PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

quarta-feira, 1 de agosto de 2018

OS RATOS – PARTE I


“A família Wright era a mais rica de West Camp”

Numa vila do interior da Inglaterra, chamada West Camp, ocorreu algo que remonta aos barbarismos da Idade Média, o fenômeno que aqui será relatado se passou nos anos de 1937 e 1938, antes da eclosão da Segunda Guerra Mundial em 1939. Foi algo inexplicável pela natureza, e colocou a população de West Camp em pânico, e tão intenso quanto este fenômeno surgiu, o mesmo arrefeceu, como num passe de mágica.
A família Wright era a mais rica de West Camp, possuíam as maiores vastidões de terras nos arredores do pequeno centro urbano da vila. O patriarca, Sir Desmond Wright, tinha sido prefeito de West Camp no último mandato, se aposentando no ano então de 1937. Sua esposa Victoria Wright era uma feminista de renome naquelas bandas. Ele tinha também cinco filhos com Victoria: Linda, a mais velha, Leonard, o segundo da leva, e em ordem de idade decrescente, os outros três, Philip, Richard e Lisa.
Outros dois donos de terra de West Camp eram Sir Douglas Barrimore e Sir Kirk Seymour. O novo prefeito eleito em 1937 foi o ex-combatente da Primeira Guerra, e ex-médico, Sir Vincent Lauren. A vila era muito rica, não havia pobreza nas terras, mas havia no centro urbanizado uma área extremamente pobre e mal cuidada, que uns chamavam de Vale Morto, e outros, de Gruta Velha. Os moradores, em condições péssimas de higiene, com muitos famintos, bêbados, mendigos, e loucos varridos, entre donas de casa de fibra, chamavam o lugar de Campo do Levante.
As coisas iam bem para os poucos donos de terra, de famílias tradicionais, que dominavam este pedaço da Inglaterra desde os tempos da Idade Média, com seus antepassados se perdendo no tempo histórico, não sendo possível enumerá-los aqui.
Victoria Wright, com seu feminismo militante, porém sem a afetação das que rasgam roupas no Plenário, era dedicada também a causas humanitárias, e sempre ia levar comida para a área pobre do centro maltratado de West Camp. Os mendigos amavam Victoria como um anjo bom e generoso que volta e meia aparecia para transformar o Campo do Levante numa festa. As donas de casa respeitavam muito Victoria, e tinham plena consciência de sua importância para aquele lugar tão sofrido e sujo.
Joseph Lang era o líder comunitário do Campo do Levante que, por sinal, tinha um diminuto sindicato, porém bastante ativo politicamente. Das lendas do Campo do Levante: tinha o mendigo Ringo, além de dois alcoólatras chamados Peter e seu camarada Denis. Victoria tinha bom trânsito tanto no sindicato como em todo o Campo do Levante, e sempre levava as causas do sindicato para seu marido quando ele era prefeito, e agora, com o prefeito Sir Vincent Lauren, embora adversário político de Desmond Wright, tinha também uma relação pacífica e madura. Vincent, na verdade, admirava o casal Desmond e Victoria, mas suas ambições políticas eram grandes e suas ideias eram bem diferentes das de Desmond, sobretudo quando o assunto era a gestão de West Camp, pois Vincent era extremamente pragmático, um homem de um senso prático monumentalmente mais forte do que o de Desmond, que tinha deixado a prefeitura endividada. Vincent estava fazendo um ajuste do orçamento da prefeitura, e os investimentos sanitários no Campo do Levante caíram 75% do ano de 1936 para o ano de 1937.
O líder comunitário e sindical Joseph Lang tinha apoiado o candidato de Desmond, Sir Walt Brolin, e odiava Vincent Lauren, achava que ele era corrupto, que tinha uma empáfia até caricata, ou seja, Joseph percebia um pouco a alma de Vincent, o que muitos não notavam, pois Joseph Lang poderia ser chamado o cara mais inteligente de toda West Camp, foi criado na rua, mas recebeu livros de um benfeitor e se tornou um homem intuitivo de fibra, personalidade forte, e com um senso de justiça incontornável. Seu apoio à Desmond, no passado, foi por causa de Victoria, e seu apoio a Walt, por causa de Desmond.
