PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

segunda-feira, 20 de abril de 2015

"FILÓSOFOS DA VIDA" OU A FARSA DO IDIOTA

   Para o entendimento, para o objetivo de saber o que se pode saber da vida, e esta vida na sua junção inextricável de vivência, experiência, conhecimento e sabedoria, num caleidoscópio que tenta abranger a visão mais justa e esclarecida de valores e ações, de relações sensíveis de causa e efeito, sobretudo nas relações humanas, e que, para funcionar bem, tais quatro dimensões devem estar em sinergia, isto é, sem bloqueio de terceiros (cirscunstancialmente ou numa situação dada), e numa preferência pela harmonia que é sempre o olho da ciência, o plus filosófico, o saber como guru de si mesmo, unindo, nas quatro dimensões já citadas, com mais cinco categorias ou faculdades anímicas: razão, vontade, emoção, sentimento e sensação (em equilíbrio, preferencialmente com assuntos nevrálgicos sanados eticamente), isto tudo, este pacote a que é dado o nome, até onde sabemos, de humano, tem como desiderato abarcar o máximo de sentido para a vida, com desenlace psicanalítico e existencial.
   Situando-nos na mente individual, que, uma vez jogada no universo, neste ser tudo do presente, com reflexos do passado e do futuro impressos nesta mesma alma, ela está inserida em forças que a ultrapassam, por via social, do inconsciente e, para quem crê, espirituais, tem evidente, uma vez tomadas estas proporções, que nem tudo é comando do ser individual, saber isso é considerar a ordem cósmica, que é muito mais coletiva e traçada por forças maiores do que possa imaginar o dom precarizado do livre-arbítrio em situações diversas, sendo o indivíduo fruto de circunstâncias entre escolhas deliberadas, ações de outros, traumas inumeráveis, bloqueios exógenos e endógenos, exibicionismos maníacos, vales suicidas do fundo da alma, lapsos que mudam tudo, iluminações que brilham como projéteis, todo este pacote nos diz que há um misto de comando individual e forças desconhecidas no que se quer saber de uma biografia, o mundo de um é sempre, e também, o mundo de outros, e de algo que ultrapassa toda inflexão fiilosófica: o mundo do isto.
   Então, a mente individual é de uma performance comprometida mais que comandante, demasiado humana, repleta de erros e acertos, dívidas e méritos, e que, se quer ser justa eticamente, busca na amplidão a sua maneira de ver e interpretar o mundo da vida, sabendo-se relativamente ignara e sábia, e que, neste átimo de entendimento da intuição primeira, na flor da pele, saberá, também que, dada a civilização como fator de complexidade além da compreensão de supostos mestres do pensamento, neste planeta gaia cabe tudo, carrega em si uma fortuna crítica e cabedal histórico de sobrevivência inesgotáveis, podemos a todo momento, se aprendemos a ficar atentos, sentir-pensar, ou nos deparar em quão diverso pode ser este isto que chamamos de vida, a fratura que, paradoxalmente, contém todo o devir individual e coletivo dentro do isto cósmico que é o segredo das estrelas.
   O que se pode entender com as palavras amplidão e diversidade é que neste nosso mundo, gaia, terra, tem de tudo. Costumo dizer, ultimamente, que este nosso planeta, no pensado e no vivido, é um pacote sortido e completo, para o bem e para o mal, e uma vez consciente e atento, pelas palavras amplidão e diversidade, este isto cosmológico ganha função ética nobre: o termo eloquente de que todos nós somos vidraça, e que, ao se fundamentar eticamente, no concreto e não como ideia cara, tem na prática e no hábito da suspensão do juízo, um bom exercício, quando este juízo se mostra inconveniente, desnecessário, invasivo ou pretensioso.
   Na faculdade dos juízos de valor, axiologia que nos guia a fundar o que chamamos ética, guardado o  ímpeto judicativo anulado, pela prudência, ipso facto, para casos exógenos supracitados ao fim do parágrafo anterior, esta faculdade demandará alta sensibilidade do proponente em suas ações e reflexões, e portanto, estou ou devo estar ciente que, na maioria dos casos, quando me deparo com pensamentos e ações alheios que não me dizem respeito, que não são da minha propriedade individual ou social, e que, portanto, não está interferindo no meu raio de ação, ou ainda, que pode ser sabiamente extirpada para fora de meu rol de interesses, pratico o hábito da economia do juízo, e não me precipito, não tiro conclusões açodadas, e muito menos faço o coro do Torquemada, e nisto ganho grande e inefável saúde anímica, a saúde de não ditar regras quando não estou inserido na ação, ou de não cair na ilusão de ser eu o ente judicativo de validação ou não de condutas, ações, razões, etc. do que se chama vida, e que, tolamente, na mão de alguns, que vou citar adiante, viram verdadeiros legisladores públicos numa pretensão de regência fora de seu raio de ação, ou fora do que, intuitivamente, receita toda ciência do bom senso.  Creio que o ímpeto legislador, de modo operante e forte, deve ser privativo aos casos de crimes contra a Humanidade.
