA DO SUBMUNDO


   À espera de quê? Se sirvo bem para nada
   E com os seios flores cortei-as,
   E como quem não é fada
   Mataria a mulher das veias
   Que é uma, e aqui eu pego
   Os olhos magos do princípio filosófico.

   Eu ante o tédio ferveria consciências
   Varado por angústias prantos e ânsias
   Que varrem o mar insólito
   Que anteveio antevéspera do holocausto.

   À espera dos sons fúnebres
   Participei do vodu, da bruma
   E da coisa finda na barca
   Do prazer híbrido clamando
   O meu espécime raro amando
   Que foi um triste
   Prazer
   Fogo elementar
   Com a pátria suada do corpo
   Rezando tentações e o pó arriado
   Da festança devorada.

   Até logo, madame telepática,
   Mostra a tua cara paralítica.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

O DESCALABRO DA DRU (DESVINCULAÇÃO DE RECEITAS DA UNIÃO)


   O CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado acaba de aprovar a DRU (Desvinculação de Receitas da União) com apenas cinco senadores (nenhum da oposição) numa sessão que durou, pasmem, cinco minutos. O parecer do senador Renan Calheiros (PMDB-AL) favorável à prorrogação da DRU até 31 de dezembro de 2015 aprovado na CCJ será votado em plenário no Senado em dois turnos, a previsão dos governistas é aprovar a DRU até o dia 22 de dezembro, último dia antes do encerramento do ano legislativo, evitando, assim, a autoconvocação depois desta data.
   Uma das prováveis medidas dos governistas será garantir que a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) da DRU já aprovada na Câmara seja apensada à do Senado, com isso, a oposição poderá recorrer ao STF (Supremo Tribunal Federal) numa tentativa de obstruir a pauta do governo.
   Ficou de se fazer um acordo por parte da oposição de não atrapalhar a aprovação da DRU com a condição de se votar a Emenda 29 que direciona 10% do PIB à saúde, mas o governo negou tal acordo votando a DRU no Senado antes disso. Pode ocorrer de se votar a Emenda 29, que corre em paralelo e em regime de urgência, mas o governo é contra a Emenda 29 e pode haver então, sim, uma obstrução por parte da oposição no Plenário na votação da DRU, vejamos.
   Para ficar claro, a DRU permite ao governo gastar livremente 20% das receitas do orçamento anual da União, o que em 2012 representará R$62,4 bilhões. Um dos argumentos do governo é que a DRU contribuirá para viabilizar de modo mais equilibrado o superávit primário de R$71,4 bilhões, que foi fixado como meta para o próximo exercício financeiro. O Planalto argumenta que o orçamento da União é “engessado”, a maior parte da receita tem destinação obrigatória, e, por isso, a prorrogação da DRU permite ao governo alocar recursos em áreas consideradas estratégicas, como programas sociais e o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). O governo alega, além disso, que a DRU é fundamental para o equilíbrio das contas públicas e para a administração do Orçamento. Outro argumento, contra a extinção da DRU, é o de que o fim da DRU forçaria o governo a buscar um meio-termo entre o ajuste nas despesas e a busca de novas fontes de receitas.
   Mecanismos de desvinculação de receitas federais estão em vigor desde o governo Itamar Franco. Em 1994 foi aprovado o Fundo Social de Emergência (FSE), um dos pilares da reorganização das contas públicas na implementação do Plano Real. Na época, o governo alegou que a FSE era um instrumento necessário, porém de transição, pois a necessidade da FSE, uma vez que o país acabara de sair do caos de um processo inflacionário de anos, era em função de uma reorientação dos recursos de áreas que tinham “sobras” para outras em que havia déficit. O mecanismo tinha previsão de durar 2 anos, período suficiente para arrumar o orçamento num novo período de estabilidade financeira com a debelação do ciclo inflacionário pelo Plano Real, mas em 1996, porém, o então presidente Fernando Henrique Cardoso instituiu o Fundo de Estabilização Fiscal (FEF), que funcionou como prorrogação da vigência do FSE. Em 1997, o fundo ganhou sobrevida até 1999 e, em 2000, transformou-se na DRU (Desvinculação de Receitas da União). Todos estes mecanismos, com diferentes nomes, funcionaram de maneira similar: para reduzir o “engessamento” do Orçamento do governo, foi formado um fundo com 20% das receitas de impostos e contribuições isentas de vinculações legais com determinadas despesas. A principal diferença da DRU, diferentemente de seus antecessores, é que ela não afetou a transferência de recursos para os Estados e os municípios.
   Mas veja você como são as coisas. Quando estava na oposição, o PT votou contra o FEF e o FSE, sob alegação de que esses sistemas retiravam recursos das áreas de saúde e educação, o que, de fato, ocorria. Em 2009, por sua vez, o Congresso aprovou uma emenda constitucional que definiu a eliminação paulatina, até 2011, da influência da DRU sobre os recursos destinados à Educação, porém, a DRU, atualmente, retira recursos da seguridade social, o que implica num agravamento da situação previdenciária, que já é complicada.
   Na verdade, o argumento de que a DRU serve ao fomento do superávit primário é falacioso, pois se a DRU permite um redirecionamento das despesas do governo federal, o que também não é inequívoco, ela não representa, contudo, um instrumento de reforço da política fiscal para a realização do superávit primário. A DRU, na verdade, é um instrumento discricionário do qual o Executivo poderá dispor, gastando livremente, sem que seja obrigado a destinar esse montante a setores como a saúde e a educação, por exemplo, como estabelece a Constituição. São praticamente  incontroláveis as despesas feitas por conta deste fundo, a DRU representa um grave entrave à efetivação do controle da execução orçamentária, pois sem o controle rígido da execução orçamentária não haverá expectativa de diminuição da pressão tributária cujo limite já está saturado, ou seja, o preço da DRU pode ser, não a criação de novos impostos, mas o aumento dos já existentes, um descalabro para um país que já arrecada muito mas gasta mal.
   Com a continuidade da DRU que inviabiliza o mecanismo de controle e fiscalização do orçamento pelo Congresso Nacional, com auxílio do TCU (Tribunal de Contas da União), a tendência é o aumento da carga tributária, como dito acima. Pois o governo se contradiz ao dizer em contenção de despesas ao mesmo tempo em que se manietam os mecanismos de controle da despesa pública.
   A eventual extinção da DRU, por sua vez, teria impacto limitado, pois o governo poderá remanejar verbas para atender áreas que venham a ser prejudicadas com o novo cenário. Gastos que são hoje cobertos pela DRU poderão ser financiados pelas fontes – impostos e contribuições – que originalmente alimentam a DRU. Programas como o Bolsa Família ou ações do SUS podem ser cobertos pela Cofins ou pela CSLL. Por exemplo, o fim da CPMF não prejudicou a saúde como diziam, a saúde gastou mais do que antes do fim da CPMF. Ora, o que houve? Remanejamento de fontes de recursos orçamentários. Agora trata-se do mesmo caso.
   A DRU, por fim, como visto, é um instrumento do Executivo para exercer de forma discricionária seus desejos, uma vez que o Congresso Nacional está dando carta branca para a DRU, o processo está sendo feito de maneira que não haja contestação, e agora a oposição terá sua última chance de impedir a DRU no Senado até dezembro, a luta será difícil, o regime presidencialista brasileiro cada vez mais retira as prerrogativas do Legislativo, o que vai de encontro com a filosofia dos freios e contrapesos de Montesquieu que deveria ser uma regra de ouro para qualquer regime democrático.

25/11/2011 Gustavo Bastos, filósofo e escritor.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

SATORI NA JAULA

Buscava os segredos da vida,
o universo se comporta
de maneira plural
e controversa.

Monges sabáticos honram
as túnicas das venerandas
razões de tumulto,
a multidão serve ao castelo
da razão fundamental,
a obra dos monges
é a cidadela do sol.

Vejo extáticos de toda estirpe
no campo que volteia vultos
sempre eternos de um coração
louco por semeaduras.

O gênio que se conserva
na alameda é o caminho
da natureza na flor
renascente pelos odores
que a compõem.

Eu estava preso,
a liberdade foi o meu
holocausto,
sacrifiquei dez novilhos
com fumaça tóxica
de esferas metafísicas
que sumiam no sono.

De repente eu vi
a deusa da lua
na couraça de um touro
nas estrelas.

De noite eu senti
a fumaça tóxica
tomar o meu coração
de medo.

A liberdade gritava
numa iluminação
que de súbito
se expandiu
em minha mente
como um oásis
de compaixão búdica
pelas misérias humanas.

A sabedoria da vida
é uma taça cheia de vinho.
Os segredos da existência
não são segredos,
é só olhar o sol
para entender
que a prisão
é ilusória.

