PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

terça-feira, 15 de setembro de 2009

O POETA FILÓSOFO

O POETA FILÓSOFO


Aqui vos digo, decididamente:

__ O tratante sou eu, e o mito é dos mitólogos.

Responde o poeta indignado:

__ Quem é filósofo? Filosofia é uma marcha, só cabe às feras, não aos miúdos.

E o filósofo ataca prontamente:

__ O templo dos pensantes está vazio, é a nossa época atroz ... ferver o dia todo é paixão miserável, o relógio não nos dá as cartas, penso-louco e loucura se pensa a si mesma com desgosto. Mas, toda a razão nos parece caduca. Cavalo é a síntese e a antítese é a Academia, ora essa!

Também, dentro do Eu-filósofo, corre afoito o Eu-poeta:

__ Já ouviu o que uma planta fala?

(O filósofo não entende a pergunta)

Então, ouves? Que foi? Tua língua pensa ser mais livre que uma planta?

Ou deve guiá-la à distância das galáxias?

O filósofo, nervosamente, contra-ataca:

__ Tu não és mestre, tampouco doutor! Mesmo que a Academia seja uma decadência!

O poeta-cômico, dá os seus costumes:

__ Eu sou ausculta. Pois também não vês? Não vês o que o animal vê?

O filósofo, sentindo-se o pior dos homens, recebe tal crueza:

__ Poeta, tu tens o quê? Só falas com plantas e animais? É inútil, ora.

Pois digo que não vejo senão o que os homens querem, e o que eles querem não é pouco. Então? O seu luxo de ausculta é louvável senão para servir à nossa vida de homens, de entes-sociais, de reviravoltas psicológicas entrecortadas de vultos religiosos. Ou só ficará aí? Como planta e animal?

O poeta, sorrindo, se vale de tal lástima:

__ O que é a religião e a psicologia? O que é o homem? O que é o entessocial?

O filósofo tem que dar conta de tudo, senão é a vitória das plantas e dos animais!

Pois, o que é uma planta? Senão uma potência animal que pode vir a ser homem?

Será que existem os homens dos quais fala? Não acredito, não acredito, não acredito.

Pois auscultá-los é limitar o sentimento. Você diz que ferver é tolice? Não, amigo venerável. Tolice é acreditar nos homens ...

O filósofo faz, então, o seu “grito de guerra”:

__ Poeta! Tu és um agnóstico severo. Eu digo, pois, sem discórdia, é um vil niilista! O teu altar é imaginário! Que é? Que é? Poeta?

O poeta, com seu sarcasmo crônico, cospe outras ironias:

__ Você é filósofo. Que mais? Ou não é filósofo? Ainda crês? Serão os homens dignos de tua esperança? Ou eles são mesmo ... porcos miseráveis? Vamos! O lobo, o canibal, o bandido, o ditador, ou talvez o pobre? Que mais? Os reis, os sacerdotes, as viúvas? Que mais? Os moralistas? Ó sofreguidão! Certo é o absurdo. Errado o poder. Errada a política. Sinistra, por fim, a ética. E senão os melindres, me responda. Tu és filósofo? Ou apenas marionete? É isto! O ventríloquo é o teu grego ou o teu alemão? O teu francês ou o teu qualquer outro do passado? És visionário ou mula?

O filósofo, constrangido, embasbacado, golpeia suas esperanças:

__ Não! A mula é quem não sabe que não sabe. E você diz já saber, ó mula!

Insisto que não sou visionário. Mas, temos: A boa vontade de alguns virtuosos, algumas leis úteis e outras inúteis. Pessoas de honra, conquistas efetivas. Eu digo, poeta, tu és a própria soberba! Já és um sábio? Creio que não.

O poeta, melindrado, admite para depois revidar:

__ Está certo! Tu és filósofo. E honrado, e sábio. Também um bom artista, tal como eu. Tal como os grandes homens. Mas, não tenho soberba. E temo pelo teu destino de infortunado. Sim! Eu só vejo plantas. Eu só vejo animais. Eu só vejo você. E os outros. E as casas. E os doentes. Sim! Sou péssimo! Sim!

Mas, veja: Eu fico fervendo. Eu não sou uma geleira ... Tu és filósofo! Sim! Pois é isto! Podes sustentar o teu querido ego nisto? Pois te chamo: Sábio ou sabichão?

O filósofo decide acolher aquele pobre poeta brutamontes:

__ Sim senhor! Eu sou filósofo, não sábio. O que amo é a sabedoria. Por isso mesmo, creio nos homens, no universo. Mas, bárbaro, a que devo a honra de teu despautério ou de tuas tortuosas bobagens?

O poeta fala o que é a ausculta, ou o ver, ou o sinestésico “ver-ouvir”:

__ Quando tu acordarás? Filósofo! Eu sou você! Já viu um homem com duas cabeças? Um é poeta, o outro filósofo ... vês agora? Tens já auscultado o dentro de si que cabe à Poesia? Ou és filósofo o tempo inteiro? Já que não sabes perguntar.

O filósofo, então, responde a si mesmo, a este poeta incrédulo:

__ Sim, sou você. Sim, sinto horror aos homens. Sim, amo-os também. Sim! Ora!

Então, já feita a revelação, o poeta filósofo vira uma cabeça só, e conclui:

__ Somos nós, o poeta e o filósofo, uma só e mesma carne. Um fala na desordem. O outro junta as peças. Um briga com o outro. Um abraça o outro. Há dois lados na moeda, duas bocas robustas, e uma só dança. Este poeta é furioso. E o filósofo é o calmo. Mas, aqui: O mesmo sangue. A mesma dor.

Nenhum comentário:

Postar um comentário