   Bom, esta humilde introdução serve como orientação a uma proposta civilizacional de convivência para redução de danos, de não-interferência aonde nós não somos chamados. E esta orientação está situada contra um mal contemporâneo e muito nutrido de malícia (a esperteza dos canalhas) que é uma nova psicologia dos costumes revirada de uma pseudo-filosofia que é um grupo de arremedos de pensadores que denomino de "filósofos da vida". Ou seja, os que, sempre em tom judicativo, acham que podem captar a ciência primeira e, como verdadeiras entidades oniscientes, ditar ao outro, estranho a si, e muito mais o outro, estranho a seu pretenso legislador, o que pode ou não pode, ou pior, o que se adequa ou não ao que eles, ignorantes do circunstancial na vida deste seu outro subjugado, chamam, de modo anódino, de (sic) "os dias de hoje". (E o termo extemporâneo desta formulação, a crônica filosófica, sempre se ri dos autores fetichizados do contemporâneo).
   Falta-lhes, aos "filósofos da vida", um pouco de visão de perspectiva, de enxergar os lados diversos das questões e posições, de como o jogo funciona para cada um, das assunções biográfica e subsunções de experiências que edificam um grande e inesgotável universo íntimo e intransferível, de como colocar tudo em termos pouco refletidos, pode acarretar numa resposta desagradável a quem se propõe erística sem saber as regras, sendo então jantado por quem provocou. Este ser íntimo e intransferível, por sua vez, tem um caráter sagrado e intocável, quando não se fala de práticas criminosas ou danosas à Humanidade, a exceção civilizatória para o que tento explanar, por hora, em poucas linhas.
   Esta ética pode ter um nome próprio: a grande pedagogia dos lugares próprios que entra como esta visão em três dimensões e não unidimensional que, tolamente, é vendida como panaceia de circo e de legislação anódina e invasiva, fetichizando expressões como "agora" ou sintagmas mântricos como "os dias de hoje". E, com isso, pecam por não terem um caráter universalista de entender o mundo em toda a sua dimensão e amplitude, num amálgama inesgotável de personalidades, histórias, marcas, superações, vergonhas, e demais coisas que nos tornam tão humanos, sendo tragado por um legislador onisciente  que ignora o rosto do outro, pois este rosto, já agora deformado por uma transferência subliminar, tem no caso propagandístico só uma justificativa para seu produto, pois ele serve, o rosto, já privado de sua propriedade e design verdadeiros, à revelia, vendendo o que não quer, e ainda como subjugado em escárnio ou como ente desprovido de crítica para legislar ele mesmo em causa própria.
   Os "filósofos da vida", que também podem ser chamados de os novos legisladores do contemporâneo, ignoram o rosto do outro, as pessoas, modus vivendi infindáveis, etnias, culturas de todos os tipos e matizes, condutas e fraturas do imperfeito que eles têm horror, pois estão embriagados num fetiche ideológico do mercado de mega-aproveitamentos, super-performances, numa neurastenia que subjuga os momentos reflexivos, narcotiza a contemplação numa roda de ansiedade e numa demanda capital de provas de desempenho, com falta de autoanálise, tudo isto puxado por uma corda de aço de um imperativo pernóstico de certezas absolutas, de verdades vendáveis, de design atraente, posto que é uma ficção, e que quer no outro o que este próprio é incapaz de servir na vida coletiva, uma vida que, se colocando como legislação dirigida, perde o olhar clínico e compassivo que vê o infinito no átimo da existência, e que descobre que o juízo no alheio, obsessivamente dirigido, é uma merda. Este tipo de texto pode ser até uma meta-legislação, mas na verdade é uma legislação da falta de parâmetro dos juízos de valor, ou uma orientação, mais do que legislação, para uma transcendência refinada e bem educada em face do abuso judicativo.
   E, uma vez restabelecida a tese das fronteiras, isto é, a cada um de acordo com suas situações e circunstâncias, a ética dos lugares próprios ganha na palavra respeito seu norte e ordem, poupando inteligências prontas de ladainhas hipócritas e maliciosas destes arautos do contemporâneo que, caricatamente, os denomino aqui de "os filósofos da vida", ou, num tom de escárnio, desorientados "posers da vivência."

18/04/2015 Crônica 

Nenhum comentário:

Postar um comentário