O poema escrito está escrito,
e o que se vê em tudo
é que é um mistério.

18/11/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)

EXTEMPORÂNEO

Fazendo jus aos nomes
que caem na lama,
impropérios digitais
e demais mazelas
são longevas e a saúde
se cobra deste ritmo indelével.

A História se funda
no poema-relógio
que marca o tempo
dos acontecimentos.

Os fenômenos inenarráveis
germinam na insanidade
 destes dias estranhos.

A nuvem passa e chove
sobre a cabeça vazia
dos contemporâneos.

Extemporâneo afogamento
de certezas é o caldo filosofal
que demanda anarquia
de álcool e gritos.

O suplício das máquinas
seviciadas de óleo
são os motores
civilizatórios
da carne putrefata
que olhava a escuridão.

18/11/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)

AUGÚRIO INTEMPESTIVO

Não é a morte que me assusta,
minha questão mortal é o tempo.
Ando em rodas eternas,
dentes da contenda
na dor dos ares e fuzis,
canto loas ao enforcado,
dizimo uma raça na canção
do desdouro.

O relógio ataca a superfície,
a psiquê desperta no subterrâneo.
As mulheres se enganam
quanto aos poetas,
espelhos de lisonjas
são arabescos apaixonados
de um reles recitador
de sevícias da carne.

O sacrifício no alto da montanha
é o sangue do corpo imolado
de uma virgem na tempestade.
O olho da revolução
é um horizonte de relva rubra
nos sonhos de um bêbado loquaz
com suas desditas
de um delírio tropical.

Todo poema urge uma patifaria,
toda dor esconde uma falsa alegria,
somos todos palhaços
de uma hora que se foi.

18/11/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

A QUESTÃO DOS ROYALTIES DO PETRÓLEO


   O Senado aprovou no dia 19/10/2011 por 70 votos a 6, o projeto de lei sobre a distribuição dos royalties do petróleo, tal projeto foi elaborado pelo relator Vital do Rêgo (PMDB-PB) como um substitutivo à “emenda Ibsen” vetada por Lula no fim de seu governo. Este substitutivo vai em breve à votação na Câmara, onde poderá sofrer novas alterações, uma vez que tem tido muita polêmica a respeito de tais medidas pelos Estados produtores (RJ e ES) de um lado, e pelos estados e municípios não produtores, de outro.
   A emenda Ibsen previa uma distribuição igualitária entre os entes federativos, mas, uma vez vetada por Lula, fez-se nesta legislatura um substitutivo para aprovação no Senado e na Câmara. O que acontece é que pode haver uma guerra federativa se tal projeto for aprovado na Câmara dos deputados, pois, uma vez que se mudam as regras do jogo, a parte que sofre com isto se manifesta infensa a tais medidas. O projeto do relator Vital do Rêgo é menos radical que a famigerada “emenda Ibsen”, mas isto não resolve o problema, a discussão continua acirrada, e se não houver veto da presidenta Dilma em relação a este novo projeto, os estados produtores, Rio de Janeiro e Espírito Santo, vão recorrer ao STF reivindicando que não se altere as regras de distribuição dos royalties, o que se tornará uma guerra federativa que maculará o pacto federativo e pode ter consequências terríveis, politicamente, pois será aberta uma guerra campal entre os estados, e economicamente, pois os repasses do petróleo aos estados e municípios podem ficar congelados enquanto não se resolver o imbróglio.
   Na regra antiga a distribuição era a seguinte: União ficava com 40%, estados produtores com 22,5% e municípios produtores com 30%. Enquanto os 7,5% restantes eram distribuídos entre todos os municípios e estados da federação, conforme as regras dos fundos de participação, que levam em conta indicadores sociais, ficando estados e municípios mais pobres com uma proporção maior do bolo. Na emenda Ibsen a previsão da distribuição dos royalties era de 40% para a União, 30% para os Estados e 30% para os municípios. A chamada emenda Ibsen foi além da camada pré-sal e tratou também de áreas já licitadas. Por sua vez, o projeto substitutivo prevê uma redução da participação dos Estados produtores de 26,25% para 20% já em 2012, a parcela da União cai de 30% para 22% e dos municípios produtores de 26,25% para 17% em 2012 e para 4% em 2020. O substitutivo prevê também a redistribuição na participação especial, com redução para a União de 50% para 42% em 2012, com aumento de receitas numa alíquota ampliada até 46%, enquanto os estados produtores perderão 2 pontos percentuais ao ano, ou seja, de 40% até 20%, e os municípios produtores, por sua vez, de 10% para 5%.
   O Estado do Rio de Janeiro contava com os royalties que representavam 12,3% do orçamento ou R$6,8 bilhões. O governo fluminense diz que, caso a emenda Ibsen estivesse em vigor, receberia neste ano R$104 milhões, o que causaria um colapso nas contas públicas. Além disso, o Estado afirma que a alteração na distribuição dos royalties provenientes de campos petrolíferos já licitados implicaria em quebra de contrato, ou seja, tal extensão é inconstitucional.
   A Petrobras é contra as mudanças nas regras atuais, tais alterações em favor de estados e municípios não produtores, se uma vez aprovada o substitutivo, poderá acarretar num caos econômico nos estados do Rio de Janeiro e do Espírito Santo e numa guerra política sem fim dos entes federativos. A mudança do regime de concessão para o novo regime de partilha pode provocar muita turbulência, já que está patente que tal projeto do senhor Vital do Rêgo (PMDB-PB) reduz os percentuais de participação da União e dos estados e municípios produtores, enquanto contempla os não produtores. Em 2011 estima-se que os royalties do petróleo somarão R$9,2 bilhões. Em 2020 deve chegar a R$21,6 bilhões. Não é o eldorado prometido por Lula, e pode dar muita dor de cabeça. Que seja feita justiça, ou seja, voltemos ao regime de concessão e deixemos de lado a partilha que é irreal para os fins do equilíbrio federativo, os custos econômicos no Rio de Janeiro e no Espírito Santo podem se transformar em custos políticos para toda a federação.

Gustavo Bastos, filósofo e escritor, 09/11/2011.


terça-feira, 8 de novembro de 2011

CORPO FECHADO


   Tens o quê? Sei não coisas tuas,
   Os teus solos pobres,
   Que eu pouco me faço nessas contas
   De soberba que carregas.

   Fé na música, fé do pó ritmado
   Em brutos, descubro olimpo
   Meu caminho que da fonte
   Carrega o muro, teus alardes
   Sonoros vácuos perdidos.
   Fazer-se de navio e certeza,
   Fazer-se no afogar,
   Acertar a vida na força
   Que te levas, de pouco a muito
   Chegar aonde quer.

         Das primeiras
   Mortes tuas entranhas
              Ardem
      Com o inferno da
             Serpente
            Procurando
           Envenenar-se
   Se eu tenho a discórdia tua
   Valendo-se do que nem sabes,
   Se tens vida perturbada
   Em sonhos de fogo, pois éramos
   Talvez o universo, depois nos
   Desfizemos no vinho.

   E que sinto da tua maldade, assassino?
   Eu era voando, eu era voando.
   Tu me buscavas, nojento.
   Se tu perdestes o senso?
   Foi o mais ridículo da criançada.
   Certo, tu se danou,
   Teu inferno ao que lhe dou
   Este inferno,
   Ao que peço que tu sofras infinitamente.

   Mas que mais peço?
                          Tu vais embora veneno!
   Serei da liberdade, serei do eterno,
   Serei da felicidade.



 

RECLAMAÇÕES E ESCRITOS DIVERTIDOS


   Eu consigo ter a ideia
   Que na vida dos tempos estradas
   Cai sob a sombra,
   A última heroica visão
   Dos lumes, esperar torto, vão e louco,
   Cair dos fins que há de ter
   Em qualquer ócio,
   Faço negócios com mercadorias,
   Tenho o barril em que guardo moedas
   Para um vento e para todo encontro.
   Era de honra um caixão de empréstimo.

   Quem sabe se da louca e furiosa ambição
   Que passeia, quando o filósofo enxerga,
   Tentei passar contramarés,
   Busquei paradoxos torpes e contravinganças.
   Se tenho uma ideia, não é só uma ideia,
   Tanto se esquece do que perguntas.
   Não é o reino fantasma do abstrato,
   Teus males não podem me eliminar
   De minha própria face.
   Só um bom senso, prazer da consequência,
   Ou perder-se, irritar-se,
   Desumano protesto, parque de homicídios,
   Fenômeno infinito da raça deletéria,
   Os meus intestinos se róem,
   Se de tal besteira me quero,
   O senhor bem disposto traz suas críticas,
   São o foco do que me leva à procura,
   Ter e não ter, coisas descritas sob o fogo.