Joseph Lang, portanto, decidiu que os trabalhadores do Campo do Levante e os camponeses fariam uma greve. Porém, não havia nada planejado, foi de supetão. Joseph dava ordens e todos do sindicato imediatamente obedeciam, com ele não havia arrogância, mas uma ascendência total sobre seus sindicalizados e também com os camponeses. Joseph só não havia saído como candidato a prefeito neste ano por causa do pedido de Victoria para o apoio a Desmond e Walt. Por isso que se diz que seu apoio a Walt foi por Desmond, que, portanto, já era efeito de seu compromisso anterior com Victoria pelo apoio a Desmond. Joseph decidiu também que não sairia a vereador, colocou seu amigo Ben Lindon para ser o mandachuva da Câmara dos Vereadores. Joseph tinha então o plano de sair candidato a prefeito nas próximas eleições. E Walt já tinha sido descartado pelo seu fraco desempenho contra Vincent.
A greve dos camponeses se estendeu às donas de casa do Campo do Levante, pois todas eram cozinheiras e bordadeiras, e a população do centro dependia delas para comer quando não havia as benesses de Victoria. Tal movimento poderia ser um tiro no pé, mas era uma estratégia de Joseph para provocar a revolta da população contra Vincent. O outro motivo era sanitário. Joseph já ficara sabendo que no Campo do Levante tinha surgido um surto de baratas, escorpiões e lacraias, e também começou a aparecer ratos, desde os telhados das casas humildes, até a fossa que estava infestada de ratazanas, umas enormes, e camundongos que invadiam as casas e que se multiplicavam nos estoques de madeira em volta das casas do Campo do Levante. As ratazanas estavam apenas nas fossas, e caíam camundongos dos tetos das casas, baratas voadoras invadiam as casas, e o Campo do Levante começava a virar um pequeno caos.
No meio disto, Ben Lindon, que era nada mais que vereador de fachada para Joseph orientar, começou a empreender a abertura de uma comissão de ética para investigar a administração do prefeito Vincent, pois havia muitas falcatruas inexplicáveis, e a fortuna de Vincent crescia a olhos vistos. Victoria foi avisada por Joseph de seu plano, e que queria ver logo Vincent fora da parada até para dar uma solução para os problemas de higiene que surgia no Campo do Levante.
Ben Lindon consegue maioria na Câmara do Vereadores e engessa a gestão de Vincent que, agora, estava meio sem saída. A comissão é montada, Vincent começa a contatar uns capangas que eram seus empregados para, se preciso, "sumirem" com Joseph e Ben.
Logo depois de começarem as investigações da comissão de ética pela articulação de Ben, digo, de Joseph, numa manhã no centro de West Camp o prefeito Vincent saía do almoço e acaba por cruzar com Joseph. Os dois se insultam e acabam saindo na mão. Joseph ganha a briga, e o prefeito manda prender Joseph, isto com Vincent com o nariz e dois dentes quebrados.
Vincent então articula um movimento para esvaziar a investigação de Ben, dizendo que Joseph estava desmoralizado, pois agora era um preso pela lei, mas Ben dá de ombros e não leva a discussão adiante com Vincent. Ben continua seu empenho de derrubar Vincent da prefeitura o mais rápido possível, e Joseph, enquanto isso, e na verdade, corria risco de morrer assassinado, pois Vincent esperava o momento oportuno para colocar um dos capangas infiltrado na cadeia e dar um fim ao barulhento líder comunitário.
(CONTINUA)

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.

Link da Século Diário :  http://seculodiario.com.br/public/jornal/artigo/os-ratos-parte-i

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