PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

domingo, 31 de julho de 2016

NOITE DE OPALA

Pedrarias quais opalas,
rio de temor.

Com que ás o hausto
se dá ao poema?

Pele de risco, a guerra soturna
embasbaca o mais sutil,
envaidece o mais idiota.

Fruto da serpente, o vinho sem lei.
Déspotas das linhas retas de armas,
rotas de fuga pela última fronteira
onde morre o sol,

as letras ensolaradas morrem de sede,
as letras suadas morrem desertas.

Pedrarias quais topázios,
em flora ametista
o mistério pulula fogo,
colunatas e capitéis
de frisos, as noites dóricas
e góticas, as bocas das Fúrias
na vinha e sarça queimadas,
sem os gritos de fúria
não há mitos,
estas arquitraves sustentam
o olimpo e as pedras roladas
do poema.

31/07/2016 Gustavo Bastos

MAPA ASTRAL

Regente Sol, à centúria espoucada
da bomba de Sêmele,
como sois Prometeu
em ebulição,
és fogo.

Dádiva, ambrosia.
Volta e meu cartucho de poema
sementeira de sal nasce,
aurora d`bruma,
que vou apagar com mel.

Regente Lua, os lunáticos.
Hölderlin e seus poemas
de duas pontas,
o hino e a loucura.

Regente Saturno, à sétima casa,
Rei dos mártires, carta da fortuna,
e o enforcado está lá,
Villon, o farsante.

Touro indômito, carta da fada,
um ser Cérbero aparece
em sonho, a mulher está rosácea
numa viagem de ácido,
bem astuta com vinho derramado
da boca, e seu linho todo preto
em frente aos nenúfares,
que sois sol, lua e saturno.

Montado o teatro dos vampiros,
regente Marte, o ataque frontal,
Mercúrio em demasia,
a mensagem seminal,
morre Joana D`Arc,
a voz da tempestade ecoa,
ela leva sua espada,
corta ao meio o poder.

Bruto o torpor de azaleias,
rosas brumosas,
lívida anca aluada,
rica em trovejar,
como um poema ferrenho.

Hefestos, o regente metal,
a carta diz:
a obra é qual edificação de ferro em brasa,
sem as dores vividas
não se faz aço viril,
e sem a felicidade suprema
não há primavera
no fim.

31/07/2016 Gustavo Bastos

O ANTI-HERÓI

Tal e qual a rua ecoa, numa estupefata canção.
Tal o poeta que é guru da esquina,
retina atenta, pupila devota,
esquálido a espalmar o livro.

Desce o itinerário de ônibus,
com uma flor na lapela,
com boca de ouro ou de gosto de vinho,
como um cavalheiro diante
de uma sílfide,
                   ou contra a parede,
endemoninhado!

Tal e qual a cidade tem suas cidadelas,
donzelas morrem em fortalezas.

E o poeta, assim assado,
documenta as tormentas
e o enfado,
condoído e espumando seu leite viçoso,
ele rema a rima qual maré,
por jurar ao mar que jura amar.

Tal e qual a rua ecoa,
um espasmo de gozo
é qual rotina
que passa ao lagar dos
bêbados,
tal e qual os prostíbulos
e fumaças de charuto,

Ele, o ser contente e ébrio,
pensa-poeta pela madrugada
estrelada do páramo,

tal e qual, a dama refeita da transa,
costuma imprecar depois
de ter tomado todas,
derruba a prataria toda,
se sua dama se arruma toda,
ele gosta, mas ri.

Tal e qual os cobradores de
túnicas espiraladas,
os lençóis deflorados
são sua rotina
de lupanar,
pobre diabo e triste,
como um palhaço
que esteve em brio
de fuga,

tal é o efeito da vodka
no segundo canto
da noite,
a balada e o rondó,
a ode espiritual
de um fauno
que parodia
ditirambos.