   Eu creio sempre em devaneios,
   Muito há na crise que se abre
   Com a falta da chave,
   Se vão limites mal consumidos,
   Uma vida não seria tão espúria,
   Tiveste a fé neste tormento
   Quão cheia de si, vil e tortuoso
   O labirinto que carregamos.

   Eu espero o tempo retomar um estilo,
   Reencarnar às noites eternas,
   Ó vício, eu ver o todo sem tomá-lo,
   O que a selva do vício
   Me tortura, sei que poderia morrer,
   Quando existe um destino
   Sem estar nele, fugindo do que vem,
   Comer o silêncio e viajar o infinito,
   Uma encosta do descanso faminto,
   Poderia escrever bilhões de sóis.

   Vem chegando
                      O meu
                    Movimento
                 Como um susto
                       Dentro
                          Do
                       Corpo.
                              Eu e todas as quimeras
                              Do ser.
                              Sento-me e possuo o meu tempo.
                        Fica a bosta de todo o resto, pouco importa.

 

FASTIO DA DEGENERESCÊNCIA


   Sei que todo anjo torto é transcendência maldita.
   Sei que todo morto quer viver, quer viver como se não morresse.
   Sei que não é tal ser de asas a salvação do mundo.
   Sei de todo o resto que vai acontecer,
   Quando tiver sol na frente da minha dor
   E eu puder ver o alívio defronte ao nada mais,
   Somente o sol e nada mais de percalços,
   Somente o sol e nada mais do curso interminável
   De ser como somos, somente o sol e nada mais.

   Dias após as guerras e as torturas,
   Sei que sou qualquer nuvem,
   Sei que sou qualquer tempo,
   Quando só tiver o sol, quando só tiver o sol,
   E nada mais, nada além do sol.
   É disso que falei nos anos todos de uma vida à margem
   Dos acontecimentos importantes.
   Mas, que é tão importante?
   Não sei se dou importância aos acontecimentos importantes,
   Por importarem tão pouco para o meu viver.

   Ainda antes do fim das guerras e das torturas,
   Estou enfurnado numa cova que não me quer,
   Estou absorto numa memória que não me lembro.
   Sei que é a transcendência maldita do anjo torto
   Aquele que cai do céu das ideias imutáveis
   E se torna mutante, escroto e mortal
   Como nós.

   Sei dos acontecimentos sem importância,
   Esses que tanto importam aos poetas do incidente,
   Na gelada noite nos fins da tempestade e da canção.
   O anjo torto pode ser a miséria do paraíso perdido
   Para sempre em meu coração.
   A miserável decadência de ser consanguíneo
   De toda a humanidade.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

SONHO DA POESIA

A estória da poesia
é uma saga infinita
das brancas nuvens
negras tempestades
desertos de rubi
vermelha e plácida
onda de níquel e sedução
contra a fome
contra o ditador
sangue de cachorro
lama de leão
feroz rosnado
de rugido da visão
desesperado desespero
da coisa em si
vulcão estomacal
de noites de boemia
nas baladas das odes
de uma elegia
que culmina
num soneto concreto
de um cordel vitalício
de métrica livre
em versos brancos
na rebordosa de um haikai
de uma épica milenar
que trata os ditirambos
como fontes inesgotáveis
de tragédias gregas.

02/11/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)

ESTATUTO DOS HIPÓCRITAS

Quem me diz que sou nada
não sabe a que horas
eu tenho dor.

Quem me diz que sou miserável
não tem calor no coração
e nem nunca dançou na chuva.

Quem diz que sou louco
não sabe da violência
que é estar num hospício.

Quem me diz que sou idiota
não consegue conceber
um pensamento idôneo.

Quem me diz que sou derrotado
não sabe do brocado
que nasce da minha pena.

Quem diz o que diz
não pensa ou fala,
repete feito matraca
um monte de infâmias
que me condenam,
poeta do gólgota,
salafrário e ladrão,
a dar boas-vindas
aos meus parcos
sentimentos
da podridão.

02/11/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)

domingo, 30 de outubro de 2011

MORTALIDADE


           
   Um homem agônico descansa na alma pálida
   Qual seja a forma de sê-la.
   Este irônico que ri de qualquer zelo
   Que com ela se arraste.
   O frio neste instante
   É nada como sua alma sem prazer.

   Quem, de todos, diria serem pálidas
   As formas desmembradas
   Dos sentidos, das razões finitas,
   Do cérebro ígneo da dúvida?
   O agônico pasto do mundo
   Canta com seus penitentes,
   Que deixam longe o segredo
   Dos seres cósmicos,
   Preferem o sol sobre a carcaça.
   (Vem lá de cima a ilha do paraíso,
   Não esperem chegar lá).

   Este homem, vês quem é?
   Com afinco me dedicarei a matá-lo.
   Este fantasma dos fantasmas
   É o pior dos idiotas, o mais mortal
   De todos os mortais.
   Eis que é o homem que não se vê,
   A mais noturna ambição
   De querer ser alma
   Quando nela se quer o mundo,
   Poeira de mundo,
   Maravilha de coisa alguma
   Em todas as coisas.

   Qual é a agonia maior do que ignorar-se?
   Qual é a mentira maior do que ignorar-se?
   Tal é a condição humana,
   Este homem é qualquer homem.
   Tal é a falta de um si mesmo infinito
   Sem as fissuras do tempo mortal,
   Seríamos anjos?
   O dia não há de chegar, pois é amanhã.

FRAGMENTO DEIXADO NO HORIZONTE


   O que eu sei, se pouco tenho a ideia exata,
   É o enorme universo no cair dos horrores.
   O que eu sei, enfadonho artista,
   É o meu pouco exato sentimento de esperança.

   O que eu sei do mundo é um enigma
   Pouco secreto, os celestes não renascem,
   Os campos morrem como devem morrer,
   Os celestes não ouvem,
   São deuses olvidados,
   O enorme universo
   No cair dos horrores.

   Fartas nações infaustas, nações aleijadas.
   Farsa farta! Farta de mim, farta de todos!
   Descortinado o uivo do sempre,
   Deuses celestes não me veem,
   Não vêm, não copulam.

   O que eu sei não é exato, nem é mistério,
   Mistério não se deve ver,
   Cegos não devem ver,
   Surdos não ouvem gritos,
   Castrados não querem prazer,
   A carne não vai temer a carne,
   Desovaram o uivo do sempre.

   No cair dos horrores
   O enorme universo,
   Cerimônias que a ideia não consola.
   Deve estar longe a estrela,
   Deuses celestes não me veem,
   Não me ouvem porque não querem.

   Castrado foi o povo. E o mundo é pouco.
   Muito é pouco. Nações não copulam,
   Não se amam.
   O que é meu, se pouco eu tenho,
   Não é mais ou menos valoroso.
   O caráter não mede o instinto.

   Instinto: a carne quer a carne.
   Instintos copulam, corpo-a-corpo,
   Tudo é ar de luxúria, selvagem,
   Do pouco farto mundo.
   O mundo que não é muito,
   E que pouco me falta.

MAIS UM LAMENTO


                 
   Marcha a estrada na noite, atropelados como eu
   Dançam. Com as migalhas da vida perfazendo
   Todas as minhas ações, torno-a maior ainda
   Em meus pés, e o solo se reveste de flores.

   Com o sol perto da rocha, e com o céu claro,
   A estrada amanhece e continua sempre.
   Marcha agora no dia, para depois retornar ao escuro
   Sem sol, vendo apenas os montes
   Nos quais o meu amor desfalece.

   O sensível toque de altivez ressoa na febre
   E nos cartazes do tempo. Torna-se logo apatia.
   Eis a vida suprimida, por não ter o amor
   Que tanto sonhava, por não ter férias em minha
   Alma de tragédia. Por não revelar, ou esconder,
   O mais silencioso palácio dentro de mim,
   Um palácio vazio, um palácio escuro,
   Em que o sol não ousa entrar,
   Que a luz da vida já não ousa entrar,
   Que a cidade ignora,
   Palácio da noite que o silêncio afaga.

   Lembro de juventudes e de sonhos,
   Sem tê-los mais, sem o céu ou o amor,
   Restando a esbórnia solitária
   Na cidade que um dia cantou,
   Cidade que mora longe,
   Cidade em que estou.    

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

LAMENTO DO TEMPO INCURÁVEL

Será que da infinitude
eu posso saber o fim?
O espaço se multiplica
polissêmico,
vozes guturais do inferno
me trazem à tona.

Eu, que tenho feito estudos
de épocas diversas,
creio que o tempo inabalável
vai e vem como um pêndulo.

