PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

domingo, 28 de junho de 2020

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DATA : 28/06/2020
CONTRATUALISMO EM JEAN-JACQUES ROUSSEAU
1 - O HOMEM NATURAL
Rousseau busca o homem natural para tentar responder à questão da origem da desigualdade entre os homens, e se esta desigualdade era permitida pela lei natural. Esta busca de Rousseau vai em direção de algo anterior à razão, de princípios como o da conservação ou amor de si e o da piedade ou comiseração. Destes dois princípios que Rousseau localiza a origem do direito natural, regras estas que a razão restabelece posteriormente com outros fundamentos, e nos desenvolvimentos sucessivos desta razão a natureza acaba sendo sufocada.
É neste estudo do homem original que Rousseau analisa as verdadeiras necessidades e os princípios que fundamentam seus deveres, e neste sentido tenta afastar as dificuldades que se referem à origem das desigualdades, é neste estudo das bases e fundamentos do homem original que se poderá distinguir o estado de natureza e o estado social. E tal estudo de Rousseau só poderá se fazer por uma “História Hipotética”, uma vez que o conhecimento antropológico das origens do homem é insuficiente.
O homem, neste estado de natureza, se encontra numa situação semelhante a do animal selvagem, ele tem força, habilidade e saúde, e tem como vicissitudes as enfermidades naturais, as doenças, a infância e a velhice. E Rousseau coloca os males de seu tempo como obras do próprio homem, que poderiam ter sido evitadas se o homem tivesse mantido a simplicidade, pois, para Rousseau, o homem natural não precisa de remédios e nem de médicos. O homem natural vive numa relação de equilíbrio com o meio.
Para explicar do que se trata o homem natural, Rousseau primeiro o distingue do animal, e coloca a liberdade como a primeira distinção essencial deste homem natural. Rousseau vai buscar as características metafísicas e morais do homem natural. O animal age por instinto, não pode se desviar das regras que lhe são prescritas, enquanto o homem realiza as suas ações como agente livre. A consciência de sua liberdade, na escolha entre concordar ou resistir às influências da natureza, que dá ao homem natural a revelação de uma certa espiritualidade da alma, pois, enquanto a Física explica os mecanismos dos sentidos e das ideias, ela não pode explicar o poder de querer e de escolha. E outra característica que Rousseau também coloca para distinguir o homem dos animais, por sua vez, é a perfectibilidade, isto é, a capacidade de o homem reagir às circunstâncias, tal capacidade que está presente tanto no indivíduo como na espécie.
Enquanto o animal nunca muda, sempre seguindo e repetindo o seu instinto, Rousseau observa que esta capacidade de reação do homem o coloca, em suas palavras, na seguinte situação : “... com o tempo o tira desta condição original na qual passara dias tranquilos e inocentes, que seja, ela que, fazendo com que através dos séculos desabrochem suas luzes e erros, seus vícios e virtudes, o torna com o tempo tirano de si mesmo e da natureza”.
O homem natural vive em seu momento imediato, satisfazendo paixões instantâneas, seus projetos não vão além do dia de hoje, ele sai deste seu isolamento com a criação da linguagem, e outro fator foi o cultivo da terra, com a divisão das terras, o homem natural, que vivia de seu instinto, passa a ter uma razão cultivada, esta que é o meio necessário que o faz sair de seu estado de natureza e viver em sociedade. Rousseau via neste estado de natureza uma condição aquém do bem e do mal.
Ao final da primeira parte do Segundo Discurso, Rousseau conclui que a desigualdade não existe no estado natural. Estudar o homem natural é, para Rousseau, essencial para conhecer a civilização, as causas das mudanças e o caráter da sociedade, a dependência mútua entre os homens em sociedade, por sua vez, leva a relações de subjugação e de exploração, e Rousseau diz que esta lei do mais forte não existiria no estado de natureza.
O conceito de homem natural tem uma importância decisiva nas teorias contratualistas. Temos o indivíduo como fonte e fundamento do poder político, são pelas características deste indivíduo que irá se determinar o conteúdo das teorias construídas segundo este modelo de interpretação da sociedade, uma vez que o conceito de lei, de gênese da sociedade civil, e a noção de corpo político, todos eles serão devedores desta concepção de homem natural.