31/07/2016 Gustavo Bastos


DISMALAND

De olhos bem abertos, ao parque risonho em que os dentes correm com a mente tal uma boca, o mundo ao dispor, a fome dos sóis como um amarelo borrado em espanto, tal a hora que antes havia nos tempos de ouro, sem dor e morte, e bate no relógio todos os dias o contorno dos corpos diante dos faróis.
O horror de Manson, fico de frente à espada, Los Angeles, e o Verão do Amor em San Francisco, a Swinging London, eu o mártir, estes outros tantos, meus carrascos, a dominação do espírito, e os sinos que habitam o tilintar dos frascos de veneno, do Bordeaux embriagado com vinhos de eternos cantores da fábrica de Jazz.
Buda em escarlate, as damas sucintas com mentiras iluminadas, versos que batem de frente, gritos que fogem de hospícios, que batem de frente, que gritam odeio vocês todos, que pulam o poema com tanta febre e terror. O rock, de dentro do coração, não sabe de todos estes esquemas que vivem de um padrão arrotado como canções de tédio. Jesus encarna a música que habitava Fender, luta renhida com sete chamas azuis na bruta lâmpada de Alladin. Insano!
De olhos bem abertos, ao parque das lágrimas, fantasmas de roupa preta batem à porta, atendo um mendicante, me torno um renunciante, flechas do torpor caem como bom soporífero, Morfeu ganha um miasma e um hematoma, eu ganho músculos como um doutor de poesia em banho de sal, mar de Mármara, reto e dançante, nadando para o sol tal o sonho de Ícaro. Vingue-se!
Mas, como um plácido verso, donde a pura flor emana, detenho-me em fúria com calma, viro-me ao tempo lasso da temperatura do corpo perfurado em tatuagens, Krishna subindo em árvores, OM transando no Mahabarata, lento o vinho com cidades estouradas de violência, bento o dia, vertendo a noite. Mate-me!
Eu quero a sedução da morte, a queda do véu, o desvelar de olho com sério pensamento, que corre em fadas e vinhas tal o sonho puro de diamante, eu quero a mortal intuição de todos os símbolos na carne, os miasmas terríveis da dor, as cores estupefatas do amor, os linhos e as malhas de túnicas com sabores de vento, os labores de prazer tal tear como rios de guitarras batendo em meus órgãos, nas tripas coração de elencos de teatro, a queda do Tártaro, o mistério dos surtos bíblicos, o Nirvana como derrota do corpo, o fim da História como o nada místico da aniquilação, a dor remendada com notas de dólares, Hollywood com sementes de riso na stand-up de um pendor básico de poema roto, os mestres do universo vindos de Órion, a estrela azul da imaginação como bom conto de prata embotada de ferrugem, aço marmóreo de toda a força, Dismaland devastada. Verta meu sangue negro!
Prenhe de loucos a nota fria da canção, os devedores pagam suas mulas de coca, passo à Cordilheira, jazzman, bluesman, guitar hero, brio todo em fera, animal interno que eclode ao sucesso, prenhe a nave veneno e rumo sem norte, o frio de escalas em harmonia, o poema que ruge com máquina de Tupã, sempre vivo Osíris, e Tamuz, Marduc babilônio na queda dos anjos de Tiamat, mito vertendo navegação em astrolábio, tem tudo na rigorosa moral, no sangue puro dos éticos de dores regidas por fracassos, nas dores sentidas do palácio, na política de títeres sem dedos, as estrelas correm em seus epiciclos, a hipnose varia com Wundt, eu detenho-me diante da morte, caio em choro por toda a alameda, não tenho tempo misterioso, arranco as vestes com tenazes de pecado, com broto de bambu como último almoço antes da guilhotina, tal é vinho depois quando estou já no céu, com meu anjinho da guarda a dar risadas de uma espoleta de olhos vermelhos, dentro da canção está a dor profunda da vontade morte vida que estoura os tímpanos, que morre vive com a conta paga na hora do suicídio em vão. Música!
Leve-me ao parque, vamos brincar, cavalos coloridos, crocodilos, elefantes, leões, o globo da morte, venha em toda a súcia de politiquentos artistas, Demônios, Deuses, gente estropiada, a entrada é gratuita, o céu está in love, a terra está arrasada, não há mistério, toda a cor de vivência humilha os detentores do saber, a verdade ultrapassa todo rigor de pensamento, o poema só estoura o que já vem bem explodido, e a vida implode por hipocrisia, não temos nada a fazer no parque, a roda gigante é um eterno retorno de ciclo entre fogo e água, vivo períodos de placidez e outros de suicídio, caio em mim e saio de si, tem um Outro na vida dos loucos, a fama só resgata um mártir depois que este já morreu. Dismaland!
O parque tem carrinhos, bebês verdes, moças amarelas, homens de preto, carroças de algodão doce, ó leãozinho, morde meu peito! Ó girafinha, estique o pescoço para ver, está diante do Homem, este animal feroz que habita teu parquinho, besta-fera é esta que arma a guerra, que tem visto para o inferno, e o céu nostálgico aparece nos sonhos de religião destes miseráveis. Pois sim, reto o drama, existência falida, espírito inteiro, no entanto. Veja, não há mistério, Buda sorri de uma piada infame, o poema sorri por pura inspiração. Legalize!
Erva santa, me salve! Vou à Jamaica, passo pelo Haiti, Dismaland é o No man`s land, Eliot sabia de Dismaland, Banksy não mostra-se assim inteiro, venha ao parquinho comer doces de sonhos bobos, palhaços com caras pintadas de vermelho, o inferno de Dante, a comédia de erros com idiotia de propaganda, muita miséria de mentira, muita verdade escondida, venha ao parquinho, andem com seus patins, deem milho aos patinhos de feira, comam a fartar os sanduíches de carne assassinada, festa tem, bem ao gosto do público, distinto e brilhante, o poema só dá sol a este calor de astúcia, venha à Dismaland, olha a fera diante do carrasco, não há escape, sonhar com tudo isso só vira poesia se o sonho não morre de inanição, a fome deste mundo é Dismaland, bruxas de preto, feiticeiras de branco, mulheres fatais de vermelho, e os homens azuis de desejo, os cortes de cicatrizes em seus gritos, vindos de rinhas de macho, e com lâmpadas acesas na cabeça quando fazem a Ideia dar errado. Venham!

(Nota: Dismaland é o centro do universo velho diante do novo que virá, se torna futuramente a utopia da Era de Aquário, com escusas, não entro em detalhes desta visão do futuro, pois a pena só indica que Dismaland é a fase negra antes de uma nova fase brilhante de ciência e espírito.)

Ao coração do mundo dedico estas flores humildes.

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.


31/07/2016 – Poema em Prosa.