O deserto da vida ainda é
o que é?

Sei algumas coisas do eterno
em minha finitude,
mas pode a vida ser grande?
Pode o grande abismo
se abrir para a queda?

Não sei se vou aos fatos diários
das notícias de jornal,
tenho me alimentado mal
e voltei a fumar,
tenho espasmos incontroláveis
que são reflexos dos meus pecados,
esta é a minha condição humana.

Pode o infinito provocar
a minha loucura?

Será que da vida carnal
o estalo de percepção
tenha solução
para os meus medos
vulgares?

A estrada se abre,
o caminho é longo,
a terra prometida
longínqua.

Tenho tédio e horror
à todos os horrores
desta vida,
tenho uma alma animal
que dança inesperada
com um brilho de névoa
a esperar a fortuna
que nunca virá.

Ele acorda às seis da manhã,
se veste e lê o jornal,
depois trabalha,
depois come,
depois se despede
de seus amigos.

Enfim, a dura carne
pode apagar o que há
de alma em nós?

Não me espanto mais
quanto à inconsequência
da juventude,
deixo esta confusão
para trás,
temo apenas a falta,
o vazio, o vácuo
da existência.

Prefiro perder meu tempo
vendo as revoluções
de bem longe.

Prefiro economizar tempo
quando da chegada
do cadafalso
dos amores
perdidos.

Canto à noite a boemia,
faço de uma mansarda
o habitat ideal
de um poema que
se insinua
no poeta
que bem sabe
lhe dar
a expressão.

Sou o tempo e o espaço
da minha razão e desrazão.

28/10/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)

ANJOS E ASAS

Aos olhos dos anjos
tudo é etéreo.
Aos olhos dos anjos
uma criança é pura.
Aos olhos dos anjos
se ignora a carne dura.

Eu brincava de anjo
em minha tenra infância,
brincava de duvidar de tudo
e de também perguntar
por tudo.

Aos olhos dos anjos
o poema deve ser
coloquial.
Aos olhos dos anjos
a tristeza é um fim
sepulcral.

Quando chegar a hora
do passo em falso
do inimigo ... as asas
se abrirão num torvelinho
de felicidade.

Aos olhos dos anjos
o êxtase da imortalidade
pode ser fatal.

28/10/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

O INFANTE

Como um infante o poeta
declama vozes desconhecidas.
Como um infante compõe suas rimas
que brilham como diamante.

Das pestes inumeráveis ele sabe
de todas, enumera os infortúnios
como um grande sabedor
das coisas obscuras.

Devaneia o amor sem
nunca ter amado deveras.
Do elixir tem saudade,
dos miasmas colhe o pranto
que no seu peito ecoa.

Como um infante o poeta
domina a arte do verso,
e neste universo de
mágoas e alegrias,
se diverte nas noites
como um idólatra
de Baco.

25/10/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)


DO PERIGO DA POESIA

Amarga vinha, poetas
descansam no ópio
e na vinha se foi
o tempo recobrar
a lamúria.

Eis que o dia é a mancha
que nos invade os olhos,
mar impreciso das
almas dançantes,
eu olhava a vida
com olhos de furacão,
eu olhava o futuro
como uma antevisão.

O que seria de nós sem o perigo?
O que sobraria da vida
sem o risco de perder tudo?

Como se sabe, a hora dos defuntos
é o dia e a noite
na taverna,
bebemos licores
que renascem
nas águas do mar,
e o delírio nos possui
como uma arma fatal.

Os amantes de boêmia
bem o sabem, e nada
lhes é precioso.

25/10/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)






CASO RARO

No tumulto das horas
uma multidão toma
o patíbulo.
Desde tempos imemoriais
o arcaico nos honra
com sua cegueira,
uma pistola é apontada
à cabeça de uma febre,
os dias gritam ou calam
ao sabor das ventanias.

No cais encontraram
um poeta morto
que as águas salgadas
do mar com suas ondas
trouxeram de volta à praia.
Na algibeira encontramos
"Uma Temporada no Inferno"
de Arthur Rimbaud,
o poeta lacrimejante
havia bebido muito
e se jogou nas pedras,
logo ficara sabendo
toda a patuleia.

No tumulto das horas
seu crânio partiu
em loucuras bêbadas
de mágoas antepassadas,
o mar chorou e disseram
que a onda o esmagara.

25/10/2011 Delírios 
(Gustavo Bastos)










































domingo, 23 de outubro de 2011

A BOCA DO MUNDO E A FOME VIZINHA


   Sonho este que está no tempo
   Ido e doído, corrói o sêmen
   E o prurido escapando
   Com o céu da boca em pranto
   Em curtas passadas da língua
   Que é a mesma fala falaciosa
   Faladeira em falsa forma.

   Sonho meu e teu e nosso
   Que a boca do espanto
   Contorce a língua que flui
   Em tons dialetos e palavras próprias
   De um viver de cultura e História.

   Sonho todo em tudo que nada além
   Diz não aos que choram.
   E dorme como come, e baba como bebe.

   Boca miúda, cala-te!
   Este sonho não é o nunca ver
   Do visto que é o mundo incômodo
   Que vem aos olhos?

   Sob o céu da boca da fome o grito.
   O real é a boca sem céu
   Do purgar-se do purgatório
   Nosso de cada dia.
   E cada noite sozinha
   Acende a vela do sétimo dia ...
   Desnutrição.

   E cada um em si já foi sêmen um dia
   Que saiu e virou gente.
   E cada um em nós é um só da mesma
   Reunião de gentes.

   Assim se vai do ventre à boca,
   Da barriga grita a fome
   Do corpo inteiro desnudo.

   O mundo assim de nós mesmos
   Que comemos, são a fachada
   Do sonho. O real que não
   Queremos não é o nosso.
   Estamos cheios, repletos de tudo,
   Longe das bocas ignotas da fome
   Sem fama sem fundo sem mundo.
   O mundo lhes é negado
   Tanto quanto se pode.
   Tudo que é tempo e sonho
   Desfez-se como gostaríamos.
   Dois mundos não se tocam.
   Um que é ser, outro que é nada.

   Nos esquecemos
   Da morte da fome
   Do que não tem nada
   E nada espera
   Senão o não
   Do mundo que lhes
   Evita.

REDAÇÃO DO INFANTE


                                     
   Lá no campo longínquo, que faz séculos que no horizonte descansa, esteve em olhos marejados um tímido coração tremendo no espanto da vida.
   No silêncio da alma não há esperança, não há alegria.
   As pedras nos sonhos jazem em masmorras, poesia sem dono que o fantasma do profundo quer como um abismo, que este filho da dor desenhou ao infortúnio, e declarou-se como o líder de uma gangue dos ínferos.
   O riso que além escapa, e a boca sedenta, derramam a alma que não quer se expor. Guardada em gavetas, a poesia não quer se revelar estonteante ou bela como antigamente.
   Antigamente, havia um paraíso, que no mar sumiu, no azul do fim.
   A fumaça vigora, a desgraça vigora. Esteve o vinho lamentando a taça vazia e o estilhaço do coração sufocado.
   Sempre o pássaro, imagem qual era, ascende em outros cimos. E a noite, agora possessa, deveria tomar o dia, e jamais trazer o sol que antes brilhava, pois o fogo da vida findou no tédio e na revolta.
   Lembro-me apenas: Antigamente é só infância. O campo longínquo não voltará.

EXISTÊNCIA


             
   É de tudo o que enfraquece, o tempo
   Do minúsculo relógio de fogo.
   Flores nos jardins me fascinaram tanto,
   Que a minha tranquila vida acabou.
   Este viço de vida que acaba
   Por ter perturbações,
   O reflexo do espelho quebrado,
   A dança morna que invade a alma.
 
   Imóvel, me movimento por dentro,
   Quando tanto sentido escapa da vida.
   E vento, ou nuvem, talvez a chuva
   _ não me convalesçam.

   O fraco sou eu.
   O tempo não é meu e de ninguém.
   As flores nos jardins que me fascinaram tanto,
   Tampouco se revelam verdadeiras.

   Não é o campo o meu êxtase.
   Não é a cidade o meu fim.
   Meu tempo que não é meu e de ninguém,
   Talvez chamando o que é este passar de tudo,
   Por tudo passa sem ter o que buscar.

   O fraco é o poeta.
   Minúsculo, esquecendo da grandeza.

                                   

NA NEGRA NOITE, UM SONHO QUE VEM


   Em mim um sonho se avizinha,
   E bate à porta.
   Por lares em que tudo alinha,
   Dou o meu verso agora.
   É noite que vive lá fora!