É nesta perspectiva que poderemos perceber a diferença entre os conceitos de natureza humana de Hobbes e Locke com a concepção de Rousseau. A agressividade imanente em Hobbes e a sociabilidade em Locke, contrastam com a radicalidade da ideia de Rousseau sobre o homem natural, que aparece como um ser isolado, que difere do animal somente pela perfectibilidade, numa relativização do conceito de natureza humana, uma vez que a descoberta do caráter social e histórico do indivíduo, colocando a natureza humana relativa a estas duas dimensões, tal potencialidade que só será possível de ser realizada com o indivíduo integrado a uma sociedade e a uma cultura, é quando este indivíduo está integrado a uma sociedade que ele se torna humano.
2 - DO ESTADO DE NATUREZA AO ESTADO DE GUERRA
“O verdadeiro fundador da sociedade civil foi o primeiro que, tendo cercado um terreno lembrou de dizer isto é meu e encontrou pessoas suficientemente ingênuas para acreditá-lo” (Segundo Discurso, V.164).
Assim inicia Rousseau, na segunda parte do Discurso da Desigualdade, a análise do surgimento da sociedade civil. Como se chegou até este ponto é o que o autor tentará demonstrar através do desenvolvimento da ideia de propriedade ao longo do tempo, localizando aí a origem da sociedade civil. Este processo coincide com a evolução histórica das causas da desigualdade.
Apesar de possíveis rivalidades neste início, a nova situação de convivência no seio das famílias, através da reunião numa habitação comum dos maridos, das mulheres, dos pais e filhos, desenvolveram os hábitos de viver juntos, e cada família, como observa Rousseau, tornou-se uma pequena sociedade ligada for afeição recíproca, donde surge a primeira divisão do trabalho, esta baseada na diferença de atividades pelo sexo masculino e feminino. Os indivíduos agora passam a necessitar de seus semelhantes e emerge em cada região nações particulares ligadas por costumes e regras próprias.
Com o desenvolvimento da sociedade, começa a surgir a moralidade, nas palavras de Rousseau : “... desde o instante em que um homem sentiu a necessidade do socorro do outro, desde de que se percebeu ser útil a um só contar com provisões para dois, desapareceu a igualdade, introduziu-se a propriedade, o trabalho tornou-se necessário e as vastas florestas transformaram-se em campos aprazíveis que se impôs a regar com o suor dos homens e nos quais logo se viu a escravidão e a miséria germinarem e crescerem com as colheitas” (D.I.III, 171)
Com o desenvolvimento da metalurgia e da agricultura houve a civilização do homem e se produziu a divisão do trabalho, marcando toda a história de sua subsistência e sociabilidade, e com a diversificação de atividades, estas perderam a sua integridade e foram sendo parcializadas, foi daí que surgiram diferenças e desequilíbrios, com os mais fortes e habilidosos se dando melhor, enquanto os outros tiveram mais dificuldades, foi então que começaram as desigualdades entre os homens.
A competição despertou o desejo do lucro, e isto tornou os homens falsos e artificiosos, a exploração entre os indivíduos começou a se aprofundar, e foi uma das consequências que a propriedade trouxe, foi rompida a igualdade natural entre os homens, e o poder passou a ser imposto pela força, e com os pobres reagindo e fazendo pilhagens, se produziu um estado de guerra.
Os ricos foram os mais prejudicados pelo estado de guerra, e estes então concebem o projeto em que seus inimigos viram seus defensores, fazendo inspirar-lhe outras máximas, dando a eles outras instituições, favoráveis o suficiente quanto lhes era contrário o direito natural, se institui, a partir daí, a sociedade civil, sob um pacto dos ricos. Rousseau considera esta a origem da sociedade política e das leis, que favoreceu os ricos e prejudicou os pobres, produziu a propriedade, acabando com a liberdade natural, e com a propriedade, veio a desigualdade.
Rousseau coloca como último momento deste processo, por sua vez, a instituição do governo quando se estabelecem os magistrados, ou seja, quando se entrega a particulares “a perigosa custódia da autoridade pública”, e aos magistrados a função de fazer-se respeitar as deliberações da comunidade. Tal sociedade e tal governo, surgido nestas circunstâncias e, sob este pacto iníquo, produziram a miséria e a opressão, daí surge o despotismo político. Rousseau, ao final do Discurso sobre a desigualdade, faz alusão aos legítimos princípios que deveriam conter o verdadeiro pacto social que fundaria uma sociedade baseada na igualdade e liberdade e que deverá ser o primordial objetivo de sua mais conhecida obra : Do Contrato Social.
Link da live : Live Instagram de 28/06/2020 – domingo :
Tema : Rousseau : O homem natural e do estado de natureza ao estado de guerra.: https://www.instagram.com/p/CCAJQryJdN6/
Link youtube : Rousseau e o Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens : https://www.youtube.com/watch?v=TffG7qwsxkI
Gustavo Bastos, filósofo e escritor.





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