PEDRA FILOSOFAL

"Em vez de pensar que cada dia que passa é menos um dia na sua vida, pense que foi mais um dia vivido." (Gustavo Bastos)

quarta-feira, 23 de setembro de 2020

O SUICÍDIO NA OBRA DE DURKHEIM

“A solução para o suicídio anômico estaria, segundo Durkheim, nas corporações”

Émile Durkheim se dedicou à criação de uma ciência sobre a sociedade que fosse independente da Psicologia, da Filosofia e das ciências naturais, seu empenho foi em fundamentar um método para esta nova ciência, esta era a sua busca para edificar um objeto próprio para a Sociologia, se tornando um dos pensadores mais importantes desta área de estudo da sociedade. Durkheim construiu seu pensamento na virada do século XIX para o XX.

Durkheim empreendeu, como sociólogo, uma pesquisa social em que os fenômenos  sociais eram entendidos como concretos, um dado, em que o pesquisador busca se manter neutro em relação às próprias concepções e pressupostos, e se concentra numa pesquisa baseada em dados concretos, remetendo a uma objetividade do mundo empírico. Durkheim, por conseguinte, define como conteúdo de sua pesquisa o que ele vai chamar de fatos sociais.

Para Durkheim, os fatos sociais são definidos, segundo ele : “toda maneira de fazer, fixada ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior; ou ainda, toda maneira de fazer que é geral na extensão de uma sociedade dada e, ao mesmo tempo, possui uma existência própria, independente de suas manifestações individuais”.

Além de manter a neutralidade, e também tratar o fato social como coisa, para Durkheim, o sociólogo deve levar em consideração a consciência coletiva dos indivíduos. A consciência coletiva sendo compreendida como “o conjunto das crenças e dos sentimentos comuns à média dos membros de uma mesma sociedade”, segundo Durkheim.

Tomando este método de estudo dos fatos sociais segundo uma orientação que parte da consciência coletiva como origem dos fatos sociais, Durkheim se debruça sobre o tema do suicídio. Durkheim, então, afirma que o suicídio não tem uma causa individual, mas uma causa social, e então Durkheim tenta compreender o suicídio definindo o que é este fenômeno.

O ponto que Durkheim levanta em sua pesquisa, por conseguinte, é que o suicídio é entendido como um fenômeno que varia numa razão inversa em relação com a coesão social, e parte desta pesquisa as três categorias de suicídio que Durkheim vai tematizar, portanto, que são : o suicídio egoísta, o suicídio altruísta e o suicídio anômico.

No tema do suicídio egoísta, Durkheim cita a questão da confissão religiosa como causa e balizadora deste tipo de suicídio. Segundo Durkheim, os países católicos e judeus possuem uma maior coesão social, portanto, Durkheim registra nestes países uma taxa menor de suicídios, ao passo que em países de confissão predominantemente protestante, com um individualismo mais forte e uma menor coesão social, estes índices de suicídios são maiores.

Outro exemplo de causa para o suicídio egoísta dado por Durkheim está no caso dos homens solteiros, divorciados e as viúvas, o que Durkheim nos diz do papel da família como um esteio que evita estes tipos de suicídios, com o indivíduo assumindo responsabilidades, tendo funções dentro do núcleo familiar. Pois, quando este indivíduo se afasta da família, para Durkheim, ele perde o sentido da vida, pois não tem mais a proteção da instituição familiar. Portanto, quando o pertencimento a grupos se enfraquece, os suicídios egoístas aumentam, contexto no qual a individuação se intensifica e a coletividade se enfraquece.

No caso do suicídio altruísta, Durkheim cita as sociedades simples, tomando como exemplo os velhos guerreiros bárbaros que se matavam ao ficarem doentes e fracos, pois não podiam mais defender o seu grupo. Outro exemplo, este nas sociedades mais complexas, é o suicídio do soldado que se sacrifica para salvar seu colega de farda, se matando também por vergonha de perder uma batalha. No suicídio altruísta, ao contrário do suicídio egoísta, temos o elemento de coesão social atuando como motivação do ato, e não a individuação excessiva, como no suicídio egoísta. Portanto, o suicídio altruísta busca preservar ou salvar a coesão social.

O último tipo de suicídio definido por Durkheim é o suicídio anômico, que, para ele, está mais presente na sociedade industrial moderna, que é quando Durkheim nos fornece a definição que diferencia o que ele chama de solidariedade mecânica, e a transição desta, na sociedade moderna, para o que Durkheim chama de sociedade orgânica, nesta que Durkheim afirma estar a consciência coletiva e a moral enfraquecidas.

O enfraquecimento dos laços sociais nas sociedades orgânicas, que são as da modernidade industrial, decorre de uma divisão do trabalho que diminui a identidade de seus membros, realizando um processo de individuação, perdendo a coesão deste mundo do trabalho que existia nas sociedades simples, em que havia uma solidariedade mecânica, em que tudo se move em conjunto no mesmo sentido, em que os movimentos dos indivíduos estão ligados inextricavelmente ao grupo a que pertencem.

Por sua vez, com a especialização que houve nas atividades modernas, decorrente de uma nova divisão do trabalho, de caráter industrial, Durkheim vai afirmar que nas sociedades complexas a consciência coletiva perde força e ocorre o que ele vai chamar de anomia social, numa solidariedade que Durkheim vai chamar de orgânica, que não é mais baseada em consenso moral ou no apego do indivíduo à coletividade, pois aqui o trabalho passa pela especialização, o que leva à individuação, diminuindo a consciência coletiva, e gerando o suicídio anômico.

A solução para o suicídio anômico estaria, segundo Durkheim, nas corporações, pois estas seriam formadas por um corpo de indivíduos de diferentes confissões religiosas e posições políticas que exercem um determinado tipo de trabalho na sociedade visando o bem estar desta, recuperando o sentido de bem comum perdido pela anomia, através desta reforma institucional, na qual as instituições voltam a um funcionamento normal, quando Durkheim nos diz : “é preciso, sem afrouxar os laços que ligam cada parte da sociedade ao Estado, criar poderes morais que tenham sobre a multidão de indivíduos uma ação que o Estado não pode ter”. As instituições devem caminhar junto com o Estado, neste auxílio à coesão social, em que exista um bom funcionamento da  sociedade.

 

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.

Blog : http://poesiaeconhecimento.blogspot.com

 

 

 


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