   Andei entre as gaivotas,
   Que mexem meus livros usados,
   E me dão às livres revoltas,
   Serena luta de reinados.

   É o vão da noite que assusta!
   Toda fé e toda luta
   Correm pelos vinhos,
   Tudo gigante, em vasos e ninhos.

   É a dor que cai onde fugimos,
   Da dor que é dor sem céu,
   Da dor que vem e que é sem véu,
   Da negra noite que surgimos.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

CARTAS IMORTAIS

Quantas horas perdidas
na cidade sem ver o sol?
O mar beija a minha alma
e salga o meu corpo,
eu lembro dos gestos do céu azul
em meus pensamentos,
vejo clarear a ideia do dia,
vejo o temor das mentes pequenas
frente à eternidade,
sinto o pecado em minha pele,
berro como um animal selvagem
nas ondas da morte,
morro no silêncio do vinho,
derreto no sortilégio frio
de uma canção solitária,
desmaio no sonho que encanta
a noite ao luar,
bebo absinto para ter o poder
da embriaguez na chuva,
faço de minha vida
um desespero envenenado
pela flecha da poesia,
não encontro nenhum amor
e nenhuma saudade,
vou à praia viver o sono
de um corpo ferido
pela nau dos corsários,
a poesia que está em mim
é viva como a chama
que queima meus olhos
num delírio de espanto.

15/10/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)

terça-feira, 11 de outubro de 2011

POEMA TRANSFIGURADO

A flor jazia na penumbra,
o coração das feras
devorava o poema.

Azul, cinza, negro.
Esta gradação era a visão
que tive ao me enforcar.

Dez tigres, quinze leões,
uma onça e uma pantera.
As feras devoravam
Deus e o Diabo.

A guerra das feras é o sustento
da anarquia dos prazeres,
prazer da carne,
prazer do espírito,
feras resmungando
suas presas.

Caça e caçador
e um dilema de
morte ou vida
nos dentes
do fim do mundo.

Caos e amor se encontram
no banho de sol,
a flor renasce das trevas
e as feras viram pássaros.

11/10/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)

CAMPO VERDE

Não desisto de estar no campo.
O campo verde que descansa
no sol e na virtude,
vou às ervas e suas alucinações,
caio em versos pelos visionários
que viam poesia aos borbotões.

Não morro de tédio e nem de ferida,
não sou ao certo o que sempre
quis ser, ave imaculada,
prazerosa chama de vida
que revela a face úmida
do pendor pelas palavras.

Deus refulge no verde campo
e vira o universo das galáxias
em furioso emblema,
minhas marcas e vivências
soam desesperadas
e a sabedoria é uma alma vigorosa
que não chora suas mágoas.

A poesia, esta doce cantata,
não é cega, vê o doce rumor
das árvores ao vento sadio
que irrompe no céu infinito.

11/10/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

LADRÃO SORTUDO A GALOPE


   Para não me tocar um só desaforo sequer; tudo é engate de céu, terra e inferno.
   Tenho o Axis Mundi. O galinheiro é o pasto. Estandartes de vinho caem como óperas.
   Dou ao idiota a sorte de moleque sacana. Um probo vence sem fileiras. Os doidos são a infantaria. Fãs o amam e o querem. O barão é o ladrão dos impostos. Quem é o jovem? Que diz o jovem? Ele se ruboriza, se encastela.
   Diante da fachada, terras tectônicas!
   Quando cai o azul, sobe o fogo!
   E volta, martírios sacros queimados de luxúria, para as fogosas mortíferas, para os alquimistas. Um ladrão elegante, que leva ouro sem roubar. E que de nada se arrepende. É majestade! Tripa e gordura. Carne e coração. Vísceras, nervos, estômago faminto, pulmão cheio de fumaça. Bicha louca infortunada. Homem-máscara de outros confins. Besteira não registrada. Balas de revólver mastigadas. E os seus sectários, todos vis nas cabanas dos tabus. A morte é o tabu!
       
                                   Soa o vinho, suor latino bárbaro.
                                   Ladrão com virtude, este homem menino.
                                   Era o alerta, o comércio ilegal.
                                   O afrontador das leis.
                                   Tenebroso, dos quereres e do intelecto.
                                   Pórtico em que ele encosta.
                                   Igreja fumada até o talo.
                                   (Galope, cavalo, notícia).

   Sei de tudo isto. É certo e sombrio. Os mentirosos choram constrangidos.
   Aqui se faz tabaco e tosse. Aqui a sorte. Aqui o tempo.
   Qualquer lei ou costume se perde, tudo está subvertido.

 

BENQUISTO MANDRIÃO


   Sofre a modorra, lenda incoerente das têmporas do sol. Sereia que o buscava, em torno das luas miseráveis dos escravos lobisomens.

                                  Era o acalanto e a enfermidade.
                                  Música das celas e dos chiqueiros.
                                  Era um tonto divagando sobre o próprio caminhar.
                                  Dava uns passos ... dois para lá, dois para cá.
                                  Entoava o livro de muquifos sem móveis.
                                  Bibliotecas sem armários. Ó rua!

   Benquisto era cidadão raro. Sofria de contubérnio de alarido. Eis o casaco que lhe protegia, ou o guardião que lhe segurava. Um filho era dançante. Um filho era doutor. E as meninas encantadas com este engodo, enfático como a bosta.
   Dava de cara com a polícia, tomava cacetadas bem sensíveis.
   Na sustança de sua pensão, outros mendigos dormiam.
   E vai ... e volta ... e vai ... bem para lá ... longevidade!

                                     O poema é estranho.
                                     Um ser de cores e cravos.
                                     O terreno guardava o pó da lasca.
                                     Começava tudo sem terminar.
                                     E loas, e vivas!
                                     Aleluia ou Jah?
                                     Um demente, sai uma quentinha da costela.
                                     Adão sem pecado.
                                     Ou pecado sem Adão.
                                     Inimigo de Eva.
                                     Ou a própria serpente.

O SERVIÇAL DO SOPRO MATUTINO


Embolora o sonho pátrio,
   Era sonho caído
   Aos pés de outono.
   Corado de vergonha misteriosa.
   Cretino ou besta ou tarado.
   Sem furor, sem batina.
   Era o vento matutino, degola.
   Das arqueadas fuligens que borram o ar.
   Deste andor mal versado.
   Como dolente ou idólatra pútrido.
   Ao seu regime estapafúrdio de horas trocadas.
   Sem susto, no vento decola.
   Ouvindo o seu segredo, o vagabundo.
   Serviçal, amo, boçal.
   Consorte da dama refrigerada.
   Ou lar de solitude ou pimenta.
   Cremado e telúrico.
   Fonte do vício espesso da coragem viandante.
   Um céu solstício pouco apreciado.
   Doceria de confeites coloridos.
   Mortos chumbos vivos.
   Quem um frio lastimou.

domingo, 2 de outubro de 2011

O DEBATE SOBRE O MARCO REGULATÓRIO DA MÍDIA


   O debate sobre o marco regulatório da mídia parecia estar enterrado com o discurso do início do governo Dilma Rousseff, em que a mesma defendeu a liberdade de imprensa e de expressão. Mas, pelo que se vê, depois do 4° Congresso Nacional do PT, a ação de ressuscitar o marco regulatório da mídia voltou a ganhar corpo, o que não impediu um de seus aliados, o PMDB, base do governo Dilma, de se opor a tal investida petista sobre a liberdade de imprensa no Brasil. O debate é intenso, e há argumentos fortes dos dois lados, mas cabe aqui fazer um posicionamento franco e sem amarras.
   Por que impor uma regulação da mídia num país que se diz democrático? Não há, para tanto, ou seja,  para o controle dos jornalistas, regras civis e leis criminais contra a chamada imprensa marrom? Isto é, um jornalista que fizer mau uso de suas prerrogativas não pode ser punido pelo sistema jurídico vigente, com implicações civis ou criminais, sem a necessidade de um marco regulatório para coibir a liberdade?
   Bom, o que se vê do lado do PT é a defesa da regulação da mídia por que isso é necessário para uma democracia que defende a pluralidade de opiniões e que vai de encontro ao monopólio familiar da mídia brasileira, mas isso me cheira a chavismo e outras coisas piores. Ou seja, depois de aprovada esta regulação pelo Congresso Nacional podemos ter a oposição ao governo Dilma tolhida e censurada de suas manifestações. O que acontece na Venezuela e na Argentina? Não é isso do que se trata, na verdade? Pois então, o PT diz que não há contradição entre liberdade de imprensa e regulamentação. Ora, mesmo sem a regulamentação censuraram o Estadão, imagina com esse “marco regulatório”, para mim isso será uma mordaça aos oposicionistas, mesmo que eu ache que muitas vezes setores da imprensa abusam de sua prerrogativas, como o grupo Abril da Veja e seu jornalismo marrom, ainda bem que eu não leio a Veja!
   O que é preciso ter claro é que a regulação da mídia não se incorpora às práticas das modernas democracias, o argumento a favor do marco regulatório diz que não há menção à criação de mecanismos de censura à imprensa, mas críticas aos abusos de grandes veículos, de que o domínio midiático por alguns grupos econômicos tolhe a democracia, o argumento é por meios de comunicação democráticos. Ora, não vejo como democrática uma avaliação prévia por marcos regulatórios do que pode ou não pode ser veiculado na imprensa, o que sou a favor é da punição civil ou criminal da imprensa marrom, o que já tem respaldo, como já disse, no nosso sistema jurídico, sem a censura governista do PT e de seus “marcos”. Não há porque, por outro lado, defender o fim dos monopólios da imprensa em troca de uma pluralidade, pois isso já está acontecendo com a internet, o fim do monopólio da informação já está em curso com as novas mídias, vide as manifestações políticas independentes geradas pelas chamadas redes sociais. Para mim trocar a liberdade de imprensa por uma suposta democratização dos meios de comunicação não é nada mais do que uma falácia, disfarce de um desejo de monopólio das ideias e de um retorno à censura, como se essa já não estivesse aí, não é Sarney?

