“Ramagem está em situação de foragido”
Diante do embate entre os Poderes, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), tem tido uma condução errática e com uma liderança tíbia, com uma evidente submissão aos interesses de caciques do Centrão, cuja instabilidade se agravou na condução de pautas como a PEC da Blindagem e do PL da Dosimetria, visto por críticos como uma anistia velada a envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro.
Para ilustrar a falta de controle de Hugo Motta na condução do trabalho legislativo, podemos citar o caso da ocupação da cadeira da presidência da Câmara dos Deputados pelo deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ) agora em dezembro, tendo que ser retirado de modo truculento, à força, pela Polícia Legislativa, em meio a um processo por quebra de decoro devido a uma agressão física a um membro do MBL.
Glauber protestava contra o seu processo de cassação, motivado por este caso de agressão que, contudo, foi provocado por ofensas deste integrante do MBL dirigidas a ele. Depois da confusão, que ainda incluiu um caso de censura explícita, com a interrupção da transmissão da TV Câmara e suspensão do acesso de jornalistas ao plenário, a Casa Legislativa decidiu por suspender o mandato de Glauber Braga por seis meses, rejeitando a cassação, o que o tornaria inelegível por oito anos.
Os deputados federais Eduardo Bolsonaro (PL-SP), o Bananinha, e Alexandre Ramagem (PL-RJ), tiveram seus mandatos cassados pela Mesa Diretora da Câmara dos Deputados. Bananinha foi cassado por faltas, pois fugiu para os Estados Unidos e pediu licença do mandato parlamentar, esta que terminou em 21 de julho.
Mas, para surpresa somente dos incautos, o parlamentar não retornou ao Brasil, e foi acumulando um número expressivo de faltas não justificadas nas sessões plenárias. Bananinha ainda é réu em processo no STF acusado de promover sanções contra o Brasil, na tentativa de evitar o julgamento de seu pai, o ex-presidente Jair Bolsonaro, pela trama de golpe de Estado.
Ramagem foi cassado pela Câmara após definição pelo STF de perda de mandato no julgamento de tentativa de golpe de Estado, com uma condenação de 16 anos de prisão. O ex-diretor da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) durante o governo de Jair Bolsonaro está em Miami, nos Estados Unidos, sendo considerado foragido pelas autoridades brasileiras desde setembro deste ano.
Após a condenação de Ramagem, o ministro Alexandre de Moraes determinou o início do cumprimento da pena, o que implica a sua captura e extradição. Ou seja, o STF formalizou um pedido de extradição ao Ministério da Justiça, e a PF apura como ele fugiu do país. Em resumo, Ramagem está em situação de foragido, com seu mandato cassado e processo de extradição em andamento, enquanto permanece nos Estados Unidos.
No caso da inclusão na Difusão Vermelha da Interpol, a pedido da PF (Polícia Federal), seria mais um elemento para que esta possa prender Ramagem nos Estados Unidos, além de reforçar a cooperação policial com autoridades do país norte-americano. Cada país decide como aplicar as próprias leis diante de um alerta da Interpol, e dos Estados Unidos, especificamente, o Departamento de Justiça afirma que um aviso internacional não obriga a prisão automaticamente.
Ou seja, mesmo podendo haver a cooperação internacional, não existe uma obrigação do país norte-americano para deter Ramagem apenas com base no alerta da Interpol. Ramagem poderia ser preso provisoriamente, entretanto, caso passe por controles migratórios ou abordagens policiais, como em um aeroporto.
De acordo com a legislação norte-americana, somente se houver base legal interna ou tratado de extradição que cubra o crime em questão para que autoridades locais possam prender alguém. E mesmo com a possibilidade de pedido formal de extradição, tais processos costumam ser longos e cheios de etapas, e mesmo com a anuência dos Estados Unidos de entregar Ramagem ao Brasil, não existe prazo determinado para o seu envio de volta ao país.
E, no caso da Interpol, a PF (Polícia Federal) está revendo todos os procedimentos internos relacionados a passaportes diplomáticos no Brasil, tendo direito a este as autoridades do mais alto escalão dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, além de diplomatas, militares de alta patente ou em missão internacional.
O objetivo é incluir o bloqueio desses documentos tanto em seus próprios sistemas quanto nas bases da Interpol, a rede internacional de polícias que reúne 196 países. Tal mudança ocorre após a fuga de Ramagem, que deixou o Brasil de carro rumo à Guiana e entrou nos Estados Unidos com um passaporte diplomático, enquanto o outro documento, de uso comum, estava cancelado. O cancelamento de passaportes diplomáticos, até então, era de competência exclusiva do Itamaraty.
No caso da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), que está presa na Itália, desde julho deste ano, o Ministério Público da segunda instância italiana emitiu parecer favorável à extradição de Zambelli, após ela ter sido condenada em dois casos distintos: a invasão dos sistemas do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e o episódio de perseguição armada pelas ruas de São Paulo às vésperas das eleições de 2022.
Como o plenário da Câmara dos Deputados rejeitou a cassação de Zambelli, mesmo que horas antes a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania) tenha recomendado a perda do mandato da parlamentar, ela pode ser extraditada e retomar o mandato como deputada. No entanto, especialistas explicam que, como deve cumprir pena por ter sido condenada pelo STF (Superior Tribunal Federal), ela pode enfrentar dificuldades ao reassumir o cargo, portanto, é inviável que Carla Zambelli continue seu mandato caso volte ao Brasil.
No caso de Zambelli voltar ao Brasil, terá de cumprir pena, já que um dos efeitos da condenação é a suspensão de direitos políticos e a consequente inexistência do exercício de mandato, e mesmo que o plenário da Câmara tenha rejeitado a cassação do mandato, como ela não pode exercer o mandato, acabará sendo caçada por faltas. E Zambelli está condenada, com sentença transitada em julgado, o que implica que a Câmara não pode rever a decisão do STF, do Poder Judiciário.
Por fim, o ano se encerra com a prisão de Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF), preso no Paraguai ao tentar embarcar para El Salvador com documentos falsos, numa cena patética e em mais um ato de fuga de um bolsonarista, em que a grita em torno das condenações revela este aspecto poltrão e do coitadismo que virou esta saga que, um dia, alguns incautos acreditaram se tratar de uma aventura imbrochável.
Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
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