02/10/2011 Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
 

sábado, 1 de outubro de 2011

OS BOÊMIOS (PARTE II)


   No teu ser o brasão impele,
   Corrente jaz de velhas eras.
   Que derrama sol e ferve esferas,
   Que da noite em degredo fere.

   É o campanário, veia lúcida.
   Há de ter tempestade na alma,
   Que vem da luz e da calma,
   Aportar no sonho da vida fúlgida,
   Oásis e morte que traz e me ama.

   Vinho do mar, violeta que dança aqui e acolá.
   Todo suntuoso mar, que do vinho é festa!
   Tudo que há para amar, perdido lá.

   Hoje é sabor doce, ou amarga vinha,
   Ainda que estrada vá.

   Lancinar, rosto que não mede as garrafas.
   Tenho certeza de hoje beber prantos,
   Colher depois risos sem amarras.
   Que eu só neste campo vejo malandros.

 

OS BOÊMIOS (PARTE I)


   Que hei de ver agora em constelação?
   Os bêbados que caíram sóbrios,
   Os vãos desvarios dos ópios.
   Querem dar olhos às mortes de verão?
   Pois eu dou veneno e sinto então.

   Do ar que bafejava noutra cascata,
   De bares corre vento e alegria.
   Não vejo minha flor, tudo resvala.

   Para o bar! Vos digo onde passar ...
   Pois há rua no meu caminhar.

   E a mesa me afoga, tempo cru da crueldade.
   Amamos a esbórnia,
   Tuas vidas, ó mocidade!
   Que vai e possui a cidade!

   Tudo que há de se beber ali,
   Bar que a madrugada toma,
   Sempre mistério que ouvi,
   Por nada que me é doma.

 

INTERROGATÓRIO


   Quem és tu, ó infame?
   Mestre de ambivalências, um paradoxo contínuo.
   Não tem nome o seu cadafalso?
   Ópios instrutivos de leituras, biografias queimadas.
   Avisa quando vem?
   Somente por botes em ninhos inférteis e escuros.
   Não tem uma faca amolada?
   As garras de unhas afiadas.
   Semeia?
   Versos de cadeiras de rodas, rosas chorosas.

   Deve algo ao povo envolto em chamas?
   Meu perdão e todos os perdões.
   Um Cristo de insanidade santa!
   Foste algum soldado autoritário?
   Nas guerras entrincheiradas voei eternamente.

   Por que não está se ocupando?
   Não adquiri habilidades práticas.
   Então, ouve seu coração?
   Às vezes tenho que escutar outros, desesperados.
   Trouxeste um presente?
   Não tenho dinheiro em meu motor de parlatórios.
   O que tu queres? Afinal de contas?
   Om mani peme hung, ó alegria do lótus!
     

ROSA MORTA (PERFEITA ILUSÃO)


    Se não existem flores,
                   sempre semeio torpores,
                                              de falsas flores.

   Encontro, qual rosa perfeita, sua maledicência.
   Ressoando a alma decantada no ar rarefeito,
   esgarçando a moral, voz hipócrita definhando.

   Estarei, depois, na praça cantante, deitado e mendicante.
   Vagarei no verso vulgar e amador.

   Meu verso, que é natimorto e feto noturno,
   olha de soslaio a derrota íntima.
   No sabor degradante de volúpias e febres,
   delírios acordam os sonos cadavéricos
   do ópio que me enleva.

           As flores são rosas mortas!

   Vejo entre mil essências o perfume de maravilhamento.
   Me tem a mortalha que mortifica, de olhos ardentes como fogo.
   Qual edificação multiforme, o pensamento se transforma.
   Delícias inumeráveis? Serei finalmente feliz?
   Agora vejo somente torpores, nada de flores.

 

sábado, 24 de setembro de 2011

SINTONIA METAFÓRICA (A HARMONIA DA PALAVRA)


   Queria deixar os vinhos desta vida,
   partir numa canoa sem angústias,
   no céu de nuvens a metáfora perfeita.
   Seria eu um nada flutuante.

   Em perfeita sintonia,
   abrindo todas as portas,
   sem verdade alguma
   a alma consome o vento.
   Os dias serão amenos,
   mesmo com a urgência de tudo.

   Se delicia o espírito na doce névoa,
   a solidão é arrastada para a contemplação
   no lago das lembranças.

   Deito-me na grama num voo silencioso,
   reconduzido ao templo da serenidade,
   onde a plenitude reina vitoriosa.

   Nos seus deleites sobrenaturais
   a alma canta a sua liberdade vulgar.
   Dormente, docemente, luminosa e fecunda.
   Versos explodem em chamas sob o sol fulminante.

   Regendo a obra numa orquestra voluptuosa,
   a riqueza da palavra harmoniosa se emana
   como raios de luz que intensificam
   por toda parte seu arrebatamento simples.

COSMOGONIA


    O mundo foi criado pela energia dos possíveis. Na sua harmonia tão caótica me faço no desespero. Vemos uma nuvem de proto-homens, prontos para uma labuta poderosa. Selva malcriada de rumos incertos, onde se combina uma escalada de progresso. Aparecem os sóis que induzem à vida! Nascemos livres. Aonde vão tão raras criaturas? Era noite quando não existíamos. Muitos ainda surgirão e serão jogados no mundo como nós. É a lei.
   Nos expulsaram do paraíso, o sofrimento é um bem hipócrita. Poderíamos contemplar uma felicidade insana e esquecer dos deveres de um pecador. Somos restos de um inventor exigente com seus filhos. Era sol invencível na juventude mundana, época em que o mar nos convidava para o seu baile de ondas, para esquecermos de tal memória de renegados.
   Como um verde campo inocente, tinha vontade de me afundar ocioso. Minto em cadeias bem articuladas, voo rasante em que a voz do futuro acorda oráculos. Nos séculos seguintes se fundou um conflito de desdentados, sedentos que agonizam, olhos fundos. Uma lágrima para cada rosto, não crio fantasmas ... eles existem. No fim tudo se queima, meu acorde fatalista, é então o vale dos que se arrastam.
   Andava no crepúsculo, nada mais era real ... atravessei aquele tempo de fluxo em agonia, senti bem perto um desastre irreparável, no ar bolorento de qualquer pesadelo. Era a vida uma certeza, e a morte uma incógnita, o que esteve antes e depois? Os mundos evoluem, certamente. A origem é reinventada, os termos se comportam no todo da linguagem das esferas. Não há doutrina visceral, uma cosmogonia que nos expõe, movimento incessante de violência criadora.

INEBRIANTE POESIA (LIRAS DE DELÍRIOS)


   Eu clamo de corpo ébrio pela liberdade,
   desta que se encontra na ciranda celeste,
   procurando a fusão harmônica e universal.
   Nirvana! Espetáculo divino de plenitude!
   A poesia que nasce de sutis eflúvios,
   a prece que vigora em cantos silvestres,
   de uma paz já finda e ornamentada.

   A canção é vívida e sempre ecoa,
   como este poeta inebriado
   que vos fala e que luta inutilmente,
   se esvaindo e se debatendo por fogo e vento.
   Ungindo na santidade à calmaria dos anjos
   e profanando narrativas gloriosas de fontes ocultas.

   Nas águas argênteas da poesia que emana a liberdade,
   me encanto com o mundo.
   Desde as liras delirantes harmonizadas pelos aedos,
   rapsódias primitivas de canção remota,
   lembrando-me de deuses mortos,
   que circundavam o universo.

   Hoje, já não há olimpo, nem alvoradas pagãs.
   Os poetas não cantam mais os mitos,
   somente suas dores, para levá-las ao sublime.
   A poesia ainda vive, desde seu habitat grego
   nas liras de delírios.

   Todo poeta que delira e morre de saudade,
   é dominado pela nostalgia
   que traz uma iluminação coroada.
   Tenta viver da arte na qual arde,
   lembrando-se poeta, na alma da poesia.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

ESTUDOS SOBRE O NIILISMO

Terapia de porra nenhuma, masmorra.
Que cê quer? O que cê quer de mim?
Vou ao alto, parado não estou.
Vou com o introito da dona flor,
Florbela Espanca está em meu
nariz de palhaço,
na clínica psiquiátrica
eu tinha 3 metros,
me perguntaram se eu era idiota,
respondi que era poliglota,
vou descarnar a miséria,
afogar minha luxúria,
beber em goles fajutos
a cachaça da anarquia,
sou tempestade no mar,
vinho salutar,
de muito em muito
vou cair no poço profundo,
imundo, quimbundo, vagabundo.
(Flor bela espanca, dizia eu.)
Noite adentro sou Rei,
noite afora sou esmola.
Não me digas o meu dever,
eu sei o que devo fazer,
não te ouvir, te calar,
te matar.
Não me arrependo de nada,
sou estoico mesmerizado
por um espírito de confusão,
sou asfalto na cara ralada
no chão.

19/09/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)

domingo, 18 de setembro de 2011

TRÂNSITO DE PALAVRAS

Vertigem no silêncio das almas mortas,
ecoa desde o fundo do oceano.
Agarro-me à esperança da fuga,
dou-me ao féretro morto por chumbo.

A consciência de si deve se voltar
à consciência do outro,
sem esta somos ilhas de egoísmo,
pois o verso dialoga com a existência,
e desta tira o fulcro das lições.

O paraíso do amor é também uma fuga,
se este amor não vem com
promessas de felicidade.

Ouço gritos da vizinhança,
os bordéis estão cheios,
 a bebida é boa,
e todos somos ébrios.

Vertigem no falatório das almas vivas,
o que resta por viver pode
tornar-se em fumaça,
a cotovia faz seu ninho
e seu canto ecoa,
minha dama predileta
pode ser um sonho,
mas não vou sozinho
nesta vida, tenho minha
poesia com a pena delirante.

18/09/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)

REFORMA POLÍTICA: VOTO PROPORCIONAL OU MAJORITÁRIO?


   Será votada em plenário até novembro deste ano a reforma política. Parece que esta discussão é eterna, cheia de prós e contras de todos os lados, mas urge como necessária uma definição. Lembrando que tal reforma, se de fato for votada, estará em vigor somente em 2014. Mas se trata, de fato, de uma discussão antiga e recorrente na História política brasileira.
   A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) está elaborando uma definição, o relator da Comissão Especial de Reforma Política, deputado Henrique Fontana (PT-RS) fez a proposta que será votada pelo CCJ do Senado e da Câmara para depois ser debatida em plenário e votada pelo quórum das respectivas casas.
   Não é uma solução fácil, está sendo costurado um difícil consenso entre os partidos, partidos que parecem em conflito, defendendo seus interesses e inclinações em diferentes frentes de combate. O PT quer a lista fechada, já se aventou um voto proporcional misto, ou seja, o eleitor votaria em um deputado em lista aberta, ou seja, voto nominal, e teria que ter um segundo voto para deputado em lista fechada, ou seja, na lista definida pelos partidos internamente sem consulta popular. O PMDB, por sua vez, defende o Distritão, encabeçado pelo vice-presidente Michel Temer e pelo relatório de Romero Jucá (PMDB-RR) que foi derrotado por 12 votos a 9 no Senado que também rechaçou a lista fechada criando uma indefinição, mais uma. E o PSDB com o voto distrital. Até aí, não vejo muita diferença entre o voto distrital (que não é o puro inglês) e o distritão. Entre maioria simples ou absoluta o resultado é o mesmo, enfraquecimento dos partidos e benefício para os caciques com seus currais eleitorais.
   Vejo com bons olhos a proposta alternativa do voto proporcional misto que é o mais provável de ser aprovado em plenário, enquanto o distritão me parece uma utopia diante de um país de dimensões continentais, teríamos que ter uma articulação entre o Tribunal Superior Eleitoral e os dados do IBGE. Acho a proposta do distritão ou do voto distrital de maioria absoluta com dois turnos muito complicada de ser posta em prática, e acabaria com uma democracia plena de multipartidarismo que, mesmo com os nanicos de aluguel, seria melhor do que um possível bipartidarismo antidemocrático.
   Entre os prós e os contras, o sistema proporcional tem o grande defeito dos cacarecos puxadores de voto como Tiririca, mas não vejo solução melhor para a representatividade popular do que um favorecimento aos partidos no sentido de heterogeneidade dentro das câmaras e assembleias legislativas, o preço do bipartidarismo via distritão seria doloroso para a democracia brasileira.
   Neste ponto, demorei em me definir entre distrital e listas abertas ou fechadas, mas um voto proporcional misto (metade lista aberta e metade lista fechada) acho a solução mais equilibrada em matéria de amadurecimento democrático. Quanto ao fim das coligações, não há dúvida de que isto é o correto a fazer, e o financiamento público de campanhas acabaria com a desigualdade de forças entre candidatos ricos e pobres, (apesar de muitos dizerem que será mais uma despesa para os contribuintes), visto que o poder econômico de um candidato X não seria mais possível no financiamento público. Mas o certo disto tudo é que, qual seja a solução, ela doerá do mesmo jeito, mas temos que saber o que é cada coisa.

18/09/2011 Gustavo Bastos

 
 
















sábado, 17 de setembro de 2011

DESDITA MÍSTICA

Desmistificar o mito.
Tânatos teratologia
do cão ácido mar de sonho.
Palavras mortas
no campo.
Deserto desejo crânios.
John Lennon foi morto
por um idiota.
Kurt Cobain suicidou-se
depois de um dia de tédio.
Rimbaud das arábias
fugiu para o país dankali,
morreu de câncer.
Des-ditas tão ditas
em desfazer-me,
cousas tão reificadas,
coisas tão cousas,
cantei Kant cantante,
fiz do meu desejo
um minuto de prazer,
passo carnaval
sem roupa,
vou deveras dever-me
ao Kaaos,
Tártaro não fica nos dentes,
titanomaquia quiromancia
astrologia química dos poros,
vinho tinto seco,
prometo que não morrerei
sem ter feito tudo, tudo.

17/09/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)

APOLOGIA DA NATUREZA

Orvalho no espaço infinito
não são lágrimas de dor,
vejo a nuvem descer da montanha
e peço a Deus um pouco de frescor.

Minha dor não é miséria da alma,
é uma vida de noites desveladas
no patíbulo da santa virgem.

Nós, que da poesia herdamos
o gesto simples, a solicitude
das palavras, escrevemos amor
e depois saudamos o sol,
a noite do horror não nos mata,
as delícias do jardim são
canções epicúreas,
sonho de fogo e canhão.

Desastre a bombordo,
descobertas a estibordo,
o navegante da nau azulada
come lótus com prazer vulcânico.

Poemas variam das armas
e do morticínio,
mas nossos extermínios
são a fome e a sede,
nós estamos vivos
por causa da arte,
a arte que se funda
na plenitude.

Quase não lembramos da sombra
que o inferno insinua,
quase não somos mais
poetas ou marginais.

Pelas veredas passamos,
pelos desertos morremos,
e nada da natureza nos salva.

A poesia da fúria e do delírio
são descampados infindos
de luxúria.

O vinho da nobreza alimenta
todo o fogo desta vida,
somos apologistas da paisagem
que dorme no silêncio,
somos os lírios semeados
em chuva e versos.

17/09/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)

CARTA DO POETA INSATISFEITO

"sejamos os novos musicistas do que se anuncia como o futuro da arte"

 Vivemos num tempo medíocre, todos falam do cotidiano, tudo é cotidiano, essa verve da stand-up comedy me dá náuseas. Poesia que fala da eternidade e que abusa de metáfora e simbolismo é logo tachada de anacrônica, eles não querem mais poetas que escrevem com o próprio sangue, tal como diria Nietzsche dos poetas trágicos da Grécia arcaica, os poetas hoje devem ser humildes, sim, humildes! Eles dizem: “Quem sou eu para dizer que sou poeta! Seria muita pretensão da minha parte!” . Eles querem o modelo cotidiano da hipocrisia da auto-pequenez, os grandiosos morrem de fome, as editoras estão atrás de um futuro inexistente, a influência das coisas comezinhas é o auge do que se faz de poesia hoje em dia, e tem um tanto que só sabem usar das rimas chatas e previsíveis, numa lírica piegas e brega que ousam chamar de poesia, e sonham em publicar seus versos apoucados na pretensão da humildade do “quem sou eu para qualquer coisa!” . Ó sonhadores, com suas naus furadas num mar revolto de paixão, ó sonhadores das máquinas de Gutemberg!
   O que é aplaudido hoje é o chamado reino da mediocridade, o puro discurso se sobrepõe à metáfora, os símbolos são renegados como História e não como plenitude, ó medíocres, sonham tão pouco, sonham errado! Os sonhadores verdadeiros têm mania de grandeza, a grandeza que está bem retratada no Ecce Homo, todas as naus furadas afundarão no mar do esquecimento, todas estas navegações sobre o pouco que resta de original, tem muitos que escrevem igual, são escravos do igual, são apologistas do igual, e o diferente que se anuncia na tormenta vem de milênios de História, sim, pois queremos a História, escrevemos por ela e por causa dela, mesmo que muitos obtusos confundam as coisas e entendam que tudo isto que nos cabe é Metafísica! Ora, onde estão os novos Rimbauds? Ora veja só, um novo Rimbaud hoje passaria despercebido, como o próprio passou despercebido, precisamos de novos bibliófilos? Sim, precisamos!
   Tal poesia do futuro eu antevejo como o contrário de hoje, poesia bem cantada, não poesia comezinha, da falsa virtude do comezinho, da falsa humildade do cotidiano, se queres falar de coisas cotidianas, sejam cronistas, não poetas! A sedução harmônica que muitos dizem anacrônica é o salto necessário para saírmos desta contemporaneidade fajuta do reino da mediocridade! Ó sonhadores, sonhem do jeito certo uma vez na vida! Sejam detentores do prazer, hedonistas musicais, façam de suas saturnais a fonte de que emana a vida, e não apenas façam um pastiche ou coletâneas de esquetes imitando o humor idiota de americanos!
   Podemos ser livres no que fazemos, e que as editoras acordem para a poesia do futuro, a verdadeira poesia do futuro, que não é nada mais que uma reflexão da tradição reaproveitada em novos sentidos, voltemos à poesia sensorial, não esqueçamos de que ela não é Metafísica, no sentido estrito, venhamos dar boas vindas ao sentido lato da vida, que a eternidade não seja trocada por uma simples natureza morta que ousam chamar poesia, sejamos vivos como viva é a inspiração, sejamos espertos e não sejamos mesquinhos, poetas devem viver o que dizem, poesia é vida antes de ser palavra ou verso, poesia é o fundamento de tudo, e façamos música e não rimas sem gosto, sejamos os novos musicistas do que se anuncia como o futuro da arte, nada de sobriedade que fala do armário ou de objetos irrelevantes, voltemos à vida, pois ela é mais do que isto!

17/09/2011 Pensamentos Livres
(Gustavo Bastos)

POESIA DAS SATURNAIS

Na festa a madrugada canta.
Pestes de poetas alcoolizados,
vestes de incertas poetisas.
Do universo eu guardo o gládio
da minha vida eterna.
No sonho em que te vejo
estou exausto e feliz,
radiante com o teu amor
em fausto, fastígio de vitória
nos teus olhos negros,
dois poços de petróleo
de perdição beduína,
vinho da juventude imberbe
com o sonho da vida destemida,
sem rancor e desejos vingativos
eu prossigo a minha caminhada,
e a estrela matutina já anuncia
a alvorada.

17/09/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)

O MAR CHEIO DE VINHO

 A adega está cheia,
o pássaro azul passou
por aqui, fez seu ninho
e se foi ao infinito.

Beberei o vinho e o absinto,
mergulharei na cerveja,
vi o canto harmônico
de minha vida,
o libelo da salvação
está nos pequenos atos
da alma em flor,
todos somos livres
do rancor.

A vida não se questiona
em vão, as palavras
que fazem efeito eficaz
são tocadas da alma
aos ouvidos,
as almas são nascidas
do ventre deste mundo.

Depois, no ar embriagado,
vem a noite, eterna noite,
nos lembrar da poesia
que vigora nos quatro cantos
da Terra,
um mar aprazível de
sedução.

17/09/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)



sexta-feira, 16 de setembro de 2011

A VIDA CONTADA EM SOBRESSALTOS


   Quando acordei, toda a vida tinha mudado, neste ódio de mutilação dorme o canto do cisne, a morte é um palco, a ressurreição é um grito. Donde se tem decrépitos que urram suas dores, ó mundo, qual a tua dor? Tenho em mim mil rugidos defronte ao meu karma, tenho nesta vida o sobressalto que corrói minhas entranhas, fumaça e gozo espiritual, carne e vida desregrada! Quantas mulheres me rechaçaram por eu ser louco? Quantos dias eu perdi em minha loucura? Não faz mal, o vinho da eternidade é inefável, saudade é uma palavra morta, não faz sentido viver incompleto.
   Desde o funeral de meus antepassados, não vi o sepulcro que nas vísceras do poema eu lutei, eu lutei por enxofre, guerra e liquidação da existência, frio e caos de fulgores. Sou intempestivo, a memória que em mim habita lembra de coisas que não posso narrar, sou joguete de tais imagens, sons pululam como música celestial, a paz invade o meu recinto, eu sinto a paisagem delirar dentro de minha alma, minha alma é o caos, as estrelas são contadas, o inferno é lembrado e citado à exaustão, o devir me chama às responsabilidades da vida, e eu sei que eu poderia ter sido morto antes de sair da juventude, mas aqui estou com o sentimento expandido do embate, todas as tentativas de enxovalho foram inócuas, eu tenho a minha paisagem, eu tenho o meu refúgio, as palavras se insinuam, neste hora não há relógio, o tempo fica suspenso, o tempo impassível da vida se perde neste mar que é a poesia, é o dia dos viventes, é o cerne da questão, decifrar a correnteza que te leva além é o trabalho a fazer, trocar de roupa e ir em frente, o corpo, matéria densa, é o brio, é a paixão, todo o fogo do desejo acorda em mim!
   Não sou deste reles mundo de hipocrisia, a vida não se limita à sua dureza, a vida não é um martírio para quem sabe dela tirar a seiva, tal fonte eterna é o trágico, o teatro do sangue é a visão do futuro, todas suas canções são canções do futuro, para quem bebe o absinto isto é a vida, o veneno que circunda meus atos não me tomaram ainda a cara embriagada, a razão do estupor é o sinal da tempestade, o sinal que todos ouvem na hora da partida, a viagem astral se faz indócil, uma nuvem de prazer brilha no sol da mente, a alma poética se afunda neste grande oceano de mistérios, o amor canta na madrugada encantada, o dia amanhece de novo e já estamos refeitos das chagas da morte, o imortal está perto de Deus, o universo se espalha pela filosofia, a cosmologia da poesia é uma estrela dadivosa, a noite é amiga dos sonhos, e os dias se vão como pequenos episódios de uma saga ao infinito.
   A peste segrega sonhos, mas os poetas, sim, os poetas, os verdadeiros poetas, não meros versificadores, morrem de paixão e embriaguez, tudo pelo sonho, tudo pela vida vivida no máximo da expressão, a estética que lhes domina vem do sangue e da paixão, a cura da poesia é o seu pathos de ritmo, orgia e possessão, a guerra travada a cada dia os fazem fortes, os delírios e sofrimentos alimentam mais ainda o sonho que navega, o poeta navegante conhece todos os mares e ventos de que se faz a poesia, o rumo que se lhes dá na veneta é vencer a miséria de ser sempre o mesmo, metamorfoses são a fonte de que se faz a viagem da canção, os poetas são grandes sonhos numa noite de verão, a ilusão é a poção extasiante que lhes ferem o dorso e lhes fazem mais apaixonados, tudo o que lhes toca é o céu e o inferno na terra vivida em carne e espírito, uma vez vivos, não desistem de vencer.

16/09/2011 Delírios
(Gustavo Bastos)


quarta-feira, 14 de setembro de 2011

HAICAI - XXX

Tempo escasso vai
descer veloz para ver
tudo que nos cai

14/09/2011 Livro de Haicais
(Gustavo Bastos)

HAICAI - XXIX

Versos tão medidos
são métricas ditas feéricas
que brilham em risos

14/09/2011 Livro de Haicais
(Gustavo Bastos)